Em 1996 ou 1997
minha vida foi afetada de maneira definitiva quando comprei Spirit
in the Dark, gravado por Aretha Franklin. Embora seja um dos discos
de menor sucesso comercial em seu período resplandecente,
contém duas das mais preciosas gemas que a Lady Soul
já cantou: a faixa-título e a inexplicável
"Don't Play That Song" que me arrepia só de lembrar.
Aliás, ouvindo o disco neste momento pela enésima
vez e vendo Aretha debulhando no piano em "The Thrill Is
Gone (From Yesterday's Kiss)" só posso pensar que
o arrepio nunca passou. E que continue assim pelo resto da minha
vida...
Muitas
vezes os melhores trabalhos para mim são discos que pessoas
ou "críticos sérios" torcem o nariz. Assim
ninguém entende como posso achar Station to Station
como o melhor álbum de David Bowie, especialmente se contar
seu imenso e impecável catálogo setentista.
É difícil
explicar o que faz um disco nos pegar mais que os outros. Para
mim, a explicação sobre Spirit in the Dark
se deve a alguns elementos que foram reforçados quando
li a história dele.
Deixe-me ser mais claro:
nesse álbum, Aretha Franklin fez um disco de canções
mais amarradas, mais conectadas, quase um álbum conceitual,
digamos. Ao invés de várias pérolas de dois
ou três minutos de corte impecável e precioso apelo,
Aretha optou por um disco mais de alma, mais profundo.
Talvez seja por isso que
não tenha sido um grande sucesso comercial - se comparado
a outros - e pouco lembrado. Mas, para mim, Spirit in
the Dark representa não apenas o melhor disco
dela, mas no mesmo patamar de What's Going On,
embora ninguém concorde comigo, nem mesmo Aretha, talvez.
Aretha
já era a Lady Soul, a maior voz da América
quando entrou para gravar seu nono disco pela Atlantic em um período
de três anos. Era ela a dona da voz mais doce e perfeita
que o mundo já ouvira, uma representante das mulheres com
suas canções que falavam de maneira incisiva sobre
o universo feminino e as injustiças que sofriam.
No início dos anos
70, Aretha era muito mais do que uma tremenda estrela; Aretha
era um símbolo.
E foi essa mulher madura,
recém-saída de um casamento conturbado com o marido
e empresário Ted White e que havia sido mãe pela
quarta vez, meses antes de Kecalf.
Quando Aretha entrou no
mês de março de 1970 para gravar o disco, no Criteria
Studios, em Miami, trazia algumas de suas melhores músicas,
assim como músicos de estatura como o guitarrista Duane
Allman, que participou de "Pullin'" e "When the
Battle is Over", além de uma idéia de fazer
um disco que falasse mais de sua vida, medos e esperanças.
A
primeira faixa, "Don't Play That Song", que abre o disco,
composta por Betty Nelson e Ahmet Ertegun, já havia sido
gravada anteriormente por Ben E. King (compositor de "Stand
by Me"), mas atingiu um outro nível com Aretha.
Ela implorou para que
os DJs não a apresentassem como uma canção
de separação e de dor, já que havia muita
vida e alegria em sua interpretação. Não
colou. E nem deveria.
Em pouco mais de três
minutos, Aretha fornece um dos momentos mais sublimes que a voz
humana poderia fornecer. Cada chorosa e sofrida nota cantada por
ela hipnotiza o ouvinte. Embora não tenha sido um imenso
sucesso - 11º primeiro lugar na parada pop, embora tenha
ocupado o primeiro lugar na parada de R&B -, Aretha abre o
disco de maneira arrasadora.
A
faixa seguinte, "The Thrill Is Gone (From Yesterday's Kiss)",
mostra que o disco era coisa muito séria.
Um clássico do blues,
cantada de maneira pungente e tendo uma Aretha ainda mais pungente
no piano, além de uma penca de músicos excepcionais,
mostra Aretha querendo colocar todas suas dores para fora. Especula-se
que foi uma mensagem ao ex-marido. Verdade ou não, é
que poucas vezes uma faixa passou tanta paixão e honestidade.
"Pullin'" continua
a explorar momentos de grande intimidade e foi gravada na primeira
visita de Aretha aos estúdios, em outubro de 1969.
A
quarta-faixa, "You and Me" é a primeira das quatro
faixas compostas pela própria Aretha, lindamente executada.
A coisa fica realmente séria na faixa-título, escrita
por ela.
A cantora jamais soube
explicar o significado do título - espírito no escuro
- dizendo que era algo extremamente pessoal para ser posto a público.
Arehta explicou que todas as canções possuem raízes
em suas experiências pessoais.
A canção
se inicia de maneira lenta, com Aretha ao piano e vocais de fundos
e vai crescendo até um final em que ela pratica o velho
chamado-e-resposta tão comum no soul. Na letra, Aretha
faz uma espécie de hino pacifista perguntando aos seus
irmãos e irmãs como se sentem. Uma canção
de imensa força, mas não de tanto sucesso - apenas
23ª posição na parada pop e 3ª na de R&B.
O
disco fecha com a clássica "Why I Sing the Blues",
composta por B. B. King e Dave Clark e que dava o exato tom ao
álbum.
Lançado em 12 de
setembro de 1970, foi o primeiro disco dela que não chegou
entre os 20 mais da Billboard, batendo apenas na 25ª posição.
Apesar disso, o produtor Jerry Wexler considera, justamente, um
dos melhores discos de Aretha.
"Spirit in
the Dark é um tremendo disco. O que aconteceu
é que tivemos pouca sorte com os compactos e você
sabe que são eles que puxam as vendagens do LP. Mas é,
sem dúvida uma, uma obra-prima."
Deixo vocês com a
imensa discografia dela e desejando nessa primeira coluna de 2008
um bom ano a todos. Um abraço e até a próxima
coluna.
Discos
1956 The Gospel Soul of
Aretha Franklin
1961 Aretha
1962 The Electrifying Aretha Franklin
1962 The Tender, The Moving, The Swinging Aretha Franklin
1963 Laughing on the Outside
1964 Unforgettable: A Tribute to Dinah Washington
1964 Runnin' Out Of Fools
1965 Yeah!: Aretha Franklin in Person
1966 Soul Sister
1967 Take It Like You Give It
1967 I Never Loved a Man (The Way I Love You)
1967 Aretha Franklin's Greatest Hits
1967 Aretha Arrives
1967 Take A Look
1968 Lady Soul
1968 Aretha Now
1968 Aretha in Paris
1969 Aretha Franklin: Soul '69
1969 Aretha's Gold
1970 This Girl's In Love With You
1970 Spirit In The Dark
1971 Aretha Live At Fillmore West
1971 Aretha's Greatest Hits
1971 Young, Gifted and Black
1972 Amazing Grace
1972 In The Beginning / The World Of Aretha Franklin 1960-1967
1973 Hey Now Hey (The Other Side of the Sky)
1974 Let Me in Your Life
1975 You
1976 Sparkle
1976 Ten Years Of Gold
1977 Sweet Passion
1978 Almighty Fire
1979 La Diva
1980 Aretha
1980 Aretha Sings The Blues
1981 Love All The Hurt Away
1982 Jump to It
1983 Get It Right
1985 30 Greatest Hits
1985 Who's Zoomin' Who?
1986 Aretha
1987 One Lord One Faith One Baptism
1989 Through The Storm
1991 What You See Is What You Sweat
1992 Queen of Soul: The Atlantic Recordings
1994 Greatest Hits (1980-1994)
1994 The Very Best Of Aretha Franklin: The 60's
1994 The Very Best Of Aretha Franklin: The 70's
1996 Aretha Sings Standards
1997 Love Songs
1998 The Delta Meets Detroit: Aretha's Blues
1998 A Rose Is Still A Rose
1999 Greatest Hits
2001 Aretha's Best
2002 Queen In Waiting: Columbia Years 1960-1965
2003 So Damn Happy
2007 A Woman Falling Out of Love
Singles
Columbia Records
(1960-1967)
1960 "Today I Sing
the Blues" (original issue)
1961 "Won't Be Long"
1961 "Operation Heartbreak"
1961 "Rock a Bye Your Baby With a Dixie Melody"
1962 "I Surrender, Dear" (A-Side)
1962 "Rough Lover" (B-Side)
1962 "Don't Cry, Baby"
1962 "Try a Little Tenderness" (A-Side)
1962 "Just For A Thrill" (B-Side)
1963 "Say It Isn't So" (A-Side)
1963 "Here's Where I Came In (Here's Where I Walk Out)"
(B-Side)
1963 "Trouble In Mind"
1963 "Skylark"
1964 "Soulville" (original issue)
1964 "Runnin' Out of Fools"
1965 "Can't You Just See Me"
1965 "One Step Ahead"
1965 "(No, No) I'm Losing You"
1965 "You Made Me Love You"
1965 "Cry Like a Baby"
1966 "Mockingbird"
Singles relançados
pela Columbia após o sucesso de Aretha na Atlantic
1967 "Lee Cross"
1967 "Take a Look"
1968 "Soulville" (re-issue of 1964 single)
1969 "Today I Sing the Blues" (re-issue of 1960 single)
Atlantic Records
(1967-1979)
1967 "I Never Loved
A Man (The Way I Love You)" (A-Side)
1967 "Do Right Woman - Do Right Man" (B-Side)
1967 "Respect"
1967 "Baby I Love You"
1967 "(You Make Me Feel Like) A Natural Woman"
1967 "Chain Of Fools"
1968 "Satisfaction" (UK release only)
1968 "(Sweet Sweet Baby) Since You've Been Gone" (A-Side)
1968 "Ain't No Way" (B-Side)
1968 "Think" (A-Side)
1968 "You Send Me" (B-Side)
1968 "The House That Jack Built" (A-Side)
1968 "I Say a Little Prayer" (B-Side)
1968 "See Saw" (A-Side)
1968 "My Song" (B-Side)
1969 "The Weight" (A-Side)
1969 "Tracks Of My Tears" (B-Side)
1969 "I Can't See Myself Leaving You" (A-Side)
1969 "Gentle On My Mind" (B-Side)
1969 "Share Your Love With Me"
1969 "Eleanor Rigby"
1970 "Call Me"
1970 "Spirit In The Dark"
1970 "Don't Play That Song (You Lied)
1970 "Border Song (Holy Moses)" / "You And Me"
1971 "You're All I Need to Get By"
1971 "Bridge Over Troubled Water" / "Brand New
Me"
1971 "Spanish Harlem"
1971 "Rock Steady" (A-Side)
1971 "Oh Me Oh My (I'm A Fool For You Baby)" (B-Side)
1972 "Day Dreaming"
1972 "All The King's Horses" / "April Fools"
1972 "Wholly Holy"
1973 "Master Of Eyes (The Deepness Of Your Eyes)"
1973 "Angel" 20 1 37
1973 "Until You Come Back to Me (That's What I'm Gonna Do)"
1974 "I'm in Love"
1974 "Ain't Nothing Like the Real Thing"
1974 "Without Love"
1975 "With Everything I Feel In Me"
1975 "Mr DJ (5 For The DJ)"
1976 "You"
1976 "Something He Can Feel"
1976 "Jump" / "Hooked On Your Love"
1977 "Look Into Your Heart"
1977 "Break It To Me Gently"
1977 "When I Think About You"
1978 "Almighty Fire (Woman Of The Future)"
1978 "More Than Just A Joy"
1979 "Ladies Only"
1979 "Half A Love"
Arista Records
(desde 1980)
1980 "United Together"
1980 "What a Fool Believes"
1981 "Come To Me"
1981 "Love All The Hurt Away" (with George Benson)
1982 "It's My Turn"
1982 "Jump To It"
1982 "Love Me Right"
1983 "This Is For Real"
1983 "Get It Right" 61
1983 "Every Girl (Wants My Guy)"
1985 "Freeway of Love"
1985 "Who's Zoomin Who?"
1985 "Sisters Are Doin' It For Themselves" (with Eurythmics)
1986 "Another Night"
1986 "Freeway Of Love" (UK reissue)
1986 "Ain't Nobody Ever Loved You"
1986 "Jumpin' Jack Flash"
1987 "Jimmy Lee"
1987 "I Knew You Were Waiting (For Me)" (with George
Michael)
1987 "Rock-A-Lott"
1987 "If You Need My Love Tonight" (with Larry Graham)
1988 "If Ever A Love There Was" (with Four Tops)
1989 "Through The Storm" (with Elton John)
1989 "It Isn't, It Wasn't, It Ain't Never Gonna Be (with
Whitney Houston)" 1989 "Gimme Your Love" (with
James Brown)
1990 "Think" (from The Blues Brothers soundtrack) (UK
release only)
1991 "Everyday People"
1991 "Someone Else's Eyes"
1991 "Ever Changing Times" (featuring Michael McDonald)
1992 "Someday We'll All Be Free"
1994 "A Deeper Love" (Ft Lisa Fischer)
1994 "Willing to Forgive"
1994 "Honey"
1996 "It Hurts Like Hell"
1998 "A Rose is Still a Rose"
1998 "Here We Go Again"
1998 "In Case You Forgot"
1999 "In The Morning"
1999 "How Many Times"
2003 "The Only Thing Missin'"
2003 "Wonderful"
|