134 - Associates


Uma das bandas chaves do movimento new wave inglês, o Associates era um duo formado por dois talentosos nomes – o vocalista Billy Mackenzie e o tecladista Alan Rankine. Em 1982 lançaram um excepcional trabalho chamado Sulk, cheio de sutilezas e requintado. Um clássico do gênero. O grupo, no entanto, teve vida curta e um triste final com a morte de Billy por overdose de pílulas, no dia 22 de janeiro de 1997. Aos 39 anos e muito deprimido, tomou uma enorme quantidade de um potente remédio e deixou um bilhete de adeus. Com ele, se foi uma das bandas mais sofisticadas dos anos 80 e um grande cantor.


Billy MacKenzie“Billy tinha uma voz assustadora. Veja, eu consigo cantar em duas oitavas e meia, mas ele atingia quatro oitavas e meia!” A definição de Ian McCulloch, do Echo and the Bunnymen para a voz de Billy MacKenzie faz sentido.

William MacArthur MacKenzie nasceu em 27 de março de 1957, na cidade escocesa de Dundee e sempre foi uma pessoa extremamente quieta, embora de forte personalidade quando confrontado. Desde menino se apaixonou pelo som de grupos como Roxy Music, David Bowie e Sparks e desde cedo criou uma paixão compulsiva pela música. “Eu sou violento, e violento mesmo quando ouço falar de música. Eu canto para mim mesmo antes de dormir. Ela é minha melhor amiga.” E Billy tinha uma voz forte, teatral, intensa e adorava se inspirar em seus artistas favoritos para cantar.

Sua paixão pela música e sua voz incomum fez com que o jovem Billy começasse e dar seus primeiros passos para a fama. Em 1976 ou 1977 integrou um trio com Angela Forbes e Patrícia Wilson com outros músicos locais. A banda, da qual ninguém se recorda o nome, fez apenas duas apresentações e o repertório era basicamente de clássicos da soul music.

Alan RankineApós deixar o tal grupo, Billy entrou para um outro, chamado Stan and Deliver, igualmente inspirada em música negra. E um desses shows, apareceu um garoto chamado Alan Rankine. Rankine era guitarrista de uma banda chamada Caspian e já conseguia os dotes vocais de Billy, por intermédios de terceiros. E ao vê-lo e ouvi-lo resolveu convida-lo para entrar no grupo. Nesse meio tempo, foi convidado para entrar em outra banda, Bread Poultice And The Running Sores, que tinha Steve Reid como guitarrista.

Na primeira audição que fez com Caspian, surpreendeu ao cantar a-capela “The Great Gig In The Sky”, do Pink Floyd. Rapidamente, os dois começaram a escrever algumas músicas e em 1977 tiveram a primeira experiência em um estúdio, quando gravaram uma demo com o grupo. Essas demos foram distribuídas por vários selos e chamaram a atenção de Chris Parry, da Fiction Records, gravadora que ficaria famosa com o The Cure, pouco tempo depois.

Quando Billy e Alan chamaram a atenção de Parry, já não faziam mais parte do Caspian. Eles eram, agora, uma dupla chamada Mental Torture. O nome Associates nasceu da sigla “APB Music”, que significava Associação de Parry e Babson, nome da companhia fundada por Parry e que cuidava dos negócios da Fiction. Billy achou a palavra “Associates” bem mais fácil e comercial do que “Mental Torture” e assim o grupo foi batizado.

Mas antes de gravarem pela Fiction soltaram um compacto, em 1979, com uma cover de “Boys Keep Swinging”, de David Bowie e que havia sido lançada pelo camaleão no disco Lodger do mesmo ano.

capa do disco The Affectionate PunchInteressado no som diferente do duo, Parry os levou para o estúdio e de lá saíram com o primeiro disco, The Affectionate Punch.

O disco foi uma bela estréia e a prova de que o grupo era uma avis rara no meio pop. Paul Morley, da New Musical Express, descreveu o disco como “bom demais, espetacular demais para soar como apenas uma cópia de Bowie.” Segundo Morley, “Billy tem vocais remanescentes de Bowie, mas que Bowie jamais cantou com tanta paixão e sutileza como ele. "Os Associates soam como o evocativo Cure e o dramático Magazine. Suas canções são inventivas, consistentes, irônicas, irreverentes, o que faz do disco uma obra-prima.” Palavras elogiosas, não?


Billy ao vivo em 1980Os Associates mostravam que tinham um excelente ouvido e gosto para melodias, e ao vivo o grupo, passava do cafona ao melodramático, do intenso ao calmo, em segundos. O grupo encabeçava a nova cena “new wave”, ao lado de Heaven 17 e Human League. A diferença é que ninguém tinha um cantor como MacKenzie.

Embora o sucesso começasse a despontar, uma faceta de Billy iria atrapalhar muito a carreira do duo: sua ojeriza pela publicidade. Billy não conseguia aceitar certas imposições das gravadoras.

capa do disco Fourth Drawer DownEm 1981 eles deixam a Fiction e vão para a pequena Situation Two. Lá gravam cinco compactos, que acabaram sendo lançados em um disco chamado Fourth Drawer Down.

O sucesso dos Associates começou a incomodar e Billy confessa que era ridicularizado na Escócia: “parecia que toda a Escócia estava contra mim porque eu estava fora do limbo. Sempre que eu passava pela rua apontavam para mim e perguntavam ‘quem é o impostor’ porque eu não estava fazendo música de três acordes. Em Dundee, me atacavam e me acusavam de veado. Eles achavam que eu era pretensioso, mas eu sempre fui naturalmente assim. Mas por outro lado, tudo isso foi bom, porque eu reagi e me direcionei em fugir daquela realidade de que ninguém faz sucesso por lá, e de alguma maneira, aquela cidade me fez ser quem sou.”

capa do disco SulkE se a Escócia o ridicularizava, iria ficar fula da vida em 1982. A culpa seria de um disco alçado à condição de clássico instantâneo: Sulk. Tudo aquilo que o grupo sonhara, chegara: sucesso, música entre as 10 mais e elogios de todas as partes.

Sulk não é um disco óbvio de sintetizadores e vocais dramáticos e distantes. É uma obra de duas pessoas que discutiam, brigavam e, ainda assim, faziam um trabalho excepcional. Rankine queria um trabalho mais simples e acessível e Billy buscava a experimentação. Dessa ambigüidade saíram faixas pops como “Party Fears Two”, que chegou às 10 mais e “18 Carats Love Affair”, lançado originalmente em single, dois meses depois, e que não fazia parte do LP original. A capa do single trazia Billy nu de costas, no chão, para alegria de seus detratores.


capa do single 18 Carats Love AffairO disco aumentou ainda mais a fama da banda, mas curiosamente a matou, já que Alan Rankine deixou o grupo, por não suportar mais o temperamento volátil do cantor. E sem Alan, Billy não teve outra alternativa a não ser matar sua galinha dos ovos de ouro.

Durante dois anos, o grupo sumiu até que Billy ressucitou com Steve Reid, que conhecera no grupo Bread Poultice And The Running Sores, em junho de 1984. Sem Alan, mas em poder legal do nome Associates, Billy estava de volta. Havia quem duvidasse que aquela figura excêntrica, difícil e que havia brigado com a Sire, antiga gravadora, pudesse conseguir algo. E Billy retrucava, dizendo que tinha mais respeito por cirurgiões cardíacos do que por músicos, já que ao menos os primeiros possuíam boas maneiras e não eram invejosos.

Em uma entrevista para a revista Sounds, em 1984, o cantor disse que ele expulsara seu colega por esse não aceitar algumas direções artísticas. Na verdade, Alan e a Warner, dona da Sire, estavam enlouquecidos com os elevados gastos de Billy que pesquisava em estúdio sem parar: “quando fico excitado com algo, preciso continuar até terminar. Não faço por dinheiro, glamour ou fama, e sim por aventura e pelo prazer, e Alan prefere as coisas mais seguras. Isso não faz dele uma pessoa pior ou melhor do que eu, mas estava claro que precisávamos nos separar.”

Outro motivo para a separação é que Billy havia torrado toda a grana que a Warner havia dado para financiar uma turnê, fato negado pelo cantor: “apenas não excursionamos porque os músicos não cabiam dentro do que eu queria.”

No futuro, Billy diria que Alan deixou a banda por problemas de saúde, já que era grande usuário de drogas e que pretendia fugir desse mundo. Alan pouco disse, porém, mais tarde, diria que ficou sem entender o motivo de Billy refutar a vida de um pop star e que ele temia a máquina que gira por detrás de tudo isso.

capa do disco PerhapsPerhaps, lançado em 1985, deveria ter sido lançado no ano seguinte, mas sofreu severas críticas dos diretores da gravadora, revoltados em terem gasto US$ 50 mil com um disco que julgavam de “qualidade inferior”. Má vontade ou não, é justo dizer que desta vez eles estavam certos. Sem Alan, Billy ficou mais solto para suas experimentações e parece ter perdido a receita.

Com uma foto na capa mais austera, trazia canções mais sexuais. Billy afirma que queria passar uma imagem de “cafetão” com a foto e que oscilava entre seu lado gentil e durão. “Embora a música tenha muito de feminino, é meu lado masculino que a conduz”, dizia.

Mesmo não tendo um material excelente, o grupo saiu finalmente em uma excursão, ou quase uma.


Na América ficou restrito a apenas dois shows na Danceteria, em Nova York, na véspera do Ano Novo de 1984 para 1985. O grupo ainda faria alguns shows em 1985 pela Europa, até serem dispensado pela gravadora e sumirem.

E Billy sumiu por muito tempo. Voltou para Dundee e ficava em casa e começou a levar uma vida pacata demais para quem havia sido uma estrela da música.

“Veja, eu ganhei muito dinheiro e esbanjei alegremente cada centavo. Mas eu percebi que precisava de uma fortaleza para poder viver bem, e fui atrás dos interesses dos Associates, peguei o dinheiro restante e investi em uma boa casa e em um carro. E assim mantive o resto de dinheiro que possuía. Infelizmente tive que virar um proprietário, mas por outro lado não tive mais que agüentar o circo da indústria fonográfica, que quase destruiu minha natureza benigna.”

Mas em 1988, ele volta e desta vez regravando um clássico: “Heart of Glass”, do Blondie.

capa original do disco The Glamour Chase, que foi abortadoMas Billy ainda tinha um problema com a WEA, que simplesmente abortou o disco e o guardou. Billy guarda mágoa até hoje do episódio: “a gravadora não entendia meu ponto de vista. Eles queriam me colocar certa vez em um programa de marionetes! Isso não é para o meu estilo e eles queriam programar cada passo meu. E isso acabou acontecendo com The Glamour Chase. Eu adorei fazer esse disco e ele tinha grandes canções, como ‘Empires of Your Heart’ que é tão boa quanto ‘Heroes’ de Bowie. Só que a gravadora não me ofereceu suporte algum e quando o pessoal da A&R ouviu e adorou, eles ficaram irritados e o engavetaram. Em minha visão, o pequeno é maravilhoso, o grande é ruim. Eu sempre quis manter o grupo pequeno, eles o queriam grande. Sei que essa minha visão é a errada, mas não posso trabalhar com gente tão mesquinha e isso me matou lá dentro.”

Bastante deprimido e com a alta estima em frangalhos, lança em 1991 Wild And Lonely, um disco que ele considera um erro. “Quando lancei esse disco, aproveitei muita coisa da época de The Glamour of Chase. Eu não tinha muito material escrito e foi feito em uma período terrível para mim. Uma das minhas irmãs perdeu seu bebê, que viveu apenas 11 dias – Stephanie Monique McGregor. Também usei mais músicos de verdade do que costumava. Eu queria mostrar para meus fãs que ainda estava vivo.”

capa do disco OuternationalSem motivo em continuar com o grupo, ainda tentou voar na carreira, mas agora com seu próprio nome. Em 1992 lança Outernational, que não faz sucesso e algumas esparsas parcerias com Barry Adamson e um dueto com Siobhan Fahey do Shakespeare’s Sister – grupo que tirou nome de um antigo single dos Smiths. Siobhan também fez parte do Bananarama -, que ela jura ser a última canção gravada por Billy, projeto que teve apenas um single lançado – “I Can Drive – e depois foi engavetado. O disco só foi lançado em 2004 com o nome de Do I Scare You e está disponível apenas no site da cantora, www.siobhanfahey.com.

Mas a vida estava difícil para Billy, que viu sua mãe morrer no dia 15 de julho de 1996, aos 60 anos. Enfrentando uma depressão imensa, insatisfação na carreira e solidão, abusou de alguns remédios prescritos para depressão e morreu no jardim da casa de seus pais, em Auchterhouse, Dundee. Ele havia acabado de assinar um contrato com a Nude Records, a mesma do Suede, e preparava uma volta. Por isso, há quem jure que sua morte não faz sentido e foi um acidente.

Quando seu corpo foi descoberto por seu pai, houve uma certa comoção. Alan conta que conversou com Billy em 1991 e combinaram de fazer algo. “Em 1993 nos reunimos após o primeiro telefonema e fizemos 17 ou 18 músicas em um final de semana. Tivemos uma oferta de uma grande gravadora, mas Billy estava fragilizado com todos os problemas anteriores e recuou. Ele dizia que queria fazer coisas paralelas e não ficar preso novamente aos Associates. Quando vimos que não havia mais chances, nos separamos. Mas eu gostava muito dele. Ele não era perfeito, mas tinha grande vivacidade e garanto que a maioria das minhas risadas que dei na minha vida, foi quando estávamos juntos. Foi uma perda enorme para mim e para a música.”

Billy foi enterrado na mesma Dundee que sua sobrinha, em 1989 e sua mãe, em 1996. Apesar da foto não ser grande, o nome dos três aparece nessa lápide e se você quiser saber mais sobre o grupo, o cantor e até ver essa foto e outras, acesse o site http://www.billymackenzie.com/.

Deixo vocês com as letras de “Party Fears Two” e “18 Carat Love Affair” e a discografia do grupo. Um abraço e até a próxima coluna.


Party Fears Two

I'll have a shower and then phone my brother up
Within the hour I'll smash another cup
Please don't start saying that or I'll start believing you
If I start believing you I'll know that this party fears two

And what if this party fears two
The alcohol loves you while turning you blue
View it from here from closer to near
Awake me

Don't turn around I won't have to look at you
And what's not found is all that I see in you
My manners are failing me I'm left feeling ugly
And you say it's wonderful to live with I never will

So what if this party fears two
The alcohol loves you while turning you blue
View it from here from closer to near
Awake me

I'm standing still and you say I dress to well
Still standing still I might but it's hard to tell
Even a slight remark makes nonsense and turns to shark
Have I done something wrong
What wrongs the wrong that's always in wrong

I'll have a shower
And then phone my brother up
Within the hour
I'll smash another cup

18 Carat Love Affair

I told you not to meet me here
I can't be seen with you whispering in my ear
I don't mind holding hands but not in front of company
It's not the done thing 'round here, baby
Next weekend we'll be on our own
And we can spend some time together all alone
But if she knew what I was doing
She'd throw the ring back into my face
An 18 carat love affair
Would then be stamped 'repair'
So we can't be seen in this place

Love affair
An 18 carat love affair
I don't know which side I'm on
But my friend John said not to care

Love affair
An 18 carat love affair
She might write to Evelyn home
If left alone and in despair

Please don't leave any clues around
The last time we...
She found some lipstick on the ground
I said an Avon girl had called
Free samples on display
She left her card
But I threw it away
But if she knew what I was doing
She'd throw the ring back into my face
An 18 carat love affair
Would then be stamped 'repair'
So we can't be seen in this place

Love
An 18 carat love affair

Discografia

Boys Keep Swinging (compacto, 1979)
The Affectionate Punch (1980)
Fourth Drawer Down (1981)
Sulk (1982)
The Affectionate Punch - The Remix (1982)
Perhaps (1985)
The Peel Sessions 1981 (1989)
Wild And Lonely (1990)
Popera – The Singles Collection (1991)
The Radio 1 Sessions (1994)
Associates: Double Hipness (2000)
Perhaps/The Glamour Chase (edição dupla de cd, contendo o disco que não foi lançado originalmente em 1988, 2002)
The Radio One Sessions Volume One 1981-1983 (2003)
The Radio One Sessions Volume Two 1984-1985 (2003)
Associates: Singles (2004)


 

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