83 - The B-52's

Essa é com certeza a banda mais legal do mundo mesmo passados mais de 20 anos. Não importa se Kate Pierson já passou dos 50 anos, se Ricky Wilson (cérebro do grupo) morreu em 1985, de Aids ou se hoje suas danças e sua alegria contagiante são meio fora de moda ou propósito nesse mundo tão certinho e sem sal de hoje. Mas houve um tempo que cabelos bufantes, roupas de cores berrantes e risos imensos eram a tônica das noites de sábado, que a bebida mais gostosa era um hi-fi ou um uísque vagabundo e o máximo era se requebrar ao som de "Legal Tender" e "Private Idaho". Não era o visual impecável do Duran Duran que fascinava, as poses sensuais de Madonna ou a raiva estampada no rosto do adolescente irado Bono que te tirava de casa. Eram Kate Pierson, Cindy Wilson e o vozeirão de Fred Schneider que faziam tudo valer a pena. E dane-se os outros que reclamavam disso ou aquilo, porque quando o B-52's rolava na pista você dançava e rachava o bico ao mesmo tempo. Alguém hoje sabe misturar essa puta receita?


A minha primeira imagem quando alguém fala "Rock in Rio" é uma só: estava eu em Campinas com meu pai, de castigo. Péssimo aluno como sempre fui tinha ficado de recuperação o mês inteiro de janeiro na escola e um final de semana ele foi para lá trabalhar. Como minha mãe havia viajado com minhas irmãs para o litoral (que sempre odiei nessa época do ano) e não tinha com quem ficar, lá fomos os dois. Para variar, meu pai não havia feito reserva e fiquei conversando com uma estonteante recepcionista e vendo televisão. E na TV, bem meus amigos, nela estava passando um compacto do Rock in Rio e nesse exato momento adentra o bife com chuchu frente àquele mundão de gente pulando. E sabe a primeira coisa que me chamou a atenção? A peruca branca de Cindy Wilson, com uma camisa sem manga e vermelha feito um pimentão, suando. Eu a achei tão linda naquela hora! Nunca mais me esqueci disso.

Enquanto eu assistia e ficava brincando de jogar amendoim para o ar ensinando a musa da recepção a técnica de comer sem deixar cair (guloso que sempre fui), ia dançando com "Legal Tender", que coincidentemente tocava na rádio. Não preciso dizer que consegui um quarto rapidinho, não estudei patavinas e ainda ganhei um bilhetinho da tal moça e um beijo na bochecha que teimei em deixar de lavar por dias. Bem, esse foi o meu Rock In Rio 1985 e isso significa B-52's para mim. Como odiar ou achar chato uma banda dessas?

Kate, Fred, Ricky, Cindy e KeithDepois desse naco absolutamente inexpressivo e saudosista de minha aborrescência vamos ao assunto propriamente dito...

Na mesma Athens que daria ao mundo o R.E.M., nasceu o B-52's. Athens é uma cidade essencialmente de estudantes e sempre teve uma forte cena alternativa e lotada de eventos culturais.

Cinco jovens de classe média sonhavam em deixar o pequeno estado da Georgia e encontraram na música uma alternativa.

Os irmãos Cindy e Ricky Wilson ao lado de Fred Schneider, Kate Pierson e Keith Strickland resolveram então criar toda uma ideologia meio esotérica, meio futurista e totalmente camp.

Nascia o B-52's, nome de um avião da Segunda Guerra Mundial e principalmente uma gíria do sul do Estados Unidos para designar perucas extravagantes.

Era novembro de 1976, após um jantar em um restaurante chinês e os cinco jovens reuniam-se para moldar o conceito.

A instrumentação ficava por conta de Keith e Ricky. Aliás, Ricky desenvolveu um método todo peculiar: sua guitarra possuía apenas cinco cordas, ao invés de seis e usava afinações completamente malucas. Keith alternava entre bateria, teclados (também pilotados por Kate).

As primeiras apresentações e reações foram das mais diversas: há quem viu naquela frivolidade uma alienação, especialmente os jovens que militavam no nascente movimento punk. Por outro lado, havia quem gostasse daquela explosão de cores e nonsense e chegaram até serem enquadrados como um grupo de disco music!

Sua estréia aconteceu em um dia dos namorados do ano seguinte, na casa de amigos. Como toda banda partiram para Nova York e aportaram no lendário clube CBGB, onde toda a geração punk norte-americana havia feito escola, gente como Talking Heads, Patti Smith, Television, Blondie, Modern Lovers, etc...

disco de estréiaDe mera curiosidade começaram chamar a atenção de várias pessoas que adoravam o alto astral da banda e sem muita dificuldade conseguiram um contrato e gravaram seu primeiro disco, simplesmente intitulado The B-52's.

Lançado pela Warner, o disco vendeu 500 mil cópias, número respeitável para uma banda novata que acabaria sendo um dos pilares da new wave. A mistura de bom humor com passos de dança intitulados como "dança do atum tímido" conquistaram toda uma garotada que queria diversão. Mesmo sem apoio das rádios comerciais, mas escorados em sucessos como "Rock Lobster," e "52 Girls.", atraíam punks de todos os lugares para buracos do Lower East Side.

E os punks admiravam aquela banda que mesmo sem fazer uma música "séria" desafiava a caretice e demonstravam forte personalidade em suas performances. O B-52's era alegre, divertido e até descartável, mas não eram jovens tolos ou alienados. Apenas canalizavam suas críticas através da comédia.

capa de Wild PlanetKate Pierson lembra que o público era basicamente formado por jovens que se sentiam marginalizados, desde punks, passando por gays e todas as minorias. "Nossos shows eram uma espécie de celebração de todos aqueles que queriam dar seu grito de liberdade. Nossas danças, roupas e letras ajudavam todos a extravasarem a repressão que sofriam dos pais e da sociedade", conta Pierson.

No ano seguinte lançaram Wild Planet. Ao invés de Chris Blackwell na produção Rhett Davies comandou a segunda revolução do grupo. O disco explodiu de vez graças ao megahit "Private Idaho" e sedimentou definitivamente o conceito sonoro e estilístico da banda, que permeou toda cena alternativa e new wave por toda a década de 80. Além de "Private Idaho", "Give Me Back My Man" e "Strobe Light" foram imensos sucessos por todo mundo.

Aproveitando o fato de serem os favoritos das famosas festinhas feitas em garagens das casas do mundo todo, lançaram um EP chamado Party Mix!, em 1981, com seis músicas dos dois primeiros álbuns mixadas.

Tanto sucesso chamou atenção de um antigo fã e um dos mais respeitados membros da safra "CBGB": o talkng head David Byrne. Byrne pediu para produzir um disco do grupo encantado com o que via e ouvia.

O resultado foi Mesopotamia de 19982, que apesar de ser o melhor disco em termos técnicos foi um fracasso comercial e de certa forma, uma decepção para os fãs de primeira hora. O motivo foi que David resolveu abordar alguns temas mais sérios e diluir toda a verve humorística da banda. Apesar de elogios por parte da crítica, o disco ficou aquém do esperado.

capa de Whammy!Mas tudo bem, nada que abalasse a reputação do grupo e no ano seguinte voltaram à boa forma com Whammy!, que trouxe o segundo grande megahit do grupo, "Legal Tender".

A letra contava histórias de garotos imprmindo dinheiro falso em um porão e o vídeo hilário foram a febre da jovem MTV. Definitivamente a banda era a mais aclamada entre as new wave do planeta e com um humor que, talvez, apenas o Devo poderia assemelhar-se.

Durante um intervalo regulamentar, o vocalista Fred Schneider, dono do vozeirão do grupo, lança seu primeiro disco solo, Fred Schneider & the Shake Society e conseguiu um certo sucesso com a canção "Monster", em 1984.

E quando retomaram às atividades no ano seguinte para a gravação de um novo disco, ocorre a grande tragédia: Ricky Wilson morre em 12 de outubro de 1985. O primeiro diagnóstico foi causa natural, mas logo depois mudaram a causa mortis para câncer linfático e posteriormente para uma nova epidemia que começaria a assombrar o mundo: AIDS.

Além de irmão de Cindy, o que só aumentava o laço de amizade entre os integrantes, Ricky era o cérebro de toda cosmologia do grupo e seu principal arranjador, compositor e letrista. "Ele tinha realmente uma visão diferente do mundo", confessa Cindy. Keith, seu melhor amigo, chegou a cogitar deixar a banda, arrasado. "Continuar sem Ricky é como fazer parte dos Beatles sem Lennon", exagerou.

os quatro integrantes originais e a capa de Cosmic ThingRicky havia morrido durante as primeiras gravações de Bouncing Off The Satellites, que saiu em 1986. Mas o disco era triste, sem inspiração. Keith assumira as funções de seu colega cuidando das letras, guitarras, bateria, e os quatro assumiram a produção do novo trabalho.

Mas nada funcionou e a banda nem quis divulgar o trabalho e mostravam uma agressividade durante entrevistas, fato inédito. Nessa época a banda ficou na corda bamba e por muito pouco não foi o fim.

O grupo se recolheu por três anos até aparecerem em 1989 com o maior sucesso comercial até hoje: o disco Cosmic Thing. Produzido pela dupla Don Was e pelo ex-Chic e parceiro de David Bowie, Nile Rodgers. Escorados em duas canções "Roam" e "Love Shack", venderam cinco milhões de cópias e voltaram a ser o foco das atenções.

E, aparentemente, a alegria voltara ao grupo, refeito da perda do ex-líder. Fred explica o processo de gestão: "Quando começamos a escrever o disco, percebemos que estávamos voltando ao nosso início em Athens, quando tudo era difícil e que esta volta às raízes deveria ser nossa diretriz. Era uma questão de descobrimos quem éramos e o que queríamos."

A reputação de banda mais divertida do planeta estava de volta. Mas por pouco tempo. Uma exaustiva excursão mundial, com seu ponto alto no dia Mundial da Terra, em 1990, para 750 mil pessoas no Central Park, em Nova York, acabou causando outra baixa: Cindy Wilson. Alegando exaustão física e emocional, a irmã caçula de Ricky deixou o grupo de forma amistosa. "Eu fui um B-52 por quase quinze anos. Me orgulho disso, mas quero uma outra vida agora, como ser mãe.

Com a saída de Cindy começou um outro período de hibernação e Kate Pierson começou a atrair atenção por seus projetos. O primeiro foi participar do novo disco de seus colegas de Athens, R.E.M. Kate emprestou voz, carisma e alegria nos vocais e vídeo de "Shiny Hapy People", um dos dois monumentais hits do álbum.

capa de Good StuffUm ano antes, fez um dueto inesquecível em "Candy", com Iggy Pop, presente no disco Brick by Brick, do pai do punk. Uma curiosidade: originalmente a escalada para o dueto era a pretender Chrissie Hynde, fã de carteirinha de Iggy. Como não pôde comparecer, Iggy chamou Kate.

Em 1992, o trio remanescente (Fred, Keith e Kate) chamaram novamente a dupla vitoriosa Don Was e Nile Rodgers e lançaram Good Stuff. A banda mudou um pouco o conteúdo das letras, falando da AIDS, meio ambiente e a defender os direitos dos animais.

Era a primeira vez que o B-52's levanta tão explicitamente bandeiras políticas. "Nossa causa é divertir, mas isso não significa que podemos fazê-las dançarem e refletirem sobre os problemas mundiais", disse Fred.

Em 1996, o mesmo Fred dançou seu segundo disco-solo, chamado Just Fred, que foi realizado em apenas duas semanas e produzido por Steve Albini, ex-membro do Big Black e que fez a fama na década de 90 produzindo gente como PJ Harvey e foi o engenheiro de In Utero do Nirvana.

uma foto com Cindy de volta e a capa de Time CapsuleEm 1998 Cindy volta ao grupo rapidamente. Juntos, compõem duas músicas novas para a coletânea Time Capsule. Uma delas era "Debbie", uma homenagem a uma querida amiga, colega e de quem o grupo era fã: Debbie Harry, vocalista do Blondie. Foi a última vez que os vocais de Kate e Cindy juntaram-se naquelas harmonizações que marcaram definitivamente a música pop dos anos 80 e 90.

O grupo não existe mais e várias coletâneas, como a excelente dupla, Nude on the Moon: the B-52's Anthology, de 2002, faz um perfil definitivo e coloca o grupo no lugar merecido: de melhor e mais importante banda new wave americana e um dos modelos definitivos de toda uma geração.

Encerro essa coluna, mais uma vez, com letras de algumas canções: "Private Idaho", "Legal Tender" e "Roam" (minha favorita). Um abraço é até a próxima!

Private Idaho

Hoo hoo hoo hoo hoo hoo hoo hoo hoo
You're living in your own Private Idaho
Living in your own private Idaho
Underground like a wild potatoe
Don't go on the patio
Beware of the pool, blue bottomless pool
It leads you straight right through the gate that opens on the pool

You're living in your own Private Idaho
You're living in your own Private Idaho

Keep off the path, beware the gate, watch out for signs that say 'hidden driveways'
Don't let the chlorine in your eyes
blind you to the awful surprise
that's waitin' for you at the bottom of the bottomless blue, blue, blue pool

You're livig in your own Private Idaho
Idaho
You're out of control the rivers that roll,
you fell into the water and down to Idaho
Get out of that state, get out of that state you're inn
You better beware

You're living in your own Private Idaho
You're living in your own Private Idaho

Keep off the patio, keep off the path
The lawn may be green but you better not be seen walkin' through a gate
that leads you down, down to a pool fraught with danger
is a pool full of strangers

You're living in your own Private Idaho,
where do I go from here to abetter state than this
Well, don't be blind to the big surprise,
swimming round and round like a deadly hand of a radium clock,
at the bottom, of the pool

I-I-I-daho
I-I-I-daho
Woah oh oh woah oh oh woah oh oh
Ah ah ah ah ah ah ah ah
Get out of that state, get out of that state
You're living in your own Private Idaho, living in your own Private Idaho

Legal Tender

We're in the basement, learning to print
All of it's hot!
10-20-30 million ready to be spent
We're stackin 'em against the wall
Those gangster presidents

Livin' simple and trying to get by
But honey, prices have shot through the sky
So I fixed up the basement with
what I was a-workin' with
Stocked it full of jelly jars
and heavy equipment
We're in the basement ...
10-20-30 million dollars
Ready to be spent

Walk into the bank, try to pass that trash
Teller sees and says "uh-huh-that's fresh as grass"
See the street pass under your feet
In time to buy the latest model get-away jeep

So I fixed up the basement with
what I was a-workin' with
Stocked it full of jelly jars
and heavy equipment
We're in the basement

So I fixed up the basement with
what I was a-workin' with
Stocked it full of jelly jars
and heavy equipment
We're in the basement,
learning to print
All of it's hot
All counterfeit

Roam
I hear a wind
Whistling air
Whispering in my ear
Boy Mercury shootin' through every degree
OOO girl dancin' down those dirty and dusty trails
Take it hip to hip rocket through the wilderness
Around the world the trip begins with a kiss
Roam if you want to
Roam around the world
Roam if you want to
Without wings, without wheels
Roam if you want to
Without anything but the love we feel
Skip the air-strip for the sunset
Ride the arrow for the target---One
Take it hip to hip rock it through the wilderness
Around the world the trip begins with a kiss
Chorus
Fly the great big sky
See the great big sea
Kick through continents
Bustin' boundaries
Take it hip to hip rocket through the wilderness
Around the world the trip begins with a kiss
Chorus
Take it hip to hip
Rocket through the wilderness

Discografia


The B-52's (1979)
Wild Planet (1980)
Party Mix (1981)
Mesopotamia (1982)
Whammy (1984)
Bouncing Off The Satellites (1986)
Cosmic Thing (1989)
The Best Of The B-52's: Dance This Mess Around (1990)
Good Stuff (1992)
Planet Claire (2 different) (1995)
Pop Giants (1997)
Time Capsule: Songs For A Future Generation
(with 2 new tracks) (1998)
Time Capsule - The Remixes (1998)
Nude On The Moon: The B-52's Anthology
(2 CD box with unreleased tracks) (2002)




 

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