458 - A Chave do Sol - entrevista com José Luiz Dinóla

A cena hard rock paulistana e brasileira dos anos 80 foi construída por abnegados. Gente sem espaço, sem mídia, perseguido pela polícia, pela ditadura e por qualquer pessoa normal. Ser cabeludo, portando uma guitarra e berrando em um microfone era o suficiente para colecionar problemas. Mas eles sempre lutaram, nunca desistiram. Assim, em homenagem a uma cena tão aguerrida e pouco lembrada, resolvi falar com um dos integrantes de um grupo importantíssimo daquela época, o baterista José Luiz Dinóla do A Chave do Sol.


José Luiz Dinóla é o atual baterista do Violeta de Outono e participou do último disco do grupo, Espectro.

Extremamente competente, versátil e ainda compositor, Dinóla deu uma nova perspectiva ao grupo liderado por Fabio Golfetti. O grupo agora possui quatro compositores.

A paixão pela música, no entanto vem de longe, desde menino.

Segundo ele próprio contou "aos 12 anos meu irmão trouxe para casa uma tumbadora emprestada de um amigo. Quando ouvi aquele som fiquei fascinado e comecei a prestar atenção nos instrumentos percussivos e a bateria me chamava mais a atenção. Gostava de ver os bateras em ação.

Nessa época não tinha bateria e descolei uma pequena mesa que dava um som interessante.

Com ela eu acompanhava as músicas da época, eu batia no centro como se fosse o bumbo e nos cantos como se fosse a caixa até que um dia a mesa rachou no meio de tanta pancada.

Foi aí que ganhei uma bateria da marca Saema. Uma curiosidade dessa bateria é que o bumbo era oval com pele de animal. Tive um mês de aula de bateria, não gostei do método aplicado e resolvi descobrir as coisas por conta própria. Sou autodidata desde então."

A bateria acabou virando uma paixão e, em 1982 foi convidado para integrar a Chave do Sol, em 1982. A Chave tinha um mistura interessante de hard rock, heavy metal e jazz rock, dando um tempero diferente e distinto aos demais.

"O Luiz Domingues (Tigueis) e o Rubens me convidaram para tocar covers em um pub. Nessa época meu estilo preferido era o jazz rock e acabei por influenciar a Chave um pouco para esse caminho. Acabou rolando um som pesado com alguma influência do jazz-rock."

No entanto, a vida não era fácil e gravar um disco ainda mais difícil. A Chave do Sol fez sua estréia no Café Teatro Deixa Falar (EX- Be-Bop-a-Lulla), em São Paulo, em 25 de setembro de 1982, há quase 30 anos.

Os garotos tentavam e, em 1984, procuraram outro abnegado do meio, Luiz Calanca, da Baratos Afins. Assinaram um contrato e lançaram um compacto de 7 polegadas: Luz.

Segundo Dinóla, "com o compacto, a intenção da banda era mostrar o lado criativo com '18 Horas' e o lado pop com 'Luz'."

O advento do Rock in Rio começou a abrir uma luz para as bandas do gênero.

O sucesso de Iron Maiden, Scorpions e outras mostravam que o público brasileiro estava sedento por bandas do mesmo calibre, inclusive em português. Essa abertura animou o grupo, que na época contava com um novo membro, o vocalista Fran.

A vida, no entanto, era difícil, até porque as gravadoras resistiam, como lembra Zé: "O metal estava surgindo por aqui e ficou mais conhecido com o Rock n Rio. Aí começaram a aparecer várias bandas neste estilo. Mas, para o público em geral, hard ou metal era a mesma barulheira. Percebendo isso, as grandes gravadoras preferiram apostar suas fichas no new-wave e aí todas essas bandas nunca conseguiram sair do underground. A Chave só ficou um pouco mais conhecida porque conseguiu a simpatia dos produtores do programa Fábrica do Som e tocamos algumas vezes lá. Com isso, conseguimos alguns poucos shows fora do estado.As principais bandas desta época eram Golpe de Estado, Viper, Sepultura e a Chave, pelo que me lembro."

Sem chance com uma grande gravadora, a Baratos resolveu abrir as portas - novamente - para o agora quarteto e lançou o primeiro disco do grupo, em 1985.

Os fãs, no entanto, não gostaram muito do som e o vocalista Fran sofreu com a antipatia. Sem falar que Dinóla odiou a capa do álbum.

O disco, aliás, tinha uma inovação rara pro mercado brasileiro: era um EP, em 45 rotações, e não um LP normal, de 33 rotações habituais. Tudo serviu para tumultuar o que já era complicado. Ou como ele mesmo explica:

"Com a influência do Rock n Rio e a falta de um projeto consistente para a banda, começamos a compor as músicas deste disco com o Fran, vocalista recém chegado. Era um EP (vinil em 45 rotações), possuía melhor qualidade de som, mas as pessoas que compraram, desinformadas, não mudavam a rotação das pick-up e aí você imagina o som que saía. Com a voz do Fran então, parecia balada de trash metal.

Imagine você chegar em casa para ouvir uma banda que admira e ouvir esse som. E o pior que quando o ouvinte mudava a rotação, se deparava com um som que não parecia em nada ao da Chave do compacto. Para eles, era outro grupo. Sem falar da capa que é horrível. E a situação piorou ainda mais quando o público conquistado na Fábrica do Som teve antipatia pelo Fran."

Ainda que Zé Luiz tenha reservas, era um bom disco, com seis faixas, todas mostrando a técnica peculiar da Chave do Sol e com boas composições.

Ao ser lançado em CD, na década de 90, as duas do compacto foram acrescentadas, como faixas 1 e 2.

Lado A

1. Anjo Rebelde
2. Um Minuto Além
3. Segredos

Lado B

4. Ufos
5. Crisis
6. Ímpeto

Chateado com a pouca publicidade e de tanto lutar sem ver um retorno desejado, Dinóla acabou deixando a banda antes do segundo LP, The Key, editado pela Rock Brigade.

A sonoridade já era outra: "neste disco, eu já não estava mais na banda e participei apenas como convidado em duas faixas. Para mim este disco ficou mais hard-pop."

As mudanças para o inglês foi para tentar o mercado internacional, "já que por aqui não ia virar."

O disco, que tinha uma linha realmente mais comercial, meio Whitesnake, trazia 8 faixas:

Lado A

1. A Woman Like You
2. Sweet Caroline
3. Change My Evil Ways
4. Keep Me Warm Tonight

Lado B

5. Profecia
6. Sun City
7. Lírio de um Pantanal
8. A Chave é o Sol

Segundo Dinóla, a grana era pouca e precisavam de ajuda dos familiares para sobreviverem. Ainda assim, ele guarda boas lembranças: "as melhores lembranças foram quando tocávamos na Fábrica e quando tocamos no programa Verão Vivo em um palco montado na praia. Infelizmente, não tínhamos outro trabalho e a banda não nos dava o suficiente. Financeiramente, éramos dependentes de nossas famílias."

Com a saída do grupo, Dinóla tocou no mercado de bandas covers e permaneceu até 2009, quando foi chamado por Fabio, para integrar o Violeta.

Ainda assim, fez um show com seu antigo grupo, em 2007.

Mesmo com tantos percalços, Zé continua otimista e manda um recado aos mais novos: "Batalhem pelos seus sonhos!"

Agora, ao serviço de outro grupo lendário da cena alternativa paulista, Dinóla aproveita a ocasião para investir em novos projetos: "além do disco Espectro, do Violeta de Outono, também vou lançar este ano mais dois trabalhos: um CD com o Caostik, banda nova que tem uma pegada pop e um vídeo com uma performance de batera."

E com o agradecimento pela entrevista e por contar um pouco mais de sua vida, fico por aqui hoje. Um abraço e até a próxima coluna.

Discografia

Compacto

Luz (1984)

Discos

A Chave do Sol (1985)
The Key (1987)
A New Revolution (1989)
Photography (1992)


 

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