Um escocês
com um nome italiano que tem uma banda radicada na Inglaterra...
Uma bela salada nesses tempos de globalização. Marco
Rossi ganhou esse nome quando seu pai, tão escocês
quanto ele, serviu a Marinha Britânica na Segunda Guerra
Mundial e, em Livorno, na Itália, conheceu uma linda mulher
de cabelos negros. E o resto é história, como ele
mesmo disse... e histórias ele conta algumas boas. À
frente do Cheese, essa pequena banda que conheci e gostei tanto,
Marco conta algumas curiosidades, como seus outros projetos e
o show que viu de Sérgio Dias Baptista, aquele mesmo dos
Mutantes, em Londres. Conheça um pouco de Marco e do Cheese...
Pergunta:
- Oi Marco, conte como surgiu o Cheese...
Marco Rossi: - Oi Rubens... bem, é tudo muito
incestuoso, receio dizer. Em Weymouth, no meio da década
de 90 havia um grande círculo de amigos e músicos
de várias bandas (The Lucky Bishops, Stonefish, Elmer Fudd,
The Chocolate Speedway) que costumavam tocar juntos, beber, fumar,
vomitar... e no meio desses todos, o Cheese brotou. Usando uma
frase já dita nós nascemos sem explicação...
Pergunta:
- Enlarge Your Johnson e Let It Brie são grandes discos.
Me falem como foram gravados...
Marco Rossi: - Obrigado! Let It Brie
só aconteceu por causa do nosso grande amigo Simon Felton,
da Pink Hedgehog, que basicamente insistiu muito para que eu o
deixasse lançar algo do Cheese, após ouvir umas
fitas antigas minhas que estavam virando cinzas embaixo da minha
cama. Eu tinha certeza que ninguém teria interesse em ouví-las,
mas Simon foi muito perseverante e felizmente, o retorno tem sido
muito maior do que eu esperava. Eu gosto mais da parte final do
CD, que são basicamente ensaios gravados ao vivo, com erros,
mas incrivelmente agressivo, que é como somos em um palco,
nos raros shows que realizamos. Já Enlarge Your
Johnson demorou uma eternidade para sair já que
havia me esquecido dessas fitas, embaraçosamente. Com filhos
e um trabalho em período integral, acabaram me deixando
sem tempo para escrever e gravar canções e elas
ficaram jogadas por um tempo. No entanto, tenho muito orgulho
desse disco, e guardo boas memórias.
Pergunta: - Você
toca em outras bandas, não? Fale um pouco delas...
Marco Rossi: - Sim, toco com os Gothic
Chicken, que é formado por Tom e Luke dos The Lucky Bishops,
e é uma ótima desculpa para sairmos por aí
tocando músicas psicodélicas em qualquer pub em
um volume ensurdecedor. Nós começamos tocando apenas
covers - Blossom Toes, The Cyrkle, Egg, The Action, Shy Limbs,
Traffic etc - até percebemos que éramos tão
brilhantes, que começamos a escrever nossas próprias
canções que serão lançadas em um futuro
próximo. Falando sério, os Chickens são a
banda mais intuitiva que já toquei e tem uma diferença
em relação ao Cheese, onde sou o único compositor.
Pergunta:
- Ouvindo o Cheese eu percebi influências de XTC, Television
e Teenage Fanclub. É isso mesmo?
Marco Rossi: - Sim, Rubens! Marquee Moon
(Television) e Black Sea (XTC) são dois
dos discos que mais me influenciaram, porque eu adoro as guitarras
desses álbuns. Eu amo o Television especialmente, por causa
do som tosco, das letras e como elas são claramente delineadas.
Eles possuem um senso de dinâmica incrível e usam
os espaços entre os instrumentos de maneira sublime, embora
o Cheese tenha um pouco mais da densidade do XTC. Agora sobre
o Teenage Fanclub, eu realmente gosto deles, mas suspeito que
temos mais as mesmas influências (The Byrds, Big Star) do
que somos influenciados por eles.
Pergunta: - Você
se sente parte de alguma cena musical, em particular?
Marco Rossi: - Não acho que me sinta parte, não.
Quer dizer, é muito bom sermos comparados com grupos que
você reverencia e imagino que conforme as pessoas tenham
mais tempo para ouvir bandas de rock, elas ficam sempre na margem,
enquanto nós preferimos ir contra a maré, embora
tenhamos pouca fé ou habilidade para conviver no mundo
musical. Não sabemos nos vender de forma adequada.
Pergunta: - Por
que o Cheese ainda não tem um site próprio?
Marco Rossi: - Ah, há tempos que quero construir
um, mas acaba ficando de lado (como tudo, aliás...) por
causa das pressões crescentes e das coisas pequenas da
vida, como contas, trabalho, etc. No entanto, prometi a mim que
entrarei no Myspace e farei um site para o Cheese, em breve. Quando
você escreve canções, se sente como se elas
fossem seus filhos e tenho me achado um pai muito negligente!
Pergunta: - Como
você vê a cena roqueira de hoje em dia?
Marco Rossi: - Ela me parece bastante saudável.
Estive vendo na tv o Top Of The Pops recentemente e vi bandas
de verdade, embora muitas delas não me animem muito. Eu
gosto de The Coral, Kasabian e The Killers, que possui um grande
baterista. Acho também genial que exista o Myspace, que
mostra que há grandes bandas, ainda que desconhecidas.
Pergunta:
- Você acha que a internet é a melhor ferramenta
para as bandas independentes hoje em dia? Por falar nisso, é
possível viver sem estar em uma major?
Marco Rossi: - Sim, eu acho que a internet é vital
para as bandas independentes, já que a tv, as rádios
e a mídia escrita não têm mais a penetração
de antes. Tudo hoje é muito fragmentado: você pode
escolher milhões de canais, milhões de emissoras
de rádio e a música hoje está muito desvalorizada
porque é muito fácil acessá-la. Posso passar
a imagem de um velho bufão, mas sinto falta dos tempos
em que existiam apenas três ou quatro canais e quase nenhum
programa de música, porque quando uma banda aparecia todo
mundo falava nela por muito tempo. A internet hoje é o
que temos mais próximo de um espírito comunitário,
então sou favorável a ela. E também porque
os músicos são completamente enganados pelas gravadoras.
Todo mundo pensa que quando você recebe £200,000 adiantado
de uma gravadora significa que você tem esse dinheiro no
banco, o que é uma bobagem, porque isso é uma dívida,
que irá sendo sanada com vendas de discos e execução
nas rádios. Por outro lado, se você vende sua música
pela internet ou no banco do seu carro, os custos são mínimos
e você pode fazer um bom dinheiro rapidamente. É
claro que isso não siginifica que você será
um sucesso, porque isso leva tempo!
Pergunta: - O que
você conhece de música brasileira, além de
bossa-nova?
Marco Rossi: - Eu amo os artistas da Tropicália
- Os Mutantes, Caetano Veloso, Tom Zé - e vi um show do
Sérgio Dias, no ano passado, em Londres. Ele é um
tremendo guitarrista, na linha Frank Zappa e é uma pessoa
incrivelmente amável. O segundo disco dos Mutantes é
um dos melhores que já ouvi. O arranjo de cordas de "Caminhante
Noturno" arrepia até os pêlos da minha nuca.
Pergunta:
- Você poderia me dizer seus cinco discos favoritos?
Marco Rossi: - Oh, Deus, eles mudam diariamente, mas
poderia citar Tago Mago (Can); Pawn Hearts
(Van der Graaf Generator); The Piper At The Gates Of Dawn
(Pink Floyd); Vol II (Soft Machine) e Odyssey
& Oracle (The Zombies). Mas é muito pouco!
Eu nem citei Beatles, Dylan, Television, The Nazz, Love, Pixies...
Syd Barrett é minha maior influência como guitarrista
e letrista... E estou muito ligado ao rock progressivo hoje em
dia. Eu amo Yes, acredite ou não. Os primeiros álbuns
parecem um Byrds superpesado. Bob Dylan, fase 1965/66, quando
era o cara mais cool do planeta. Letras vivas, grande cabelo.
Peter Hammil, um dos melhores e mais literatos letristas que tivemos...
Também tiro meu chapéu para Vivian Stanshall, Ollie
Halsall, Robert Wyatt, Ivor Cutler, Todd Rundgren, Robert Fripp,
Robin Williamson, Richard Lloyd, Ray Davies etc etc etc... Er,
falei bem mais do que cinco, não?
Pergunta: - Quais
são seus projetos futuros?
Marco Rossi: - The Gothic Chicken estão com um
álbum a caminho e você pode ouvir algumas canções
no nosso Myspace.
Comecei a escrever novas canções para a banda em
um idioma, que pretendo que soe como Donovan ou Left Banke. No
entanto, não abandonei o Cheese! Estou com uma idéia
extravagante de fazer um disco acústico, mas ainda não
me decidi...
Pergunta: - Obrigado
pela entrevista, Marco. Deixe uma mensagem final...
Marco Rossi: - Fico realmente feliz que alguém
ouça nossas músicas e goste delas. É indescritível
o prazer que sinto quando descubro que uma canção
que fiz no meu quarto pode ser ouvida em várias partes
do planeta. Se houver algum fã do Cheese lendo isso, agradeço
de coração. E se você, algum dia, vier a Dorset
me procure, que lhe pagarei uma cerveja.
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