25 - Cheese - entrevista

Um escocês com um nome italiano que tem uma banda radicada na Inglaterra... Uma bela salada nesses tempos de globalização. Marco Rossi ganhou esse nome quando seu pai, tão escocês quanto ele, serviu a Marinha Britânica na Segunda Guerra Mundial e, em Livorno, na Itália, conheceu uma linda mulher de cabelos negros. E o resto é história, como ele mesmo disse... e histórias ele conta algumas boas. À frente do Cheese, essa pequena banda que conheci e gostei tanto, Marco conta algumas curiosidades, como seus outros projetos e o show que viu de Sérgio Dias Baptista, aquele mesmo dos Mutantes, em Londres. Conheça um pouco de Marco e do Cheese...


da esquerda para a direita: Chris Page (bateria); Rich Murphy (guitarra); Marco Rossi (guitarra e vocal); Al Strawbridge (baixo e vocal) Pergunta: - Oi Marco, conte como surgiu o Cheese...
Marco Rossi: -
Oi Rubens... bem, é tudo muito incestuoso, receio dizer. Em Weymouth, no meio da década de 90 havia um grande círculo de amigos e músicos de várias bandas (The Lucky Bishops, Stonefish, Elmer Fudd, The Chocolate Speedway) que costumavam tocar juntos, beber, fumar, vomitar... e no meio desses todos, o Cheese brotou. Usando uma frase já dita nós nascemos sem explicação...

capa do disco Let It BriePergunta: - Enlarge Your Johnson e Let It Brie são grandes discos. Me falem como foram gravados...
Marco Rossi: -
Obrigado! Let It Brie só aconteceu por causa do nosso grande amigo Simon Felton, da Pink Hedgehog, que basicamente insistiu muito para que eu o deixasse lançar algo do Cheese, após ouvir umas fitas antigas minhas que estavam virando cinzas embaixo da minha cama. Eu tinha certeza que ninguém teria interesse em ouví-las, mas Simon foi muito perseverante e felizmente, o retorno tem sido muito maior do que eu esperava. Eu gosto mais da parte final do CD, que são basicamente ensaios gravados ao vivo, com erros, mas incrivelmente agressivo, que é como somos em um palco, nos raros shows que realizamos. Já Enlarge Your Johnson demorou uma eternidade para sair já que havia me esquecido dessas fitas, embaraçosamente. Com filhos e um trabalho em período integral, acabaram me deixando sem tempo para escrever e gravar canções e elas ficaram jogadas por um tempo. No entanto, tenho muito orgulho desse disco, e guardo boas memórias.

Pergunta: - Você toca em outras bandas, não? Fale um pouco delas...
Marco Rossi: -
Sim, toco com os Gothic Chicken, que é formado por Tom e Luke dos The Lucky Bishops, e é uma ótima desculpa para sairmos por aí tocando músicas psicodélicas em qualquer pub em um volume ensurdecedor. Nós começamos tocando apenas covers - Blossom Toes, The Cyrkle, Egg, The Action, Shy Limbs, Traffic etc - até percebemos que éramos tão brilhantes, que começamos a escrever nossas próprias canções que serão lançadas em um futuro próximo. Falando sério, os Chickens são a banda mais intuitiva que já toquei e tem uma diferença em relação ao Cheese, onde sou o único compositor.

capa do disco Enlarge Your JohnsonPergunta: - Ouvindo o Cheese eu percebi influências de XTC, Television e Teenage Fanclub. É isso mesmo?
Marco Rossi: -
Sim, Rubens! Marquee Moon (Television) e Black Sea (XTC) são dois dos discos que mais me influenciaram, porque eu adoro as guitarras desses álbuns. Eu amo o Television especialmente, por causa do som tosco, das letras e como elas são claramente delineadas. Eles possuem um senso de dinâmica incrível e usam os espaços entre os instrumentos de maneira sublime, embora o Cheese tenha um pouco mais da densidade do XTC. Agora sobre o Teenage Fanclub, eu realmente gosto deles, mas suspeito que temos mais as mesmas influências (The Byrds, Big Star) do que somos influenciados por eles.

Pergunta: - Você se sente parte de alguma cena musical, em particular?
Marco Rossi: -
Não acho que me sinta parte, não. Quer dizer, é muito bom sermos comparados com grupos que você reverencia e imagino que conforme as pessoas tenham mais tempo para ouvir bandas de rock, elas ficam sempre na margem, enquanto nós preferimos ir contra a maré, embora tenhamos pouca fé ou habilidade para conviver no mundo musical. Não sabemos nos vender de forma adequada.

Pergunta: - Por que o Cheese ainda não tem um site próprio?
Marco Rossi: -
Ah, há tempos que quero construir um, mas acaba ficando de lado (como tudo, aliás...) por causa das pressões crescentes e das coisas pequenas da vida, como contas, trabalho, etc. No entanto, prometi a mim que entrarei no Myspace e farei um site para o Cheese, em breve. Quando você escreve canções, se sente como se elas fossem seus filhos e tenho me achado um pai muito negligente!

Pergunta: - Como você vê a cena roqueira de hoje em dia?
Marco Rossi: -
Ela me parece bastante saudável. Estive vendo na tv o Top Of The Pops recentemente e vi bandas de verdade, embora muitas delas não me animem muito. Eu gosto de The Coral, Kasabian e The Killers, que possui um grande baterista. Acho também genial que exista o Myspace, que mostra que há grandes bandas, ainda que desconhecidas.

Pergunta: - Você acha que a internet é a melhor ferramenta para as bandas independentes hoje em dia? Por falar nisso, é possível viver sem estar em uma major?
Marco Rossi: -
Sim, eu acho que a internet é vital para as bandas independentes, já que a tv, as rádios e a mídia escrita não têm mais a penetração de antes. Tudo hoje é muito fragmentado: você pode escolher milhões de canais, milhões de emissoras de rádio e a música hoje está muito desvalorizada porque é muito fácil acessá-la. Posso passar a imagem de um velho bufão, mas sinto falta dos tempos em que existiam apenas três ou quatro canais e quase nenhum programa de música, porque quando uma banda aparecia todo mundo falava nela por muito tempo. A internet hoje é o que temos mais próximo de um espírito comunitário, então sou favorável a ela. E também porque os músicos são completamente enganados pelas gravadoras. Todo mundo pensa que quando você recebe £200,000 adiantado de uma gravadora significa que você tem esse dinheiro no banco, o que é uma bobagem, porque isso é uma dívida, que irá sendo sanada com vendas de discos e execução nas rádios. Por outro lado, se você vende sua música pela internet ou no banco do seu carro, os custos são mínimos e você pode fazer um bom dinheiro rapidamente. É claro que isso não siginifica que você será um sucesso, porque isso leva tempo!

Pergunta: - O que você conhece de música brasileira, além de bossa-nova?
Marco Rossi: -
Eu amo os artistas da Tropicália - Os Mutantes, Caetano Veloso, Tom Zé - e vi um show do Sérgio Dias, no ano passado, em Londres. Ele é um tremendo guitarrista, na linha Frank Zappa e é uma pessoa incrivelmente amável. O segundo disco dos Mutantes é um dos melhores que já ouvi. O arranjo de cordas de "Caminhante Noturno" arrepia até os pêlos da minha nuca.

a grande influência de Marco, Syd BarrettPergunta: - Você poderia me dizer seus cinco discos favoritos?
Marco Rossi: -
Oh, Deus, eles mudam diariamente, mas poderia citar Tago Mago (Can); Pawn Hearts (Van der Graaf Generator); The Piper At The Gates Of Dawn (Pink Floyd); Vol II (Soft Machine) e Odyssey & Oracle (The Zombies). Mas é muito pouco! Eu nem citei Beatles, Dylan, Television, The Nazz, Love, Pixies... Syd Barrett é minha maior influência como guitarrista e letrista... E estou muito ligado ao rock progressivo hoje em dia. Eu amo Yes, acredite ou não. Os primeiros álbuns parecem um Byrds superpesado. Bob Dylan, fase 1965/66, quando era o cara mais cool do planeta. Letras vivas, grande cabelo. Peter Hammil, um dos melhores e mais literatos letristas que tivemos... Também tiro meu chapéu para Vivian Stanshall, Ollie Halsall, Robert Wyatt, Ivor Cutler, Todd Rundgren, Robert Fripp, Robin Williamson, Richard Lloyd, Ray Davies etc etc etc... Er, falei bem mais do que cinco, não?

Pergunta: - Quais são seus projetos futuros?
Marco Rossi: -
The Gothic Chicken estão com um álbum a caminho e você pode ouvir algumas canções no nosso Myspace. Comecei a escrever novas canções para a banda em um idioma, que pretendo que soe como Donovan ou Left Banke. No entanto, não abandonei o Cheese! Estou com uma idéia extravagante de fazer um disco acústico, mas ainda não me decidi...

Pergunta: - Obrigado pela entrevista, Marco. Deixe uma mensagem final...
Marco Rossi: -
Fico realmente feliz que alguém ouça nossas músicas e goste delas. É indescritível o prazer que sinto quando descubro que uma canção que fiz no meu quarto pode ser ouvida em várias partes do planeta. Se houver algum fã do Cheese lendo isso, agradeço de coração. E se você, algum dia, vier a Dorset me procure, que lhe pagarei uma cerveja.