Esses são
os primórdios. De uma banda que nem sabia segurar os instrumentos,
afinar suas guitarras ou tinham idéia de como se escrevia
uma canção. De um grupo que começou como
um trio mais uma bateria eletrônica. De uma banda que em
pouco menos de dois anos construiu uma identidade e estreou com
um dos grandes discos de 1980. Não se conta o começo
pelo meio, como estou fazendo, mas cada um conta à sua
maneira. Eis o começo de Ian McCulloch e seus coelhinhos;
o nascimento do Echo and the Bunnymen.
Como
toda banda da época, o Echo aproveitou o furacão
punk para botar suas manguinhas de fora. E como toda boa banda
iniciante daqueles tempos, nem sabia usar um instrumento.
Tudo
começou em 1977, em Liverpool. Ian McCulloch havia feito
parte de uma banda que na verdade jamais existiu, The Crucial
Three, formado por ele, Julian Cope (futuro líder do Teadrop
Explodes) e Pete Wylie (que formaria primeiro o Wah! Heat, depois
o Wah! e mais tarde o The Mighty Wah!). Ian se recorda de serem
"os melhores amigos inimigos que podiam ser", pois havia
sempre uma pequena rixa entre eles. Naturalmente, cada um seguiu
seu rumo.
Assim, Ian acabou conhecendo
o calado e colecionador de discos Will Sergeant e o baixista Les
Pattinson. Os três começaram a ensaiar, embora sem
a menor idéia de como se fazia isso. A primeira canção
que escreveram foi "I Bagsy Yours", depois rebatizada
de "Monkeys". O trio não havia encontrado um
baterista e por isso utilizavam uma bateria eletrônica batizada
de "Echo". O grupo resolveu então se batizar
como Echo and the Bunnymen.
A
estréia ao vivo aconteceu precisamente no dia desta foto,
em 15 de novembro de 1978, no Eric's, que ficava na Mathew Street,
mesma rua do antigo clube Cavern, onde nasceu uma certa banda
chamada Beatles, quase 20 anos antes.
A apresentação
se resumiu a uma longa versão de "Monkeys" por
quase 20 minutos. Nada que os coelhinhos gostem de lembrar muito
hoje, principalmente por causa do nervosismo.
Foi no Eric's que nasceu
toda uma nova geração talentosa. Entre eles, dois
nomes começaram a tramar algo mais sólido, uma pequena
gravadora. Bill Drummond (The KLF) e Dave Balfe (Teadrop Explodes)
haviam fundado a Zoo Records e tinham lançado um EP do
Teadrop Explodes, Sleeping Gas, em fevereiro
de 1979, quando Julian Cope falou sobre o trio do amigo Ian.
Ian
Broudie contactou os coelhinhos e propôs um compacto. Dessa
maneira, no dia em que Ian McCulloch completava 20 anos (5 de
maio de 1979) é editado Pictures On My Wall,
compacto de estréia.
O lado trazia "Read
It In Books", escrita por Ian e Julian Cope. Cope, aliás,
deu uma grande força ao tocar teclado. A capa foi desenhada
Kevin Ward, do grupo Big In Japan e batizada de "O Deus Coelho".
Gravado em oito canais,
Will se lembra que a banda precisou da ajuda dos demais para afinar
suas guitarras e que não esperavam nada, tanto que ele
mantinha um emprego de meio período para sobreviver. Para
surpresa geral, o compacto recebeu elogios nas publicações
musicais como Sounds e New Musical Express.
"Eu
nunca pensei em fazer parte de uma grande banda, era mais estar
dentro do espírito punk da época. Mas Ian pensava
diferente e ele e Julian ficavam circulando pelo Eric's. Nós
vimos o The Fall, meu grupo favorito naquele período, e
os dois comentavam que Mark Smith era um modelo a ser seguido."
No dia 20 de julho de 1979,
o Echo realiza seu segundo show, desta vez em Manchester, no Factory
Club e, ironicamente, abrindo para o The Fall.
No dia 2 de agosto, com
um repertório maior, o grupo tocou no YMCA, em Tottenham
Court Road, abrindo para o Joy Division. Nesse dia estava presente
Seymour Stein, diretor da Sire/WEA norte-americana, que assinou
com o grupo para lançarem seus discos pelo selo Korova.
Ian se lembra bem desse encontro: "acho que Seymour queria
me cantar, o que ele não fez. Ele gostou do grupo, mas
pediu que arranjássemos um baterista de verdade, porque
nosso som estava muito limitado. E nós já estávamos
procurando um, na verdade."
Ainda
em agosto o grupo o grupo cede "Monkeys" para uma coletânea
com as bandas de Liverpool, chamada Street to Street:
A Liverpool Album.
E "Monkeys" foi
a primeira gravação do trio, anterior a "Pictures
On My Wall". Ela havia sido feito no Open Eye, em quatro
canais. O grupo costumava ensaiar no Merseyside Visual Communications
Unit (MVCU) e a canção foi produzida por Noddy Knowler.
Após um show no
Eric's, em 15 de setembro de 1979, o trio finalmente encontrou
o baterista que tanto queria: Pete de Freitas.
Pete
era mais jovem do que os demais e não era de Liverpool.
Havia nascido em Trinidad
e Tobago e ninguém sabe muito bem como entrou no grupo.
Em uma entrevista bem recente,
Ian fala que o considerava o maior baterista do mundo, além
de parecer um jovem Laurence Olivier. Com ele, a formação
estava fechada.
Quando o contrato com a
Korova foi anunciado, em dezembro de 1979, o Echo and the Bunnymen
já tinha um repertório bem extenso, com boas canções.
O primeiro lançamento como quarteto aconteceria em maio
de 1980, com o single Rescue.
Rescue
trazia a mesma foto do coelho usado em Pictures On My
Wall, porém, invertida. O lado B trazia "Simple
Stuff", e no compacto de 12 polegadas havia o acréscimo
de "Pride".
O grupo entrou em pânico
para as gravações, já que tinha pouquíssima
experiência em estúdio. Ian Broudie colocou um timbre
de guitarra que não agradou muito. Will sempre detestou
o riff da música por considerá-la parecida a um
banjo. O fato é que Rescue marca a entrada
do Echo and the Bunnymen na grande indústria.
Menos de dois meses depois,
saía o primeiro LP do grupo, Crocodiles.
Até hoje não se sabe o motivo dele não ter
sido produzido por Ian Broudie - os escolhidos foram David Balfe
e Ian Drummond - e o disco alcançou a 17ª posição
nas paradas britânicas.
O
disco foi aclamado pelas principais revistas inglesas. A Record
Mirror saudou como a "primeira grande obra-prima do
ano."
E Crocodiles
era, de fato, uma obra-prima.
Um álbum denso,
cheio de climas dos anos 60 e com as peculiares e abstratas letras
de Ian McCulloch, os belos fraseados de Will e o baixo sólido
e preciso de Les, além da personalíssima bateria
de Pete de Freitas dando o clima.
A edição
inglesa trazia a seguinte ordem nas faixas:
Faixas
Going Up
Stars are Stars
Pride *
Monkeys
Crocodiles
Rescue *
Villiers Terrace
Pictures on My Wall
All That Jazz
Happy Death Men
Nas
edições americanas e japonesas foram acrescentadas
"Do It Clean" e "Read It In Books". Quando
o disco saiu aqui, em 1987, por ocasião da primeira excursão
do grupo, saiu fiel à edição inglesa.
Porém, o disco,
rendeu algumas brigas. McCulloch pegou Balfe pelo pescoço
quando o produtor queria introduzir teclados em "Do It Clean".
Foram três semanas tensas, até porque a banda não
sabia exatamente o que queria com todas suas composições.
Um outro momento de tensão
aconteceu quando a gravadora queria lançar um novo single
do disco. A gravadora achou que "Villiers Terrace" seria
uma boa escolha, mas o grupo odiava a música. Ian, por
exemplo, prefere mil vezes a versão que tocaram no programa
de John Peel.
O
grupo também não queria lançar "Do It
Clean" como compacto, porque a queria usá-la no disco
- o que não aconteceu na edição inglesa,
a original. Por isso, acabaram optando por uma terceira canção:
"The Puppet".
Ian odiou a escolha, afinal
odiava a letra dela. Will não se aborreceu muito, embora
a achasse muito rápida e tinha certeza que não faria
sucesso, porque não era tão pop.
Quando o disco saiu, a
banda já estava em meio a uma enorme turnê.
Paralelamente,
o Echo and the Bunnymen foi criando um estilo em cima do palco,
com fumaça, camuflagem, e com uma forte presença
de Ian e a bateria de Pete mostrando uma força desconhecida
ao vivo. Essa turnê ficou conhecida como a "Camo Tour".
O grupo se apresentou pela
Inglaterra, Escócia, Holanda e encerrou a turnê no
dia 4 de dezembro em Bonn, então capital da Alemanha Ocidental.
Com um LP de sucesso, boas
músicas e simpatia da crítica, o quarteto entraria
em 1981 confiante e pronto para vôos mais altos. Com Heaven
Up Here viria o período mais feliz, antes das
brigas internas.
Deixo vocês com a
discografia do grupo. Um abraço e até a próxima
coluna.
Discografia
Crocodiles (1980)
Shine's So Hard (1981)
Heaven Up Here (1981)
Porcupíne (1983)
Ocean Rain (1984)
Songs to Learn and Sing (1985)
Echo & The Bunnymen (1987)
Reverberation (1990)
BBC Radio 1 In Concert (1992)
Evergreen (1997)
Ballyhoo (1997)
What Are You Going To Do With Your Life? (1999)
Flowers (2001)
Crystal Days 1979-1999 (2001)
Live In Liverpool (2002)
Siberia (2005)
Fillmore - San Francisco Ca 12/5/05 (2006)
House of Blues - West Hollywood Ca 12/6/05 (2006)
The Very Best of Echo & the Bunnymen - More Songs To Learn
& Sing (2006)
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