230 - Echo and the Bunnymen - Crocodiles

Esses são os primórdios. De uma banda que nem sabia segurar os instrumentos, afinar suas guitarras ou tinham idéia de como se escrevia uma canção. De um grupo que começou como um trio mais uma bateria eletrônica. De uma banda que em pouco menos de dois anos construiu uma identidade e estreou com um dos grandes discos de 1980. Não se conta o começo pelo meio, como estou fazendo, mas cada um conta à sua maneira. Eis o começo de Ian McCulloch e seus coelhinhos; o nascimento do Echo and the Bunnymen.


Como toda banda da época, o Echo aproveitou o furacão punk para botar suas manguinhas de fora. E como toda boa banda iniciante daqueles tempos, nem sabia usar um instrumento.

Ian McCullochTudo começou em 1977, em Liverpool. Ian McCulloch havia feito parte de uma banda que na verdade jamais existiu, The Crucial Three, formado por ele, Julian Cope (futuro líder do Teadrop Explodes) e Pete Wylie (que formaria primeiro o Wah! Heat, depois o Wah! e mais tarde o The Mighty Wah!). Ian se recorda de serem "os melhores amigos inimigos que podiam ser", pois havia sempre uma pequena rixa entre eles. Naturalmente, cada um seguiu seu rumo.

Assim, Ian acabou conhecendo o calado e colecionador de discos Will Sergeant e o baixista Les Pattinson. Os três começaram a ensaiar, embora sem a menor idéia de como se fazia isso. A primeira canção que escreveram foi "I Bagsy Yours", depois rebatizada de "Monkeys". O trio não havia encontrado um baterista e por isso utilizavam uma bateria eletrônica batizada de "Echo". O grupo resolveu então se batizar como Echo and the Bunnymen.

Ian e Les no primeiro show do Echo, no Eric's, em 1978A estréia ao vivo aconteceu precisamente no dia desta foto, em 15 de novembro de 1978, no Eric's, que ficava na Mathew Street, mesma rua do antigo clube Cavern, onde nasceu uma certa banda chamada Beatles, quase 20 anos antes.

A apresentação se resumiu a uma longa versão de "Monkeys" por quase 20 minutos. Nada que os coelhinhos gostem de lembrar muito hoje, principalmente por causa do nervosismo.

Foi no Eric's que nasceu toda uma nova geração talentosa. Entre eles, dois nomes começaram a tramar algo mais sólido, uma pequena gravadora. Bill Drummond (The KLF) e Dave Balfe (Teadrop Explodes) haviam fundado a Zoo Records e tinham lançado um EP do Teadrop Explodes, Sleeping Gas, em fevereiro de 1979, quando Julian Cope falou sobre o trio do amigo Ian.

capa do compacto Pictures On My WallIan Broudie contactou os coelhinhos e propôs um compacto. Dessa maneira, no dia em que Ian McCulloch completava 20 anos (5 de maio de 1979) é editado Pictures On My Wall, compacto de estréia.

O lado trazia "Read It In Books", escrita por Ian e Julian Cope. Cope, aliás, deu uma grande força ao tocar teclado. A capa foi desenhada Kevin Ward, do grupo Big In Japan e batizada de "O Deus Coelho".

Gravado em oito canais, Will se lembra que a banda precisou da ajuda dos demais para afinar suas guitarras e que não esperavam nada, tanto que ele mantinha um emprego de meio período para sobreviver. Para surpresa geral, o compacto recebeu elogios nas publicações musicais como Sounds e New Musical Express.

Will Sergeant"Eu nunca pensei em fazer parte de uma grande banda, era mais estar dentro do espírito punk da época. Mas Ian pensava diferente e ele e Julian ficavam circulando pelo Eric's. Nós vimos o The Fall, meu grupo favorito naquele período, e os dois comentavam que Mark Smith era um modelo a ser seguido."

No dia 20 de julho de 1979, o Echo realiza seu segundo show, desta vez em Manchester, no Factory Club e, ironicamente, abrindo para o The Fall.

No dia 2 de agosto, com um repertório maior, o grupo tocou no YMCA, em Tottenham Court Road, abrindo para o Joy Division. Nesse dia estava presente Seymour Stein, diretor da Sire/WEA norte-americana, que assinou com o grupo para lançarem seus discos pelo selo Korova. Ian se lembra bem desse encontro: "acho que Seymour queria me cantar, o que ele não fez. Ele gostou do grupo, mas pediu que arranjássemos um baterista de verdade, porque nosso som estava muito limitado. E nós já estávamos procurando um, na verdade."

capa do disco Street to Street: A Liverpool AlbumAinda em agosto o grupo o grupo cede "Monkeys" para uma coletânea com as bandas de Liverpool, chamada Street to Street: A Liverpool Album.

E "Monkeys" foi a primeira gravação do trio, anterior a "Pictures On My Wall". Ela havia sido feito no Open Eye, em quatro canais. O grupo costumava ensaiar no Merseyside Visual Communications Unit (MVCU) e a canção foi produzida por Noddy Knowler.

Após um show no Eric's, em 15 de setembro de 1979, o trio finalmente encontrou o baterista que tanto queria: Pete de Freitas.

Pete de FreitasPete era mais jovem do que os demais e não era de Liverpool.

Havia nascido em Trinidad e Tobago e ninguém sabe muito bem como entrou no grupo.

Em uma entrevista bem recente, Ian fala que o considerava o maior baterista do mundo, além de parecer um jovem Laurence Olivier. Com ele, a formação estava fechada.

Quando o contrato com a Korova foi anunciado, em dezembro de 1979, o Echo and the Bunnymen já tinha um repertório bem extenso, com boas canções. O primeiro lançamento como quarteto aconteceria em maio de 1980, com o single Rescue.

capa do compacto RescueRescue trazia a mesma foto do coelho usado em Pictures On My Wall, porém, invertida. O lado B trazia "Simple Stuff", e no compacto de 12 polegadas havia o acréscimo de "Pride".

O grupo entrou em pânico para as gravações, já que tinha pouquíssima experiência em estúdio. Ian Broudie colocou um timbre de guitarra que não agradou muito. Will sempre detestou o riff da música por considerá-la parecida a um banjo. O fato é que Rescue marca a entrada do Echo and the Bunnymen na grande indústria.

Menos de dois meses depois, saía o primeiro LP do grupo, Crocodiles. Até hoje não se sabe o motivo dele não ter sido produzido por Ian Broudie - os escolhidos foram David Balfe e Ian Drummond - e o disco alcançou a 17ª posição nas paradas britânicas.

capa do disco CrocodilesO disco foi aclamado pelas principais revistas inglesas. A Record Mirror saudou como a "primeira grande obra-prima do ano."

E Crocodiles era, de fato, uma obra-prima.

Um álbum denso, cheio de climas dos anos 60 e com as peculiares e abstratas letras de Ian McCulloch, os belos fraseados de Will e o baixo sólido e preciso de Les, além da personalíssima bateria de Pete de Freitas dando o clima.

A edição inglesa trazia a seguinte ordem nas faixas:

Faixas

Going Up
Stars are Stars
Pride *
Monkeys
Crocodiles
Rescue *
Villiers Terrace
Pictures on My Wall
All That Jazz
Happy Death Men

Les PattinsonNas edições americanas e japonesas foram acrescentadas "Do It Clean" e "Read It In Books". Quando o disco saiu aqui, em 1987, por ocasião da primeira excursão do grupo, saiu fiel à edição inglesa.

Porém, o disco, rendeu algumas brigas. McCulloch pegou Balfe pelo pescoço quando o produtor queria introduzir teclados em "Do It Clean". Foram três semanas tensas, até porque a banda não sabia exatamente o que queria com todas suas composições.

Um outro momento de tensão aconteceu quando a gravadora queria lançar um novo single do disco. A gravadora achou que "Villiers Terrace" seria uma boa escolha, mas o grupo odiava a música. Ian, por exemplo, prefere mil vezes a versão que tocaram no programa de John Peel.

capa do compacto The PuppetO grupo também não queria lançar "Do It Clean" como compacto, porque a queria usá-la no disco - o que não aconteceu na edição inglesa, a original. Por isso, acabaram optando por uma terceira canção: "The Puppet".

Ian odiou a escolha, afinal odiava a letra dela. Will não se aborreceu muito, embora a achasse muito rápida e tinha certeza que não faria sucesso, porque não era tão pop.

Quando o disco saiu, a banda já estava em meio a uma enorme turnê.

Paralelamente, o Echo and the Bunnymen foi criando um estilo em cima do palco, com fumaça, camuflagem, e com uma forte presença de Ian e a bateria de Pete mostrando uma força desconhecida ao vivo. Essa turnê ficou conhecida como a "Camo Tour".

O grupo se apresentou pela Inglaterra, Escócia, Holanda e encerrou a turnê no dia 4 de dezembro em Bonn, então capital da Alemanha Ocidental.

Com um LP de sucesso, boas músicas e simpatia da crítica, o quarteto entraria em 1981 confiante e pronto para vôos mais altos. Com Heaven Up Here viria o período mais feliz, antes das brigas internas.

Deixo vocês com a discografia do grupo. Um abraço e até a próxima coluna.

Discografia

Crocodiles (1980)
Shine's So Hard (1981)
Heaven Up Here (1981)
Porcupíne (1983)
Ocean Rain (1984)
Songs to Learn and Sing (1985)
Echo & The Bunnymen (1987)
Reverberation (1990)
BBC Radio 1 In Concert (1992)
Evergreen (1997)
Ballyhoo (1997)
What Are You Going To Do With Your Life? (1999)
Flowers (2001)
Crystal Days 1979-1999 (2001)
Live In Liverpool (2002)
Siberia (2005)
Fillmore - San Francisco Ca 12/5/05 (2006)
House of Blues - West Hollywood Ca 12/6/05 (2006)
The Very Best of Echo & the Bunnymen - More Songs To Learn & Sing (2006)


 

 

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