175 - The Cure - 1989 a 1992

parceria com Beatrix Algrave


O ano de 1989 foi crucial na carreira do The Cure em vários aspectos: primeiro os fãs ficaram chocados com a saída de Lol Tolhurst, demitido do grupo por Robert Smith, que era agora o único integrante original. Mas logo em seguida, o grupo lançou Disintegration, o disco de maior vendagem da carreira da banda e que fez um sucesso até certo ponto inesperado para o Cure. E essa fase duraria até 1992, quando lançaram Wish e Robert Smith sucumbiu a tamanha pressão da mídia. Veja o desenrolar desse anos agora...


 

Quem achava que Robert Smith voltaria mais calmo às atividades em 1989, após o Cure tirar o ano anterior para férias, quando o cantor casou com a antiga namorada Mary, tomou um susto. Tudo porque Robert havia demitido seu antigo companheiro e mais constante colaborador, Lol Tolhurst, dizendo que o baterista e tecladista se recusava a trabalhar nas novas canções e que vivia bêbado e caindo em todos os lugares.

A confusão começou quando Lol começou a beber ostensivamente durante a turnê de Kiss Me Kiss Me Kiss Me, em 1987. A situação ficou tão complicada, que o tecladista Roger O'Donnell foi adicionado ao grupo, e o Cure, provisoriamente, virou um sexteto. Lol ainda subia ao palco, mas sua colaboração musical era mínima nessa época.

Se Lol não contribuia muito musicalmente, era fundamental na função de trabalhar como uma ponte entre Robert e os demais. Afinal, ele era também um fundador da banda e sabia como lidar com a personalidade forte do líder do Cure. O baixista Simon Gallup retrata bem esse período: "era muito bom tê-lo em volta, ainda que ele não estivesse contribuindo na parte musical, já que ele era parte do Cure."

capa do disco DisintegrationParalelamente, o The Cure lançava um novo álbum, Disintegration, com a promessa de ser o último disco do The Cure.

"Não há a menor chance do grupo continuar após esse disco. Também não há a menor chance de eu sair em excursão promovendo esse álbum. Se for preciso, quebrarei minhas mãos para não tocar. Eu farei apenas os 27 shows que já estavam agendados na América e depois será o fim do The Cure. Sei que falei o mesmo quando lançamos os dois discos anteriores, mas agora é definitivo."

E Robert estava realmente determinado, tanto que havia começado a gravar um disco-solo, quase folk, inspirado em Nick Drake e afirmou que estava pensando em chamar o baixista Simon Gallup e o baterista Boris Williams para o trabalho. Gallup ficou triste ao ouvir isso (sobre o fim do Cure), mas afirmava que o cantor mudaria de idéia, "afinal ele já disse isso antes."

The Cure sem Lol; Roger é o último, à direitaA situação com Tolhurst havia contribuído muito para a tensão do cantor. Durante as gravações do novo disco, Lol ficava sentado bêbado, assistindo televisão e desmoralizando a banda. "Eu havia pedido durante a excursão para que ele parasse de se comportar daquela maneira e disse que precisava de um tratamento. Ele prometeu que faria isso, mas nunca quis, de fato. A única solução que tive foi demiti-lo", explica Smith.

Mas, logo depois da demissão os ânimos entre Tolhurst e os demais não estavam tão exaltados. Lol tinha uma boa reserva financeira e convidou todos (inclusive Robert) para seu casamento em 1989, mas a banda não compareceu por estar excursionando, mas como forma de retribuição, o chamou para o show que dariam em Wembley.

Porém, Lol não digeriu bem a demissão e meses depois, disse que Robert era manipulador, egoísta, mimado, e uma pessoa que não aceitava o diálogo. A situação ficou tão feia entre os dois que Lol processou Robert exigindo uma parte mais substancial nos direitos autorais do The Cure, em 1991. A briga se arrastou por três anos, com ganho de causa de Smith.

Disintegration foi um sucesso imenso, inesperado até por ter sido realizado em clima tão desfavorável. Foi o disco de maior sucesso da carreira do The Cure e rendeu quatro singles: "Lullaby", "Fascination Street", "Pictures Of You" e "Lovesong".

O disco contou com os seguintes músicos: Simon Gallup (baixo e teclado); Robert Smith (voz, guitarra e teclados);
Porl Thompson (guitarra); Boris Williams (bateria) e Roger O'Donnell (teclados). E Smith dividiu a função de engenheiro de som e produção mais uma vez com Dave Allen.

Quando saiu em maio de 89, o disco se tornou um imenso sucesso, o que agradou Robert Smith: "Eu o considero um grande álbum, apesar de eu estar me sentindo terrivelmente mal na época. Eu tive uma grande visão de como eu queria que ele soasse, mas não conseguia explicar aos outros o que eu buscava. Por isso, tentei manter o total controle da produção, mas é como segurar mercúrio com as mãos, impossível."

Smith explica mais sobre o conceito de Disintegration: "eu queria que o álbum falasse sobre um estado de desintegração. Eu tenho essa satisfação perversa em fazer discos depressivos. Eu tinha lido sobre dois jovens na Nova Zelândia que cometeram suicídio ouvindo nossos discos e alguns jornais estamparam a manchete 'Gothic Cult Suicide'. Fiz questão de pregar isso na parede do estúdio. Sei que é trágico, mas ao mesmo tempo é terrivelmente cômico, pois isso não tem nada a ver com o Cure. Todos estavam brincando no estúdio com a maneira pela qual eu aborreço as pessoas usando palavras. A minha idéia era produzir um álbum temático."

capa do single LullabyO primeiro single saiu algumas semanas antes do novo LP: Lullaby. Mas Robert não gosta muito da canção. "é a canção que menos gosto, mas acabou virando um single por ter um típico som do The Cure. Era o tipo de canção de ninar que meu pai cantava para mim. Ela também me remete ao meu tio Robert, que encontrava todas as maneiras possíveis, contando incríveis histórias no meu ouvido."

E no mesmo mês em que Disintegration saiu, Robert queimou a língua e liderou o The Cure para um imensa turnê mundial, com 76 shows entre maio até setembro. Batizado de The Prayer Tour, o Cure estava no auge do sucesso.

Os shows eram estranhos para alguns membros, especialmente o tecladista Roger O'Donnell. "Confesso que durante mais de um ano tinha muito medo de Robert. Ele é um cara muito quieto, muito fechado, quase não fala e eu não sabia como lidar com ele. Mas basta você fazer algo que o deixa feliz e ele abre o maior dos sorrisos. Mas confesso que me senti bastante desconfortável com toda essa situação.

capa do single Fascination StreetEm junho é lançado o segundo single, Fascination Street. "Eu fiz essa canção pensando na famosa Bourbon Street de New Orleans, sobre os prazeres de explorar a vida noturna de uma cidade. Basicamente eu procurava por um momento perfeito."

Em agosto é a vez de um novo compacto, Lovesong, canção essa que salvou o disco, segundo Robert.

capa do single Disintegration"Se Lovesong não estivesse no disco seria muito fácil descer a lenha em Disintegration. Uma canção falando de amor em um disco sobre uma ótica tão pesada faz as pessoas pensarem duas vezes e fico feliz por ela já que levei 10 anos para compor uma canção de amor. Eu dei para Mary uma fita com essa música como presente de casamento. Ela correu para o quarto e depois me cobriu de beijos. De certa maneira, é a música mais verdadeira e franca que já cantei. E é uma das canções mais difíceis para tocar ao vivo porque todas as emoções estão ali, escancaradas."

O último compacto extraído do disco, Pictures Of You, só foi lançado em março de 1990. "Eu tenho uma pasta e vivo perdendo as fotografias que coloco dentro dela. São fotos antigas, de amigos, familiares. Eu a fiz inspirado em um ensaio escrito por Myra Paleo, The Dark Power of Ritual Pictures. Quando eu o li tive um acesso de ódio e destruí todas as minhas antigas fotos pessoais e quase todas as de casa, bem como minha coleção de vídeos. Acho que eu estava tentando me livrar do passado e dias depois me arrependi do que fiz."

capa do disco EntreatNo ano de 1990, após as vendagens do disco passarem de um milhão de cópias, o The Cure descansou nos primeiros meses do ano e realizou apenas 11 shows entre os meses de junho até agosto.

Em setembro o grupo lança um disco ao vivo, Entreat, gravado em julho de 1989, apenas com canções do Disintegration: "Pictures Of You", "Closedown", "Last Dance", "Fascination Street", "Prayers for Rain", "Disintegration", "Homesick" e Untitled".

capa do disco Mixed UpEm outubro de 1990, o grupo surpreendeu com um disco de remix chamado Mixed Up. O disco servia mais como uma curiosidade do que qualquer outra coisa e continha as faixas "Lullaby (Extended Mix)", "Close To Me (Closer Mix)", " Fascination Street (Extended Mix)", "The Walk (Everything Mix)", "Lovesong (Extended Mix)", "A Forest (Tree Mix)", "Pictures Of You (Extended Dub Mix)", "Hot! Hot! Hot! (Extended Mix)", "Why Can't I Be You? (Extended Mix)", "The Caterpillar (Flicker Mix), "Inbetween Days (Shiver Mix)" e "Never Enough (Big Mix)"

Com tanta atividade em 1989 e 1990, o Cure fez de 1991 um ano de descanso, dando apenas três shows em Londres, no mês de janeiro, nos dias 17, 19 e 24.

capa do disco WishFoi apenas em 1992, que a banda voltou a dar as caras com um novo disco: Wish. Lançado em abril de 1992, o disco já trazia uma nova formação com a adição de Perry Bamonte, tocando baixo, teclado e guitarra e com a presença de Kate Wilkinson na viola.

O disco já tinha colocado o The Cure na condição de supergrupo, uma situação irritante para Robert Smith. Cada vez mais ele se irritava com os fãs, que se vestiam, se portavam e o imitavam nos mínimos detalhes: "em alguns lugares, como Paris, é desesperador. Eles usam o mesmo corte de cabelo igual ao meu, as mesmas roupas e basta eu sair às ruas para uma perseguição irritante acontecer. Eu sei que fizemos muito sucesso e sei que minhas músicas criam uma identificação imensa com as pessoas, mas não gosto nem um pouco disso."

O resultado foi a gigantesca excursão Wish Tour, precedida da The Warm-Up Tour: nada menos que 111 shows entre maio e dezembro daquele ano.

O primeiro single High, saiu semanas antes de Wish e nela Robert Smith fala de Dorothy, uma colega de infância. Mais uma vez Wish era considerado o disco final da banda por Robert Smith, que tinha, inclusive, composto "End", e a colocado como última música do álbum: "era esse o clima do disco e quando Porl Thompson deixou o grupo e depois Boris e até quando Simon pensou em sair, eu vi como um adeus. Eu imaginei como o canto do cisne da formação mais estável que tive dentro do Cure."

capa do single  Friday I'm In LoveO segundo single do disco foi Friday, I'm In Love, uma das canções mais tolas que Robert Smith já escreveu, segundo o próprio: "é uma canção totalmente absurda, totalmente positiva e otimista. Espero que ninguém a leve à sério."

A excursão de Wish foi dura para Smith por vários motivos. Musicalmente, o grupo estava no auge de sua forma, e tocando como nunca. Além disso, Smith tinha uma grande amizade com o baterista Boris Williams, casado com sua irmã Janet.

"Eu sentia que tudo estava desmoronando. Tínhamos um sucesso imenso, mas não conversávamos mais. Os músicos me olhavam de uma maneira estranha: ora estavam bravos, ora tristes e outras vezes nem me ouviam.

Eu sabia que não poderíamos ir muito mais longe e estava desesperado com isso, até porque eram nossos melhores shows. Mas a excursão foi longa demais, estafante demais e quando acabou ninguém podia olhar para a cara do outro. Eu olhava para todos e sentia que o The Cure tinha acabado. Não havia como continuar."

capa do single A Letter to EliseE Robert ficou profundamente decepcionado com a escolha de A Letter to Elise como terceiro single do disco: "é isso que dá quando você deixa os diretores da gravadora decidirem algo. Foi uma escolha terrível. Eu tinha lido Les Enfants Terribles, de Jean Cocteau e tinha me inspirado em "Letter to Hermione", de David Bowie, para compor a música. Odiei quando vi que tinha virado um single."

Assim, dessa maneira 1992 terminava para o The Cure. O grupo ainda teria alguns lançamentos em 1993 até entrarem em férias forçadas e aparecem como novo disco apenas no ano de 1996. Mas esses são papos para outro dia. Um abraço e até a próxima coluna.

 


 

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