Na América,
apenas o B-52’s representou tão bem o espírito
"new wave" como o Devo. E as duas bandas possuem muito
em comum: visual bizarro, letras divertidas e um grande talento
para entretenimento. Nascidos na mesma cidade que deu ao mundo
Chrissie Hynde – Akron – a banda foi mais uma que
resolveu retornar agora em 2004. Seus apaixonados fãs criaram
vários sites falando não só do grupo mas
do estilo "Devo de viver". É mole? E já
que é assim, "time out for fun"!!!
Se algum dia algum maluco
quiser descrever o ano de 2004 para o rock pode perfeitamente
chamá-lo “da volta dos que não foram”,
já que dezenas de bandas tidas como mortas ou sumidas resolveram
dar as caras para lançar um disco ou ganhar uma grana fácil
em shows pelo mundo. Alguns até passaram por aqui, como
foi o caso dos Pixies, que fizeram uma volta decepcionante, tocando
com pouco tesão e nitidamente atrás de umas verdinhas.
O pensamento foi simples: “já que estamos nos fodendo
em carreiras-solos bobas ou mesmo fazendo nada, porque não
ressuscitamos nossa grande banda do passando e garantimos mais
um troco para nossas aposentadorias?” E no meio de tanta
mediocridade atual e de um ano fraquíssimos em lançamentos
decentes, a onda foi voltar e lançar mais uma coletânea,
porque os antigos fãs lotariam ginásios e estádios
e comprariam os discos. Certo? E como. E o Devo não fugiu
à regra, embora não tenham deixados os antigos seguidores
com a sensação de que estavam sendo enganados.
O
grande mérito do grupo sempre foi o grande senso de humor
e o visual para lá de esquisito. Uma banda que simplesmente
destrói um clássico como “Satisfaction”
ou adota um corte de cabelo semelhante ao de John Kennedy não
poderia passar batido. Mas o Devo conseguiu deixar uma marca única
nos anos 80, uma década que boa parte da idiota crítica
considera descartável ou supérflua. É verdade...
Bons são os grupos de hoje que precisam chupar os ossos
de Beatles, Clash, Joy Division, PiL. para fazerem algo passável.
E sem a menor classe. Bile despejada, retorno à história
da banda...
O Devo foi formado em 1972,
em Akron quando dois estudantes da escola de arte Kent State,
Jerry Casale e Mark Mothersbaugh, resolveram formar uma banda
com uma idéia curiosa. Eles queriam descrever a “de-evolution”
ou regressão da sociedade americana, que se tornava cada
vez mais rígida, opressora, mecânica e conservadora.
Desse conceito nasceu o nome do grupo, Devo. E a música
teria que ser uma demonstração de tudo isso, utilizando
sintetizadores e equipamentos eletrônicos, os integrantes
precisariam se vestir e se mexer como se fossem andróides.
Jerry (seu nome de batismo é Gerald) e Mark chamaram Bob
Lewis para que começassem a criar o conceito da banda.
Eles haviam se inspirado no livro The Beginning Was the
End: Knowledge Can Be Eaten. Lewis acabou tocando por
pouco tempo no grupo, mas continuou com Mark e Jerry, porém,
atuando como empresário.
A primeira formação,
em 1972, trazia Jerry, no baixo, Mark nos vocais, e dois irmãos
de Mark, Bob (guitarra) e Jim, bateria. Jim logo deixou o grupo,
entrando Alan Myers em seu lugar. E Jerry chamou seu irmão,
igualmente chamado Bob, para tocar outra guitarra.
O
grupo cria um pequeno selo, Booji Boy, e lançam alguns
singles, sendo um deles, uma versão atonal de “Satisfaction”.
Um outro destaque era “Jocko Homo”, seu primeiro grande
sucesso. Mark desenvolve o visual, abusando do kitsch,
utilizando imagens absurdas utilizando batatas representando os
integrantes e fazendo com que todos os membros tivessem o mesmo
corte de cabelo. Os integrantes deveriam demonstram que o mundo
havia tornado as pessoas completamente sem vida e personalidade.
Sobre a simbologia das
batatas, que tanto marcou o grupo, Jerry explica: “A batata
é um elemento que mantêm a humanidade viva. Ela é
desprezível e desprovida de beleza. Ela é também
um condutor de eletricidade. As pessoas devem lembrar que na escola
nos ensinaram que é possível fazer transmissores
e até rádios com batatas. Elas nos cercam e as vejo
como um símbolo de nossa humilde caminhada para a evolução
humana.”
A
criação do grupo durou quatro anos, e em 1976, causaram
uma pequena sensação quando participaram de um festival
de cinema em Ann Arbor (onde Iggy Pop havia sido criado), com
um curta-metragem chamado The Truth About De-Evolution,
que levou o prêmio. Iggy e David Bowie estavam entre os
presentes e ficaram tão alucinados com a película,
que os ajudaram a conseguir uma gravadora.
O grupo voou então
para a Inglaterra, onde fechou com a independente Stiff Records
e lançou em 1977 o compacto Be Sitff.
O disquinho fez apenas aumentar a sanha em torno da banda e no
ano seguinte, a Warner ofereceu um contrato e Brian Eno produziu
o disco. Aliás, Brian conseguiu convencê-los a não
serem produzidos por Bowie e sim por ele, prometendo que emprestaria
dinheiro para tocar o projeto e que eles trabalhariam na Alemanha,
em um estúdio de propriedade do mitológico produtor
Conny Plank, responsável por discos do Can, Kraftwerk,
Ultravox e Eurythmics.
“Brian estava meio
puto com David pois ele não havia recebido os devidos créditos
nos álbuns em que havia gravado com ele, na Alemanha. David
havia se prontificado para ser o nosso produtor e disse que precisava
apenas se ausentar uns dois meses para filmar Just a Gigolo,
na Alemanha, mas pediu que nós o esperássemos. Nesse
meio tempo, Brian apareceu e nos fez essa proposta. Disse que
não se preocupássemos com uma gravadora, pois ele
providenciaria isso”, conta Mark.
Lançado
em 1978, Q: Are We Not Men? A: We Are Devo!,
o disco tornou-se rapidamente um clássico e uma das mais
criativas estréias que se conhece. Além de “Satisfaction”
e “Jocko Homo” (tocando num estranhíssimo ritmo
7/8), havia outras pérolas como “Mongoloid”
e “Too Much Paranoias”. Ninguém soava ou se
parecia com o grupo, que recebeu elogios do mundo todo. Brian
Eno havia conseguido dar mais força ao som da banda, que
já havia conseguido uma personalidade própria.
Sobre
o clássico dos Stones, Jerry conta que precisaram mostrar
a versão que haviam feito da canção para
Mick Jagger, que poderia liberar ou vetar a mesma. “Naquela
época, as leis de direitos autorais eram muito severas.
Você não podia simplesmente chupar uma canção
como esses grupos de rap fazem atualmente. Você precisava
pedir permissão para a gravadora. Quando eles ouviram a
nossa versão disseram que não era uma cover fiel
à original e que os Stones precisariam aprovar. Então,
marcaram um encontro nosso com Mick Jagger em Nova York. Ele foi
simpático, mas estava visivelmente entediado, com um copo
de vinho, enquanto nós mostrávamos a música
a ele. Mick sentou e ficou ouvindo, sem se mexer ou olhar para
nós. Até que levantou, deu voltas pela sala e disse
que havia gostado muito da nossa versão e deu a sua aprovação.
Meu Deus, quando ele disse que havia achado ótimo, fiquei
nas nuvens. Nunca mais esquecerei esse dia enquanto viver!”
É bem verdade que
nem todos entenderam a mensagem da banda e a conservadora revista
de rock (quer coisa mais triste do que isso?) Rolling Stone
os chamou de fascistas, pela desumanização que pregavam,
sem entender que eles não queriam pregar nada, apenas mostrar
em que as pessoas haviam se tornado.
No ano seguinte o grupo
lança um novo disco, Duty Now for the Future
que não fez tanto sucesso quanto o álbum de estréia,
embora seja um excelente trabalho e com destaque para a cover
de “Secret Agent Man”.
Em
1980 a banda atinge um patamar incrível graças à
nascente MTV, que maciçamente veiculou o vídeo da
canção “Whip It”, do disco Freedom
of Choice. O disco sedimentou toda a concepção
da banda, com os sintetizadores tomando conta do som e com a dupla
Mark e Jerry produzindo alguns dos mais inspirados momentos da
“new wave”. Há quem considere a grande obra-prima
do Devo.
Ainda em 1980, o grupo
lançou um EP gravado ao vivo, DEV-O Live.
E quando o sucesso parecia inevitável, surpreendem lançando
um disco pesado e mais sério, New Traditionalists.
Tentando explorar novas idéias e conceitos, o Devo parecia
perdido e tentando fugir da imagem que haviam perpetuado.
E
se a inspiração andava em baixa, o mesmo não
se pode dizer dos problemas. Após ter sido demitido pelos
membros do Devo, Bob Lewis entrou com uma ação alegando
que ele tinha propriedade intelectual na concepção
do grupo. E Lewis acabou vencendo após achar uma fita em
que Mark dizia, em uma antiga entrevista, que ele havia sido um
dos responsáveis pela concepção do Devo.
Mas confusão mesmo
o grupo arrumou quando tiveram uma idéia, no mínimo
bizarra: queriam musicar um poema escrito por Robert Hinckley
Jr., que ficou famoso ao tentar assassinar o então presidente
norte-americano Ronald Reagan. O grupo foi taxado de doente e
causou um grande mal estar durante as sessões que acabariam
rendendo o disco oh, no! it's Devo.
Produzido
por Roy Thomas Baker, que havia trabalhado com os Cars, teve uma
fria acolhida e mostrava a banda soando um tanto perdida e repetitiva.
Mas, esse disco traz duas curiosidades: as faixas “Peek-a-boo!”
e “Time Out For Fun”, que não foi sucesso em
lugar nenhum, com exceção do... Brasil! Aliás,
o Brasil é conhecido por emplacar faixas que em nenhum
outro país consegue ser sucesso. E, talvez, o maior exemplo
seja “Love of my Life”, do Queen...
Apesar
das inúmeras excursões e do aumento dos fãs,
o Devo tinha perdido a aura de grupo inovador e havia se misturado
com grupos da safra “new wave” que não possuíam
um décimo do seu talento original. E o próximo disco,
Shout era o ponto mais baixo. Trazendo poucas
composições boas, acabaram escorregando até
em uma versão de “Are You Experienced?”, de
Jimi Hendrix.
Parecia
que o Devo havia chegado ao fim após três discos
que pouco haviam acrescentado artisticamente a uma banda tão
inovadora.
Em 1986, Alan Myers resolve
abandonar o grupo e em seu lugar entra o baterista David Kendrick,
ex- Sparks. Mas a banda mal existia e em 1987 lançam E-Z
Listening Muzak , o primeiro trabalho do grupo a sair
em formato CD, com quase 70 minutos de música. E em 1988
lançam um disco fraquíssimo, Total Devo,
em que pareciam uma leve paródia do que haviam conseguido
nos primeiros anos.
No
ano seguinte lançam em disco duplo gravado ao vivo, Now
It Can Be Told e em 1990, o derradeiro trabalho de estúdio,
Smooth Noodle Maps. Insatisfeito, Mark Mothersbaugh
começou a investir em comerciais de televisão e
trilhas sonoras, fazendo trabalhos para a MTV, o canal de desenho
Nickelodeon, além de ser músico de estúdio
para os Rolling Stones e Debbie Harry. Mas não se esqueceu
dos velhos companheiros e montou uma produtora chamada Mutato
Muzika, onde empregou vários dos membros do Devo.
Jerry também teve
uma vida agitada após sair do grupo, trabalhando como diretor
de vídeos para o Foo Fighters e Soundgarden.
Várias coletâneas
foram lançadas nesse período sendo as mais importantes
Hardcore DEVO Volume One 1974-1977 e Hardcore
DEVO Volume Two 1974 – 1977, ambas de 1991, em
que resgatam canções dos primeiros anos
Em 1996 receberam uma oferta
para tocarem seis dias na turnê Lollapalooza, para delírio
dos fãs, que nem sonhavam mais com uma volta do grupo.
Nessas apresentações contavam com o baterista Josh
Freese. No ano seguinte, lançam um jogo em formato CD-ROM,
The Adventures of the Smart Patrol, composta
de uma trilha sonora com músicas tiradas da turnê
do ano anterior.
Em
2000, é a vez de mais duas sensacionais comPiLações
duplas: Pioneers Who Got Scalped, com uma belíssima
capa holográfica, editada pela Rhino e Recombo
DNA, uma edição limitada vendida apenas
por correio e igualmente editada pela Rhino.
Em 2001, os irmãos
Mothersbaugh e Casale resolveram se reunir para finalizarem um
antigo projeto que acalentavam desde meninos, quando tocavam no
porão da família Casale: montar uma banda de “surf
music”. Assim nasce os Wipeouters que lançam P'
Twaaang!!!. Fazem uma excursão e resolvem todos
ao trabalho na Mutato Muzika, quando em 2002, mais uma vez se
reúnem, usando desta vez o nome com o qual haviam ficado
famosos: Devo!
Usando
a desculpa de terem mais uma coletânea no mercado The
Essentials, começam então a fazer incontáveis
apresentações que se arrastaram até o dia
24 de setembro de 2004, em Chicago.
Embora não tenham
nenhum material novo lançado, parece que a banda teve sua
importância devidamente reconhecida, colhendo críticas
favoráveis e uma grande receptividade dos velhos e novos
fãs. O grupo possui uma bela página oficial, www.clubdevo.com
e vários sites espalhados pela internet, que cultuam a
banda e disseminam a velha filosofia do grupo.
E
se nós tivemos Pixies e até Brian Wilson no Brasil
em 2004, não é demais sonhar com esses malucos em
2005. Afinal, fãs no Brasil é que não faltam
a eles. Deixo vocês com uma foto da época do disco
New Traditionalists, letras dos clássicos
“Jocko Homo”, “Time Out For Fun” e “Peek-a-boo!”,
além da discografia da banda. Um abraço e até
a próxima coluna.
Jocko Homo
they tell us that
we lost our tails
evolving up from little snails
i say it's all just wind in sails
are we not men? we are DEVO!
we're pinheads now we are not whole
we're pinheads all jocko homo
are we not men? D-E-V-O
monkey men all in business suit
teachers and critics all dance the poot
are we not men? we are DEVO!
are we not men? D-E-V-O
we must repeat o.k. let's go!
Time Out For Fun
hello
this is devo
we would like to say
things go both ways
new ideas stupid moves
nightmares or dreams come true
mucho work minus play
tension mounts in a twisted face
dark clouds in the crystal ball
tension mounts in a foreign place
the screw turns someone calls
time out for fun!
so you're living
under the gun
circumstances have you on the run
a doctor frowns you feel bad
take this you've just been had!
don't you lose
it now listen to us
everything's going to be all right
take a break take some time
everything's going to be all right
don't you lose it remember to take
time out for fun!
so your life has
just begun
somebody else is saying that it's done
nurses whisper others grin
something's funny at your expense again
Peek-a-boo!
Peek-a-boo!
I can see you
And I know what you do
So put your hands on your face
And cover up your eyes
Don’t look until I signal
Peek-a-boo! peek-a-boo! peek-a-boo!
The way that we weren’t is what we’ll become
So please pay attention while I show you some
Of what’s about to happen
Peek-a-boo!
I know what you do
Cause I do it too
Laugh if you want to or say you don’t care
If you cannot see it you think it’s not there
It doesn’t work that way
Discografia
Be Stiff (EP, 1977)
Q: Are We Not Men? A: We Are Devo! (1978)
Duty Now For The Future (1979)
Freedom of Choice (1980)
DEV-O Live (EP, 1980)
New Traditionalists (1981)
oh, no! it's DEVO (1982)
Shout (1984)
E-Z Listening Muzak (1987)
Total Devo (1988)
Now It Can Be Told (1989)
Smooth Noodle Maps (1990)
Greatest Hits (1990)
Greatest Misses (1990)
Hardcore DEVO Volume One 1974-1977 (1991)
Hardcore DEVO Volume Two 1974 - 1977 (1991)
DEVO Live - The Mongoloid Years (1992)
BMG Greatest Hits (1998)
Pioners Who Got Scalped (2000)
Recombo DNA (2000)
The Essentials: Devo (2002)
|