Uma
das bandas mais bacanas inglesas dos anos 70 foi esse grupo de
malucos amantes de blues e r&b e que foram os maiores expoentes
do "pub rock". Liderados pelo tresloucado vocalista
Lee Brilleaux, o Dr. Feelgood possui uma história imensa,
rica em lendas e em sons inesquecíveis. A grande alma era
o guitarrista Wilko Johnson, dono de um fraseado tão interessante,
que foi convidado (e recusou!) para entrar nos Rolling Stones
quando Mick Taylor deixou a banda. Cercada de várias lendas
(seria essa mais uma?), a banda ainda permanece viva, na milésima
formação. Apesar de nenhum integrante original continuar,
o grupo ainda existe, afinal é uma instituição
inglesa das mais importantes quando se fala em puro rock e blues.
E eles continuam fazendo exatamente aquilo para o qual foram feitos:
tocar ao vivo. O Dr. Feelgood continua sendo do cacete!
Tudo
começou há muito tempo atrás. Em 1967 um
jovem chamado Lee Brilleaux e um colega chamado Chris Fenwick
sonhavam em montar um grupo.
Os meninos eram apaixonados
pelo blues e pela música folk. Assim nascia a Southside
Jug Band em 1967.
A banda depois mudou de
nome para The Fix e The Pigboy Charlie Band. O grupo ficou junto
até 1971 e no ano seguinte sofreria uma mudança
radical. Um garoto magrinho, que tinha um irmão mais velho
que já tocava guitarra e com quem acabaria aprendendo e
criando um estilo único: Wilko Johnson.
Quando Wilko entrou no
grupo, algumas mudanças ocorreram: John B. Sparks, ou “Sparko”,
assumiu o baixo. Chris deixou o grupo para se tornar o empresário
e a banda resolveu adotar um outro nome. O escolhido foi Dr. Feelgood,
um velho hit do grupo Johnny Kidd & The Pirates.
O
nome Dr. Feelgood possui algumas lendas. Dr. Feelgood é
o nome dado a médicos que enalteciam demasiadamente os
benefícios de remédios psicossomáticos, ou,
no popular, os curandeiros que vendiam drogas para aliviar as
dores e depressões em geral. E
existiu um pianista, Piano Red, que gravou brevemente sobre o
codinome Dr. Feelgood & the Interns e seu maior sucesso foi
justamente “Dr. Feelgood”.
E, em 1967, Aretha Franklin
compôs, ao lado de Ted White, uma canção também
intitulada “Dr. Feelgood (Love Is A Serious Business)”,
registrado no seu clássico disco I Never Loved
A Man The Way I Love You.
O estilo de Wilko era derivado
da guitarra de Mick Green, guitarrista do Pirates, e logo a banda
estaria fazendo alguns shows, com a entrada do baterista John
“Big Figure” Martin. O grupo partiu para Londres,
onde fez seu primeiro show no Tally Ho, em Camden, no ano de 1973.
Com seu som básico,
um guitarrista ensandecido e técnico ao mesmo tempo e um
vocalista absolutamente carismático, o Dr. Feelgood foi
um dos maiores representantes do chamado “pub rock”,
um movimento que tentava resgatar a simplicidade e a energia da
música perdida no meio de tantos grupos que faziam hard
rock ou progressivo.
Wilko
relembra bem a fase: “éramos realmente um grupo
de ‘pub rock’. Durante 18 meses ficamos tocando nos
clubes perto de nossas casas e nunca tínhamos pisado em
Londres. Éramos completamente desconhecidos e nunca tínhamos
tocado profissionalmente. E quando ouvimos sobre essa coisa de
bandas tocando em pubs e começamos a tocar em alguns deles.
Vimos um monte de bandas iniciantes realmente boas e que tinham
sido deixadas meio que no vácuo. Éramos então
as caras novas e começamos a tocar juntos, fazer amizades
e tal. Acabamos criando uma vantagem, porque treinamos muito e
fizemos todos os erros possíveis com o pessoal de nosso
vilarejo. A nossa preocupação era não dar
vexame em Londres. Pessoalmente, acho que encaixávamos
nessa definição, que cobria bandas díspares,
que tocavam rock and roll, blues, reggae e soul.”
E
foi nesse circuito minúsculo que o grupo começou
a fazer nome e fama, até chamarem a atenção
da United Artists.
O grupo lança um
primeiro single, “Roxette”, escrito por Wilko e em
1975 lançam o primeiro disco Down By The Jetty,
gravado em mono.
O
disco foi rapidamente aclamado como uma das melhores estréias
do ano. O disco trazia elementos dos primeiros anos do Rolling
Stones e Animals. Wilko era o grande destaque, mas não
há como passar batido pelo vocal e gaita de Lee Brilleaux.
O trabalho foi produzido
por Vic Maile e a foto foi tirada em Canvey Island em frente a
um pub chamado The Lobster Smack. O grupo logo caiu na estrada,
fazendo parte da The Naughty Rhythms Tour com Kokomo and Chilli
Willi e The Red Hot Peppers, com shows por todo o Reino Unido
e com muita bagunça.
Nessa época, o grupo
deixa de tocar em pequenos clube e parte para espaços maiores.
Os fãs começavam a crescer e viam no grupo uma alternativa
para o "rock cabeça" da época.
"Eu estou cheio
dessas bandas que ficam falando de cosmos, morte e ficam me perguntando
se eu não entrarei nesse estilo, e me acusam de não
ter imaginação. Imaginação? Qual o
problema de uma música simples, divertida, com acordes
menores, instrumentos simples e abordar nas letras idéias
cotidianas? Será que precisamos ainda de deadheads? Eu
não acho que o rock and roll seja um veículo para
ficar falando dessas besteiras esotéricas", afirmou
Wilko, em uma entrevista no ano de 1976.
Lee
Brilleaux dizia ainda mais: "você não precisa
ser um músico para tocar rock and roll. Para tocar rock
basta apenas gostar da música. "É
isso mesmo. Veja bem, hoje nossos shows estão lotados de
garotos que nasceram quando os Beatles gravaram 'Love Me Do'.
Eles estão cansados desses grupos cheios de tecnologia,
teclados, luzes e efeitos especiais. Eles querem algo vivo, quente
e também em que possam se espelhar, de olhar e dizer 'eu
posso fazer isso! vou comprar uma guitarra'. É isso que
falta hoje em dia, diversão",
complementava Wilko.
Por tudo isso, é
bem razoável supor que o Dr. Feelgood foi uma inspiração
para os grupos punks que começavam a pipocar por toda Inglaterra.
Ainda
no mesmo ano, o grupo lança o segundo disco, e a grande
obra-prima, Malpractice. Nessa época as
excursões não permitiam que o quarteto parasse para
escrever novas canções com calma, o que obrigou
os integrantes a gravarem da mesma maneira que o disco de estréia.
"Na verdade, nós
os gravamos também em mono. Ele só acabou sendo
em estéreo, porque não aguentávamos mais
aquela lenga-lenga das pessoas chegarem até nós
e perguntarem 'oh, por que gravaram o primeiro LP em mono?', estávamos
cheios daquilo, então na hora de finalizá-los, passamos
para estéreo, embora não tenha muita diferença
de um disco para o outro. Talvez o som da bateria esteja melhor
gravado, mas nós não fizemos overdubs e basicamente
é o som de três instrumentos e a voz de Lee",
disse Wilko.
Back
In The Night / I'm A Man foi o primeiro compacto do disco,
que alcançou a 17ª posição nas paradas
de mais vendidos.
O disco trazia canções
clássicas de Wilko e de alguns clássicos dos anos
50 e 60. Com o disco vendendo bem, o Dr. Feelgood continuou atuando
em sua essência, ou seja, em cima de um palco. Foi também
quando enfrentaram a primeira excursão norte-americana.
E lá, enfrentaram uma situação curiosa.
"A América
é muito curiosa. Você não tem um bom lugar
para tocar para 2 mil pessoas. O que se tem lá são
espaços minúsculos ou grandes ginásios e
que dão muitas despesas. E é inviável economicamente
viajar até lá e tocar em lugares pequenos. Essa
é a razão que hoje tocamos em lugares maiores, porque
precisamos aprender a conviver com esse dilema. Todos os 'pubs
groups' tiveram que se adaptar a essa realidade. Nós temos
uma relação muito boa e independente com a platéia.
Não precisamos que eles nos digam o que devemos tocar ou
não, mas gostamos de ver a reação durante
nossas apresentações. Uma das coisas mais irônicas
de lá e optar entre fazer um show longe do público
e cercado de seguranças ou em um lugar pequeno, perto dos
fãs e perder dinheiro", conta Wilko.
E
o que mais faltava para a banda, acabou acontecendo. Em 1976 o
grupo solta Stupidity, um disco ao vivo e que
capta toda a essência e gana da banda.
O disco alcançou
a primeira posição na parada inglesa e mostrava
do que a banda era feita: uma combinação da guitarra
crua e poderosa de Wilko, com a energia inesgotável de
Lee.
Gravado sem overdubs
e com versões bem fiéis às registradas
no dois discos de estúdio, o Dr. Feelgood conseguia a consagração.
Mas o que era doce, azedou
quando Wilko Johnson deixou o grupo em 1977. A pressão,
então, era enorme: shows, entrevistas, viagens, aeroportos
e durante uma discussão sobre uma canção
que iria entrar no novo disco, Wilko se encheu de Lee e disse
que iria deixar o grupo. Os fãs ficaram desesperados, já
que Johnson era dono de um estilo único.
Uma das perguntas que mais
aborreciam o guitarrista era se ele iria entrar para os Rolling
Stones, que o haviam convidado para ser o segundo-guitarrista
após a saída de Mick Taylor. Wilko deixara bem claro
que não tinha o menor interesse em servir de apoio para
outro guitarrista - no caso, Keith Richards - e que não
via sentido em deixar sua banda para ingressar em outra. Taylor
acabaria sendo subsutituído por Ron Wood, dos Faces.
O escolhido para a missão
de substituir o insubstituível acabou nas mãos do
desconhecido John "Gypie" Mayo, um obscuro guitarrista
de jazz e funk de Harlow. E Mayo já entrou com uma grande
batata para descascar: tinha apenas uma semana para aprender todo
o repertório clássico do grupo, que começaria
uma nova excursão pelo Reino Unido.
E
logo após a excursão, é lançado Sneakin'
Suspicion, novo disco de estúdio. John conseguiu
o que parecia impossível: criar um estilo totalmente diferente
de Wilko, e ainda assim, deixar sua marca e colocar um sorriso
no rosto dos amantes da banda.
Além disso, era
um bom compositor e fez uma boa parceria com Lee Brilleaux. Ainda
no mesmo ano, a banda solta um novo disco batizado de Be
Seeing You.
O grupo ia muito bem comercialmente,
vivendo um ótimo período e o disco acabou sendo
produzido por Nick Lowe, co-autor do clássico "Milk
And Alcohol", com Mayo.
Porém, o destino
foi duro com o grupo e Mayo deixou o Dr. Feelgood em 1981, com
problemas de saúde. A partir daí, a banda sofreria
uma série imensa de mudança de integrantes. Quando
John Crippen, o "Johnny Guitar", entra o no grupo, Lee
vê Sparks e Big Figure saírem.
Nos
anos seguintes, Lee Brilleaux manteria o grupo tocando e fazendo
discos, alguns irregulares, ou bons. Lee dizia que não
poderia pensar em outra vida que não fosse a em cima de
um palco, tocando seu som cru e alegre.
Porém, Lee também
deixaria os palcos de uma maneira trágica: no dia 7 de
abril de 1994, morria de linfoma, a alma da banda, seu mestre
de cerimônia, em Essex.
Lee, que havia nascido
em Durban, África do Sul, no dia 10 de maio de 1952, e
que havia voltado para a Inglaterra, aos três anos, com
seus pais, acabou sendo homenageado por inúmeros fãs,
muitos deles, próprios integrantes do Dr. Feelgood, que
ainda excursionam pelo mundo com o nome, apesar de nada mais terem
em comum com os anos de ouro.
O grupo hoje é composto
por Kevin Morris (bateria), Phil Mitchell (baixo), Robert Kane
(vocais e gaita) e Steve Walwyn (guitarra).
Wilko seguiu uma carreira-solo,
que mesmo longe do sucesso do passado, o mantém vivo e
tocando até hoje. Em 1998, participou de um tributo ao
amigo Lee, de quem não guarda mágoas. Mas Wilko
salienta que cada um tinha seu destino e que a vida assim o quis.
Uma
das grandes marcas da banda era o seu logotipo, usado na capa
de uma coletânea e que era o maior símbolo da alegria
do Dr. Feelgood.
Um dos grandes site, senão
o melhor, é o site oficial, mantido por uma grande fã
alemã, Gabi Schwanke: www.drfeelgood.de,
com vários links e curiosidades sobre toda a carreira da
banda. Uma ótima maneira de aprender e mergulhar em uma
verdadeira instituição do rock and roll.
Deixo vocês com duas
letras de canções do disco Malpractice.
Um abraço e até a próxima coluna.
Don’t Let
Your Daddy Know
(Wilko Johnson)
I'll get nervous when we
meet
You look so young and sweet
You're taking time off school
Oh angel keep it cool
He worries so
Don't let your daddy know
I think the time is right
To take you out tonight
I can't call at your door
What if the neighbour saw
One thing just before I
go
Don't let your daddy know
- Break -
Before I knew your name
I loved you just the same
I love you still I do
It's a secret between us two
He might not dig it so
Don't let your daddy know
Don't let your daddy know
Don't let your daddy know
Don't let your daddy know
Don't let your daddy know
He might not dig it so
Don't let your daddy know
Don't You Just
Know It
(Smith/Vincent)
("Hey's")
Hey pretty baby can we
go strollin
(Don't you just know it)
You got me rockin when I wanna be rollin, child
(Don't you just know it)
CHORUS:
Ah hah hah hah (ah hah hah hah)
Hey hey hey oh (hey hey oh)
A kooba kooba kooba kooba kooba (kooba kooba kooba kooba)
Ah hah hah hah (ah hah hah hah)
Ah hah hah hah (ah hah hah hah)
Hey hey hey oh (hey hey oh)
Baby baby you're my blue
heaven
(Don't you just know it) yeah
You got me pushin when I wanna be shoving
(Don't you just know it)
(chorus)
(instrumental, with "hey's")
I don't care, you've got
a hold on me, child
(Don't you just know it) yeah
Yeah a young girl sure gonna follow the streets, child
(Don't you just know it)
(chorus)
Ah hah hah hah (ah hah
hah hah)
Hey hey hey oh (hey hey oh)
Ah hah hah hah (ah hah hah hah)
Hey hey hey oh
Discografia
Down By The Jetty (1975)
Malpractice (1975)
Stupidity (1976)
Sneakin’ Suspicion (1977)
Be Seeing You (1977)
Private Practice (1978)
As It Happens (1979)
Let It Roll (1979)
On The Job (1979)
A Case Of The Shakes (1980)
Casebook* (1981)
Fast Women Slow Horses (1982)
Doctors Orders (1984)
Mad Man Blues (1985)
Brilleaux (1987)
Classic (1987)
Case History* (1987)
Live In London (1989)
Singles – The UA Years+* (1989)
Primo (1991)
Stupidity + - Dr. Feelgood Live 1976-1990* (1991)
The Feelgood Factor (1993)
Down At the Doctors (1994)
Looking Back (caixa com cinco cds, 1995)
On The Road Again (1996)
25 Years of Dr. Feelgood* (1997)
Centenary Collection* (1997)
Chess Masters (2000)
Singled Out – U.A/Liberty A’s B’s & Rarities*
(2001)
Finely Tuned* (2002)
Wolfman Calling – The Blues of Lee Brilleaux* (2003)
Speeding Thru Europe (2003)
Live At The BBC 1974-5 (1999)
Complete BBC Sessions 1973-1978 (2001)
Down At The BBC – In Concert 1977-1978 (2002)
* coletâneas
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