O último
disco de estúdio da banda é um dos momentos mais
inspirados do trio e um sonoro tapa na cara para quem achava que
iriam adocicar sua massa sonora após terem sido contratados
pela Warner. Warehouse solidificava todo o conceito apresentado
no espetacular Candy Apple Grey. De quebra, trazia alguns das
melhores canções de Bob Mould e Grant Hart. Um disco
duplo perfeito e que não contém nenhuma faixa ruim.
Em suas 20 canções (12 de Bob e 8 de Grant), o trio
conseguiu pavimentar de forma definitiva seu nome na década
de 80. E nunca mais repetiriam a faísca criativa após
a separação.
Depois
que o duplo Zen Arcade foi lançado, o
grupo evoluiu muito em sua fama e influência. E, enquanto
promoviam o disco, já tinham outro pronto e que foi guardado
pela SST até 1985. E 1985 foi um ano cheio para o Dü,
com o lançamento de dois álbuns e um single.
O primeiro é New
Day Rising, lançado em janeiro e que mais parecia
uma colagem de sonhos. A canção que abre o disco,
a faixa título, tinha apenas uma linha de letra, “New
Day Rising”, berrada. Bob disse que sempre gostou de falar
dos seus sonhos, por serem sempre tão esquisitos, especialmente
em frente ao aparelho de televisão. “quando você
dorme com a televisão ligada, aumentam suas chances de
ter sonhos porque há uma aura maior. Às vezes quando
deixo ligado no canal 24 horas de notícias, meus sonhos
são ainda mais alucinantes; eu os ouço falar sobre
a África, por exemplo, e algo no meu subconsciente é
acionado.”
A
canção Book About UFO’s” possui uma
ligação meio indireta com “Mr. Spaceman”,
dos Byrds. Aliás, não era a primeira vez que o grupo
pagava um tributo ao grupo, já que havia lançado
uma cover de “Eight Miles High”. Vale lembrar que
as duas canções citadas do grupo são do disco
Fifth Dimension, de 1966. No geral, New
Day Rising consolidou o excelente nível e momento
do trio e mostrou que podiam falar sobre sentimentos femininos,
como em “The Girl Who Lives On Heaven Hill”. Sobre
os arranjos mais elaborados e com maior presença de teclados,
Bob avisou que a essência do grupo era apenas baixo, bateria,
guitarra e vocal e que não incluiriam teclados em seus
shows.
Com toda atenção,
nada mais natural do que saírem mundo afora excursionando
e conquistando mais fãs. Os shows da banda sempre foram
um dos pontos altos da banda, com destaque para a guitarra de
Bob Mould. O grupo costumava dar preferência ao novo repertório,
mas sem esquecer de incluir alguns clássicos.
“O
palco é nosso habitat natural, o local onde podemos
extravasar nossas tensões e nossa raiva. E fico feliz que
o público corresponda de maneira tão positiva, pois
nossa intenção é deixá-los com um
sorriso ao final de cada apresentação.”, dizia
Grant Hart. E não havia como não deixar os fãs
felizes com tamanho frenesi.
Até o calado e pouco
balado Greg Norton, que mais parecia uma engrenagem para preencher
o som, empolgava a platéia, dando os famosos saltos que
Pete Townshend e Sting imortalizaram.
“Nosso
som é quente e me dá vontade de pular. E eu pulo
mais ainda quando vejo os garotos fazerem o mesmo”, dizia
o bigodudo.
A fama começou a
extrapolar os limites dos selos e palcos independentes e o grupo
era agora paquerado pelas grandes gravadoras, para horror de alguns
e indiferença da banda. “Eu não sei nada sobre
isso, apenas ouço dizer do interesse, mas nada oficial
aconteceu ainda”, garantia Grant Hart. Enquanto isso, a
banda brindava o mundo com dois lançamentos seguidos: o
single Makes No Sense At All e o LP Flip
Your Wig.
Makes
No Sense At All traiu uma velha promessa do grupo, a
de nunca aparecerem em uma capa de disco. É certo que eles
estavam com o rosto escondido embaixo de alguns lençóis,
o que diminuiu um pouco o susto, especialmente das fãs
femininas. E na verdade, o single servia apenas como um aperitivo
para o novo disco, já que a duas canções
tinham menos de 4 minutos. A canção principal tinha
2 minutos e 35 segundos e “Love Is All Around”, apenas
1 minuto e 41 segundos.
Em setembro, um mês
depois do compacto é editado Flip Your Wig.
Nesse novo trabalho, o grupo resolve abordar um tema que evitavam
usar, que era o protesto político, ainda que Grant Hart
não concordasse exatamente com essa expressão: “eu
acho que protestar é muito importante e que devemos sempre
fazer isso. Porém, não concordo, com essa coisa
de direita ou esquerda, certo ou errado, ou apenas protestar em
frente às câmeras de televisão. Acho que as
pessoas hoje vão pouco para as ruas exigir seus direitos.
Se acreditassem mais nesses ideais, conseguiriam muito, mas algumas
preferem ficar vegetando dentro de casa.”
Um
exemplo disso é a letra “Divide And Conquer”,
que mostra o futuro alienante do mundo e que prevê um novo
modelo de vida virtual. Sim, você conhece bem isso: é
a internet, onde por acaso você agora se encontra. Um trecho
da letra diz : “Bem, eles dividiram toda a área /
E agora temos cidades e estados / As cidades possuem bairros e
seus distritos / Há vários ‘ceps’ agora
/ e nove dígitos em cada ‘cep’ / Decodificadores
secretos ... / Nós iremos inventar novos computadores /
Que irão conectar a aldeia global / E teremos a AP, UPI
e Reuters / para dizer a todos nós, as notícias.”
Além do belo trabalho,
a notícia que mais chamava a atenção era
a mudança de gravadora. O Hüsker Dü era considerado
a “próxima grande coisa” e iriam deixar a independente
SST para abraçarem uma major. Boato ou não?
“Bem, eles nos procuraram,
realmente, e nos ofereceram um contrato. É algo tentador,
pois não temos nenhuma obrigação formal com
a SST. As gravadoras independentes não possuem uma grande
estrutura para promover seus artistas. Não que elas trabalhem
pouco, pois, de fato, trabalham pesado. Porém, elas vivem
à margem das grandes companhias. É apenas uma questão
de ter dinheiro ou não e eu prefiro ter alguma grana sobrando
do que ficar sem nenhum.”
Bob
afirmava que se a mudança ocorresse seria apenas uma etapa
que eles deveriam seguir e considerá-la uma evolução
natural. “Nós temos muita amizade com o pessoal da
SST, que fizeram um grande trabalho conosco. Eu não sei
o motivo de tanta polêmica. Se mudarmos para um outro selo
é porque estamos chamando mais atenção e
da mesma maneira que não queremos mais compor canções
thrash, já que evoluímos tecnicamente,
também podemos querer mudar de casa, sem que isso nos afete
musicalmente. Alguns temem que poderemos deixar nosso som mais
comercial, o que é uma besteira.”
E o que muitos temiam,
aconteceu: o grupo entra em 1986 gravando pela Warner e lá
produzem outra obra-prima: Candy Apple Grey.
O
disco abre com uma paulada, “Crystal” e traz alguns
dos maiores clássicos do grupo, como “Sorry Somehow”
(uma das canções mais amargas já escritas
sobre rompimento amoroso), “Don’t Want to Know If
You Are Lonely”. A revista Sounds o chamou de Revolver,
do Hüsker Dü, uma metáfora mais do que feliz.
E há ainda momentos calmos, com violões, mas nada
com que os fãs pudessem se descabelar e gritar “meu
Deus, eles parecem o Culture Club!”, pois o grupo não
faria isso consigo próprio...
E o mais importante de
tudo é que o espírito permaneceu intacto. Em uma
entrevista promocional, Bob explicou a diferença entre
o Hüsker e os demais grupos do selo Warner. “Ao contrário
dos outros grupos, nós continuamos gerenciando nossas carreiras.
Nós fomos os produtores do disco, nós agendamos
nossos shows, dirigimos nossa van para as apresentações
e organizamos as entrevistas que daremos. É uma questão
de atitude, pois achamos que devemos responder pelos nossos atos,
corretos ou não. Procuramos não ter um intermediário
em nossas negociações e penso que a Warner gosta
de nossa maneira de trabalhar. Não ficamos aborrecendo
ninguém por qualquer porcaria.”
Bob
explica que essa independência foi até fácil
de ser obtida. “Tudo que queremos é paz para podermos
trabalhar. Eles prensam o disco, distribuem como preferirem e
negociamos os outros pormenores. E nós pedimos muito pouco
em troca. Tudo tem corrido bem nesse primeiro ano.”
Quando saíram da SST, concordaram em deixar com a antiga
gravadora a posse dos antigos discos. “O pessoal da SST
continua sendo amigo da gente. São pessoas bacanas e não
houve mágoa ou ressentimento de nenhuma parte. Eles entenderam
que a nossa saída foi apenas uma jogada comercial. E nossos
fãs não ficaram ressentidos. A prova disso foi nosso
show com o Black Flag em Nova York, onde fomos muito bem recebidos”,
contou Greg Norton, que ainda revelou que mesmo mudando para a
Warner não tiveram um orçamento maior para gravarem
Candy Apple Grey: “o disco foi gravado
antes de assinarmos com eles e demoramos um pouco mais porque
Bob queria ter mais cuidado com a produção. E as
canções acústicas desse disco não
podem ser chamadas de novidade, pois Bob compõe ao violão.
Aliás, muitas pessoas ainda achavam que o disco tinha saído
pela SST, e só quando nós dissemos que estávamos
na Warner, é que comentaram algo.”
E mantendo seu ritmo de
apresentações e composições, em janeiro
de 1987 sai o derradeiro disco de estúdio do trio: Warehouse:
Songs and Stories. Considerá-lo a obra-prima do
grupo é complicado devido aos vários grandes lançamentos,
mas não há como negar a evolução técnica
nesse novo álbum duplo. Das 20 novas músicas, 12
eram assinadas por Bob e 8 por Grant, que foram novamente os produtores.
O disco havia sido gravado entre agosto e novembro de 1986.
Logo no primeiro meses
de lançamento, dois singles são extraídos
do álbum: “Could You Be the One?” e “Ice
Cold Ice”. Na verdade, o disco poderia ter facilmente cinco
ou seis singles de sucesso, se a gravadora quisesse, embora isso
não fizesse a menor diferença para Bob Mould. “Se
você está preocupado com vendagens, você precisa
se preocupar com a venda dos compactos; mas se você está
preocupado em passar uma mensagem, então deve se preocupar
com a venda do disco. Eu estou preocupado em passar uma mensagem”,
disse Bob.
Uma das qualidades do disco
é o perfeito casamento entre a canção e a
fúria do passado. A Gibson Flying V de Bob pula como o
instrumento de frente e seus vocais parecem muito mais poderosos
do que os de Grant e algumas de suas melhores canções
estão logo no primeiro lado do disco, como “These
Important Years”, “Stading In The Rain” e “Ice
Cold Ice”. Grant respondeu com “Charity, Chastity,
Prudence and Hope” e “You’re a Soldier”
Ouvindo as 20 canções, fica a impressão que
os dois disputam uma luta particular de quem fazia uma canção
melhor.
E
essa disputa acabou desmoronando o grupo, justamente quando davam
um salto qualitativo gigante em termos de acabamento e produção.
Há alguns anos Bob e Grant já não se entediam
muito bem. Quando Grant Hart se tornou um viciado em heroína,
seu comportamento ficou muito selvagem e a relação
entre os dois acabou. Grant admitia o vício de heroína,
mas chamava Bob de ditador e egoísta.
Bob lembra que o ambiente
ficou tão insuportável, que durante o outono de
1987 resolveu pular da fora, mas só comunicou ao grupo
e à gravadora ao final da excursão promocional.
Em janeiro de 1988, ele avisou os dois antigos colegas que sairia
do Hüsker Dü. Nessa época, eles estavam reunidos
em Minneapolis para iniciar a gravação do terceiro
disco pela Warner, que começava a pressioná-los,
querendo impor um produtor para a banda. Tanta tensão acabou
fazendo Bob pular fora.
Com o final do grupo, Bob
e Grant resolveram seguir suas vidas. Grant lançou um EP
chamado 2541 pela SST em outubro de 1988 e Bob
estreou em carreira solo com Workbook pela Virgin.
Os dois ainda gravaram por novas bandas – Grant com o Nova
Mob e Bob com o Sugar. Apenas Greg desistiu da vida de músico
e virou um chef de cozinha, após tocar descompromissadamente
em um grupo chamado Grey Area.
Em
1994 saiu um disco pela Warner, que a banda devia em contrato.
The Living End foi gravado em outubro de 1987
e mostra toda a energia em cima de um palco. Como aperitivo, o
grupo fecha com “Sheena Is a Punk Rocker”, dos Ramones.
Inexplicavelmente, esse disco é o único do grupo
que se encontra fora de catálogo.
Quando a SST relançou
os discos do grupo em CD a partir de 1990, ela decidiu juntar
dois singles em um único CD por ocuparem pouco espaço.
Sendo assim, Eight Miles High e Makes
No Sense At All saíram com uma foto da banda ao
fundo e a reprodução dos compactos, em tamanho menor.
No
Brasil, os discos do trio são difíceis de encontrar.
No entanto, alguns trabalhos do Sugar, banda de Bob podem ser
achadas em sebos da vida. Não é o ideal, mas já
é uma grande pedida.
Deixo vocês com três
letras desse clássico dos anos e a discografia da banda.
Um abraço e até a próxima coluna.
Standing In The
Rain
Looking outside
my window
And all I see is grey
I'm watching the clouds roll by every day
And we make a reservation
You say you'll be on time
I say, "I might be a little late"
Well, I pull it
together and brush my teeth
Comb my hair
I stop to think and I can see you there
I think of the times you've waited
Just for me to care
I care about you
Checking the clock
inside
The room we call our own
I see that I'm late, I should get going
Hop on a local transit
Spending all my change
And I can still hear the telephone
I wanna go back,
but I'm halfway to
The place where we will meet
And I'm half dead on my feet
And once I get there, I see
Everything's the same
Here comes the rain
You left me standing
I should have guessed
that you'd stand me up
Why did I even go, now
And I guess it goes to show
The snow may well thaw out, but it
Goes right down the drain
You left me
You left me
You left me
You left me
You left me standing in the rain
Ice Cold Ice
Barren lands and
barren minds
In another place and time
I feel I've never known myself
Frozen in the sand again
See the blank expressions
waiting for progression
They're standing still in place and time
And no one's moving, they're only
Standing still in ice cold ice cold ice
All machines and
all are one
Catching up on what's been done
Stealing glimpses from the past
These impressions always last
Never penetrating,
always contemplating
We sit and count the blessings but we're blessed by icons
No one else could
Trust in ice cold ice cold ice cold ice
We'll stay together
till the end
Thinking you might be a friend
We sit and pray
together that they might change the weather
My love for you will never die
If I sound distant, that's because
You shouldn't see me crying ice cold ice
Could You Be The One?
Could you be the
one they talk about?
Hiding inside, behind another door?
Is it only happiness you want?
Does wanting a feeling matter any more?
It doesn't mean
that much to me
Sometimes I don't mean that much to you
And I don't even know what I'm hiding for
And I don't even
know what I'm crying for
Don't even know what I'm hiding for
Could you be the
one they talk about?
Life is a game that only you can make
Maybe I'm about to throw it out
I've given it all, that's all I can take
Could you be the
one
Could you be the one
Could you be the one that's hanging all around
Don't even know
what I'm hiding for
Don't even know what I'm crying for
Don't even know, could you be the only
Broken hearted one
Discografia
Statues / Amusement (single,
1981)
Land Speed Record (1982)
Everything Falls Apart (1983)
Metal Circus (EP, 1983)
Eight Miles High (single, 1984)
Zen Arcade (1984)
New Day Rising (1985)
Makes No Sense At All (single, 1985)
Flip Your Wig (1985)
Candy Apple Grey (1986)
Warehouse: Songs and Stories (1987)
The Living End (1994)
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