O disco que
contém "Because the Night", o maior hit de Patti
composto junto com Bruce Springsteen. O disco que lhe deu fama
acima do esperado ou sonhado. Easter fez de Patti uma artista
comercialmente bem-sucedida e a levou para uma outra esfera. Mas
a gestação do disco não foi fácil,
especialmente por causa das seqüelas do acidente de Tampa.
O
ano de 1977 não foi fácil para Patti Smith. O acidente
lhe deixou com seríssimos problemas. Por muito tempo ela
foi obrigada a usar um colar de gesso no pescoço para curar
a vétebra quebrada e passar por longas e dolorosas sessões
de fisioterapia.
Durante a gravação
de Radio Ethiopia Patti e banda travaram amizade
com um engenheiro de som do Record Plant Studios de nome Jimmy
Iovine.
Ele começou a rondar
o grupo procurando um hit em potencial para Patti cantar. Segundo
Lenny Kaye, Jimmy ficava ouvindo o que eles gravavam e, ansioso,
prestava atenção em tudo.
Enquanto nisso, no estúdio
ao lado, Bruce Springsteen estava gravando Darkness on
the Edge of Town e Jimmy pensava em juntar os dois. Ele
havia trabalhado com The Boss no LP Born to Run.
Bruce
também começou a ficar intrigado com Patti. Os dois
haviam sido criados em New Jersey e começaram a conversar
e a se aproximar. Patti acabou gostando de Bruce e fizeram amizade.
Aos poucos, Bruce foi oferecendo
algumas músicas para Patti gravar, compondo no estilo do
Patti Smith Group, mas sem sucesso, já que não conseguia
ter uma perspectiva feminina.
Porém,
entre elas, estava uma chamada "Because the Night",
em um ritmo latino, mas que não se encaixava no contexto
de seu disco.
Patti fez várias
alterações na letra mudando o contexto masculino
para o feminino e mexeu também na melodia, deixando-a bem
mais rock.
Bruce gostou da versão
e os dois chegaram a subir no palco do CBGB, em 30 de dezembro
de 1977, como Bruce sendo convidado da cantora.
Dessa maneira, nascia a
mais famosa canção do catálogo de Patti Smith:
"Because the Night".
A essa altura estava claro
que Jimmy Iovine seria o produtor, o que foi muito importante,
já que possuía uma boa bagagem e competência
para opinar em arranjos.
Assim,
nascia o novo álbum, batizado de Easter,
para alívios dos fãs e após 18 meses do disco
anterior.
No trabalho há uma
baixa considerável, o pianista Richard Sohl. Como estava
seriamente doente, Sohl foi aconselhado a se tratar, entrando,
provisoriamente Bruce Brody.
A foto da capa de Lynn
Goldsmith mostra uma Patti olhando para a axila não raspada
e com uma camiseta sem sutiã realçando seus seios.
Em certo sentido, Easter
era um disco igual aos outros, com peças mais experimentais
e outras mais acessíveis, como é o caso de "Because
the Night".
O disco continha as seguintes
faixas:
Lado 1
1. "Till Victory"
– 2:45
2. "Space Monkey" (Smith, Ivan Kral, Tom Verlaine) –
4:04
3. "Because the Night" (Smith, Bruce Springsteen) –
3:32
4. "Ghost Dance" – 4:40
5. "Babelogue" (Smith) – 1:25
6. "Rock N Roll Nigger" – 3:13
Lado 2
1. "Privilege (Set
Me Free)" (Mel London, Mike Leander, Psalm 23) – 3:27
2. "We Three" (Smith) – 4:19
3. "25th Floor" (Smith, Kral) – 4:01
4. "High on Rebellion" (Smith) – 2:37
5. "Easter" (Smith, Jay Dee Daugherty) – 6:15
Patti estava fascinada
pelo conceito Rock N Roll Nigger que havia formalizado.
Segundo ela, Mick Jagger era uma perfeita amostra disso, não
por ser negro (óbvio!), mas por ser um artista-mutante
que estava acima de qualquer gênero.
Em
uma entrevista para a revista Rolling Stone,
uma matéria assinada por Charles M. Young, Patti discorre
sobre sua filosofia.
Quando o repórter
perguntou que não entendia porque Mick Jagger seria um
nigger já que não havia sofrido como os
habitantes do Harlem, Patti explicou: "o sofrimento não
te fazer negro. Veja, eu também fui pobre quando criança.
Estilisticamente, acredito que ele se encaixa. Eu acho que Mick
sofreu muito. Ele tem um grande coração, sabe, mesmo
nos momentos mais cínicos, um grande amor pela sua prole.
Ele tem muita alma. Veja, bem, eu não entendo muito sobre
isso. Você acha, por acaso que os negros são melhores
que os brancos? Eu fui criado junto aos negros. É como,
eu posso descer a rua e dizer "Hey nigger." Eu não
tenho um super-respeito ou medo, ou qualquer coisa do tipo. Quando
faço declarações como essa, gostaria que
elas não fossem analisadas, porque elas parecem ser algo
sem humor e eu tenho senso de humor, e isso é uma coisa
que a maioria das pessoas ignoram quando chegam até mim.
O que quero dizer é que falo muita coisa séria,
mas algumas deveriam ser apenas divertidas."
Patti estava tão
absorta com a idéia que, segundo o autor da matéria,
ela havia conversado com o motorista da limusine que a levava
pro show, um negro de nome Gary, sobre o sonho de fazer um show
no lendário Teatro Apollo, no Harlem, e como sonhava em
arrastar os Rolling Stones com ela para dividirem o palco.
No
mesmo mês em que o LP é editado, sai o compacto Because
the Night. A canção chegou à 13ª
posição nos EUA e em 5º no Reino Unido, de
longe sua melhor posição.
Ao longo dos anos, Patti
desenvolveria sentimentos controversos sobre a canção,
pelo fato de muitos a verem como uma composição
de Bruce doada a ela, o que não era verdade. Lenny Kaye
lembra o sucesso que fez. "Quando o disco saiu, mandaram-no
primeiro para WNEW, e Vin Scelsa tocou-o três vezes seguidas.
Era no tempo em que ainda podia se fazer isso no rádio.
Realmente nos empenhamos em fazer aquele disco; tínhamos
ficado fora do circuito por um ano, queríamos fazer uma
declaração tão clara quanto possível,
não queríamos ser mal-entendidos." (N
do E: citação tirada do livro Please Kill
Me.)
O título do disco
fazia referência à Páscoa e "Privilege
(Set Me Free)" é quase uma oração inspiradas
no Salmo 23. Na contra-capa há uma citação
de uma Epístola em que diz "eu tive uma boa luta e
consegui vencer minha maldição." Em "Babelogue",
que desagua em "Rock N Roll Nigger", Patti abra declamando:
"eu não fodo com o passado, mas fodo um montão
com o futuro!"
Ao
contrário de Radio Ethiopia, Easter
teve aclamação geral da crítica, fato que
deixou Patti feliz. O sucesso, também a fez feliz, como
relatou na mesma matéria da Rolling Stone: "eu
achei fantástico (ter sucesso). Paradas são paradas.
O principal ponto de fazer um trabalho é conseguir se comunicar,
seja êxtase ou alegria. O álbum é um grande
sucesso também. E no disco eu falo 'foda' 'mijar', 'merda',
'erva' 'negro'. Veja, é muito mais ousado, muito mais perverso
e muito corrupto do que Radio Ethiopia. Estamos
nos comunicando como muitas pessoas e acredito que os outros conseguem
acreditar em nós. Não acredito, não sei...
que dizer, não somos impecáveis. Somos bem o oposto
disso."
Easter
levaria Patti Smith Group aos ginásios pelo mundo, criando
uma histeria que a faria dar uma parada ao final de 1979. Mas
isso é papo para outro dia. Um abraço e até
a próxima coluna.
Discografia
Horses (1975)
Radio Ethiopia (1976)
Easter (1978)
Wave (1979)
Dream of Life (1988)
Gone Again (1996)
The Patti Smith Masters: The Collective
Peace and Noise (1997)
Gung Ho (2000)
Land 1975-2002 (2002)
Trampin’ (2004)
Twelve (2007)
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