Essa coluna abordará
o período de 1985 até 1989, quando morre o baterista
Pete de Freitas. Durante esses quatro anos, o Echo soltou apenas
um disco de estúdio intitulado apenas Echo and the Bunnymen
e que marca a última vez em que o quarteto original gravou
um LP. Nessa coluna falarei também do lendário disco
pirata On Strike, no qual tenho uma cópia. Ironicamente,
o Echo acabou quando se preparava para conquistar o mercado norte-americano,
embora a banda vivesse um período extremamente conturbado.
A
banda queria, mas não tirou um ano de descanso como desejava.
O tal descanso foi apenas dos estúdios, porque continuaram
tocando ao vivo.
Foi nesse período
que começaram a tocar várias covers de outros artistas:
Doors, Velvet Underground, Modern Lovers, Talking Heads, Wilson
Pickett, Television, Rolling Stones... Seriam os momentos finais
do Echo, segundo palavras do próprio Ian McCulloch.
Os maiores momentos aconteceram
na Escandinávia, quando tocaram na Dinamarca e na Suécia.
Ali, sem bandas suportes, a banda fazia dois shows - o primeiro
só de covers e o segundo só com músicas próprias.
Um exemplo é o set-list do dia 25 de abril, em
Gotemburgo, na Suécia...
(primeira entrada)
She Cracked
There She Goes Again
The Big Country
Friction
In the Midnight Hour
It's All Over Now, Baby Blue
Soul Kitchen
Action Woman
Paint It Black
Run, Run, Run
(segunda entrada)
The Back of Love
All That Jazz
My Kingdom
Heads Will Roll
Villiers Terrace
Angels and Devils
The Killing Moon
The Cutter
Rescue
A Promise
Thorn of Crowns
Crocodiles
Take It as It Comes
No Dark Things
E
foi na Suécia que um programa de rádio começou
a apresentar essas músicas. E aí nasceu o melhor
disco pirata dos anos 80, On Strike.
A capa é horrorosa,
amarela, mas o que sai de dentro dele é algo espetacular.
Com uma belíssima
qualidade de som, o grupo apresenta "It's All OVer Now, Baby
Blue" (Bob Dylan); "She Craked" (Modern Lovers);
"Friction" (Television); "Paint It Black"
(Rolling Stones); "In The Midnight Hour" (Wilson Pickett);
"Action Woman" (The Litter); "Soul Kitchen (The
Doors); "Run Run Run" e "There "She Goes Again"
(ambas do Velvet); "The Big Country" (Talking Heads);
além de uma belíssima versão de "Thorn
of Crowns" com "The End" (Doors) no meio.
Pelos set-lists
apurados, o mais provável é que seja o show de Estocolmo,
em 29 de abril de 1985, apesar de na contra-capa constar "gravado
em qualquer lugar, em qualquer data". Algumas delas constam
na caixa Crystal Days 1979-1999. Esse bootleg
é raríssimo e tive a sorte de conseguir o meu por
um preço irrisório e me arrependido de não
ter comprado a outra cópia que existia na loja.
A
banda ainda passou alguns meses tocando e, em novembro, apareceu
com duas surpresas para seus fãs. No dia 14 sai um novo
single, Bring On The Dacing Horses.
Originalmente, a música
se chamava "Jimmy Brown" e o grupo sonhava em que ela
chegasse ao topo da parada.
Acabou apenas em 21º
lugar. O lado B trazia "Over Your Shoulder" e segundo
Ian foi uma brincadeira do tipo "vamos mostrar ao The Jesus
and Mary Chain como se faz direito", com seus vocais soterrados
e cheia de feedback.
No
dia seguinte é lançada a coletânea Songs
to Learn and Sing, talvez a melhor compilação
da década de 80. O disco traz todos os grandes sucessos
do grupo, além da própria "Bring On The Dacing
Horses."
Está tudo aí:
"Rescue"; "The Puppet"; "Do It Clean";
"The Killing Moon", e ainda com um belo atrativo: as
letras! Um disco altamente recomendável.
Mas o final de 1985 e começo
de 1986 marca um drama para o grupo, afinal o baterista Pete de
Freitas havia sumido, quando a banda iniciaria uma nova turnê
pelos Estados Unidos. A sensacionalista imprensa inglesa noticiou
que ele havia deixado a banda para se juntar à seita Children
of God e que todos teriam viajado para Nova York onde iriam pintar
o símbolo de paz e amor nas torres gêmeas do World
Trade Center!
Aos
fatos: Pete realmente viajou para os Estados Unidos, mas com os
amigos de uma nova banda chamada Sex Gods, onde ele era o guitarrista!
Exausto de seu grupo original
e movido por muita bebida e drogas, Pete foi com um bando de amigos
de Liverpool para os Estados Unidos, onde ficavam em orgias, bebendo,
gravando e filmando. O final foi devastador. Bancando tudo, o
baterista dilapidou sua fortuna em questão de semanas e
foi abandonado por seus novos companheiros. Foi preciso que pessoas
do staff do Echo fossem socorrê-lo.
O sumiço obrigou
a banda a excursionar provisoriamente com o baterista Blair Cunningham,
do Haircut 100 e acabou abrindo uma enorme ferida entre Pete e
os demais companheiros. Ferida que jamais seria fechada.
Quando Pete voltou, a tensão
ainda era alta, porque o baterista continuava dedicando muito
tempo às demos de sua nova banda. Ele já havia participado
de um disco do grupo Colourfield, quando estes lançaram
o disco Virgins and Philistines, em abril de
1985. Pete tocou nas faixas "Take" e "Cruel Circus".
A volta de Pete se deu
à amizade dos demais por ele e também porque viram
que sem seu baterista, nada funcionava direito. Os shows com Blair
foram fracos, apesar da competência do músico.
Em junho daquele ano o
trio entrou em estúdios com Gil Norton para gravar umas
novas demos. Nessas sessões possivelmente tocaram Stephen
Morris (New Order) ou David Palmer. Produziram várias canções
como: "Lover I Love You"; 'Satisfaction" (nada
a ver com a dos Stones", "New Direction", "All
Your Mind" (que tinha um som propositadamente mais New Order
e essa, com certeza, teve Morris).
Já
com Pete de Freitas, o grupo começou a gravar no segundo
semestre de 1986 um novo disco. Foram os dias mais tensos jpa
vividos pela banda.
O disco começou
a ser produzido em Liverpool e continuou na Bélgica, Alemanha,
Londres e nunca terminava. A produção estava a cargo
de Laurie Latham, produtor de "Bring On The Dancing Horses".
O único momento
de alegria foi quando Ray Manzarek apareceu no estúdio.
Os Bunnymen havia sido convidados pelo diretor Joel Schumacher
para participarem da trilha-sonora do filme The Lost Boys
e eles acabaram gravando uma versão do clássico
dos Doors, "People Are Strange". Ray também participaria
das gravações de "Bedbugs and Ballyhoo".
As gravações
continuaram e o grupo não conseguia mais olhar para as
músicas. Ian detesta o disco e lembra que algumas mixagens
foram aprovadas pelo telefone.
"Tudo
estava errado. 'New Direction' deveria ter sido rebatizada de
'No Direction' porque no final tinha sintetizadores e samplers.
O disco durou uma eternidade
e o produtor estragou algumas boas músicas. 'Lips Like
Sugar' poderia ter sido um clássico nosso se Laurie tivesse
mantido o arranjo original."
Em junho de 1987 sai o
primeiro compacto do novo trabalho, The Game,
que conseguiu apenas o 28º posto na parada e mostrava um
Echo diferente, com um som mais direto, cru, sem a sedução
de antes. Ian também cantava sem a dramaticidade de antes.
O descontentamento entre eles era nítido.
No
mês seguinte sai o novo disco batizado apenas de Echo &
The Bunnymen. Era latente a tristeza geral, a começar pela
foto da capa, com o ar de tédio de Ian e Pete, de perfil.
Curiosamente o disco teve
ótimas vendagens iniciais, chegando ao 4º posto no
Reino Unido e na 51ª posição na América.
E "Bedbugs and Ballyhoo" e "People Are Strange"
escancaram a porta do mercado norte-americano.
No dia do lançamento,
6 de julho, a banda teve uma idéia que acabou sendo totalmente
infeliz.
O grupo quis subir ao teto
da loja HMV, em Londres, para tocar quatro músicas. Encerraram
a apresentação com "Twist and Shout" para
evocar os Beatles, que, em 1969, subiram no telhado da Apple e
deram um mini-show. Só que, meses antes, o tão odiado
U2 tivera a mesma idéia e filmou o clip de "Where
The Streets Have No Name", nas ruas de Los Angeles da mesma
maneira.
A
banda iniciou então uma imensa turnê mundial começando
pelos shows do Brasil, onde tiveram uma recepção
fanática e surpreendente, pois não imaginavam terem
tantos fãs.
Ian conta que foram apresentações
mágicas no Rio de Janeiro, em Porto Alegre e, em São
Paulo, e um dos últimos momentos mágicos do grupo,
especialmente a última noite.
A reação
da platéia, particularmente, o deixou entusiasmado. Segundo
o cantor, em Porto Alegre foi "selvagem", com a platéia
quebrando cadeiras e pulando o tempo todo.
Em julho e agosto o grupo
lança mais dois compactos: Bedbugs and Ballyhoo
e Lips Like Sugar.
O grupo seguiu então
1987 e 1988 com suas apresentações e cheios de incertezas.
Embora fossem cada vez mais populares na América e a gravadora
fizesse pressão para um novo disco, apostando que venderiam
muito mais, o grupo não conseguia mais suportar a idéia
de novas de gravar novas músicas. O grupo chegou a viajar
no segundo semestre de 1987 ao lado do Gene Loves Gezebel e do
New Order.
O fim aconteceu em 1988.
O grupo estava realizando shows no Japão quando chegou
a notícia de que o pai de Ian McCulloch havia sofrido um
enfarte, no mesmo dia do show em Fukuoka, no dia 25 de abril.
Todos
queriam dar a notícia a Ian após a apresentação,
mas Les Pattinson foi decente o suficiente para avisá-lo
antes de pisarem no palco.
O show, no entanto, foi
realizado, pois não havia vôo disponível para
aquele horário. Ian partiu tão logo acabou a apresentação,
partiu para Liverpool, mas seu pai morreu 20 minutos antes dele
pousar.
Ian resolveu deixar a banda
no dia seguinte, mas comunicou aos demais somente em outubro.
Não havia mais clima
para continuar, a insatisfação era grande, embora
tivessem uma esperança de que tudo poderia ser resolvido.
Um último lançamento
oficial acabou sendo o EP New Live And Rare,
que saiu no Japão. Nele constavam as seguintes canções:
"People Are Strange"; "The Killing Moon (All Night
Version)"; "All You Need Is Love"; "Paint
It Black"; "Run, Run, Run"; "Friction"
e "Do It Clean".
"All
You Need Is Love" é do EP Life At Brian's
- Lean And Hungry. As covers são da mesma safra
da Escócia e haviam aparecido pela primeira vez no lado
B do single de 12 polegadas de Bedbugs and Ballyhoo.
"Do It Clean" era uma nova versão do show do
Royal Albert Hall, em 1983.
Mas, o fim mesmo, aconteceu
em 14 de junho de 1989 quando Pete de Freitas morreu em um acidente
de moto. Sua morte foi um baque tremendo e todos ficaram arrasados.
Pete tinha apenas 27 anos.
O Echo até faria
uma volta em 1990 sem Ian e Pete e voltaria, pela terceira vez,
no meio da década de 90. Mas isso é papo para outro
dia.
Um abraço e até
a próxima coluna.
Discografia
Crocodiles (1980)
Shine's So Hard (1981)
Heaven Up Here (1981)
Porcupíne (1983)
Ocean Rain (1984)
Songs to Learn and Sing (1985)
Echo & The Bunnymen (1987)
Reverberation (1990)
BBC Radio 1 In Concert (1992)
Evergreen (1997)
Ballyhoo (1997)
What Are You Going To Do With Your Life? (1999)
Flowers (2001)
Crystal Days 1979-1999 (2001)
Live In Liverpool (2002)
Siberia (2005)
Fillmore - San Francisco Ca 12/5/05 (2006)
House of Blues - West Hollywood Ca 12/6/05 (2006)
The Very Best of Echo & the Bunnymen - More Songs To Learn
& Sing (2006)
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