366 - Edgard Scandurra - Amigos Invisíveis

Edgard já era um músico conhecido e respeitado quando resolveu seguir os passos do ídolo Pete Townshend e começar uma carreira-solo paralela a do Ira! E, assim como Pete, lançou um exepcional disco do estréia, mostrando que tinha muito talento e que poderia viver perfeitamente sem o grupo, no futuro. Amigos Invisíveis é a prova de que Edgard era um dos nomes mais importantes do pop e rock brasileiro dos anos 80 e 90.


Após a fraca repercussão do excelente e ousado Psicoacústica, em 1988, Edgard se trancou novamente no estúdio Nas Nuvens, no Rio de Janeiro, com os engenheiros Paulo Junqueiro e Mauro Bianchi para gravar o primeiro disco-solo. Edgard tinha reservado algumas composições que, segundo ele, não casaria muito com o Ira!

Nasi resumiu de maneira brilhante a diferença entre os dois primeiros álbuns do Ira! e o período de Psicoacústica. Segundo ele, os integrantes quase choravam ao ler as letras dos dois primeiros discos feitas por Scandurra, por serem hinos à juventude.

O terceiro, segundo ele, já trazia uma banda mais madura, mais consciente da vida adulta, com outros problemas e as letras refletiam as angústias da época.

Todavia, Edgard continuava a compor "hinos", especialmente ao filho recém-nascido Daniel, que foi homenageado com uma foto na contra-capa e uma faixa "Bem Vindo Daniel".

Isso, sem falar, que mesmo antes de nascer, já era citado no disco Vivendo e Não Aprendendo, do Ira!, de 1986, nas faixas "Casa de Papel", e na letra de "Dias de Luta" ("se meu filho nem nasceu / eu ainda sou o filho...")

Edgard tinha se inspirado no eterno líder do The Who, autor de vários discos-solos nas décadas de 70 e 80 enquanto o The Who era uma das grandes estrelas do planeta.

Pete tinha optado por lançar, nesses álbuns, canções bem mais pessoais do que eram destinadas à banda.

Segundo Roger Daltrey, apesar de excelentes, elas eram tão íntimas que se sentia desconfortável em cantá-las. Assim, Pete brindou os fãs com álbuns personalíssimos.

E, de certa forma, Edgard se inspirou na idéia, indo mais longe: com exceção do teclado em "Abraços e Brigas", cortesia da esposa Taciana Barros, Edgard tocou todos os instrumentos.

Assim, Edgar (guitarra solo, guitarras base, guitarra 12 cordas, violão espanhol, contra-baixo Hofner, órgão elétrico, sintetizadores, violino pícolo, metalofone, voz, vocais, percussão e bateria) se empenhou de corpo e alma ao projeto.

Batizado de Amigos Invisíveis, Edgard disseca a paixão pelas histórias em quadrinhos, relacionamento, fala do rebento, faz um releitura do clássico do Ira! ("Gritos na Multidão") e outra do Who ("Our Love Was", a única que teve Bianchi como engenheiro).

Aliás, em "Our Love Was", Edgard coloca trechos do início de Quadrophenia, primeiro disco que ouviu da banda, aos 13 anos, e grande paixão. A faixa originalmente está no disco The Who Sell Out, de 1967.

Mais pessoal, impossível.

O disco abre com a instrumental "Estamos Nesse Trem".

Segue por "Amor em B.D", até chegar à empolgante "Minha Mente Ainda É A Mesma": ("Ainda me lembro dos meus tempos de esperança / Daquelas noites que passava sem dormir / Poder chorar, gritar, cuspir na sua comida / O tempo já mudou..."). Edgard mostra um excelente apuro como produtor na faixa, criando um clima positivo, emotivo e tocando como poucas vezes fizera com o Ira!, desnudando-se.

A próxima faixa recebeu uma releitura do Ira! no disco Isso É Amor (1999), "Abraços e Brigas". Escrita com a esposa Taciana Barros, traz uma versão mais intimista do que no álbum com seu ex-grupo.

Edgard faz uma versão quase acústica - algo impensável - para a raivosa e visceral "Gritos na Multidão" - e abusa das faixas instrumentais: além de "Estamos Nesse Trem", há "Quero Voltar Pra Casa", "Amigos Invisíveis", "1978" e "Bem Vindo Daniel".

Edgard não só queria voltar pra casa, como estava em casa, falando de seus sonhos e esperanças.

O álbum trazia as seguintes faixas:

Lado A

1. Estamos Nesse Trem
2. Amor em B.D.
3. Minha Mente Ainda é a Mesma
4. Abraços e Brigas
5. Gritos na Multidão
6. Quero Voltar Pra Casa
7
. Our Love Was

Lado B

1. Amigos Invisíveis
2. 1978
3. Culto de Amor
4. Bem Vindo Daniel
5. Vou Me Entregar Como Nunca

Ao ser lançado em Cd, em 2000, ganhou mais duas faixas:

13. Minha Mente Ainda é a Mesma (monitor mix)
14. Estamos Nesse Trem (monitor mix)

O disco teve excelente repercussão junto à crítica, apesar das vendagens poucas expressivas. O problema, porém, veio depois. Após ficar meses cuidando do disco, Edgard teve que voltar às pressas com a banda para gravar um novo LP.

Exausto da maratona, por ter feito alguns shows promocionais e sem tempo para escrever novas músicas, é lançado Clandestino, disco que deixa uma sensação de ter sido feito de forma apressada e sem muito esmero.

Apesar do sucesso radiofônico, "Tarde Vazia", Clandestino teve que utilizar várias canções antigas de Edgard ("Nasci Em 62", "O Dia, A Semana, O Mês) para pode ser editado. Se isso foi importante para "esvaziar o baú", nas palavras do próprio Edgard, deixou fãs e críticas insatisfeitos, e criando desconforto interno.

O disco trazia as seguintes faixas:

Lado A

1. Melissa
2. Tarde Vazia
3. Efeito Bumerangue
4. Boneca de Cera
5. Cabeças Quentes

Lado B

1. O Dia, A Semana, O Mês
2. Patroa
3. Consciência Limpa
4. Clandestino
5. Nasci Em 62

Edgard só voltaria a carreira-solo em 1996, com Benzina, um disco mais eletrônico, estilo que abraçou até hoje.

Apesar de ser pouco lembrado, Amigos Invisíveis é um dos tesouros perdidos da década de 80. Pena que já está fora de catálogo e muito dificilmente de ser achado. A solução é apelar para alguns blogs especializados em anos 80 e curtir essa obra-prima.

Um abraço e até a próxima coluna.

Discografia

Amigos Invisíveis (1989)
Benzina (1996)
Dream Pop (2003)
Benzina Remixes (2004)
Amor Incondicional (2007)

 

 




 


 

Colunas