05 - Fabio Golfetti - entrevista

Se você é fã do Violeta de Outono e se sente falta de notícias da banda, aqui vão três de uma tacada só: o grupo está gravando disco novo. O baterista é novamente Claudio Souza, membro original, que havia saído. E estão sendo produzidos por Sérgio Dias Baptista. Estão contentes?

Pois eles não estão. Querem mais. Fazer um puta disco, cheio de grandes canções e com um acabamento técnico que até hoje não tiveram. Para isso, pegaram todo o material que gravaram com Gregor Izidro, dono das baquetas após a saída de Claudio e estão novamente trabalhando todo o repertório. O trabalho era para ter saído no começo do ano, mas Fabio Golfetti, estava insatisfeito com a qualidade técnica da gravação e achava que o grupo podia melhorar. Com a volta de Claudio, resolveram começar tudo de novo.

Mas se está salivando, vem aqui uma ducha de água meio morna, meio fria. Para custear as gravações, o grupo ainda está tentando viabilizar financeiramente o projeto até para manter o ex-Mutantes no comando. Fabio conta que seu ídolo se propôs a produzir ao ouvir algumas faixas novas. Com uma disposição de fazer inveja a muito garoto, Fabio deu uma entrevista de uma forma inusitada: numa terça-feira noite adentro no chatroom do site da Voiceprint. Veja a íntegra da conversa...


Pergunta - Fabio, fale sobre a volta do Claudio. Como se processou, como ficaram as músicas com a mudança de baterista?
Fabio Golfetti -
Bem, a volta do Claudio está da seguinte maneira: recentemente temos nos falado pela nossa amizade antiga e ele se demonstrou muito animado em retomar os estudos de bateria e muito animado também depois da vinda do Bill Bruford.

Pergunta - O que mudou? Gregor tinha uma batida mais pesada...
Fabio Golfetti -
Deixe eu explicar o que aconteceu: Nós mixamos as gravações feitas com o Gregor, porém, ficou uma dúvida com relação à qualidade técnica do material. Gostamos muito do Gregor, ele é imbatível ao vivo, mas ficou sacrificado na gravação, porque fizemos toda a tomada de bateria das músicas em duas sessões. A diferença entre o Gregor e o Claudio é que o Claudio tem 20 anos a mais e a mesma formação musical minha e do Angelo (Pastorello, baixista). O Gregor toca com muita energia, o que nos shows levava a banda para cima.

Pergunta - E por que ele saiu?
Fabio Golfetti -
O Gregor não saiu, o envolvimento dele está mais para shows. Tem um, nós ensaiamos e tocamos, mas acho que quando foi para conceituar um novo trabalho, me pareceu talvez que ele não tenha demonstrado o mesmo envolvimento. Quando digo que ele saiu, apenas quero dizer que ele não ouviu o que gravou nesse ano e meio.

segunda formação do Violeta com Sandro, Fabio e GregorPergunta - Quer dizer que o Gregor oficialmente não deixou a banda? Vocês conversaram depois disso?
Fabio Golfetti -
Na verdade, acho que o Gregor gosta é de tocar ao vivo com o Violeta de Outono porque tem um pé no psicodelismo/garage. Nós sempre deixamos ele muito à vontade, dávamos muitas risadas. O que acho é que ele tem a banda dele, FuzzFaces, entre outros projetos (Laboratório), que é onde está o coração dele, então não posso exigir que ele goste por exemplo do Camel, do Van Der Graaf Generator, do Genesis, seria anti-artístico fazer com que ele mudasse o conceito dele. Mas, quero deixar uma coisa bem explícita: Não deixo de considerar o Gregor tocando em shows e outros projetos. Ele é sempre bem vindo, inclusive, toca as composições do Claudio com interpretação própria e sempre com muita competência. O que acontece agora eu comparo ao Gong, em 1974, que tinha vários bateristas revezando em gravações e shows como Pierre Moerlen, Bill Bruford, Chris Cutler e Brian Davidson... Obviamente, o Claudio tem a preferência por ser “fundador” da banda....

Claudio SouzaPergunta - OK, me fale então de que maneira é o som e o trabalho com Cláudio.
Fabio Golfetti -
O Claudio é compositor no Violeta de Outono. A química para compor entre Claudio, Angelo e myself (como dizia o pessoal do Led Zeppelin), criou um quarto elemento que é a música do Violeta de Outono e isso é um fato. Se um sair não será mais a mesma banda, pode ser até melhor, mas não a mesma.

Pergunta - Ouvindo Mahavishnu (Fabio me mandou meses atrás um mp3 com duas faixas novas...) percebi uma composição mais elaborada, uma coisa mais delicada. Como está esse famoso CD que não pirateou para mim? Quer mexer nele?
Fabio Golfetti -
Vou revelar... Após ter gravado tudo, mixado, algo não estava em harmonia, não sei explicar ao certo. Anyway, eis que recebo um telefonema da esposa do Sérgio Dias me perguntando se eu queria ir conhecer o estúdio dele. Fui até lá com nosso CD. O Serginho, chegou para mim e falou: "as músicas estão muito boas, o trabalho está legal, mas o som está muito inferior ao que já fizeram." E ele se ofereceu para produzir o CD, gravar tudo de novo, entende agora? A volta do Claudio para gravar foi sugestão do Sérgio; não que ele tenha feito comentários sobre o Gregor, mas ele percebeu a química existente nos trabalhos originais.

Pergunta - Sérgio é o melhor guitarrista que já tivemos. Ele te deu alguma dica? Tocará no disco? Quem mais participará das gravações?
Fabio Golfetti -
Ainda não sabemos como será, até porque ainda estamos atrás de patrocínio para custear as gravações. Obviamente, o Sérgio é meu mestre desde que me conheço por gente. Assisti vários shows dos Mutantes, fase 1973/74 quando o som estava mais na cabeça do Serginho. Ele é minha referência. O mais mágico é que, em 1987, quando pensávamos em produtor para o Violeta de Outono, o nome que vinha era Sérgio Dias, mas na época ele não estava por aqui e nós não tínhamos contato.

Pergunta - Eu quero chegar num ponto, que você pode achar chato, mas considero importante: o Violeta é totalmente fora do que toca por aí. São três caras com mais de 40 anos, que fazem um rock-revival (chamemos assim) que não se encaixa em nenhum estilo vigente. Você acha que ainda tem interesse pelo que fazem num país onde a maioria dos "novos roqueiros" não sabem construir uma frase sem dizer "mano", "galera", "falô"?
Fabio Golfetti -
O Violeta de Outono faz rock, sem concessões, tocamos por que gostamos, se não interessar para este público aqui, vai interessar para outro ali. Não estamos preocupados com o que vão achar, aliás, nunca estivemos e esse sempre foi o ponto quando abdicarmos um pouco do sucesso. Eu me lembro quando a RCA queria colocar uma música na novela das 7 e nós recusamos. Hoje acho que fomos um pouco radicais, mas imagine "Sombras Flutuantes", "Luz" em uma novela...

Pergunta - Mas, tem o lance do retorno financeiro. Gravar é caro, e quando se faz algo de qualidade há de se querer um retorno mínimo...
Fabio Golfetti -
Nisso concordo contigo. Se tivéssemos aceitado a novela, talvez o caminho tivesse sido outro. Consegui me manter com a música apenas durante 1987e 1988, quando fazíamos mais shows.

Angelo PastorelloPergunta - O que quero dizer e talvez, não tenha ficado bem claro, é que mesmo tocando sem concessões perigam ficarem de lado. Você me contou na outra entrevista (em 2000, publicada na coluna Mofo) que um dos motivos alegados pelo Angelo e pelo Cláudio saírem naquela época é que não havia retorno, principalmente financeiro. Vocês tinham um público fiel, mas ele não superava um certo patamar e eu sei o quanto luta no seu dia-a-dia. Por isso, quer goste ou não, money talks...
Fabio Golfetti -
Claro, hoje penso que seria muito mais fácil vender nossa música, porém, é muito mais difícil fazer com que alguém grande se interesse em vender esta música. Existem muitos produtos no mercado fonográfico, muitos discos, muito tudo, acho que hoje apenas uma exposição maciça em TV e Rádio faz com que um grupo tenha sucesso. Por outro lado, dá para continuar o hard work, que é divulgar por meios alternativos.

Pergunta - Então imagine o seguinte: o Brasil não tem tanta tradição, como lá fora, de bandas voltarem e saírem vendendo. OK. vocês nunca pararam, mas o mercado exige que quem volta se molde ao "moderno", que hoje é acústico. Não temem ouvirem, "o Violeta de Outono volta depois de tantos anos", e de repente não emplacarem como pensam ou merecem e cause um mal-estar interno? Fazem um puta disco e nada acontece?
Fabio Golfetti -
O Violeta de Outono, como qualquer outro grupo vai fazer sucesso se alguém injetar dinheiro para promover, rádio, televisão, etc etc. Outra coisa é que nada é moderno, ou o Red do King Crimson é moderno? O rock acabou em 1976, de lá para cá apenas se reciclou e, em meados dos anos 80, virou produto de gravadora. Para mim, hoje música é aquela tocada ao vivo pelos músicos, o resto não existe mais.

Pergunta - Isso não é algo meio simplista?
Fabio Golfetti -
Vou te explicar como funciona: vou colocar três pontos do Robert Fripp (ex-líder do King Crimson) para uma banda dar certo: grana, o som é muito legal e os integrantes são amigos. Para uma banda dar certo tem que ter duas entre essas três características: aí você pode formar as seguintes equações: a música dá muita grana, o som é muito bom e os integrantes são muito amigos. Mas pode acontecer outra coisa: o som é duca, os caras são amigos mas não rola grana. Ou ainda: o som é duca, rola uma grana alta mas os caras se odeiam. Ou então: os caras são muito amigos, ganham uma bela grana e o som é uma baba. E por aí vai, entende?

Pergunta - O que tem ouvido?
Fabio Golfetti -
Oasis, Kula Shaker, King Crimson (fase Red), um show do Gong com Bill Bruford, John McLaughlin / Larry Coryel - Spaces, e por aí vai...

Pergunta - Se fosse fazer um paralelo entre o Violeta de 20 anos atrás e hoje, o que diria que mudou: a essência é a mesma ou foi alterada com os anos? Você ainda gosta de tocar ao vivo como no início?
Fabio Golfetti -
O que mudou é que, talvez toquemos melhor, mas a música é a mesma. O espírito ainda permanece, acho que compor igual ao começo é impossível, o momento era fundamental para o que criamos, mas nós estamos muito animado com o que está acontecendo agora!

Pergunta - Como é a relação com o Angelo e Claudio? Você é realmente o líder ou existe uma democracia interna?
Fabio Golfetti -
Eu sou o 'lider' por ser aquele que escreve, marca os ensaios, faz a maior parte das entrevistas, sou o vocalista... Mas a música é da banda. Claro que muitas eu ou o Angelo fazemos no violão e depois é arranjado pelo grupo, ou o Claudio e Angelo fazem uma jam no estúdio e depois paramos para elaborar. E eu escrevo as letras.

Pergunta - Vamos pensar em linguagem beatleniana: Vocês já fizeram o Sgt Pepper's do Violeta? E esse novo trabalho se encaixa em que nível de elaboração, digamos, de um Help! até Let it be?
Fabio Golfetti -
Ainda não sei. O que está gravado é na linha de "Mahavishnu", com arranjos elaborados a la Revolver/Sgt Pepper's, mas hoje gostaria de gravar Let it Be, a banda tocando junto, o estúdio apenas para captar a energia que sai dos amplificadores, bateria... Não sei se o Violeta de Outono fará um Sgt Pepper's...

Pergunta - Qual é o disco dos Beatles que mais gosta?
Fabio Golfetti -
Gosto do Revolver e do All Things Must Pass (primeiro disco-solo de George Harrison).

Pergunta - O espaço rock hoje é mais escasso e underground que quando começaram. Por que isso? Como é dar shows com pouca divulgação?
Fabio Golfetti -
Não dá para fazer muitos shows, pelo menos para o Violeta de Outono. Para uma banda que está começando a se divulgar, vale tocar em todo o circuito, que apesar de tudo é melhor em qualidade do que há 20 anos. Na época existiam vários locais como Madame Satã, Rose Bom Bom, Espaço Mambembe, Ácido Plástico, mas as condições técnicas eram muito precárias. Os shows no Madame Satã eram no porão, o Rose Bom Bom era minúsculo. A diferença era que os jornalistas, etc freqüentavam estes lugares e davam espaço nos veículos da mídia.

Pergunta - Falando de rock aí em São Paulo: Kid Vinil agora é o diretor-artístico da Rádio Brasil 2000 e disse que só rock de verdade entra lá, agora. O que acha de algo assim? É possível ter bala na agulha para manter essa postura sem precisar "apelar"? Como vê a careteira cena de hoje?
Fabio Golfetti -
Respeito muito o Kid, espero que ele consiga colocar um pouco do conhecimento dele na rádio, mas sabemos que tem que dar lucro, não é uma “instituição de caridade”. Tenho certeza que se ele puder, vai dar uma força!

Pergunta - Você ainda mantém contato com quem do rock dos anos 80, tirando o pessoal do Ira!, (Fabio participou do disco ao vivo do grupo paulistano)?
Fabio Golfetti -
Ciro Pessoa (ex-Cabine C). Aliás, a Voiceprint acabou de lançar o disco dele, No Meio da Chuva Eu Grito Help.

Pergunta - Do que você vive hoje?
Fabio Golfetti -
No momento vivo da música, mas não com o Violeta de Outono. A Voiceprint (selo que Fabio representa no Brasil) paga as contas, mas principalmente com a distribuição de CDs importados.

Pergunta - Valeu Fabio. Mais uma vez o fã mala te aporrinha.
Fabio Golfetti -
Sem problemas. Abração.

Para saber mais sobre a banda acesse o site do grupo e se quiser conhecer o catálogo da Voiceprint, clique aqui.