Se você
é fã do Violeta de Outono e se sente falta de notícias
da banda, aqui vão três de uma tacada só:
o grupo está gravando disco novo. O baterista é
novamente Claudio Souza, membro original, que havia saído.
E estão sendo produzidos por Sérgio Dias Baptista.
Estão contentes?
Pois eles não
estão. Querem mais. Fazer um puta disco, cheio de grandes
canções e com um acabamento técnico que até
hoje não tiveram. Para isso, pegaram todo o material que
gravaram com Gregor Izidro, dono das baquetas após a saída
de Claudio e estão novamente trabalhando todo o repertório.
O trabalho era para ter saído no começo do ano,
mas Fabio Golfetti, estava insatisfeito com a qualidade técnica
da gravação e achava que o grupo podia melhorar.
Com a volta de Claudio, resolveram começar tudo de novo.
Mas se está
salivando, vem aqui uma ducha de água meio morna, meio
fria. Para custear as gravações, o grupo ainda está
tentando viabilizar financeiramente o projeto até para
manter o ex-Mutantes no comando. Fabio conta que seu ídolo
se propôs a produzir ao ouvir algumas faixas novas. Com
uma disposição de fazer inveja a muito garoto, Fabio
deu uma entrevista de uma forma inusitada: numa terça-feira
noite adentro no chatroom do site da Voiceprint. Veja a íntegra
da conversa...
Pergunta
- Fabio, fale sobre a volta do Claudio. Como se processou, como
ficaram as músicas com a mudança de baterista?
Fabio Golfetti - Bem, a volta do Claudio está
da seguinte maneira: recentemente temos nos falado pela nossa
amizade antiga e ele se demonstrou muito animado em retomar os
estudos de bateria e muito animado também depois da vinda
do Bill Bruford.
Pergunta - O que
mudou? Gregor tinha uma batida mais pesada...
Fabio Golfetti - Deixe eu explicar o que aconteceu: Nós
mixamos as gravações feitas com o Gregor, porém,
ficou uma dúvida com relação à qualidade
técnica do material. Gostamos muito do Gregor, ele é
imbatível ao vivo, mas ficou sacrificado na gravação,
porque fizemos toda a tomada de bateria das músicas em
duas sessões. A diferença entre o Gregor e o Claudio
é que o Claudio tem 20 anos a mais e a mesma formação
musical minha e do Angelo (Pastorello, baixista). O Gregor toca
com muita energia, o que nos shows levava a banda para cima.
Pergunta - E por
que ele saiu?
Fabio Golfetti - O Gregor não saiu, o envolvimento
dele está mais para shows. Tem um, nós ensaiamos
e tocamos, mas acho que quando foi para conceituar um novo trabalho,
me pareceu talvez que ele não tenha demonstrado o mesmo
envolvimento. Quando digo que ele saiu, apenas quero dizer que
ele não ouviu o que gravou nesse ano e meio.
Pergunta
- Quer dizer que o Gregor oficialmente não deixou a banda?
Vocês conversaram depois disso?
Fabio Golfetti - Na verdade, acho que o Gregor gosta
é de tocar ao vivo com o Violeta de Outono porque tem um
pé no psicodelismo/garage. Nós sempre deixamos ele
muito à vontade, dávamos muitas risadas. O que acho
é que ele tem a banda dele, FuzzFaces, entre outros projetos
(Laboratório), que é onde está o coração
dele, então não posso exigir que ele goste por exemplo
do Camel, do Van Der Graaf Generator, do Genesis, seria anti-artístico
fazer com que ele mudasse o conceito dele. Mas, quero deixar uma
coisa bem explícita: Não deixo de considerar o Gregor
tocando em shows e outros projetos. Ele é sempre bem vindo,
inclusive, toca as composições do Claudio com interpretação
própria e sempre com muita competência. O que acontece
agora eu comparo ao Gong, em 1974, que tinha vários bateristas
revezando em gravações e shows como Pierre Moerlen,
Bill Bruford, Chris Cutler e Brian Davidson... Obviamente, o Claudio
tem a preferência por ser “fundador” da banda....
Pergunta
- OK, me fale então de que maneira é o som e o trabalho
com Cláudio.
Fabio Golfetti - O Claudio é compositor no Violeta
de Outono. A química para compor entre Claudio, Angelo
e myself (como dizia o pessoal do Led Zeppelin), criou
um quarto elemento que é a música do Violeta de
Outono e isso é um fato. Se um sair não será
mais a mesma banda, pode ser até melhor, mas não
a mesma.
Pergunta - Ouvindo
Mahavishnu (Fabio me mandou meses atrás um mp3 com
duas faixas novas...) percebi uma composição
mais elaborada, uma coisa mais delicada. Como está esse
famoso CD que não pirateou para mim? Quer mexer nele?
Fabio Golfetti - Vou revelar... Após ter gravado
tudo, mixado, algo não estava em harmonia, não sei
explicar ao certo. Anyway, eis que recebo um telefonema
da esposa do Sérgio Dias me perguntando se eu queria ir
conhecer o estúdio dele. Fui até lá com nosso
CD. O Serginho, chegou para mim e falou: "as músicas
estão muito boas, o trabalho está legal, mas o som
está muito inferior ao que já fizeram." E ele
se ofereceu para produzir o CD, gravar tudo de novo, entende agora?
A volta do Claudio para gravar foi sugestão do Sérgio;
não que ele tenha feito comentários sobre o Gregor,
mas ele percebeu a química existente nos trabalhos originais.
Pergunta - Sérgio
é o melhor guitarrista que já tivemos. Ele te deu
alguma dica? Tocará no disco? Quem mais participará
das gravações?
Fabio Golfetti - Ainda não sabemos como será,
até porque ainda estamos atrás de patrocínio
para custear as gravações. Obviamente, o Sérgio
é meu mestre desde que me conheço por gente. Assisti
vários shows dos Mutantes, fase 1973/74 quando o som estava
mais na cabeça do Serginho. Ele é minha referência.
O mais mágico é que, em 1987, quando pensávamos
em produtor para o Violeta de Outono, o nome que vinha era Sérgio
Dias, mas na época ele não estava por aqui e nós
não tínhamos contato.
Pergunta - Eu quero
chegar num ponto, que você pode achar chato, mas considero
importante: o Violeta é totalmente fora do que toca por
aí. São três caras com mais de 40 anos, que
fazem um rock-revival (chamemos assim) que não se encaixa
em nenhum estilo vigente. Você acha que ainda tem interesse
pelo que fazem num país onde a maioria dos "novos
roqueiros" não sabem construir uma frase sem dizer
"mano", "galera", "falô"?
Fabio Golfetti - O Violeta de Outono faz rock, sem concessões,
tocamos por que gostamos, se não interessar para este público
aqui, vai interessar para outro ali. Não estamos preocupados
com o que vão achar, aliás, nunca estivemos e esse
sempre foi o ponto quando abdicarmos um pouco do sucesso. Eu me
lembro quando a RCA queria colocar uma música na novela
das 7 e nós recusamos. Hoje acho que fomos um pouco radicais,
mas imagine "Sombras Flutuantes", "Luz" em
uma novela...
Pergunta - Mas,
tem o lance do retorno financeiro. Gravar é caro, e quando
se faz algo de qualidade há de se querer um retorno mínimo...
Fabio Golfetti - Nisso concordo contigo. Se tivéssemos
aceitado a novela, talvez o caminho tivesse sido outro. Consegui
me manter com a música apenas durante 1987e 1988, quando
fazíamos mais shows.
Pergunta
- O que quero dizer e talvez, não tenha ficado bem claro,
é que mesmo tocando sem concessões perigam ficarem
de lado. Você me contou na outra entrevista (em 2000,
publicada na coluna Mofo) que um dos motivos alegados pelo
Angelo e pelo Cláudio saírem naquela época
é que não havia retorno, principalmente financeiro.
Vocês tinham um público fiel, mas ele não
superava um certo patamar e eu sei o quanto luta no seu dia-a-dia.
Por isso, quer goste ou não, money talks...
Fabio Golfetti - Claro, hoje penso que seria muito mais
fácil vender nossa música, porém, é
muito mais difícil fazer com que alguém grande se
interesse em vender esta música. Existem muitos produtos
no mercado fonográfico, muitos discos, muito tudo, acho
que hoje apenas uma exposição maciça em TV
e Rádio faz com que um grupo tenha sucesso. Por outro lado,
dá para continuar o hard work, que é divulgar
por meios alternativos.
Pergunta - Então
imagine o seguinte: o Brasil não tem tanta tradição,
como lá fora, de bandas voltarem e saírem vendendo.
OK. vocês nunca pararam, mas o mercado exige que quem volta
se molde ao "moderno", que hoje é acústico.
Não temem ouvirem, "o Violeta de Outono volta depois
de tantos anos", e de repente não emplacarem como
pensam ou merecem e cause um mal-estar interno? Fazem um puta
disco e nada acontece?
Fabio Golfetti - O Violeta de Outono, como qualquer outro
grupo vai fazer sucesso se alguém injetar dinheiro para
promover, rádio, televisão, etc etc. Outra coisa
é que nada é moderno, ou o Red
do King Crimson é moderno? O rock acabou em 1976, de lá
para cá apenas se reciclou e, em meados dos anos 80, virou
produto de gravadora. Para mim, hoje música é aquela
tocada ao vivo pelos músicos, o resto não existe
mais.
Pergunta - Isso
não é algo meio simplista?
Fabio Golfetti - Vou te explicar como funciona: vou colocar
três pontos do Robert Fripp (ex-líder do King
Crimson) para uma banda dar certo: grana, o som é
muito legal e os integrantes são amigos. Para uma banda
dar certo tem que ter duas entre essas três características:
aí você pode formar as seguintes equações:
a música dá muita grana, o som é muito bom
e os integrantes são muito amigos. Mas pode acontecer outra
coisa: o som é duca, os caras são amigos mas não
rola grana. Ou ainda: o som é duca, rola uma grana alta
mas os caras se odeiam. Ou então: os caras são muito
amigos, ganham uma bela grana e o som é uma baba. E por
aí vai, entende?
Pergunta - O que
tem ouvido?
Fabio Golfetti - Oasis, Kula Shaker, King Crimson (fase
Red), um show do Gong com Bill Bruford, John
McLaughlin / Larry Coryel - Spaces, e por aí vai...
Pergunta - Se fosse
fazer um paralelo entre o Violeta de 20 anos atrás e hoje,
o que diria que mudou: a essência é a mesma ou foi
alterada com os anos? Você ainda gosta de tocar ao vivo
como no início?
Fabio Golfetti - O que mudou é que, talvez toquemos
melhor, mas a música é a mesma. O espírito
ainda permanece, acho que compor igual ao começo é
impossível, o momento era fundamental para o que criamos,
mas nós estamos muito animado com o que está acontecendo
agora!
Pergunta - Como
é a relação com o Angelo e Claudio? Você
é realmente o líder ou existe uma democracia interna?
Fabio Golfetti - Eu sou o 'lider' por ser aquele que
escreve, marca os ensaios, faz a maior parte das entrevistas,
sou o vocalista... Mas a música é da banda. Claro
que muitas eu ou o Angelo fazemos no violão e depois é
arranjado pelo grupo, ou o Claudio e Angelo fazem uma jam
no estúdio e depois paramos para elaborar. E eu escrevo
as letras.
Pergunta - Vamos
pensar em linguagem beatleniana: Vocês já fizeram
o Sgt Pepper's do Violeta? E esse novo trabalho se encaixa em
que nível de elaboração, digamos, de um Help!
até Let it be?
Fabio Golfetti - Ainda não sei. O que está
gravado é na linha de "Mahavishnu", com arranjos
elaborados a la Revolver/Sgt Pepper's, mas hoje
gostaria de gravar Let it Be, a banda tocando
junto, o estúdio apenas para captar a energia que sai dos
amplificadores, bateria... Não sei se o Violeta de Outono
fará um Sgt Pepper's...
Pergunta - Qual
é o disco dos Beatles que mais gosta?
Fabio Golfetti - Gosto do Revolver e
do All Things Must Pass (primeiro disco-solo
de George Harrison).
Pergunta - O espaço
rock hoje é mais escasso e underground que quando começaram.
Por que isso? Como é dar shows com pouca divulgação?
Fabio Golfetti - Não dá para fazer muitos
shows, pelo menos para o Violeta de Outono. Para uma banda que
está começando a se divulgar, vale tocar em todo
o circuito, que apesar de tudo é melhor em qualidade do
que há 20 anos. Na época existiam vários
locais como Madame Satã, Rose Bom Bom, Espaço Mambembe,
Ácido Plástico, mas as condições técnicas
eram muito precárias. Os shows no Madame Satã eram
no porão, o Rose Bom Bom era minúsculo. A diferença
era que os jornalistas, etc freqüentavam estes lugares e
davam espaço nos veículos da mídia.
Pergunta - Falando
de rock aí em São Paulo: Kid Vinil agora é
o diretor-artístico da Rádio Brasil 2000 e disse
que só rock de verdade entra lá, agora. O que acha
de algo assim? É possível ter bala na agulha para
manter essa postura sem precisar "apelar"? Como vê
a careteira cena de hoje?
Fabio Golfetti - Respeito muito o Kid, espero que ele
consiga colocar um pouco do conhecimento dele na rádio,
mas sabemos que tem que dar lucro, não é uma “instituição
de caridade”. Tenho certeza que se ele puder, vai dar uma
força!
Pergunta - Você
ainda mantém contato com quem do rock dos anos 80, tirando
o pessoal do Ira!, (Fabio participou do disco ao vivo do grupo
paulistano)?
Fabio Golfetti - Ciro Pessoa (ex-Cabine C). Aliás,
a Voiceprint acabou de lançar o disco dele, No
Meio da Chuva Eu Grito Help.
Pergunta - Do que
você vive hoje?
Fabio Golfetti - No momento vivo da música, mas
não com o Violeta de Outono. A Voiceprint (selo que
Fabio representa no Brasil) paga as contas, mas principalmente
com a distribuição de CDs importados.
Pergunta - Valeu
Fabio. Mais uma vez o fã mala te aporrinha.
Fabio Golfetti - Sem problemas. Abração.
Para saber mais sobre a
banda acesse o site
do grupo e se quiser conhecer o catálogo da
Voiceprint, clique aqui.
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