Ah,
é tão fácil escrever sobre coisas que gostamos
tanto e que se tornam clássicas. E é tão
difícil não cairmos no lugar comum.
Essa caixa é um presente inimaginável
para os fãs do Durutti Column (quantos somos?): uma edição
com os 4 primeiros LPs - The Return of the Durutti Column,
LC, Another Setting, Without
Mercy - e ainda mais dois cds cheios de bônus.
Mas, para nosso desespero, apenas 1175
cópias foram feitos (será que nem eles sabem quantos
somos?).
O jeito então é correr
atrás rapidinho, antes que acabem. Mas também
não precisa se desesperar porque após o grande
sucesso, estão sendo providenciadas novas cópias.
Das 1175 cópias numeradas, tive
a alegria de ser o dono do número 617. E digo isso com
muita alegria, porque há anos tentava recuperar uma cópia
em CD de LC - já que tenho o vinil nacional
tanto dele quanto de Without Mercy.
E se dependesse da Factory - ou que restou
dela - jamais seriam reeditados. Então como se deu a
mágica?
O culpado de tudo isso é o filho
do finado Tony Wilson, dono do selo, Oliver Wilson. Ele conta
que após a morte do pai, foi até a casa dele para
arrumar as coisas e encontrou um arsenal impressionante de fitas
da gravadora, algumas desorganizadas. Intrigado, ficou se perguntando
o quê faria com tudo aquilo. Como não encontrava
uma resposta, resolveu dar tudo aos artistas originais.
Para Vini Reilly, foi um presente dos
céus. Há anos, ele sonhava em editar alguns de
seus primeiros LPs, mas não tinha idéia de onde
e com quem estariam as fitas masters.
Ao receber, Vini e Bruce Mitchell começaram
a ouvir e passaram a bola para um especialista em remasterização
para lançamentos em CDs, Keir Stewart.
Segundo Vini, "Keir é o cara
ideal para isso, com um talento impressionante e de uma técnica
imaculada." E o legado não era pequeno, afinal os
4 primeiros LPs do Durutti são obras absolutamente personalistas
da mente e da palheta de Vini, ainda que ele deteste particularmente
dois discos: Another Setting e Without
Mercy.
Porém, é necessário
dar o devido desconto ao gênio em questão. O fato
de não gostar dos discos não significa dizer que
são ruins, muito pelo contrário.
O primeiro disco, The Return
of the Durutti Column foi feito em um momento duro
para Vini, já que os músicos de sua banda simplesmente
o abandonaram. Reilly, que sempre sofreu de anorexia nervosa,
caiu em profunda depressão e ficou jogado na cama e só
saiu de lá graças aos esforços de Tony
Wilson e de Alan Erasmus, que o levavam ao estúdio, junto
com o produtor Martin Hannett.
Segundo o próprio, Martin o obrigou
a gravar 13 peças musicais em dois dias e depois ele
voltou para casa, para curtir sua tristeza. Vini estava tão
doente que só chegou a ouvir as músicas após
o disco ter sido prensado e mixado. A primeira capa era em papel
aerado, mas depois Tony pediu que Vini escolhesse uma outra
imagem, e Reilly optou por uma imagem do artista pós-impressionista
Raoul Duffy.
O segundo disco, LC,
nasceu de uma maneira inusitada. Vini tinha um gravador de eco
e um gravador de rolo simples em sua casa e resolveu gravar
algumas músicas de noite, enquanto sua mãe dormia
ao lado.
Durante cinco horas gravou várias
coisas e no dia seguinte, foi ao estúdio para colocar
alguns vocais, alguns overdubs de piano e a bateria de Bruce
Mitchell, que havia entrado na banda, meio que por acaso, semanas
antes. No dia seguinte, o disco foi mixado. Em menos de 48 horas
nascia um dos grandes clássicos dos anos 80. Uma faixa
que merece destaque é "The Missing Boy", feita
em homenagem ao amigo Ian Curtis.
Another Setting é
o grande pesadelo, segundo Vini. A Factory pediu que ele trabalhasse
com o engenheiro Chris Nagle e o resultado foi um "desastre".
"O som da guitarra não ficou bom. Eu iria cantar
mas acabei não cantando. Nada soava bem, o disco todo
parecia murcho, sem vida e fiquei incrivelmente desapontado,
pois estava em um ótimo estúdio com um ótimo
equipamento. Até uma canção como 'The Beggar',
que ao vivo fica quase um rock era totalmente sem vida. Fiquei
muito desapontado e imagino que Tony também, pois ele
investiu muito em mim, queria uma carreira pro Durutti."
Without Mercy é
um dos discos favoritos dos fãs, mas não de Vini,
que trabalhou nele por encomenda de Tony Wilson. "Tony
um dia chegou para mim e disse 'olha eu deixo você fazer
todos os discos que desejar da maneira que quiser, desde que
você me dê um disco em específico'. Ele queria
uma narrativa específica em cima de um poema de Keats
'La Belle Dame Sans Merci', que para Tony era a "canção
pop' do poeta. Seria algo com orquestras e metais e muito interessante
se eu tivesse algum interesse, o que não era o caso.
Por isso, odiei cada segundo de Without Mercy,
porque não pus meu coração no projeto.
Eu não gostei do som da guitarra, para começo
de conversa, e se a guitarra não responde bem, para mim
nada funciona. E foi o que aconteceu nessa gravação."
Foram cinco dias de tortura para Vini,
num disco com o próprio Tony produzindo e, apesar da
beleza registrada, os dois sentiram que o projeto foi um fiasco.
Ao menos, nessas gravações, ele conheceu um músico
que viria a ser quase um membro fixo da banda, John Metcalfe.
Fosse apenas uma edição
dos 4 CDs e a caixa já valeria muito. Mas ela traz muito
mais. Para início de conversa, há uma linda caixa
de presente na cor vinho. Ao abri-la, você verá
um envelope lacrado e dentro desse envelope seis cds embalados
separadamente; em quatro cores diferentes - copiando as cores
da capa dos LPs originais - e mais dois cds embalados em invólucros
da cor vinho, os extras.
Mas há mais: as quatro capas originais
são reproduzidas em papel glossy, maior do que uma capa
de CD. Além disso, há mais cinco folhas com entrevistas
feitas com Vini, Bruce Mitchell, Oliver Wilson, John Metcalfe,
Stewart Pickering (o produtor de LC), Keir
Stewart e Tim Kellet, um dos músicos que mais colaborou
com Vini ao longo dos anos.
Todo esse material foi editado com o
extremo carinho pela pequena gravadora Kooky Records que fez
1175 cópias numeradas, que rapidamente se esgotou.
E como fazer para adquiri-la? Bem, será
praticamente impossível que alguma loja no Brasil compre
alguma cópia. O melhor que se tem a fazer é o
seguinte: munido de um cartão de crédito internacional
entre no site
do selo, ou no site
da banda.
Uma outra alternativa - e foi a que usei
- é entrar no
site da Amazon, mas a inglesa e não
a norte-americana, e comprar uma peça usada. Isso porque
eles têm várias em ótimo estado e com preços
mais acessíveis, caso você não encontre
em lugar algum.
No momento - noite do dia 22 de outubro
- há 8 peças usadas com preços variando
de 39,99 libras a 200 libras. A Amazon garante a qualidade e
funciona como uma intermediária entre o vendedor e o
comprador, sempre com ótimos resultados.
Com a baixa do dólar, minha caixa
saiu muito em conta e paguei menos de 1/3 do que pediu a Cdpoint,
por exemplo, e que ainda não dão 100% de garantia
de conseguir um exemplar.
Apesar de serem maneiras elitistas para
se conseguir o artefato, segue sendo a única para os
fãs brasileiros. Você pode até pedir para
uma loja tentar importar, mas saiba que vai pagar bem mais e
ainda corre o risco deles não conseguirem.
Por isso, se for realmente fã
da banda, corra atrás. É o lançamento do
ano, sem a menor dúvida.