95 - The Durutti Column - Four Factory Records

Ah, é tão fácil escrever sobre coisas que gostamos tanto e que se tornam clássicas. E é tão difícil não cairmos no lugar comum.

Essa caixa é um presente inimaginável para os fãs do Durutti Column (quantos somos?): uma edição com os 4 primeiros LPs - The Return of the Durutti Column, LC, Another Setting, Without Mercy - e ainda mais dois cds cheios de bônus.

Mas, para nosso desespero, apenas 1175 cópias foram feitos (será que nem eles sabem quantos somos?).

O jeito então é correr atrás rapidinho, antes que acabem. Mas também não precisa se desesperar porque após o grande sucesso, estão sendo providenciadas novas cópias.

Das 1175 cópias numeradas, tive a alegria de ser o dono do número 617. E digo isso com muita alegria, porque há anos tentava recuperar uma cópia em CD de LC - já que tenho o vinil nacional tanto dele quanto de Without Mercy.

E se dependesse da Factory - ou que restou dela - jamais seriam reeditados. Então como se deu a mágica?

O culpado de tudo isso é o filho do finado Tony Wilson, dono do selo, Oliver Wilson. Ele conta que após a morte do pai, foi até a casa dele para arrumar as coisas e encontrou um arsenal impressionante de fitas da gravadora, algumas desorganizadas. Intrigado, ficou se perguntando o quê faria com tudo aquilo. Como não encontrava uma resposta, resolveu dar tudo aos artistas originais.

Para Vini Reilly, foi um presente dos céus. Há anos, ele sonhava em editar alguns de seus primeiros LPs, mas não tinha idéia de onde e com quem estariam as fitas masters.

Ao receber, Vini e Bruce Mitchell começaram a ouvir e passaram a bola para um especialista em remasterização para lançamentos em CDs, Keir Stewart.

Segundo Vini, "Keir é o cara ideal para isso, com um talento impressionante e de uma técnica imaculada." E o legado não era pequeno, afinal os 4 primeiros LPs do Durutti são obras absolutamente personalistas da mente e da palheta de Vini, ainda que ele deteste particularmente dois discos: Another Setting e Without Mercy.

Porém, é necessário dar o devido desconto ao gênio em questão. O fato de não gostar dos discos não significa dizer que são ruins, muito pelo contrário.

O primeiro disco, The Return of the Durutti Column foi feito em um momento duro para Vini, já que os músicos de sua banda simplesmente o abandonaram. Reilly, que sempre sofreu de anorexia nervosa, caiu em profunda depressão e ficou jogado na cama e só saiu de lá graças aos esforços de Tony Wilson e de Alan Erasmus, que o levavam ao estúdio, junto com o produtor Martin Hannett.

Segundo o próprio, Martin o obrigou a gravar 13 peças musicais em dois dias e depois ele voltou para casa, para curtir sua tristeza. Vini estava tão doente que só chegou a ouvir as músicas após o disco ter sido prensado e mixado. A primeira capa era em papel aerado, mas depois Tony pediu que Vini escolhesse uma outra imagem, e Reilly optou por uma imagem do artista pós-impressionista Raoul Duffy.

O segundo disco, LC, nasceu de uma maneira inusitada. Vini tinha um gravador de eco e um gravador de rolo simples em sua casa e resolveu gravar algumas músicas de noite, enquanto sua mãe dormia ao lado.

Durante cinco horas gravou várias coisas e no dia seguinte, foi ao estúdio para colocar alguns vocais, alguns overdubs de piano e a bateria de Bruce Mitchell, que havia entrado na banda, meio que por acaso, semanas antes. No dia seguinte, o disco foi mixado. Em menos de 48 horas nascia um dos grandes clássicos dos anos 80. Uma faixa que merece destaque é "The Missing Boy", feita em homenagem ao amigo Ian Curtis.

Another Setting é o grande pesadelo, segundo Vini. A Factory pediu que ele trabalhasse com o engenheiro Chris Nagle e o resultado foi um "desastre". "O som da guitarra não ficou bom. Eu iria cantar mas acabei não cantando. Nada soava bem, o disco todo parecia murcho, sem vida e fiquei incrivelmente desapontado, pois estava em um ótimo estúdio com um ótimo equipamento. Até uma canção como 'The Beggar', que ao vivo fica quase um rock era totalmente sem vida. Fiquei muito desapontado e imagino que Tony também, pois ele investiu muito em mim, queria uma carreira pro Durutti."

Without Mercy é um dos discos favoritos dos fãs, mas não de Vini, que trabalhou nele por encomenda de Tony Wilson. "Tony um dia chegou para mim e disse 'olha eu deixo você fazer todos os discos que desejar da maneira que quiser, desde que você me dê um disco em específico'. Ele queria uma narrativa específica em cima de um poema de Keats 'La Belle Dame Sans Merci', que para Tony era a "canção pop' do poeta. Seria algo com orquestras e metais e muito interessante se eu tivesse algum interesse, o que não era o caso. Por isso, odiei cada segundo de Without Mercy, porque não pus meu coração no projeto. Eu não gostei do som da guitarra, para começo de conversa, e se a guitarra não responde bem, para mim nada funciona. E foi o que aconteceu nessa gravação."

Foram cinco dias de tortura para Vini, num disco com o próprio Tony produzindo e, apesar da beleza registrada, os dois sentiram que o projeto foi um fiasco. Ao menos, nessas gravações, ele conheceu um músico que viria a ser quase um membro fixo da banda, John Metcalfe.

Fosse apenas uma edição dos 4 CDs e a caixa já valeria muito. Mas ela traz muito mais. Para início de conversa, há uma linda caixa de presente na cor vinho. Ao abri-la, você verá um envelope lacrado e dentro desse envelope seis cds embalados separadamente; em quatro cores diferentes - copiando as cores da capa dos LPs originais - e mais dois cds embalados em invólucros da cor vinho, os extras.

Mas há mais: as quatro capas originais são reproduzidas em papel glossy, maior do que uma capa de CD. Além disso, há mais cinco folhas com entrevistas feitas com Vini, Bruce Mitchell, Oliver Wilson, John Metcalfe, Stewart Pickering (o produtor de LC), Keir Stewart e Tim Kellet, um dos músicos que mais colaborou com Vini ao longo dos anos.

Todo esse material foi editado com o extremo carinho pela pequena gravadora Kooky Records que fez 1175 cópias numeradas, que rapidamente se esgotou.

E como fazer para adquiri-la? Bem, será praticamente impossível que alguma loja no Brasil compre alguma cópia. O melhor que se tem a fazer é o seguinte: munido de um cartão de crédito internacional entre no site do selo, ou no site da banda.

Uma outra alternativa - e foi a que usei - é entrar no site da Amazon, mas a inglesa e não a norte-americana, e comprar uma peça usada. Isso porque eles têm várias em ótimo estado e com preços mais acessíveis, caso você não encontre em lugar algum.

No momento - noite do dia 22 de outubro - há 8 peças usadas com preços variando de 39,99 libras a 200 libras. A Amazon garante a qualidade e funciona como uma intermediária entre o vendedor e o comprador, sempre com ótimos resultados.

Com a baixa do dólar, minha caixa saiu muito em conta e paguei menos de 1/3 do que pediu a Cdpoint, por exemplo, e que ainda não dão 100% de garantia de conseguir um exemplar.

Apesar de serem maneiras elitistas para se conseguir o artefato, segue sendo a única para os fãs brasileiros. Você pode até pedir para uma loja tentar importar, mas saiba que vai pagar bem mais e ainda corre o risco deles não conseguirem.

Por isso, se for realmente fã da banda, corra atrás. É o lançamento do ano, sem a menor dúvida.