Não são
poucos os fãs que consideram esse disco como o melhor trabalho
solo de um Beatle. O grupo havia acabado de terminar e George
Harrison achou que era hora de colocar todo seu talento de compositor
para fora, frustrado por ter poucas composições
próprias nos Beatles. Assim, lança em 1970, o LP
triplo All Things Must Pass, com produção de Phil
Spector e uma penca de convidados. Sim, você conhece esse
disco, especialmente a clássica canção "My
Sweet Lord", um dos maiores hits da história. Um disco
obrigatório, que teve uma reedição em 2001
e lançamento por aqui. Por isso, corra atrás! Mas,
antes leia a história.
Imagine
como era a vida de um Beatle após o fim do grupo. Agora
tente imaginar como devia estar se sentindo o tímido e
talentoso George Harrison, que foi eclipsado por John Lennon e,
principalmente, Paul McCartney.
George vinha acumulando
canções desde 1966, sendo "The Art of Dying"
e "Isn't It a Pity" dessa época.
George já havia
lançado dois discos solos antes de All Things Must
Pass: Wonderwall Music (1968) e Electronic
Sound (1969), mas que eram basicamente instrumentais.
George havia oferecido algumas dessas canções aos
Beatles para o LP Get Back, mas sem sucesso.
Com o final do grupo mais
importante da história, George Harrison resolveu entrar
nos estúdio Abbey Road com o produtor Phil Spector, para
lançar seu terceiro LP solo, no dia 26 de maio, seis dias
depois da estréia do filme Get Back.
As gravações
durariam mais de três meses e George teria a colaboração
de dezenas de amigos. Spector foi chamado pelo seu famoso wall-of-sound,
um som com muita reverberação e que George queria
usar. Essa técnica seria criticada pelo próprio
George quando o disco teve uma reedição especial
em CD, em 2001, no texto introdutório.
George
passou os primeiros dias apresentando as músicas à
Spector, apenas com um violão e acompanhado de um baixista
desconhecido. Foram 15 canções, das quais oito seriam
retrabalhadas, sendo que algumas delas acabariam não sendo
aproveitadas. Uma delas era "Everybody, Nobody", que
depois seria rebatizada como "The Ballad of Sir Frankie Crisp".
Para a gravação,
George contou com uma legião de amigos: Ringo Starr, todo
o grupo Badfinger, Eric Clapton - que por razões contratuais
não foi creditado no disco - o pessoal do Derek and the
Dominoes, o baterista Alan White, que tocava na época com
John Lennon, antes de entrar no Yes, o pianista Billy Preston.
Também estava presente o amigo de longa data, o baixista
e artista Klaus Voorman, que desenhou a capa de Revolver.
George e Eric haviam excursionando
nos últimos meses de 1969 com o combo Delaney and Bonnie
e retomado a antiga amizade, abalada quando Clapton "roubou"
Patty Boyd, então esposa de George.
George resolveu abrir o
disco com uma canção escrita com Bob Dylan, em Woodstock,
em 1968, quando passou uns dias com ele e com o Band, "I'd
Have You Anytime."
Segundo
Harrison, "fui visitar Bob após aquele acidente em
que quebrou o pescoço e ele estava muito quieto e parecia
sem confiança; foi isso que senti quando o visitei em Woodstock.
Ele mal disse algumas palavras em dois dias. Bem, finalmente começamos
a tocar um pouco e foi muito gostoso, com todas as crianças
correndo e nós, ali, compondo. Acho que estávamos
perto do feriado de Ação de Graças. Ele cantou
uma canção e estava muito nervoso e tímido
e perguntou o que eu tinha achado. Fiquei surpreso porque eu adorava
as coisas dele. Quando fui para a Índia, uns anos antes,
levei apenas um disco, que era Blonde On Blonde. Acabei me sentindo
mais próximo a ele, porque era alguém tão
genial, tão importante e, ainda assim, estava totalmente
nervoso e com baixa auto-estima. Aí eu me virei para ele
e disse 'você escreveu canções brilhantes
e ainda me pergunta o que achei?'. Então comecei a mostrar
alguns acordes, porque Bob tem uma tendência a tocar acordes
bem simples, básicos enquanto eu pedia que escrevesse uma
letra para mim. E assim, surgiu, rapidamente os primeiros versos
'Behind That Locked Door.'" A canção acabaria
sendo terminada por Dylan enquanto ele participava do Festival
da Ilha de Wight. George e Bob se encontrariam também em
1969 enquanto Dylan gravava o LP New Morning.
George acabaria usando a canção "If Not For
You", em All Things Must Pass.
Outra canção
curiosa é "Apple Scruffs". Esse era o nome que
os Beatles davam aos fãs mais xiitas da banda, que praticamente
moravam nos degraus do prédio da Apple, em Saville Row.
George conta que a dedicação deles era tão
grande, que dois deles acabaram como empregados da Apple ou dos
estúdios Abbey Road. Quando George escreveu a canção
os convidou para ouvirem, levando os fãs ao delírio
e às lágrimas.
O disco teve uma grande
influência: Deus. George estava muito influenciado pelo
Hari Krishna. Para demonstrar seu amor, compôs o maior sucesso
de sua longa carreira, "My Sweet Lord". Talvez, apenas
"Imagine", possa rivalizar com ela em todo o catálogo
solo dos ex-integrantes dos Beatles. Segundo George, cantar "Hare
Krishna" como se fosse um mantra foi fundamental para ajudá-lo
a se livrar do vício da heroína. Segundo ele, "Hare
Krishna" é mais poderoso do que "Aleluia!".
"É mais do que glorificar Deus, é pedir para
ser o servo dele.
O
curioso é que, enquanto gravava a canção,
John Lennon estava no estúdio ao lado, em Abbey Road gravando
seu primeiro disco-solo, Plastic Ono Band, cantando
"Deus é um conceito no qual medimos nossa dor."
E o mais irônico é que nos dois discos participavam
Klaus Voorman e Ringo. E ambos eram produzidos por Phil Spector!
George tinha tanto respeito
pelos fãs que não deixou a EMI lançá-la
como single, para não afetar a vendagem do álbum
e para não dar gastos extras aos compradores.
All
Things Must Pass era, até aquela data, o mais
caro LP já feito pela gravadora. A música só
seria lançada em compacto algum tempo depois. Na América
saiu em 23 de novembro de 1970 e, no Reino Unido, em 15 de janeiro
de 1971, chegando ao primeiro lugar nos dois lados do Atlântico.
Lançado em 27 de
novembro de 1970, All Things Must Pass foi ao
topo na parada de todo o planeta e surpreendeu a todos, ao sair
em três LPs, com 18 músicas próprias.
O álbum triplo trazia
as seguintes faixas:
Lado 1
1. "I'd Have You Anytime"
(George Harrison/Bob Dylan) – 2:56
2. "My Sweet Lord" – 4:38
3. "Wah-Wah" – 5:35
4. "Isn't It a Pity" (Version 1) – 7:08
Lado 2
1. "What Is Life"
– 4:22
2. "If Not for You" (Bob Dylan) – 3:29
3. "Behind That Locked Door" – 3:05
4. "Let It Down" – 4:57
5. "Run of the Mill" – 2:49
Lado 3
1. "Beware of Darkness"
– 3:48
2. "Apple Scruffs" – 3:04
3. "Ballad of Sir Frankie Crisp (Let It Roll)" –
3:46
4. "Awaiting on You All" – 2:45
5. "All Things Must Pass" – 3:44
Lado 4
1. "I Dig Love"
– 4:55
2. "Art of Dying" – 3:37
3. "Isn't It a Pity" (Version 2) – 4:45
4. "Hear Me Lord" – 5:46
Apple Jam*
Lado 5
1. "Out of the Blue"
(Jim Gordon/Carl Radle/Bobby Whitlock/Eric Clapton/Gary Wright/George
Harrison/Jim Price/Bobby Keys/Al Aronowitz) – 11:14
2. "It's Johnny's Birthday" (Based upon "Congratulations"
- Bill Martin/Phil Coulter) – 0:49
* Recorded in August 1970 with Ringo Starr and presented to John
Lennon on 9 October in celebration of his 30th birthday
3. "Plug Me In" (Jim Gordon/Carl Radle/Bobby Whitlock/Eric
Clapton/Dave Mason/George Harrison) – 3:18
Lado 6
1. "I Remember Jeep"
(Ginger Baker/Klaus Voormann/Billy Preston/Eric Clapton/George
Harrison) – 8:07
2. "Thanks for the Pepperoni" (Jim Gordon/Carl Radle/Bobby
Whitlock/Eric Clapton/Dave Mason/George Harrison) – 5:31
* Os lados Sides 5
e 6 foram lançados como "Apple Jam".
Com
All Things Must Pass, George Harrison mostra
seu arsenal de composições guardadas ao longo dos
anos e seu talento. Apesar de ser longo, é forte candidato
a melhor trabalho solo de um ex-Beatle. Isso se não for
mesmo o melhor.
O LP foi aclamado de forma
unânime e teve vendagens excelentes, consolidando Harrison
como um artista singular.
Seu prestígio era
tão grande que, em 1971, fez um dos primeiros concertos
de causa social, The Concert for Bangla Desh,
outro disco triplo, gravado ao vivo, no Madison Square Garden,
em Nova York, e com as presenças de Bob Dylan, Ravi Shankar,
Eric Clapton, Ringo Starr, Billy Preston, Badfinger, Leon Russell,
entre outros.
All
Things Must Pass virou um clássico absoluto e,
30 anos depois, George resolveu fazer uma edição
comemorativa, lançando músicas extras, além
de soltar faixas conhecidas apenas em piratas.
Além disso, pela
primeira vez, deu a lista de todos os músicos que participaram
das gravações originais e um texto belíssimo
falando do processo. Como curiosidade, fica-se sabendo que em
"Art of Dying", a percussão foi feito por um
jovem desconhecido, de apenas 19 anos. Seu nome? Phil Collins.
O CD duplo trazia as seguintes
faixas:
CD1
1. "I'd Have You Anytime"
(George Harrison/Bob Dylan) – 2:56
2. "My Sweet Lord" – 4:38
3. "Wah-Wah" – 5:35
4. "Isn't It a Pity" (Version 1) – 7:09
5. "What Is Life" – 4:22
6. "If Not for You" (Bob Dylan) – 3:29
7. "Behind That Locked Door" – 3:05
8. "Let It Down" – 4:57
9. "Run of the Mill" – 2:49
10. "I Live For You" – 3:35
* A 2000 recording of a previously unreleased track from the 1970
sessions for All Things Must Pass
11. "Beware of Darkness" – 3:19
* An acoustic run-through of the song recorded on 27 May 1970
at the start of the sessions
12. "Let It Down" – 3:54
* An acoustic run-through of the song recorded on 27 May 1970
at the start of the sessions, with a keyboard overdub effected
in 2000
13. "What Is Life" – 4:27
* An early mix of the song's backing track on 9 August 1970 with
piccolo trumpet and oboe
14. "My Sweet Lord (2000)" – 4:57
* A re-working of the original 1970 recording with new overdubs
in 2000, including backing vocal from Sam Brown
CD2
1. "Beware of Darkness"
– 3:48
2. "Apple Scruffs" – 3:04
3. "Ballad of Sir Frankie Crisp (Let It Roll)" –
3:46
4. "Awaiting on You All" – 2:45
5. "All Things Must Pass" – 3:44
6. "I Dig Love" – 4:55
7. "Art Of Dying" – 3:37
8. "Isn't It a Pity" (Version 2) – 4:45
9. "Hear Me Lord" – 5:46
10. "It's Johnny's Birthday" (Based upon "Congratulations"
- Martin/Coulter) – 0:49
11. "Plug Me In" (Jim Gordon/Carl Radle/Bobby Whitlock/Eric
Clapton/Dave Mason/George Harrison) – 3:18
12. "I Remember Jeep" (Ginger Baker/Klaus Voormann/Billy
Preston/Eric Clapton/George Harrison) – 8:07
13. "Thanks for the Pepperoni" (Jim Gordon/Carl Radle/Bobby
Whitlock/Eric Clapton/Dave Mason/George Harrison) – 5:31
14. "Out of the Blue" (Jim Gordon/Carl Radle/Bobby Whitlock/Eric
Clapton/Gary Wright/George Harrison/Jim Price/Bobby Keys/Al Aronowitz)
– 11:16
Eis
a lista de todos os músicos envolvidos nas gravações
originais:
Guitarras: George Harrison,
Eric Clapton, Dave Mason, Peter Frampton
Baixo: Klaus Voorman, Carl Radle
Arranjos de orquestra: John Barham
Teclados: Gary Wright, Bobby Whitlock, Billy Preston, Gary Brooker
Percussão e Bateria: Ringo Starr, Jim Gordon, Alan White,
Phil Collins, Ginger Baker
Gaita - George Harrison(?) (a autoria da gaita tocada em "If
Not for You" e "Apple Scruffs", é desconhecida,
mas o baterista Alan White jura que foram feitas por John Lennon)
Pedal steel guitar (with talk box): Pete Drake
Sax Tenor : Bobby Keys
Trumpet: Jim Price
Guitarra-rítmica e Percussão: Badfinger
Fender Rhodes and backing vocals ("I Live for You")
and ("My Sweet Lord", 2000 version): Dhani Harrison
Tambourine ("My Sweet Lord", 2001 version): Ray Cooper
Vocais adicionais: ("My Sweet Lord", 2001 version):
Sam Brown.
Uma dica final: esse relançamento
de 2001 saiu em edição nacional e é possível
ser encontrada. Corra atrás! Deixo a discografia de George.
Um abraço e até a próxima coluna.
Discografia
Wonderwall Music (1968)
Electronic Sound (1969)
All Things Must Pass (1970)
The Concert For Bangladesh (1971)
Living in the Material World (1973)
Dark Horse (1974) US #4 RIAA: Gold
Extra Texture (Read All About It) (1975)
The Best of George Harrison (1976)
Thirty Three & 1/3 (1976)
George Harrison (1979)
Somewhere in England (1981)
Gone Troppo (1982)
Cloud Nine (1987)
Traveling Wilburys Vol. 1 (1988)
Best of Dark Horse 1976-1989 (1989)
Traveling Wilburys Vol. 3 (1990)
Live In Japan (1992)
Brainwashed (2002)
The Dark Horse Years 1976-1992 (Box, 2004)
|