Mofo: - Há alguma semelhança entre os
Gilbertos e o Fellini ou mesmo o Smack?
Thomas Pappon: - Com o
Fellini, sim, muito. Minha voz e estilo são diferentes
do Cadão e - ao contrário dele - sofro demais
para fazer letras. O Fellini sempre será uma inspiração.
Não podemos esquecer que a nova formação
dos Gilbertos tem um baixista de identidade bem própria,
o Akira.
(capa do primeiro disco, Os Eurosambas 1992-1998)
Mofo: - Fale um pouco do lançamento dos 3 cds,
como você os planejou, lançou, etc...
Thomas Pappon: -
O primeiro álbum é praticamente uma coletânea
de 'singles', de demo tapes que compus ao logo de 6 ou 7 anos,
com a ideia de enviá-las para rádios européias,
cada uma gravada em momentos, cidades, países e condições
distintas.
O segundo é o primeiro álbum propriamente dito,
concebido num mesmo período e mesmo lugar (minha casa
em East Dulwich Londres, onde morava), com um conceito em mente,
de fazer algo meio folk e MPB, tipo Led Zepplin III
combinado com o Clube da Esquina (Milton
Nascimento).
O terceiro é o disco 'raiz', inspirado no rock anos
70 e 80, na São Paulo da minha adolescência, na
Pompéia e na USP. Os dois primeiros são mais eletrônicos,
tem teclados e os ritmos são sampleados ou programados,
fiz tudo sozinho. Eles foram lançados pela midsummer
madness, do querido Rodrigo Lariu. O último tem bateria
de verdade, gravada na garagem de casa (na minha casa atual,
em North Dulwich), e tem o Akira fazendo os baixos. Foi lançado
pela Pisces.
Mofo: - Você grava em lo-fi e continua morando
na Europa. Há shows por aí ou o grupo acaba sendo
um hobby?
Thomas Pappon: -
Hobby total. Só fizemos shows uma única vez, em
julho/agosto de 2011, todos em São Paulo.
(capa
dos discos, Deite-se Ao Meu Lado e À Noite Sonhamos)
Mofo: - Você mistura folk, violões e tem
um clima até bossa nova. Mas ele parece mais ser "culpa"
do canto mais intimista do que sonoro. É isso mesmo?
Thomas Pappon: - Humm,
talvez. Gosto demais do som do violão, pena que não
sei tocar usando palheta, ficaria mais folk, e menos bossa.
O som é bossa por causa disso, por que toco violão
de nylon, estilo samba, e não rock. No último
disco a coisa mudou um pouco, por causa das guitarras. Ficou
um rock-samba mais 'shuffle'.
Mofo: - Nos anos 80, tínhamos ditadura, uma
abertura lenta, mas uma cena independente ativa, forte, e mesmo
não vendendo muito discos, havia espaço. Hoje
temos liberdade, internet, mas a cena independente parece bem
menos consistente do que há 30 anos, com menos casas
interessadas, veiculação zero em AMs e FMs. O
que vc acha que aconteceu?
Thomas Pappon: - Não
sei. Os últimos discos do Fellini (Você
nem Imagina) e dos Gilbertos (À Noite
Sonhamos), ambos do início de 2011, passaram
em brancas nuvens. Ninguém deu bola, nem blogs comentaram,
não tocou em rádio alguma. Fiquei bem chocado,
estava acostumado com alguma forma de feedback, mesmo
que discreta.
Imaginei que os fãs fossem criar um auê, o que
não aconteceu. E são dois discos geniais, cheio
de ideias, molho, rock'n'roll. Ninguém ficou sabendo
que os discos saíram, uma tristeza - depois de todo esse
trampo. Me parece que o interesse do público, mesmo o
'alternativo', depende hoje, basicamente, de clipes virais no
YouTube.
Mofo: - Os 3 discos da banda são extremamente
diferentes de qualquer coisa que se faz por aqui. Você
se sente ligado a alguma cena ou acha que navega só?
Thomas Pappon: - Sou um
tiozinho de 52 anos que fica tocando violão e cantando
em casa, nos fins de semana, compondo e planejando gravações
caseiras. Ouço música, leio livros e quadrinhos
e vejo TV de montão. That's it.
(Akira
e Thomas)
Mofo: - Você pensa em voltar pro Brasil, fincar
raízes e voltar ao meio musical ou isso é utopia?
Thomas Pappon: -
Putz... não penso mais em voltar ao Brasil. Meus filhos
são praticamente ingleses e não quero ficar longe
deles. Mas se tem algo que sinto falta é tocar com banda,
coisa que só faço quando vou ao Brasil. Adoro
o pessoal do Fellini, do Smack, dos Voluntários, são
todos queridos amigos, todos incrivelmente talentosos e gosto
demais de tocar com todos eles.
Mofo: - O que é música para você,
hoje em dia? Qual o espaço dela na sua vida? Com que
regularidade você compõe?
Thomas Pappon: -
Trabalho durante a semana, dou duro lá na BBC, chego
em casa, cozinho pra familia (ouvindo música), todo dia.
No sabado de manhã, passo umas boas duas horas tocando
violão e compondo. Música, cinema e comida (+
maconha e cerveja) são tudo para mim no fim de semana.
Sim, sou um hippie velho que adora música.
Mofo: - Deixe uma mensagem aos fãs.
Thomas Pappon: - Alguém
quer ver o show do Family, em fevereiro, no Sheperds Bush Empire,
comigo?
Discografia
Os Eurosambas 1992-1998 (1999)
Deite-se Ao Meu Lado (2004)
À Noite Sonhamos (2011)