40 - The Gilbertos - entrevista

Aos 52 anos e com passagens pelo Smack, Fellini e Voluntários da Pátria, Thomas Pappon é mais um músico brasileiro que se mudou para a Europa há décadas, onde vive uma vida pacata com a família, o emprego na BBC e ainda mostra dotes de chef. Mas, Thomas não consegue largar a música, especialmente aos sábados quando tira umas horas para escrever novas canções. Longe da badalação e dos velhos amigos, Thomas desenvolve há quase 15 anos um projeto próprio, de nome The Gilbertos com três discos independentes lançados e atualmente com a colaboração do baixista Akira S.


Por isso achei bem interessante entrevistá-lo para falar de seu projeto, infelizmente desconhecido da maioria das pessoas e saber mais detalhes das gravações, shows, gravações, etc.

Saibam ainda que é possível encontrar os CDs em várias lojas, inclusives nas Americanas da vida e a preços bem acessíveis. Assim sendo, conheça um pouco mais da vida de Thomas e dos Gilbertos.

Mofo: - Thomas fale como surgiu a ideia dos Gilbertos? Imagine que seja uma brincadeira com João, Astrud e Gil, não?
Thomas Pappon: - Foi. Queria um nome que desse uma dica do som, pelo menos para o público europeu. Quem ouve a palavra 'Gilberto' aqui pensa na Astrud, no Brasil, em bossa nova...com o 'The' na frente parece meio coisa de conjunto de rock.

Acho que funcionou...o único problema é que muitos acham que fazemos só bossa nova.

Mofo: - Há alguma semelhança entre os Gilbertos e o Fellini ou mesmo o Smack?
Thomas Pappon: -
Com o Fellini, sim, muito. Minha voz e estilo são diferentes do Cadão e - ao contrário dele - sofro demais para fazer letras. O Fellini sempre será uma inspiração. Não podemos esquecer que a nova formação dos Gilbertos tem um baixista de identidade bem própria, o Akira.

(capa do primeiro disco, Os Eurosambas 1992-1998)

Mofo: - Fale um pouco do lançamento dos 3 cds, como você os planejou, lançou, etc...
Thomas Pappon: - O primeiro álbum é praticamente uma coletânea de 'singles', de demo tapes que compus ao logo de 6 ou 7 anos, com a ideia de enviá-las para rádios européias, cada uma gravada em momentos, cidades, países e condições distintas.

O segundo é o primeiro álbum propriamente dito, concebido num mesmo período e mesmo lugar (minha casa em East Dulwich Londres, onde morava), com um conceito em mente, de fazer algo meio folk e MPB, tipo Led Zepplin III combinado com o Clube da Esquina (Milton Nascimento).

O terceiro é o disco 'raiz', inspirado no rock anos 70 e 80, na São Paulo da minha adolescência, na Pompéia e na USP. Os dois primeiros são mais eletrônicos, tem teclados e os ritmos são sampleados ou programados, fiz tudo sozinho. Eles foram lançados pela midsummer madness, do querido Rodrigo Lariu. O último tem bateria de verdade, gravada na garagem de casa (na minha casa atual, em North Dulwich), e tem o Akira fazendo os baixos. Foi lançado pela Pisces.

Mofo: - Você grava em lo-fi e continua morando na Europa. Há shows por aí ou o grupo acaba sendo um hobby?
Thomas Pappon: - Hobby total. Só fizemos shows uma única vez, em julho/agosto de 2011, todos em São Paulo.

(capa dos discos, Deite-se Ao Meu Lado e À Noite Sonhamos)

Mofo: - Você mistura folk, violões e tem um clima até bossa nova. Mas ele parece mais ser "culpa" do canto mais intimista do que sonoro. É isso mesmo?
Thomas Pappon: -
Humm, talvez. Gosto demais do som do violão, pena que não sei tocar usando palheta, ficaria mais folk, e menos bossa. O som é bossa por causa disso, por que toco violão de nylon, estilo samba, e não rock. No último disco a coisa mudou um pouco, por causa das guitarras. Ficou um rock-samba mais 'shuffle'.

Mofo: - Nos anos 80, tínhamos ditadura, uma abertura lenta, mas uma cena independente ativa, forte, e mesmo não vendendo muito discos, havia espaço. Hoje temos liberdade, internet, mas a cena independente parece bem menos consistente do que há 30 anos, com menos casas interessadas, veiculação zero em AMs e FMs. O que vc acha que aconteceu?
Thomas Pappon: -
Não sei. Os últimos discos do Fellini (Você nem Imagina) e dos Gilbertos (À Noite Sonhamos), ambos do início de 2011, passaram em brancas nuvens. Ninguém deu bola, nem blogs comentaram, não tocou em rádio alguma. Fiquei bem chocado, estava acostumado com alguma forma de feedback, mesmo que discreta.

Imaginei que os fãs fossem criar um auê, o que não aconteceu. E são dois discos geniais, cheio de ideias, molho, rock'n'roll. Ninguém ficou sabendo que os discos saíram, uma tristeza - depois de todo esse trampo. Me parece que o interesse do público, mesmo o 'alternativo', depende hoje, basicamente, de clipes virais no YouTube.

Mofo: - Os 3 discos da banda são extremamente diferentes de qualquer coisa que se faz por aqui. Você se sente ligado a alguma cena ou acha que navega só?
Thomas Pappon: -
Sou um tiozinho de 52 anos que fica tocando violão e cantando em casa, nos fins de semana, compondo e planejando gravações caseiras. Ouço música, leio livros e quadrinhos e vejo TV de montão. That's it.

(Akira e Thomas)

Mofo: - Você pensa em voltar pro Brasil, fincar raízes e voltar ao meio musical ou isso é utopia?
Thomas Pappon: - Putz... não penso mais em voltar ao Brasil. Meus filhos são praticamente ingleses e não quero ficar longe deles. Mas se tem algo que sinto falta é tocar com banda, coisa que só faço quando vou ao Brasil. Adoro o pessoal do Fellini, do Smack, dos Voluntários, são todos queridos amigos, todos incrivelmente talentosos e gosto demais de tocar com todos eles.

Mofo: - O que é música para você, hoje em dia? Qual o espaço dela na sua vida? Com que regularidade você compõe?
Thomas Pappon: - Trabalho durante a semana, dou duro lá na BBC, chego em casa, cozinho pra familia (ouvindo música), todo dia. No sabado de manhã, passo umas boas duas horas tocando violão e compondo. Música, cinema e comida (+ maconha e cerveja) são tudo para mim no fim de semana. Sim, sou um hippie velho que adora música.

Mofo: - Deixe uma mensagem aos fãs.
Thomas Pappon: -
Alguém quer ver o show do Family, em fevereiro, no Sheperds Bush Empire, comigo?

Discografia

Os Eurosambas 1992-1998 (1999)
Deite-se Ao Meu Lado (2004)
À Noite Sonhamos (2011)