80 - House of Love


Uma das boas bandas descobertas pelo selo Creation, mas sem a fama de Jesus and Mary Chain, Primal Scream e Oasis, foi o House of Love, que teve seu primeiro disco lançado no Brasil com pouco atraso (um ano). A canção "Christine" até tocou (timidamente) nas rádios. Liderados por Guy Chadwick e fazendo uma belíssima ponte entre Jesus and Mary Chain e Smiths, duraram oito anos e com álbuns antológicos, que estão voltando aos poucos a constar em catálogos (o segundo conhecido como Butterfly, Fontana ou simplesmente House of Love, foi relançado em Junho de 2003). Existem boas opções: três boas coletâneas disponíveis dão um bom apanhado desse grupo. O vinil que saiu aqui até pode ser achado em alguma loja de discos usados e várias de suas músicas estão disponíveis na internet. Continuando a missão de apresentar grupos pouco comentados, um breve resumo do grupo liderado por Guy Chadwick, que perigas voltar em breve. Saiba um pouco da história da banda e não deixe de ouvir.


Guy Chadwick era um garoto que já tinha passado por um grupo chamado Kingdoms quando resolveu tentar a sorte novamente. Os Kingdoms tinham conseguido gravar um single pela RCA e depois morreram. Guy queria mais. Em 1986, no pequeno dormitório que morava em Allingham Street pegou seu violão e mostrou uma nova composição para sua namorada, Suzi Gibbons. A canção se chamava "Christine" e, motivado por ter visto o Jesus and Mary Chain tocarem no Eletric Ballroom, resolveu começar um grupo que batizaria como House of Love, inspirado no livro de Anais Nin, A Spy In the House Of Love.

Guy colocou um anúncio nos classificados da Melody Maker e apareceram Terry Bickers (guitarra), Chris Groothuizen (baixo) e Andrea Heukamp (guitarra e vocal), além do velho amigo Pete Evans (bateria). Com essa formação nascia o House of Love e começaram a ensaiar. De boca em boca foram fazendo fama, principalmente num buraco que Dickie Dirts usava como armazém e que virou o point da região.

Com seus punhados de shows, Guy começou a caçar Alan McGee, responsável pelo selo Creation e pelo lançamento do primeiro álbum do Jesus, banda favorita de Guy à época e mandavam tapes e telefonava sem dar descanso. Alen só mostrou algum interesse pelo grupo quando sua esposa Yvonne tocou "Shine On". Alan gostou do que ouviu e quis assisti-los. Ele foi e continuou e achou o grupo curioso. Agendou um ensaio em um estúdio de Livingstone para a gravação de um single. Em Maio de 1987, lançaram "Shine On" e acabaram saindo em uma excursão junto com o Felt e o Zodiac Mindwarp.


capa do single Shine On Letra de "Shine On":

In a garden in the house of love
Sitting lonely on a plastic chair
The sun is cruel when he hides away
I need a sister - I'll just stay
A little girl, a little guy
In a church or in a school
Little Jesus are you watching me
I'm so young - just eighteen
She, she, she, she Shine On
She, she, she Shine On
She, she, she Shine On
In a garden in a house of love
There's nothing real, just a coat of arms
I'm not the pleasure that I used to be
So young - just eighteen
She, she, she, she Shine On
She, she, she Shine On
She, she, she Shine On
I don't know why I dream this way
The sky is purple and things are right every day
I don't know, it's just this world's so far away
But I won't fight and I won't hate
Well, not today

In a garden in the house of love
Sitting lonely on a plastic chair
The sun is cruel when he hides away
I need a sister - I'll just stay

She, she, she, she Shine On
She, she, she Shine On
She, she, she Shine On
She, she, she, she Shine On
She, she, she Shine On
She, she, she Shine On

She, she, she, she Shine On
She, she, she Shine On
She, she, she Shine On
And on... and on...
Shine...

A segunda canção, "Real Animal" passou em branco, mas mesmo assim manteve a banda na estrada e desta vez com o Mighty Lemon Drops. Guy e Suzi acabaram casando e tendo uma filha chamada Cydney. Em um show no The Town and The Country Club tiveram uma performance considerada devastadora, e Alan finalmente ofereceu um contrato para um disco. O grupo aceitou e o resultado foi uma nova canção, "Christine", a mesma que Guy tocara para Suzi um ano antes em seu quartinho. O disco, batizado apenas com o nome da banda, foi gravado em oito dias. O produtor Pat Collier, que já tivera problema em mixar "Christine" encontrou outros obstáculos por causa do excesso de ácido durante os trabalhos. Mesmo pressionado pelos integrantes, por Alan e por alguns curiosos, Pat terminou e a banda entrou em férias, após quase um ano tocando ao vivo. Em Maio de 1988, "Christine" foi a canção número 1 das paradas independentes e puxou as vendas do disco.

Eis a letra:

capa do single Christine Christine - Still walking at me
Still talking at me
Christine - Such a sense of loss
and the baby cried
Christine
Christine

And the whole world dragged us down
The whole world turned aside

Christine - You're in deep, pristine
With a god-like glow
Christine - Christine - Heart and the glory and me
Chaos and the big sea

Christine - Still walking at me
Still talking at me
Christine
Christine
Christine

And the whole world dragged us down
Not a sonnet not a sound
And the whole world turned aside
The cruelest hand just turned an eye

disco de estréia e que chegou a sair no BrasilO disco vendeu bem por toda a Europa e para capitalizar ainda mais a Creation lançou uma coletânea contendo os dois primeiros compactos e canções inéditas, que também teve ótima vendagem. Guy queria aproveitar o momento e falou para Alan que o próximo compacto deveria ser "Destroy the Heart", que ninguém gostava, por causa de seu ritmo um tanto quanto lento. Guy disse que mudaria então o ritmo dela e no lado B incluiu "Blind", feita para sua namorada e fotógrafa oficial do grupo, Suzi Gibbons. Assim, "Destroy The Heart" acabou sendo o quarto single da banda, que na mesma semana foi capa dos semanários Melody Maker e New Musical Express, que votaram no single como a canção da semana e foi a banda principal do festival da Creation, no Town & Country Club, com 2500 pessoas presentes.

O otimismo em cima do House of Love era tão grande que foram considerados o próximo rival do U2 nas paradas.

A banda virou a coqueluche do momento e disputada à tapa pelos grandes selos, especulando-se que teriam oferecido aos integrantes até 1 milhão de libras para assinarem. No final, foram para a Fontana/Phonogram e por uma soma menor: 400 mil libras. A nova casa queria que o grupo rapidamente entrasse em estúdio para lançarem um novo single. Guy e os integrantes queriam lançar "Safe", uma espécie de "canção perdida", mas Daniel Miller, da Fontana, preferia "Never". A banda ficou mais irritada quando "Safe" tornou-se o lado B, com um outro título, "Soft as Fire". O single foi um fracasso nas paradas, mas a banda conseguia capitalizar o bom momento com grandes apresentações pelo continente europeu.

No verão de 1989, o House decidiu tocar por uma semana seguida na I.C., famosa casa de Londres, tendo o lendário Pere Ubu (logo logo vira coluna...) e os Rainbirds como bandas suportes. Apesar de ótimos elogios, a crítica estava mais interessada na vida mundana que alguns dos músicos começava a ter, com fartas fofocas de porres, drogas, desperdício de dinheiro e destruição dos equipamentos. A banda estava atingindo um auge e fama de insuportáveis nas gravações, contratando e demitindo produtores, entrando e saindo de estúdios, aumentando a tensão entre o selo e os músicos.


Após muita briga, decidiram regravar o segundo disco quase pronto e que teve quatro produtores diferentes, e lançaram mais um single, "I Don't Know Why I Love You", em Novembro de 1989. Mais uma vez a canção fracassou nas paradas. Para aplacar a raiva da Fontana, saíram novamente excursionando. E o grupo acabou sofrendo um racha quando Guy e Terry começaram a trocar insultos via imprensa e Terry foi demitido. Simon Walker, que tocava no Dave Howard Singers, foi chamado às pressas, já que tinham um show marcado para o dia 4 de Dezembro, em Portsmouth. Foi aprovado e ficou sendo membro fixo.

Adentraram 1990 regravando "Shine On", que teve maciça execução.

capa do disco House of Love lançado pela FontanaLogo depois sai o segundo disco, também chamado House of Love, mas que ficou conhecido por Fontana (para diferenciar o feito pela Creation) ou como Butterfly, já que tinha uma borboleta. Pé na estrada, por toda a Europa e pela América e uma excentricidade: o novo single "Beatles and The Stones" foi lançado em 10 formatos diferentes. O vídeo teria o grupo vestido iguais aos dois grupos, uma idéia vetada pelos próprios músicos. A gravadora queria lançar "Shake and Crawl" como novo single e o House queria que fosse "Sigh", que nunca chegou a ser gravada.

Apesar das disputas com a Fontana, concordaram em lançar um disco com lados B e canções nunca lançadas das sessões feitas em 1989. Nascia então Spy in the House of Love, curiosamente o nome do livro que Guy havia se inspirado para montar o grupo.

Já que um disco com músicas inéditas não saía, apesar da pressão dos fãs, mídia e da Fontana, resolveram promover mais três shows em Londres: ULU, Town & Country Club e London's Boston Arms, sem repetir o set list.

Quase um ano sem passara sem nenhuma nova canção feita e lançada, até que saiu "The Girl With the Loneliest Eyes", em 1991, que naufragou nas paradas. A banda era tida como datada e tola, especialmente na América que assistia, impávida, o nascimento do grunge, capitaneados pelo Nirvana e ainda haviam os rumores que a gravadora não estava mais distribuindo o single nas principais lojas, procurando uma maneira de despedirem o grupo.

Tentando escapar de toda a confusão, a banda se mudou para Eel Pie Studios, para começarem um disco novo, levando consigo Warne Livesey, co-autor de várias canções. Após três semanas de trabalho perdido, Guy começou a ficar desesperado, mas na quarta semana a banda finalmente conseguiu sair com novas melodias: "Cruel", "Burn Down The World", "High" e "Feel". Essa última, aliás, tinha sido lançada como single seis meses antes, mas sequer alcançou o Top 40. Na pressa escolheram "You Don't Understand", que esperavam chamar a atenção, como nova música de trabalho, mas ela falhou miseravelmente. Novamente.

capa de Babe RainbowBabe Rainbow foi o nome do rebento. Lançado em 1992, com uma capa pintada por um dos artistas pop art mais importantes dos anos 60, Peter Blake, e lançado quase dois e anos meio do disco anterior, ficou pouquíssimo tempo entre os mais vendidos, apesar de boas críticas. Simon Walker havia saído e fora substituído por outro Simon, Mawby, que havia tocado com Jimmy Sommerville. Mas Mawby foi muito pouco (ou quase nada) visto com a banda. O grupo voltou de novo a colocar o pé na estrada, desta vez com o Ocean Colour Scene e Catherine Wheel.

Enquanto o disco naufragava em vendagem por ser considerado "muito limpo", Guy e o grupo tocavam maciçamente para tentar fazer a grana que o disco não conseguia.

Em Janeiro de 1993, o grupo (agora um trio) voltou a gravar. Guy, Pete Evans e Chris Groothuizen conseguiram juntar doze canções inéditas e gravaram e mixaram o disco em oito dias, como nos velhos tempos, pela módica quantia de 40 mil libras. As canções agora tinham os três como co-autores, além de uma antiga querida de Guy chamada "Into The Tunnel", escrita anos e anos atrás. A maioria das músicas foi escrita durante a tour norte-americana. O grupo fez uma viagem rápida viagem para a França para algumas apresentações e quando retornaram Pete anunciou que iria deixar o House of Love e abandonar a música.

Audience With Mind foi lançado em Junho sem muita promoção, sem excursão e nenhum single. Parecia uma espécie de despedida de todos e não apenas de Pete. Era o fim do grupo.

Em Agosto de 1994, os fã-clubes receberam uma carta de Guy falando de sua nova banda. O grupo se chamava The Madonnnas, e tinha Guy nos vocais e guitarra, Bob Bradley na outra guitarra Marcus Williams no baixo e David Ruffs, na bateria. Bob e Marcus haviam tocado no The Blue Aeroplanes e David, no Ruts. Guy passou parte do ano separando e escolhendo canções, mas no final acabou usando material que tinha escrito quando estava no House of Love. Os Madonnas fizeram sua estréia ao vivo no The Splash Club no London's Kings Cross, no dia 1º de Setembro, abrindo para o Cranberries, que ironicamente já tinha sido banda suporte do House of Love.

Depois dos Madonnas, Guy tentou a sorte na Bélgica com uma banda chamada Eyedreams, em um auto-exílio na Bélgica, em 96, com Kurt na outra guitarra, Didier e Marc. Um show aconteceria no dia 13 de Dezembro, em Bruxelas. Guy daria uma entrevista para uma emissora de rádio e faria uma pequena apresentação acústica. "Eyedreams", "What's My Line" e a querida "Shine On" eram as canções escolhidas, mas acabaram tocando canções, mais uma vez, do House: "Shine On", "Girl With The Loneliest Eyes" e "Cruel".

Frustrado com as duas bandas, resolveu voltar para Londres, desesperado para gravar algo realente novo. E optou pela carreira-solo. Seu primeiro lançamento pós-House foi um EP, em Novembro de 1997, This Strength e o disco Lazy, Soft & Slow, em Fevereiro do ano seguinte.

capa do Best OfNeste mesmo ano, escolheu o repertório da coletânea House of Love - Best Of, quinze canções preferidas de sua ex-banda. Tanto a coletânea como o álbum das sessões realizadas no programa do DJ da BBC, John Peel, entre 1988 e 1989, foram solenemente ignorados. O sol só voltou a brilhar em 2001, após a coletânea lançada pela Creation, que recebeu ótimas críticas e fez reativar a amizade e parceria de vez com Simon Walker, já que os dois haviam excursionado por um tempo pelo Japão em 1998 .

Guy voltou também a tocar com Terry Bickers e até chegaram a fazer alguns shows com o nome House of Love novamente, chamando Pete Evans (que desistiu do anonimato) e com novo baixista, Matt Jury. Será que voltarão a gravar? Alguns juram que sim. Com qual nome ninguém sabe. Apenas que brevemente mais algumas canções de Guy Chadwick serão apresentadas. O homem que conseguiu um mix de Jesus com Smiths, avisa que ainda não desistiu. É esperar para ouvir, e se possível, ver.
Até mais!

Discografia

*The House of Love (1987)
The House of Love (1988)
The House of Love (ou Fontana ou Butterfly, 1990)
The Spy in The House of Love (1990)
Babe Rainbow (1992)
Audience With Mind (1993)
The House of Love - Best Of (1998)
John Peel Sessions 1988 - 1989 (2000)
The House of Love 1986 - 1988 The Creation Recordings (2001)

*lançado pela Creation em 1987 como coletânea de singles, não é considerado um disco de carreira. Foi relançado pela Rough Trade. O vinil contém as duas versões originais de "Shine On" e "Real Animal", além de "Welt" and "The Hedonist." Já a versão em CD possui "On the Hill" e "Loneliness Is a Gun".

 




 

Colunas