018 – U2 – Live Under a Blood Red Sky

Eles foram a banda mais aclamada dos anos 80, capa da Time, mérito que apenas Beatles e Who haviam conseguido. Foram também um dos mais bombásticos shows ao vivo na década passada. Deixaram na memória, apresentações memoráveis como o do Live Aid. E boa parte desse fogo ficou registrado no disco Live Under a Blood Red Sky, de 83, lançado após War. Foi a turnê chave da banda na América, quando sendimentaram seu nome e começaram a fazer fama e dinheiro com sua música de protesto. Hoje, o U2 aparece em Fantástico, e vendem horrores no Brasil. Mas nem sempre foi assim. Houve um período, em que eram apenas mais um nome desconhecido do grande público e sonho secreto de muitos para que tocassem no país. U2, a maior banda dos anos 80 e Live Under a Blood Red Sky, o disco que mais ouvi em toda minha vida.


Ok, vamos começar falando do passado bem distante, mais ou menos 1984, 1985. Nessa época, U2 no Brasil era uma novidade, e que estava pouco disponível. Me lembro de dois especiais, um na Globo e um na Bandeirantes, do mesmo show, um feito na Alemanha, em 84. Eu tinha um colega que em todas as suas capas de caderno riscava o nome U2 e desenhava a bandeira da Irlanda. Eu não sabia muito bem o que era aquilo. Ele acabou me contando que era uma banda de rock que tinha ouvido na casa de um primo, no Rio de Janeiro, e que tinha ficado apaixonado.

Eu virei 84, sem comprar nenhum disco da banda. A coisa só começou a pegar forma no meio de 85, um ano trágico na minha vida. Meu avô tinha morrido, eu havia tomado pau no segundo colegial. Fui curtir férias no Guarujá, com duas fitinhas de 46 minutos: uma com o disco Under a Blood Red Sky e metade de The Unforgettable Fire, e outra com o resto de Fire mais RPM.

Era o começo de 86, e na volta, paramos em São Paulo, onde comprei mais um disco do U2: War. Eram todos os três que tinham saído no Brasil, na época. Já convertido ao U2, eu ouvia os três discos sem parar e tentava decorar as letras e procurar as que não tinham nos encartes.

Meu disco de cabeceira era Under a Blood Red Sky, o mini LP de oito faixas e pouco mais de 30 minutos. Até hoje tenho duas cópias em vinil guardadas, e bem gastas, posso garantir.

O disco começa com “Gloria”, uma música de fortes ligações religiosas. Me lembro do clip dessa música, com a banda tocando em uma balsa, no meio de um rio, em Dublin.

A segunda canção é “11 O’Clock Tick Tock”, uma música dos primórdios do U2 e que nunca saiu em disco de estúdio, só em compactos, ainda pela CBS irlandesa, quando eram conhecidos como U-2.

A terceira canção é a enérgica “I Will Follow”, que Bono conta que se lembra de sua mãe, pois é uma canção sobre morte. Ele a perdeu na adolescência. Uma das canções mais fortes do grupo e tocada até hoje.

Outra canção inédita em vinil, disponível apenas em compacto, é “Party Girl”. Conta a estória de uma festa de garotos, e clima que The Edge coloca apenas no violão acústico é maravilhoso. Não é à toa que no meio da canção, Bono grita, “Guitar hero!” O herói da guitarra era Edge, de quem Bono é o maior fã confesso.

O lado B abre com o clássico absoluto, “Sunday Bloody Sunday”. Se na versão de estúdio de War, a canção era lenta, aqui ganha um punch incrível e excita as pessoas a um nível absurdo. No meio da canção, Bono sempre empunhava uma bandeira branca e berrava No More! (pedia não mais guerras).

Mal saiu da energia de Sunday, o ouvinte já é puxado para “The Electric Co.” uma composição de Boy, primeiro LP do grupo. O final da música com Edge ensandecido é maravilhoso. Vale lembrar que Adam Clayton no baixo e Larry Mullen na bateria seguram todas e não deixam o clima abaixar um segundo sequer.

“New Year’s Day” é a prova das qualidades de Edge, que fica entre o piano e a guitarra. A letra, uma homenagem ao sindicato Solidariedade, da Polônia, ajuda muito a animar o espetáculo.

O disco chega ao fim (já?) com “40”, uma canção em que Edge e Adam costumavam trocar de instrumentos, por diversão e terminava com um solo de bateria de Larry acompanhado por um coral de vozes da platéia.

O vídeo é ainda mais forte. Começa com a banda entrando no palco, todos de mangas curtas, sob um frio enorme. Vão desfilando clássicos e levam a audiência ao êxtase.

O anfiteatro possui duas tochas acesas no alto e o grupo vai tocando praticamente todas as músicas de seu repertório. Eu me lembro de ver esse vídeo n vezes, emprestado de um colega, enquanto estava com o pé quebrado. E o mais gozado foi o acidente que provoquei, ao tropeçar na hora de tirar a fita e sem querer gravar Os Flintstones em cima durante segundos. Eu queria morrer de vergonha.

Essa mesma fita tinha um clip raríssimo de “Two Hearts Beat As One”, gravado em Paris, e outros clips como “A Sort of Homecoming” e “Bad”.

Anos depois, comprei a fita do show e dei para meu colega que havia perdido a dita. Foi uma forma de retribuir o tempo em que fiquei com ela, numa época em que eu costumava escrever U2 nas minhas calças jeans e por todos meus livros e cadernos escolares.

Ainda hoje, adoro essa primeira fase da banda, que vai até Rattle and Hum (88). Vira e mexe quando posso, compro um compacto desse período só para minha coleção. Nos anos 90, já foram outra banda, mais eletrônica, menos visceral em palco, menos contudentes.

Eles alegaram que tinham virado uma caricatura de si mesmos, que já eram gozados pelo que representavam. Mas se você puder assistir os vídeos Under a Blood Red SkyThe Unforgettable Fire, ou até mesmo a participação da banda no Live Aid, saberá do que estou dizendo.

Tentaram voltar aos bons tempos com o último álbum, mas pouco conseguiram. O grande e vigoroso U2 dos anos 80, virou uma banda de baladinhas e canções mais suaves nos 90. As letras continuam engajadas e fortes, mas o som parece que voou para outra dimensão. Deve ser a idade, agora que todos beiram os 40 anos. Mas era muito bom ver a banda empunhando a bandeira branca em “Sunday Bloody Sunday”, tirar uma garota para dançar em “11 O’Clock” e distribuir rosas durante “Bad”.

O messiânico e falastrão Bono continua lá, assim como o gentleman Adam, o discreto Larry e o eficientíssimo Edge. São hoje a maior banda do planeta, multimilionários, vieram ao Brasil duas vezes, fizeram especial para a Globo, foram simpáticos, deram uma baita entrevista.

Mas vendo a banda hoje em um especial no Multishow, mostrando toda a carreira, especialmente no começo, dá saudade de quando eram apenas um sonho de alguns aqui no Brasil. Eu me lembro que saía correndo para a TV toda vez que um clip da banda era tocado e que emprestava meus singles importados para o pessoal de Ribeirão tocarem nas pistas de dança.

Eu era mais novo, odiava a escola, e consumia menos cds. Ouvia os discos até quase furarem. Eram bons tempos.

Under a Blood Red Sky foi com certeza o mais ouvido em toda minha vida. E um dos mais queridos da minha coleção.

Essa coluna é dedicada ao meu colega de Ribeirão Preto, Gustavo de Almeida e Silva, o dono dos cadernos e que me fez gostar não só de U2, mas como Smiths, Cure, Echo, entre outros. Abração!

Fiquem com a letra de Sunday Bloody Sunday. Bom Final de Ano. Até 2001!

I can’t believe the news today,
I can’t close my eyes and make it go away.
How long, how long must we sing this song?
How long? Tonight we can be as one.
Broken bottles under children’s feet,
Bodies strewn across a dead end street,
But I won’t heed the battle call,
It puts my back up, puts my back up against the wall.

Sunday, bloody Sunday.
Sunday, bloody Sunday.

And the battle’s just begun,
There’s many lost, but tell me who has won?
The trenches dug within our hearts,
And mothers, children, brothers, sisters torn apart.

Sunday, bloody Sunday.
Sunday, bloody Sunday.

How long, how long must we sing this song?
How long, Tonight we can be as one.
Tonight, tonight.

Sunday, bloody Sunday.
Sunday, bloody Sunday.

Wipe the tears from your eyes,
Wipe your tears away,
Wipe your blood shot eyes.

Sunday, bloody Sunday.
Sunday, bloody Sunday.

And it’s true we are immune.
When fact is fiction and T.V. is reality,
And today the millions cry,
We eat and drink while tomorrow they die.
The real battle just begun.
To claim the victory Jesus won,
On a Sunday bloody Sunday,
Sunday bloody Sunday.

Traduzindo ficaria assim:

Eu não posso acreditar nas notícias de hoje
Eu não posso fechar os olhos e ir em frente
Por quanto tempo, quanto tempo, cantaremos essa canção?
Quanto tempo? Esta noite podemos ser apenas um
Garrafas quebradas sob os pés das crianças
Corpos estendidos em uma rua sem saída
Mas eu não irei atender ao chamado de batalha
Que coloca minhas costas, colocas minhas costas contra a parede

Domingo, sangrento, domingo
Domingo, sangrento, domingo

E a batalha apenas começou
Há muitos perdedores, mas me diga quem venceu?
As trincheiras cavadas em nossos corações,
E mães, crianças, irmãos, irmãs, separados

Domingo, sangrento, domingo
Domingo, sangrento, domingo

Por quanto tempo, quanto tempo, cantaremos essa canção?
Quanto tempo? Esta noite podemos ser apenas um
Esta noite, esta noite

Domingo, sangrento, domingo
Domingo, sangrento, domingo

Tire suas lágrimas dos seus olhos
Seque suas lágrimas
Seque seus olhos injetados de sangue

Domingo, sangrento, domingo
Domingo, sangrento, domingo

E a verdade é imune
Quando os fatos são ficção e a TV é a realidade
E hoje milhões choram
Nós comemos e bebemos, enquanto amanhã eles morrem
A batalha real já começou
Para consagrar a vitória de Jesus
Em um Domingo, sangrento, domingo
Domingo, sangrento, domingo