050 – Television – Marquee Moon

Nova York está em alta, pelo menos na coluna. Depois de Patti Smith, Velvet e Lou Reed, é a vez de uma importantíssima banda, porém pouco conhecida por aqui: Television. Liderado pelo guitarrista e vocalista Tom Verlaine, a banda teve uma fulgaz trajetória: dois discos de estúdio (Marque Moon e Adventure), um póstumo ao vivo (The Blow-Up, com uma precária qualidade de som, mas que saiu – milagrosamente – recentemente no Brasil, com um preço bem acessível e remasterizado). Voltaram nos anos 90 para lançar um disco intitulado apenas como Television e sumiram novamente. Nos anos 80, apenas Tom teve uma carreira-solo melhor sucedida. Mesmo com pouco tempo de vida e curta discografia, deixaram um registro mais do que respeitável no rock: Marquee Moon, um dos maiores clássicos da era pré-punk (se quiserem chamar assim).



Tom Miller era um jovem com 18 anos, quando deixou a pequena Delaware e veio para Nova York, em agosto de 1968. Aquele garoto disperso, arredio, (que sonhava em ser músico clássico e poeta, amava o free jazz – em especial John Coltrane – , acabou querendo ser músico de rock após ouvir “19th Nervous Breakdown”, dos Rolling Stones) chegou a ser votado como a figura mais inexpressiva de sua escola na adolescência, pela seu isolamento e distanciamento dos demais. Resolvendo deixar a pequena cidade, mudou-se para a “Big Apple”, sonhando em virar músico. Seu plano era encontrar um amigo de infância que já estava na cidade desde o ano anterior: Richards Myers.

Myers e Tom já tinham uma longa e antiga amizade. Durante a adolescência os dois fugiram de Delaware, mas acabaram presos em Alabama, após provocarem um incêndio. Apesar de não se bicarem no começo, acabaram-se inseparáveis, apesar das diferenças de personalidades: Tom era quieto, arredio, e Myers, niilista, briguento, drogado, e pode ser considerado realmente um dos primeiros punks da América.

Ao desembarcar na cidade, Tom foi trabalhar em uma loja que vendia filmes chamada Cinemabilia, onde já estava seu velho amigo. Com a entrada de Billy Ficca na bateria, montaram a banda Neon Boys em 1971. O grupo durou pouco, pois Billy foi para Boston durante algum tempo, antes de voltar para ser membro oficial do Television.

Com a banda desfeita, Tom começou a fazer alguns shows na cidade, tocando sua guitarra e declamando suas poesias. Myers era seu melhor amigo e iam muitas vezes assistir shows pela cidade, e em especial os New York Dolls, banda preferida do baixista. Os dois garotos começaram a trabalhar juntos e chamaram a atenção de Terry Ork, gerente da loja e que resolveu ajudá-los. Os dois procuravam um segundo guitarrista e foi Ork que os apresentou a um garoto que chamava a atenção não só por seu estilo de tocar, mas também pela aparência: Richard Lloyd.

Tom começa a adotar o sobrenome Verlaine, em homenagem a um de seus poetas preferidos e Richard muda o nome Myers por Hell.

“Terry trabalhava na Factory de Andy (Warhol) e eu estava procurando um lugar para morar. Nós nos conhecemos no Max’s Kansas City e ele me ofereceu um quarto. Ele sabia que Tom procurava mais um guitarrista e começou a falar de mim, que a princípio não se empolgou. Eles eram ainda os Neon Boys e tinham até colocado um anúncio na Creem Magazine com os seguintes dizeres: “procura-se um guitarrista-base. Não é necessário ter talento”. Dee Dee Ramone e Chris Stein foram os primeiros a aparecer, mas acabaram não sendo aprovados.

“Eu me lembro que após audição com o grupo, Tom ficou irritado com a minha inabilidade de executar os acordes que eu pedia. Ele e Richard eram muito sérios e eu não era bom o suficiente para a banda. Acabei sendo dispensado”, lembra Dee Dee.

Depois do insucesso, Terry voltou à carga para que Tom aceitasse Lloyd. Ele ofereceu seu apartamento para que ensaiasse e prometia comprar amplificadores e custeá-los até que pudessem se apresentar, mas com a condição de que Lloyd entrasse na banda. O acordo foi fechado. Apesar do acordo, os primeiros problemas começaram a aparecer: Terry era viciado em heroína e Lloyd ia pelo mesmo caminho. Hell também caiu de boca nas drogas. O único que não se aventurava era Tom, que começou a se irritar com a influência de Terry. Lloyd começou a ter sérios problemas coma heroína e chegou a ser várias vezes internado devido ao vício, a ponto de ser submetido a tratamento com choques.

Mesmo com todos esses problemas, e com a volta de Billy estava formado o Television. O nome veio de uma ironia de Hell e Verlaine que diziam que era uma coisa que estava em todos os lares americanos. Após muito ensaio, Verlaine e Lloyd começaram a procuram desesperadamente um lugar para se apresentarem. Acabaram topando com Hilly Kristal, dono de um clube chamado CBGB e que abrigava qualquer tipo de som. No dia 2 de março de 1974 fizeram a primeira apresentação na casa que ficaria marcada como a meca do movimento punk em Nova York.

Uma das pessoas mais assíduas da casa era Patti Smith, então uma poetisa de prestígio no circuito literário da cidade. Ela se encantou com Tom e com sua maneira de tocar guitarra: “a guitarra dele reproduz o mesmo som de mil pássaros berrando”. Rapidamente iniciou-se um flerte entre os dois. O caso entre Tom e Patti começou a irritar Hell. Além de discutirem várias vezes no palco, Richard sentia-se em segundo plano na vida de Verlaine.

Terry Ork, que havia montado um pequeno selo e lançado o primeiro compacto do Television no dia 19 de agosto de 1975 (“Little Johnny Jewel”), sabia que Patti negociava um contrato com a Arista Records para lançar seu primeiro álbum (Horses) e organizou quatro shows conjuntos entre as duas bandas no CBGB, de quinta a domingo, durante algumas semanas. Entusiasmado com o sucesso, Kristal desistiu de fazer o CBGB ser uma casa de vários estilos musicais e abraçou a nova cena da cidade.

“O CBGB foi especial. Ela o local onde tudo acontecia e as bandas queriam se apresentar. Mas nós éramos únicos. Eu tinha certeza que éramos o melhor grupo do planeta, pelo menos nos nossos primeiros cincos meses.”

Mesmo estando na “melhor banda do mundo”, Hell acabou sendo expulso por Verlaine do grupo. Tom argumentara que não aguentava mais os excessos do companheiro, que não praticava e só queria ficar bebendo durante os ensaios. Hell argumentara que Tom havia virado um monstro e que começara a limar todas suas composições, lentamente.

“Me lembro que em um ensaio, Tom começou a desprezar as minha canções, até sobrar apenas “Blank Generation” (que acabou virando um clássico no disco de Hell com sua banda Voidoids). Eu já estava irritado e ele me chamou e disse que essa canção também estava fora do repertório. Olhei para a cara dele, puto da vida, e começamos a brigar. Ele me chamava de irresponsável e drogado, e eu argumentava que estava virando um egocêntrico, um verdadeiro pé-no-saco. Não havia mais como ficarmos juntos”.

Para o lugar de Hell, foi chamado Fred Smith. Com essa formação, em julho de 1976, a banda assina com a gravadora Elektra, e em fevereiro de 1977, lança o primeiro disco Marquee Moon.

Considerado o disco mais importante da “era CBGB”, depois de HorsesMarquee Moon foi aclamado pelo mundo todo. Além das letras peculiares de Verlaine, o grupo entusiasmava pela sonoridade das guitarras, que criavam uma coesão pouco vista anteriormente.

Apesar de ser um dos expoentes dos grupos punks da América, o som do Television era radicalmente diferente, por exemplo, de seus colegas Ramones. Enquanto os Ramones insistiam em riffs básicos e canções curtas, Verlaine e Lloyd produziam canções complexas e longas e com letras diferentes.

Um mês após o lançamento foram convidados para abrirem a turnê norte-americana de Peter Gabriel. Em maio, fizeram shows com ingressos esgotados pela Inglaterra e foram eleitos como a banda mais promissora pela Melody Maker e o melhor disco pela Sound. O sucesso chegara ao grupo. Após dua semanas de lançamento o disco pulara da 81ª posição nas paradas inglesa para a sétima.

Após o sucesso, Tom ficou empolgado e tentou fazer um segundo disco mais elaborado. Apesar de boas críticas Adventure não empolgou tanto quanto o antecessor e logo em seguida a banda acabaria. Verlaine e Lloyd começaram então carreiras-solos nos anos 80, até uma volta nos anos 90.

Vale ainda checar Blank Generation, primeiro disco de Richard Hell com os Voidoids e que virou também um clássico do gênero e que ainda vai virar tema de mais uma coluna.

Fiquem com a letra da clássica faixa-titulo. Um abraço a todos!

Marque Moon

I remember
how the darkness doubled
I recall
lightning struck itself.
I was listening
listening to the rain
I was hearing
hearing something else.

Life in the hive puckered up my night,
the kiss of death, the embrace of life.
Ooh! There I stand neath the Marquee Moon
Just waiting,
Hesitating…
I ain’t waiting

I spoke to a man
down at the tracks.
I asked him
how he don’t go mad.
He said “Look here junior, don’t you be so happy.
And for Heaven’s sake, don’t you be so sad.”

Well a Cadillac
it pulled out of the graveyard.
Pulled up to me
all they said get in.
Then the Cadillac
it puttered back into the graveyard.
And me,
I got out again

Discografia

Marquee Moon (1977)
Adventure (1978)
The Blow-Up (1980)
Television (1992)
Live at the Old Waldorf (2003)