066 – Aztec Camera – High Land, Hard Rain

Roddy Frame tem bons antecedentes. Afinal, nasceu na pequena cidade escocesa de East Kilbride, mesmo lar dos irmãos Jim e William Reid do Jesus and Mary Chain. Mas diferente dos barulhentos conterrâneos, Roddy é um especialista em forjar lindas melodias. Com 18 anos, lançou este disco pelo pequeno selo Rough Trade (que depois ficaria mundialmente famoso por ser o lar dos Smiths). Um disco delicado, com arranjos pops e até umas levadas de bossa. No Brasil, seu grande sucesso foi uma versão de “Jump” (isso mesmo, aquela canção do Van Halen!) que saiu no disco Knife, produzido por Mark Knopfler do Dire Straits. E o mais incrível é que essa faixa está apenas na edição brasileira, pois lá fora foi editada como single. Mas foi com High Land, Hard Rain que Roddy e o Aztec Camera marcaram os anos 80. Um daqueles clássicos subestimados que valem a pena ser conhecidos.


Aztec Camera é basicamente a banda de Roddy Frame. É ele que comanda, escreve e lidera o grupo que ainda continua e lançou seu último álbum em 2002. A banda foi formada na cidade de Glasgow, Escócia, em janeiro de 1980.

Roddy, então com 16 anos, convidou o baterista David Mulholland e o baixista Alan Welsh para fazerem algumas apresentações na cidade e em Edimburgo. Alan não durou muito tempo e seis meses depois entrava Campbell Owens no seu lugar. Em dezembro do mesmo ano conseguiram um contrato com um pequeno selo chamado Postcard, que já havia contratado uma outra banda promissora: Orange Juice.

Já em janeiro do ano seguinte lançam o primeiro single Just Like Gold, que é bem recebido nas paradas independentes. Roddy começa a mostrar que não gosta de trabalhar com músicos fixos e no próximo single “Mattress of Wire” convoca o baterista do Orange Juice, Stephen Daly para gravar. A canção é bem recebida assim como a anterior e começa um rodízio imenso de músicos dentro do Aztec, especialmente os bateristas.

Em 1982, Roddy decide procurar uma gravadora maior para gravar um LP, já que possuía material próprio suficiente. Acaba conseguindo assinar com a Rough Trade. E mais uma vez recruta novos músicos: David Ruffy (ex-Ruts) fica na bateria e Bernie Clark assume os teclados e também a produção do álbum, ao lado de John Brand. Assim nasce High Land, Hard Rain, lançado em maio de 1983. É editado um single nos Estados Unidos e dois na Inglaterra e o grupo promove sua primeira excursão. Acabam chamando a atenção de Elvis Costello, que os convida para abrir suas apresentações em uma viagem de oito semanas aos Estados Unidos.


Apesar do sucesso do álbum, que possuía uma sonoridade incomum (pitadas de jazz, rock e bossa), Roddy confessa que seu primeiro grande espelho era o esquizo Mark Smith, do The Fall: “eu estava naquela fase de extrema inocência, achava que não podia chegar perto de garotas, era contra drogas, bebidas, tudo isso. E muitas das letras de Mark falavam disso e eu as adorava. Ele era tão cínico que muitas vezes pensava que ele deveria se matar, já que ele não tinha outra opção. Isso me assustava e fascinava e tentei ser mais otimista.” Outras fortes influências foram o Velvet Underground e Bob Dylan.

Roddy desde cedo odiou ser chamado de prodígio: “Eu me irritava com essa coisa de garoto prodígio pelo simples fato que não me sentia tão jovem. E Glasgow tem essa mentalidade provinciana. Muitas vezes quando ia tocar em bares, alguns iam mais para ver um garoto sem barba na cara do que pela música.”

Nessa época, o movimento punk explodia e Roddy começava a escrever suas primeiras canções. “A melhor coisa do punk foi que todo mundo estava em pé de igualdade e que havia um grande estímulo para que cada um produzisse e escrevesse suas próprias canções. Acho que essa foi a maior contribuição do movimento.”

Suas letras já eram elaboradas e ele começou a ser taxado de visionário: “Sempre achei que tudo pode melhorar. Há sempre um lugar melhor e não acho que as pessoas precisem ficar entediadas. Eu me entediava na escola e quando saí de lá fui muito mais feliz e descobri o prazer de ler”. O escritor favorito era Sartre, especialmente o livro A Idade da Razão.

Embora apostasse em um lado mais otimista, suas canções não eram ingênuas. “We Could Send Letters”, uma das melhores canções dos primeiros discos mostra o nível que o garoto de 18 anos atingiu: “Você disse que é livre e para mim isso é tudo/Você diz que é livre para me empurrar e eu livre para cair/Você tem minha confiança e eu seu endereço/E agora a única chance que temos é esperar que ninguém mais faça isso virar realidade… Feche seus olhos novamente/Até as coisas melhorarem e você descobrir/Então os quatro anos não significarão nada para mim quando eu estiver sufocado e feliz vendo você sangrar… Você nunca estará longe, mas poderemos enviar cartas”.

Tamanha complexidade fez Roddy ser comparado a Ian Curtis e “We Could Send Letters” ser considerado uma irmã de “Love Will Tear Us Apart”.

Sua postura tímida com as garotas e seu jeito introvertido acabaram criando uma imagem de que o Aztec seria uma banda por demais “feminina”. Roddy não se incomoda com isso: “Acho realmente que temos um pouco disto. Acabou virando uma piada com os meus amigos, porque todos gostam de ficar bebendo cerveja em East Kilbride. Eu odeio esportes e futebol! Mas nunca me achei gay. Sou apenas um cara romântico.”

Roddy também mostrou ser um cara ambicioso ao abandonar a Rough Trade e assinar com a Warner para a gravação do segundo disco: “O problema da Rough é que eles não consegue ultrapassar certos limites, apesar de Geoff Travis ser uma das melhores pessoas nesse meio que já conheci. A Warner é diferente, eles te dão um suporte maior e passam uma grande confiança. Apesar disso, eu mantenho contato com Geoff que me ajudou muito quando lancei “Oblivious”. Todo mundo fala que não sonha com o sucesso. Isso é besteira! Você faz uma música e não espera ser reconhecido com ela? É claro que há muita porcaria na parada de sucessos, mas não é motivo para você não tentar. Eu assisto o “Top of The Pops” como qualquer pessoa. Por que não ver?”

Roddy conta que o solo de guitarra em “We Could Send Letters” é a melhor coisa que já fez: “Não me acho um grande guitarrista, mas adoro o som da guitarra nesta canção. Eu tentei fazer um estilo meio Neil Young, meio Tom Verlaine, uma coisa meia amarga, porque a letra não é alegre, é sarcástica. Não me acho um guitarrista convencional, não vejo necessidade de tantos solos ou velocidade em um canção. Às vezes uma guitarra alta acaba com uma boa música.”

Esse garoto, que amava bandas como Can e Faust, confessa ser apaixonado pelos hippies: “Eu sou um hippie, sabia? Gosto de muitas coisas deles, exceto o abuso das drogas, porque afeta meu ritmo. Quando componho prefiro estar controlado e concentrado. Eu tento escrever para outras pessoas e quero que gostem, mas tento manter um padrão elevado, já que acredito que meu público espere isso de mim. Eu me preocupo muito com que os outros achem de minhas letras. Elas são extremamente pessoais. Eu tentava evitar deixar transparecer minhas emoções, mas percebi que é uma bobagem esconder isso.”

Ao deixar a Rough Trade e assinar com a Warner, a gravadora chamou ninguém menos que Mark Knopfler para produzir Knife. Apesar de ser um bom disco, ficou muito distante do brilhantismo do LP de estréia. Uma das razões pode ser o uso maior de guitarras ou por Mark ter intimidado o jovem Roddy em estúdio, já que o Dire Straits era uma das bandas de maior vendagem pelo mundo. Mesmo assim vale uma conferida.

Um último detalhe: Kevin Armstrong participou em 1989 do disco de estréia do Tin Machine, banda criada e liderada por David Bowie, que recebeu pauladas de todo mundo. Uma injustiça, pois é um belíssimo disco de rock. Mas um dia falarei mais desse trabalho.

Fiquem com a letra de “Oblivious”, o primeiro grande sucesso do grupo. Até mais!

Oblivious

From the mountain tops to the sunny street
A different drum is playing a different kind of beat
It’s like a mystery that never ends,
I see you crying and I want to kill your friends

I hear your footsteps in the street,
It won’t be long before we meet,
It’s obivious
Just count me in and count me out and
I’ll be waiting for the shout,
Oblivious…

Met Mo and she’s okay, said no-one really changed
Got different badges but they wear them just the same
But down by the ballroom I recognised that flaming fountain
in those kindred caring eyes

I hear your footsteps in the street,
It won’t be long before we meet,
It’s obivious
Just count me in and count me out and
I’ll be waiting for the shout,
Oblivious…

I hope it haunts me ‘til I’m hopeless,
I hope it hits you when you go,
And sometimes on the edge of sleeping
It rises up to let me know it’s not so deep,
I’m not so slow

I hear your footsteps in the street,
It won’t be long before we meet,
It’s obivious
Just count me in and count me out and
I’ll be waiting for the shout,
Oblivious…

They’re calling all the shots, they’ll can and say
they phoned,
They’ll call us lonely when we’re really just alone.
And like a funny film, it’s kinda cute
They’ve bought the bullets and there’s no-one left to shoot

I hear your footsteps in the street,
It won’t be long before we meet,
It’s obivious
Just count me in and count me out and
I’ll be waiting for the shout,
Oblivious…

Discografia

High Land, Hard Rain (1983)
Knife (1984)
Aztec Camera (1985)
Love (1987)
Stray (1990)
Dreamland (1993)
Live on The Test rec. 1983 (1995)
Frestonia (1995)
The North Star (1998)
The Best of Aztec Camera (1999)
Surf (2002)