400 – The Flying Burrito Brothers

Entre os vários “tesouros escondidos do rock”, o Flying Burrito Brothers – um dos nomes mais exóticos de uma banda! – é um desses achados que poucos sabem, falam ou ouvem, mas que, ao fazer, acabam apaixonados. A grande estrela era Gram Parsons, um sujeito meio místico, meio maluco, um excepecional guitarrista que havia tocado nos Byrds e grande chapa do stone Keith Richards, a quem ensinou os truques da country music. Parsons morreu cedo no Joshua Tree National Monument Park, aquele mesmo que inspirou o U2 a fazer o disco mais importante de sua carreira e que mudaria para sempre a vida do quarteto irlandês.


Uma coluna especial e tão adiada, a de número 400. Era para ter sido publicada em abril ou maio, mas fui adiando por inúmeros problemas e assim só agora, no final de setembro, é que vê a luz. E, portanto, vamos deixar de adiá-la mais uma vez…

A história da banda começa com dois membros dos Byrds e que haviam deixado o grupo após o disco Notorious Byrd Brothers, em 1968, o guitarrista e vocalista David Crosby e o baterista Michael Clarke.

Os Byrds eram formados então apenas por Roger McGuinn e Chris Hillman e colocaram o primo de Hillman, Kevin Kelley, na bateria, e começaram a tocar como trio.

Mas aquele trio praticamente emulava o velho som dos Byrds, algo que não queriam. O grupo era empresariado por Larry Spector, o mesmo de Gram Parsons, um jovem músico que Hillman já tinha ouvido falar de suas duas bandas de nomes estranhos: The International Submarine Band e Flying Burrito Brothers (que acabaria inspirado o título Notorious Byrd Brothers).

Gram Parsons (nascido Cecil Ingram Connor III, no dia 5 de novembro de 1946, em Winter Haven, Flórida) e era uma figura carismática e, apesar de jovem, com grande talento e bagage musical.

Após um encontro entre ele e Hillman, resolveu aceitar o convite para integrar os Byrds. Junto ao trio McGuinn, Hillman e Kelley, lançaram o estupendo Sweetheart of the Rodeo, considerado o marco zero do country-rock, superando em seis meses outro clássico do gênero, Nashville Skyline, de Bob Dylan.

Na verdade, costumam dizer que o marco zero do estilo seria Safe at Home, do The International Submarine Band, ex-banda de Parsons. Mas como os Byrds eram muito mais importantes e famosos, adota-se esse álbum como o começo de tudo.

Apesar do fracasso comercial, o disco deu novas dimensões à carreira de Parsons. McGuinn sonhava em fazer um álbum duplo em que contasse a história da música norte-americana, começando pelo country e passando pelo bluegrass, rock and jazz rock até terminar com sintetizadores da moderna “space music”.

Parsons era um músico talentoso, a ponto de tocar órgão, piano, violão e cantar e começou a levar o grupo a outros ritmos.

Hillman admite que foi ele quem o ensinou a ouvir soul e r&b, algo que era estranho para Chris, pois havia sido criado ouvindo country e western.

Apesar de tanto talento, Gram era uma pessoa difícil, e logo começou a fazer exigências demais, como mais dinheiro e pensava – ousadia máxima – demitir o líder Roger McGuinn do grupo. Ou começar um novo grupo.

Ao mesmo tempo, foi processado por Lee Hazlewood, da gravadora LHI, por quem havia lançado Safe at Home, com The International Submarine Band. Lee argumentava que Parsons tinha contrato com ele e ameaçava processar a CBS também.

Para evitar uma longa disputa judicial, Roger McGuinn ia gravando os vocais que cabiam à Gram no disco, até chegarem um acordo, com Lee ficando com os direitos de nome e das músicas do ex-grupo.

A banda tinha uma excursão para a África do Sul agendada, mas Parsons se negou a ir, devido aos problemas raciais. Irritados, McGuinn e Hillman o demitiram.

Na verdade, Parsons havia conhecido os Rolling Stones duraram a turnê britânica e se tornado grande amigo de Keith Richards, que acabou tornando-se seu “aluno” e aprendendo alguns truques de como tocar country e western.

Antes de ser expulso dos Byrds, Parsons havia tocado com Hillman, Clarence White, Gene Parsons e Gib Guilbeau, onde sonhavam em montar um grupo que tocaria “country music com atitude rock’n’roll”.

Fizeram alguns ensaios com Clarence White, Gene Parsons e Gib Guilbeau. Mas Hillman acabou ficando irritado com Parsons pela saída surpreendente dos Byds.

Após retornar de Londres, Parsons reativou o Flying Burrito Brothers, nome criado pelo baixista Ian Dunlop, colega dos tempos do Submarine Band.

Parsons se uniu ao baixista Chris Ethridge e começaram a tocar de forma descompromissada. Os dois chamaram Clarence White, Gene Parsons para integrarem o novo grupo, mas estes preferiram entrar nos Byrds.

Assim, Parsons convida Sneaky Pete Kleinow, para a steel guitar, um músico conhecido e que havia trabalhado com Parsons e com o Byrds.

Hillman logo saiu dos Byrds e era natural que ele e Gram começassem novos planos juntos. Começaram a trabalhar em Nova York, mas logo decidiram mudar de ares e foram para San Francisco e alugaram uma casa no Vale de San Fernando.

Começaria o período mais produtivo na vida de Hillman, segundo o próprio: “aqueles dias com Parsons foram os que mais produzi em toda minha vida. Estava saindo de um divórcio e nós dois dividimos uma casa. Apesar de não termos um baterista fixo, trabalhávamos feito loucos, junto com Chris Ethridge e Sneaky Pete.”

Foi nesse período que nasceu “Christine’s Tune (Devil in Disguise),” “Wheels,” “Juanita,” e “Sin City,” (esta uma resposta ao empresário Larry Spector).

A banda rapidamente chamou a atenção de vários selos e, no final de 1968, assinam com a A&M e lançam The Gilded Palace of Sin.

Com quatro bateristas convidados – Jon Corneal: (faixas 1, 3, 4, 5, 7); Popeye Phillips: (faixas 8, 9, 11); Eddie Hoh: (faixas 2, 10) e Sam Goldstein: (faixa 6), o álbum surpreende por trazer covers de grandes canções da soul music, tocadas com uma roupagem totalmente diferente.

O álbum trazia as seguintes faixas:

Lado 1

1. “Christine’s Tune” (Parsons, Hillman) – 3:04
2. “Sin City” (Parsons, Hillman) – 4:11
3. “Do Right Woman” (Chips Moman, Dan Penn) – 3:56
4. “Dark End Of The Street” (Chips Moman, Penn) – 3:58
5. “My Uncle” (Parsons, Hillman) – 2:37

Lado 2

1. “Wheels” (Hillman, Parsons) – 3:04
2. “Juanita” (Hillman, Parsons) – 2:31
3. “Hot Burrito #1” (Ethridge, Parsons) – 3:40
4. “Hot Burrito #2” (Ethridge, Parsons) – 3:19
5. “Do You Know How It Feels” (Parsons, Barry Goldberg) – 2:09
6. “Hippie Boy” (Hillman, Parsons) – 4:55

Logo após o lançamento, o ex-baterista dos Byrds, Michael Clarke resolve se juntar ao combo, acabando com o drama de não terem um baterista.

Usando paletós psicodélicos (onde eram desenhadas folhas de maconha, mulheres nuas e pílulas), a banda tocava em todos os lugares possíveis, fazendo shows até em prisões. E invariavelmente eram presos por algum motivo ligado às bebidas e drogas.

Parsons resolveu ir a um alfaiate e pediu que fizessem ternos no estilo das bandas soul, iguais para todos. O grupo saiu em uma turnê pelo país de trem, já que Parsons tinha verdadeiro pavor de voar. Essas viagens, regadas a muito pôquer e cigarros de maconha, inspiraram a escreverem “The Train Song”.

Nesse mesmo ano Chris Ethridge deixa o grupo, entrando Bernie Leadon na segunda guitarra, indo Chris Hillman para o baixo. O que poderia ser um novo período de intensa criatividade começa a ser abortada justamente por Parsons. Cada vez mais próximos dos Stones, passa mais tempo ouvindo os mixes de Let It Bleed, novo álbum do quintento londrino, do que as novas canções de sua banda.

“Se o primeiro disco foi feito em um clima de intensa camaradagem, comprometimento e muita dedicação, o segundo foi feito sem nenhum coração. Parsons e eu começávamos a ir por caminhos diferentes”, lembra Hillman.

Ainda assim, é editado o segundo LP, Burrito Deluxe, em 1970.

Nesse disco, uma novidade: Parsons havia se apaixonado por uma canção dos Stones e que ainda não havia sido gravado por eles: “Wild Horses”.

Como Keith devia muito a Gram por aprender a tocar violão, cedeu-a. Na verdade, Keith queria que Sneaky adicionasse alguma steel guitar na faixa, mas acabou sendo convencido por Gram a deixar gravá-la. No ano seguinte, ela seria gravada pelos Stones no extraordinário LP Sticky Fingers e seria um dos maiores clássicos do grupo.

O disco trazia as seguintes faixas:

Lado A

1. “Lazy Days” (Gram Parsons) – 3:03
2. “Image of Me” (Harlan Howard, Wayne Kemp) – 3:21
3. “High Fashion Queen” (Chris Hillman, Parsons) – 2:09
4. “If You Gotta Go, Go Now” (Bob Dylan) – 1:52
5. “Man in the Fog” (Bernie Leadon, Parsons) – 2:32
6. “Farther Along” (J.R.Baxter, W.B.Stevens) – 4:02

Lado B

1. “Older Guys” (Hillman, Leadon, Parsons) – 2:31
2. “Cody, Cody” (Hillman, Leadon, Parsons) – 2:46
3. “God’s Own Singer” (Leadon) – 2:08
4. “Down in the Churchyard” (Hillman, Parsons) – 2:22
5. “Wild Horses” (Mick Jagger, Keith Richards) – 6:26

Além do pouco interesse de Gram, ele começava a ter sérios problemas com as drogas e o álbum deu considerável prejuízo à A&M, que haqvia cedido aos pedidos de Hillman para contratar o produtor Jim Dickinson.

A amizade com os Stones permaneciam em alta, e os Burritos chegaram a participar do fatídico show de Altamont, onde os Rolling Stones quase tiveram a carreira enterrada, em 1969.

Em 1971 lançam um novo disco, The Flying Burrito Brothers, mas com uma triste novidade: Gram Parsons havia deixado o grupo que fundara.

Com problemas cada vez maiores com as drogas e com os companheiros, Parsons resolve sair em carreira-solo, acabando com qualquer carisma possível.

O grupo traz o desconhecido Rick Roberts para o lugar do ex-líder e tinha as seguintes faixas:

Lado A

1. “White Line Fever” (Merle Haggard) – 3:16
2. “Colorado” (Rick Roberts) – 4:52
3. “Hand to Mouth” (Rick Roberts, Chris Hillman) – 3:44
4. “Tried So Hard” (Gene Clark) – 3:08
5. “Just Can’t Be” (Rick Roberts, Chris Hillman) – 4:58

Lado B

6. “To Ramona” (Bob Dylan) – 3:40
7. “Four Days of Rain” (Rick Roberts) – 3:39
8. “Can’t You Hear Me Calling” (Rick Roberts, Chris Hillman) – 2:23
9. “All Alone” (Rick Roberts/Chris Hillman) – 3:33
10. “Why Are You Crying” (Rick Roberts) – 3:02

O Flying continuaria até 1976, com várias formações, mas teria seu “sepultamento” com a morte de Gram no dia 19 de setembro de 1973. Ele havia se registrado um dia antes no hotel Joshua Tree Inn, no quarto 8, perto do Joshua Tree National Monument, um local a pouco mais de duas horas de Los Angeles e que ele adorava ir para descansar e fugir das pressões.

Parsons adorava o local onde podia se drogar à vontade, perto dos cactus enquanto procurava discos-voadores no céu.

Esteve presente várias vezes por lá, com Chris Hillman, Keith Richards ou mesmo sozinho. Sua morte até hoje é envolta em mistério e com eventos não muito bem esclarecidos.

Seu corpo acabou sumindo no Aeroporto Internacional de Loas Angeles, onde estava sendo pronto para enviarem até Louisiana para ser enterrado. Parsons havia pedido para ser cremado em Joshua Tree e que suas cinzas fossem espalhadas por Cap Rock. Ao invés disso, seu padastro ordenou que fosse enterrado em New Orleans, em uma cerimônia particular e sem presença de ninguém do meio musical, apenas os familiares.

O corpo havia sido roubado por Phil Kaufman e um amigo, que queriam realizar o último pedido do amigo. Eles foram até Joshua Tree e tentaram cremá-lo com cinco galões de gasolina e abriram o caixão e jogaram um fósforo dentro. Acabaram provocando uma imensa bola de fogo. Os dois fugiram, mas acabaram sendo presos anos depois.

Como não havia uma lei específica que falasse de roubos de cadáveres, foram apenas multados em US$ 700 e não foram processados por deixarem cerca de 15 kgs de fuligens de Gram no deserto.

Os Burrito lançaram ainda mais dois discos – Flying Again e Airbone – e estavam meio esquecidos.

Mas, em 2000, foi editada uma excelente compilação contendo os três primeiros LPs do grupos e mais oito faixas não incluídas: Hot Burritos! The Flying Burrito Brothers Anthology 1969-1972, disco que tenho e aconselho a adquirirem.

Deixo vocês com a discografia do grupo. Um abraço e até a próxima coluna.

Discografia

The Gilded Palace of Sin (1969)
Burrito Deluxe (1970)
The Flying Burrito Brothers (1971)
Flying Again (1975)
Airborne (1976)
Hearts on the Line (1981)
Sunset Sundown (1982)
Eye of a Hurricane (1994)
California Jukebox (1997)
Honky Tonkin’ aka Sons of the Golden West (1999)

Discos ao vivo

Last of the Red Hot Burritos (1973)
Sin City (1976)
Flying Burrito Brothers ’76 (1976)
From Another Time (1976)
Close Encounters to the West Coast (1978)
Live from Tokyo (1979)
Hollywood Nights 1979-82 (1983)
Cabin Fever (1985)
Live from Europe (1986)
Gram Parsons Archives Vol.1: Live at the Avalon Ballroom 1969 (2007)

Coletâneas

Close Up the Honky Tonks (1974)
Sleepless Nights (1976)
Farther Along: The Best of the Flying Burrito Brothers (A&M) (1988)
Best of the Flying Burrito Brothers (Relix Records) (1995)
The Gilded Palace of Sin & Burrito Deluxe (A&M) (1997)
Hot Burritos! The Flying Burrito Brothers Anthology 1969-1972 (2000)
Sin City: The Very Best of the Flying Burrito Brothers (2002)