407 – Lou Reed – Coney Island Baby

Não era fácil ser Lou Reed no meio da década de 70. Responsável por “transformar uma geração inteira em ‘bichas viciadas'” no célebre cartaz criado pela Creem Magazine (foto que abre a matéria), Lou estava no limbo após obrigar a RCA a lançar o fiasco Metal Machine Music, álbum duplo que quase quebrou o selo e destruiu sua reputação dentro da casa, Lou tinha as mãos amarradas quando entrou novamente em estúdio, com orçamento limitado. O resultado? outra obra-prima.


“Em 1975, eu estava sendo processado por um empresário e seu irmão produtor. Tinha lançado um disco chamado Metal Machine Music que havia tido um incrível número de devoluções e foi tirado do mercado em três semanas. Eu não tinha dinheiro e nem guitarra. Os roadies haviam levado os instrumentos por falta de pagamento. Eu estava devendo para todo mundo, inclusive para o sindicato dos músicos. A RCA me colocou em um hotel enquanto decidiam o meu futuro.”

Essa era a vida de Lou Reed contada por ele mesmo no encarte do CD de Coney Island Baby. O homem que foi imortalizado pela Creem Magazine e considerado o “culpado” por mudar toda uma geração de jovens americanos, estava falido e perto de comer merda, literalmente.

Realmente não era fácil ser Lou Reed naqueles dias.

Segundo Lou, no mesmo encarte, “meu amigo Ken Glancy, era presidente da companhia e um bonre homem, de caráter. Ele me perguntou se eu poderia prometer que não faria um Filho de Metal Machine Music. Eu disse que, sim, claro, afinal eu estava em apuros e o pesadelo de que pudesse traí-los me assolava. Assim, Ken me colocou no Gramercy Park Hotel. A Rolling Thunder Revue estava lá, pronta para ganhar a estrada. Mas meu trovão estava mudo. Eu não estava a indo a lugar algum que não fosse a advogados, ao sindicato dos músicos e a contadores que tentavam me tirar da enorme enrascada que havia me metido. Eu estava indo ao tribunal porque não pagava meus impostos há cinco anos. Então, um dia Ken Glancy me ligou e disse ‘ok, escolha um estúdio, vá a um estúdio e faça um disco de rock’. E eu fiz.”

Assim, durante 10 dias, Lou gravou o disco no Mediasound, entre 18 e 28 de outubro, dividindo a produção com Godfrey Diamond.

Lou se cercou de vários amigos, entre eles, Doug Yule, o último guitarrista do Velvet Underground e que ficou vampirizando o grupo após a saída de Lou. As participações de Doug, no entanto, só apareceram na edição de 30 anos, em CD, nas faixas bônus.

É impressionante que tendo pouco tempo para gravar e com a grana contada possa ter inspirado Lou a fazer um grande álbum.

Na verdade, era mais do que um ótimo disco que estava em jogo. Lou flertava com não apenas sua carreira, como sua própria vida. Ele sabia que jamais teria outra chance se estragasse essa.

Metal Machine Music havia se tornado um pesadelo. Um disco duplo cheio de feedbacks e ruídos e que Lou vendera com uma verdadeira obra de arte para a gravadora. As críticas negativas e os problemas com as devoluções haviam deixado o selo em péssimos lençóis, financeiramente falando.

Para complicar, o “padrinho” de Lou no selo, David Bowie, também tinha várias pendências financeiras com a RCA e não podia fazer muito para auxiliá-lo.

Bowie, aliás, causou outra enorme crise quando lançou Low, em janeiro de 1977, para ódio dos executivos, que o chamavam de Metal Machine Music II, embora o disco de David fosse bem mais palatável, ainda que metade das faixas fossem instrumentais.

Assim, com pouca grana e gente, Lou se encarregou das guitarras e pianos e teve os seguintes músicos envolvidos nas gravações:

Bob Kulick – guitarra
Bruce Yaw – baixo acústico e baixo elétrico
Michael Suchorsky – bateria
Joanne Vent, Michael Wendroff, Godfrey Diamond – background vocals
Doug Yule – baixo nas faixas bônus tracks 2, 4-6, guitarra nas faixas bônus 4-6
Bob Meday – bateria nas faixas bônus 2, 4-6
Michael Fonfara – teclados nas faixas bônus 2, 4-6

Com uma bela fotografia do venerado Mick Rock, Coney Island Baby, foi lançado em dezembro de 1975 e chegou ao 41º posto, em fevereiro de 1976, uma boa colocação.

O LP trazia as seguintes faixas:

Lado A

1. “Crazy Feeling” 2:56
2. “Charley’s Girl” 2:36
3. “She’s My Best Friend” 6:00
4. “Kicks” 6:06

Lado B

1. “A Gift” 3:47
2 . “Ooohhh Baby” 3:45
3 . “Nobody’s Business” 3:41
4 . “Coney Island Baby” 6:36

Ao ser editado em CD, em 2006, trazia as seguintes faixas bônus:

1. “Nowhere at All” 3:17 recorded November 18 & 21, 1975 at Mediasound Studios, NYC

2. “Downtown Dirt” 4:18 recorded January 3 & 4, 1975 at Electric Lady Studios, NYC

3. “Leave Me Alone” 5:35 recorded October 19 & 20, 1975 at Mediasound Studios, NYC

4. “Crazy Feeling” 2:39 recorded January 3 & 4, 1975 at Electric Lady Studios, NYC

5. “She’s My Best Friend” 4:08 recorded January 4, 1975 at Electric Lady Studios, NYC

6. “Coney Island Baby” 5:41 recorded January 6, 1975 at Electric Lady Studios, NYC

Lou mostrava-se ainda um grande compositor. Utilizando uma antiga canção do Velvet – “She’s My Best Friend” – do terceiro disco da banda (The Velvet Underground, de 1969), Lou escreveu outras boas composições e mostrava um lado bem rock e despojado.

Seria um retorno seguro ao selo e ao mundo do rock, que mesmo tendo disco irregulares e outros bons, solidificaria de vez sua carreira.

Mas isso é papo para outro dia. Um abraço e até a próxima coluna.

Discografia

Lou Reed (1972)
Transformer (1972)
Berlin (1973)
Rock ‘n’ Roll Animal (1974)
Sally Can’t Dance (1974)
Lou Reed Live (1975)
Metal Machine Music (1975)
Walk on the Wild Side & Other Hits* (1975)
Coney Island Baby (1975)
Rock and Roll Heart (1976)
Walk on the Wild Side: The Best of Lou Reed* (1977)
Live: Take No Prisoners (1978)
Street Hassle (1978)
The Bells (1979)
Vicious* (1979)
Rock and Roll Diary: 1967-1980* (1980)
Growing Up in Public (1980)
Rock & Roll Today (1980)
The Blue Mask (1982)
I Can’t Stand It* (1982)
Rock Galaxy* (1983)
Legendary Hearts (1983)
Live in Italy (1984)
New Sensations (1984)
City Lights (Classic Performances By Lou Reed)* (1985)
Mistrial (1986)
New York Superstar* (1986)
Wild Child* (1987)
New York (1989)
Retro* (1989)
Songs for Drella (1990)
Magic and Loss (1992)
Between Thought and Expression: The Lou Reed Anthology* (1992)
A Retrospective* (1993)
Very Best of Lou Reed & Velvet Underground* (1995)
The Best of Lou Reed & the Velvet Underground* (1995)
Different Times: Lou Reed in the ’70s* (1996)
Set the Twilight Reeling (1996)
Live in Concert (1997)
Perfect Day* (1997)
Perfect Night: Live in London (1998)
The Definitive Collection* (1999)
Very Best of Lou Reed* (2000)
Ecstasy (2000)
American Poet (2001)
The Wild Side: Best of Lou Reed* (2001)
Golden Collection* (2002)
Legendary* (2002)
NYC Man: The Ultimate Lou Reed Collection*(2003)
The Raven (2003)
The Platinum & Gold Collection* (2004)
NYC Man: Greatest Hits* (2004)
Le Bataclan ’72 (2004)
Animal Serendade (2004)
Hudson River Wind Meditations (2007)

* coletâneas