003 – Fabio Golfetti & Violeta de Outono

Fabio Golfetti é líder do Violeta de Outono, a banda paulistana mais cultuada. Amante de anos 60, principalmente do grupo Gong, é hoje aos 40 anos um músico maduro e extremamente simpático.

 


O Violeta de Outono nunca fui uma banda de vender milhões. Desde sua aparição, se tornou a banda mais cultuada do rock paulistano.

Seu fiel público sempre esteve presente em qualquer lugar. Nos anos 80, publicaram dois discos por um selo grande (Plug, um braço voltado para o rock brasileiro, da antiga RCA) e um independente, pela cultuada loja Wop-Bop. Há também pela mesma Wob Bop um flexidisc solo de Fabio e uma fita cassete chamada Early Years.

Mas falar em Violeta é falar em Fabio Golfetti. Fabio é hoje uma pessoa tranquila, que continua a tocar com a banda.

Aos 40 anos, vive hoje basicamente como representante comercial da gravadora Voiceprint, selo que também distribui os cds do Violeta. Um cara de fala mansa, extremamente simpático e de uma humildade cativante.

Para fazer uma entrevista de uma hora, fiz tudo o que não se deve fazer. Ao invés de ir até a casa do entrevistado, ele veio até a minha. Um copo de água depois, tirou se sua sacola um cd com demos do novo disco e contou todas as etapas de criação do Violeta, até os futuros projetos.

Mofo – Fale um pouco do começo da carreira do Violeta. Em que anos vocês se juntaram, a proposta da banda.
Fabio Golfetti –
A banda começou a se juntar em 82, 83. Mas eu comecei a tocar em 79, com um grupo chamado Ultimato. Era meio jazz rock, meio psicodélico, meio Frank Zappa. Em 82, eu conheci o Guilherme Isnard, que nessa época estava saindo do Voluntários de Prata. Nós queríamos uma banda pop, e fundamos o Zero. Conseguimos um compacto na CBS (Heróis), mas a banda acabou implodindo depois de um ano. Cada um foi para o seu canto. O Zero continuou com o Guilherme e eu e o baterista, Claudio, saímos e formamos o Violeta de Outono.

Mofo – E como surgiu o Violeta?
Fabio Golfetti –
Bem, o Violeta já existia na época do Zero. A nossa idéia era fazer o nosso som de origem, tipo Beatles, psicodélico. Como tínhamos pouca experiência, voltamos a fazer um som mais simples, para aprender realmente a tocar. O Angelo apareceu porque era um amigo meu de infância. Ele tocava violão. Falei para que aprendesse a tocar baixo. Ficamos um ano ensaiando, de 84 até 85. Esse foi o nosso período mais fértil, quando montamos o nosso conceito sonoro.

Mofo – Vocês falaram no início que eram grandes fãs do Echo and The Bunnymen. É verdade?
Fabio Golfetti
– Nós éramos ligados muito nos anos 60 e 70. O Echo parecia uma banda dos anos 60, que tinha sido congelada até os anos 80. Eles tinham uma essência sessentista e sofisticação com detalhes do anos 80, como reverberação, produção típica dos grupos daquela época. O único problema é que eles tinham aquela melancolia, que ficou uma coisa meio datada. Hoje o Ian McCulloch canta bem diferente de como cantava naquela época.

Mofo – Me explique como apareceu o René Ferri da Wop-Bop. Como a loja inaugurou o selo?
Fabio Golfetti
– Eu não sei como o René apareceu no Violeta. Eu era cliente dele desde 1975. Lá por 85, 86, nós estávamos começando a conversar com a Baratos Afins, que estava montando seu selo. Aí o René quis fazer um brinde para os clientes, com uma banda nova. Ele gostava muito de bandas dos anos 60 e viu na gente um som similar. Nós tínhamos uma proposta para entrar no projeto Não São Paulo, da Baratos e o René veio com uma proposta de disco só nosso, com três músicas e uma capa do nosso jeito. Aceitamos.

Mofo – O que aconteceu com a crítica que elogiou o EP e depois falou mal do primeiro disco que saiu pela Plug?
Fabio Golfetti
– Acho isso gozado. O primeiro teve aquela coisa de ser um brinde, de uma banda diferente, da loja mais “cult’’ de São Paulo. Embora seja mal gravado, toda a nossa essência de som estava lá. O que aconteceu com o disco da Plug foi que faltou experiência para nós em termos de produção. Nós queríamos fazer a coisa do nosso jeito e acabou sendo muito tímida, ficamos com muitos dedos. Foi culpa nossa. E com isso perdemos o impacto da novidade e como o resultado não foi tão inovador quanto o EP, surgiram algumas críticas não tão boas. A nossa primeira foi na BIZZ, feito pelo Celso Pucci, não foi muito elogiosa. Anos depois, quando o disco foi relançado, ele mudou de idéia e elogiou.

Mofo – Vocês quase tiveram uma coisa em TV da Globo não foi?
Fabio Golfetti –
É, era para entrar “Outono”, mas não quisemos. O Violeta sempre segurou o sucesso, achávamos que o som nosso, não iria fazer sucesso com o grande público e perderíamos nossa audiência cult.

Mofo – Quanto venderam os dois discos do selo Plug?
Fabio Golfetti
– O primeiro vendeu 25 mil cópias e o Em Toda Parte, 15 mil.

Mofo – Uma curiosidade: por que grandes bandas dos anos 80, como vocês, RPM, Ira! e Ultraje a Rigor saíram de cena das grandes gravadoras?
Fabio Golfetti
– Eu não sei dizer, mas tomando pelo nosso exemplo, o Violeta nunca acabou. Fizemos um disco independente, foi elogiado. O segundo a crítica não gostou. Quando fizemos o terceiro, em 89, achávamos que ia ser um sucessos nas rádios, mas tivemos muitos problemas na produção e acabamos perdendo um pouco o tesão. Em 89 também começamos a perder espaço para tocar. Muitas bandas não queriam se sujeitar a tocar em lugares menores, a regredir. E também tinha o problema que muitas vezes a química dos músicos vai acabando. A banda começou a ressurgir em 93, na festa da 89 FM. O show foi um sucesso, e vi que mantínhamos o público.

Mofo – Você vai tocar no novo disco do Ira!, que foi gravado ao vivo?
Fabio Golfetti
– Eu toquei com eles em quatro músicas.

Mofo – Vocês sempre mantiveram seu público não?
Fabio Golfetti
– Tem uma história gozada. Em 94, nós estávamos fazendo um show do projeto Invisible Opera e o baterista era o Claudio. Mas os shows estavam sempre vazios. Resolvi fazer uma coisa diferente em um show de quarta-feira. Ao invés de escrever Invisible Opera no cartaz, chamei o Angelo e pus o nome Violeta de Outono. Lotou o Centro Cultural, tinha gente saindo pelo ladrão. Eu não acreditava que tínhamos esse público ainda. Comecei a bater na porta da RCA e pedi para relançar os discos. Falei com eles em outubro e o disco saiu em junho do ano seguinte. A RCA foi super legal, organizou uma entrevista coletiva para nós. Nós oferecemos um novo disco para eles, mas eles acabaram não querendo. Foi uma pena, porque o Mulher na Montanha tinha música para tocar em rádios.

Mofo – É verdade que o primeiro EP está sendo relançado em CD?
Fabio Golfetti
– É, vai sair por um selo independente e vamos vender no nosso site. Vão sair as três músicas, o flexidisc e mais uns 40 minutos de músicas inéditas.

Mofo – Do que você vive hoje?
Fabio Golfetti
– Eu tinha uma web desgin, mas fui aos poucos me desligando disso e hoje só trabalho com a Voiceprint (selo de discos da Inglaterra, especializado em psicodélicos e folk inglês).

Mofo – Vocês nunca pensaram em cantar inglês e tentar uma carreira no exterior?
Fabio Golfetti
– O que acontece é que seríamos apenas uma banda a mais. Mas eu tenho um projeto que quero lançar nessa linha. Tenho gravado o último show com a formação original do Violeta, em 98. O que gostaria de fazer é manter as bases ao vivo, trabalhar o resto em estúdio e cantar em inglês. Eu já comecei a fazer isso. Mas eu não tenho muita intenção em conquistar um público lá fora, até porque eu já atingi isso um pouco com o Invisible Opera, que só foi lançado no exterior e também porque já toquei com o Gong. Eu estou satisfeito com isso.

Mofo – Vocês tiveram aquele lance de tiete nos anos 80? Fabio Golfetti – Não muito, porque o Violeta nunca mostrou muito a cara. Às vezes era reconhecido em um restaurante, mas nunca fui na rua.

Mofo – Como entraram o Sandro e o Gregor no grupo?
Fabio Golfetti
– O Sandro gostava muito do Violeta, ia a shows e mandava cartas para a nossa caixa postal. Ele quis lançar uma coletânea e queria uma música do Violeta e eu dei a ele. Um dia, surgiu uma possibilidade tocarmos em um lugar. Depois do show de 98, o nosso último, o Angelo e o Claudio não queriam tocar mais de gente nenhum. Então resolvi agitar uma banda. Nisso, fui convidado para tocar na MTV, no Lado B. O Claudio e o Angelo não apareceram e acabei tocando com dois funcionários da casa. No programa começaram a me perguntar se o Violeta iria voltar. Convidei o Sandro para tocar baixo. Ele acabou trazendo o Gregor. Três ensaios depois, o nosso som estava pronto. Já tinham aprendido as músicas. E é uma coisa gozada, porque o Sandro tem dez anos a menos do que eu, e o Gregor tem dez anos a menos que o Sandro. E hoje estamos nos apresentando bastante, porque o Sandro e o Gregor topam tocar em condições mais simples e isso é importante para mim porque sou músico e ainda acredito na música.

Mofo – Musicalmente o que mudou com a entrada dos novos integrantes? Eu me lembro que no show do Centro Cultural o Sandro tocava com um baixo Rickenbacker e o Angelo fez uma participação com um baixo Fender e o som ficou muito diferente.
Fabio Golfetti
– É, o que acontece que o som do baixo Fender Precision é mais gordo do que o Rickenbacker, que é um baixo para ser mais desenhando, floreando, enquanto o Angelo toca mais “’gordo’’. Mas basta mudar um integrante entrar para mudar todo o som. O que mais ficou distinto foi a bateria. O Gregor é muito diferente do Claudio, ele é mais dinâmico. O Claudio é mais fechado nos anos 80, mais desenhado, não tão improvisado. O Gregor é mais selvagem, mais quebrado.

Mofo – Vai ter um trabalho novo?
Fabio Golfetti
– Eu quero juntar 10 músicas novas e tocar com o Sandro e Gregor. Perto de março espero lançar um novo trabalho.

Mofo – É difícil ganhar dinheiro com o Violeta?
Fabio Golfetti –
É. Vou fazer uma comparação – se eu vender 1000 cds independentes, eu ganho mais do que 20 mil cds de uma gravadora. Para começar você ganhar alguma grana, precisa vender 100 mil cópias. E precisa tocar nas rádios. Aí você começa a fazer shows, mas o pessoal não tem muito dinheiro. Você não pode cobrar muito para as apresentações ao vivo. Não dá muito dinheiro, não.

Mofo – O público de vocês é o mesmo dos anos 80 ou está revitalizado?
Fabio Golfetti
– Tem muita gente de 16, 17 anos que nunca tinha visto o Violeta antes e hoje gosta. Nosso público recicla muito.

Mofo – Para encerrar, qual é o próximo show da banda?
Fabio Golfetti
– Está confirmado para o dia 21 de novembro no Sesi da Paulista. Outro show será para abrir o Gene Loves Gezebel, em uma rave gótica. Inicialmente será no dia 25 de novembro, mas acho que vai mudar para o dia 9 de dezembro. Eu não quero tocar muito nesse final de ano. Prefiro me concentrar no disco novo.

Essa entrevista é dedicada a Fernando Marçal e todos os outros fãs do Violeta, que muitas vezes ficam sem saber o que acontece com o grupo. Para comprar os discos, entre na página do Violeta de Outono. Ouçam também o Momento 68, banda paralela de Sandro e do Gregor.