98 - Kimberley Rew - Entrevista

Eis-me aqui de novo entrevistando um ilustre desconhecido no Brasil e que, de certa forma, me faz encerrar o assunto entre Robyn Hitchcock, Soft Boys e Katrina and The Waves que tanto circulou por essa coluna e em minha cabeça nos últimos meses. E para juntar todo esse elo, consegui entrevistar Kimberley Rew, guitarrista dos Soft Boys e dos Waves, através do seu site pessoal. Kimberley, assim como Katrina, Andy Gill e outros, foi extremamente solícito e respondeu pacientemente meu questionário, mostrando aquele bom humor que tanto permeou sua carreira e pode ser ouvido em suas músicas. O compositor de "Walking On Sunshine" é uma pessoa inteligente e divertida. Entre suas peripécias, é dele o texto sobre a história dos Soft Boys no site oficial do grupo e que reproduzirei algumas partes. Por e-mail, Rew conta como era trabalhar com Robyn, a recente reunião do grupo para alguns shows e o sucesso com os Waves. E ficou, assim como Katrina, exultante ao saber que venceram o prêmio de melhor banda nova em 1985, da extinta revista "Bizz", no qual fez questão de agradecer os eleitores. Sendo assim, e como já enchi lingüiça suficiente nesse início, vamos a um resumo da carreira do homem e a entrevista propriamente dita...


 

"Em 1975 tive contato com Robyn Hitchcock, que havia acabado de chegar em Cambridge procurando músicos para formar um grupo. Robyn era o protótipo do roqueiro: calças de couro preta, jaqueta igualmente negra, cabelo comprido e barba. Foi através de Sunshine Joe, um cara igualmente estranho, que conheci Robyn. Eu morava então em um quarto alugado de uma casa em que o porão era um estúdio de gravação, o Spaceward. Robyn ia lá para trabalhar e durantes os intervalos, começamos a conversar, na cozinha da casa. Além dele, circulava Morris Windsore Rob Lamb (que era o cantor original dos Waves), que formaram o Sheboygan, um grupo de 'pub rock'. Em 1975, chamaram Robyn e Andy Metcalfe e fundaram Dennis and the Experts. Os ensaios eram no quarto de Robyn. Rob acabou saindo e chamaram Alan Davies para a guitarra. Foi em um show de Natal em uma universidade que Robyn apagou o nome Dennis and the Experts no quadro negro e escreveu The Soft Boys. E assim nasceu o grupo. Em 1977 lançaram o EP Give It To The Soft Boys e começaram a abrir shows para The Pirates, Elvis Costello e Vibrators. Eu entrei no ano seguinte e assinamos um pequeno contrato com a Radar Records, que tinha Elvis Costello e Nick Lowe em seu catálogo. Fizemos shows de abertura para o Damned - a única vez que toquei para uma platéia punk na minha vida - e a Radar nos deu dinheiro para gravarmos um disco no estúdios Rockfield, perto do País de Gales, por duas semanas. Fazer dinheiro era algo difícil, pois eram tempos em que Supertramp (com Logical Song) e Dire Straits (com Sultans of Swing) entupiam as rádios. Em 1979, Robyn resolveu lançar pelo seu próprio selo nosso primeiro disco, A Can of Bees, que teve uma pequena repercussão. No entanto, Andy deixou o grupo para se juntar ao Telephone Bill and the Smooth Operators. Matthew Selligman acabou entrando como baixista. Nessa época consegui passar no exame para dirigir (nenhum de nós tinha habilitação) com uma van emprestada. Voltamos para o Spaceward e gravamos 'I've Got the Hots', 'He's a Reptile', 'Song Number Four' e 'You'll Have to Go Sideways'. Essa última canção consistia de um simples riff de guitarra repetida várias vezes por três minutos. O estúdio tinha um Mini Moog, que custava perto de 600 libras naquele tempo e o usei nessa canção. O Cambridge City Rowing Club Boathouse passou a ser um local freqüente para as bandas locais poderem ensaiar, sendo que uma das bandas que lá tocava e que ficou bastante famosa foi o Captain Sensible. Trabalhamos duro nas novas canções que viriam a ser nosso novo disco Underwater Moonlight. Nossos últimos suspiros como um grupo independente veio com o pequeno selo Armaggedon que lançou nosso EP The Kingdom of Love, que ficou entre as 25 mais da parada alternativa da New Musical Express. Embarcamos em uma turnê pela Escócia, ficando em um quarto de hotel, em Edimburgo, com cinco camas, como se fôssemos todos uma família.



Underwater Moonlight foi lançado no verão de 1980 e nessa época tínhamos mudado para Londres e Robyn havia gravado The Man Who Invented Himself. Nossa vida estava mudando. 'Only The Stones Remain' foi nosso último grande esforço, e que apareceu somente na coletânea póstuma, Two Halves For The Price Of One. Partimos então para nossa maior aventura, uma viagem para Nova York, onde tocamos no Mudd Club e no Danceteria. Nosso último show acabou sendo na segunda parte da nossa turnê pela Inglaterra. Foi no Golden Lion, em Fullham, Londres. Tinhamos então nossos projetos paralelos - Robyn com os Egyptians, Morris tocava com os Gliders, Matthew com os Snail e eu já completava 18 meses com Katrina and the Waves. Cada um seguiu sua vida até que em 2001 nos reunimos para tocar em um disco tributo a Paul McCartney. Dessa reunião surgiram alguns ensaios e lançamos um novo disco, Nextdoorland. Começamos a fazer shows abrindo para os Pretty Things e acabamos saindo em uma turnê pela América, em 2002, para promovermos o nosso trabalho. E as coisas caminham muito bem...

Esse texto foi roubado e adaptado do site oficial dos Soft Boys e mostra um pouco da vida e personalidade de Kimberley, autor da imensa história do grupo, que lá está dividida em capítulos. Depois de deixar os Boys, Rew se dedicou de corpo e alma no Katrina and the Waves, onde virou o principal compositor e teve um grande sucesso. Além de “Walking On Sunshine”, vale destacar a bela versão que as Bangles fizeram de “Going Down to Liverpool), que virou um mini-hit da banda feminina. Em 1982, lançou um disco tendo como banda suporte os americanos do dB’s, um grupo que tinha as mesmas idéias do Soft Boys, que era resgatar o som dos anos 60 para a década de 80. Durante e depois do Katrina, tocou com vários artistas (a relação completa está na discografia do rapaz ao final do texto).


Sempre criativo e amante dos sons antigos (Beatles, Byrds, Beach Boys, Kinks), Rew é hoje uma pessoa que não liga muito para a atual cena roqueira, preferindo se concentrar mais nos sons da “era dourada” como ele mesmo definiu na entrevista. Sua amizade com os velhos companheiros permanece intacta e vira e mexe se encontram, para alguns shows, como foi a excursão com os Soft ou mesmo participar do disco de Katrina. Fique agora com um pouco das idéias de Kimberley e saiba mais sobre ele, um quase anônimo por aqui (para não dizer totalmente desconhecido) e leia como ele enfrentou o sucesso com os Waves e a sua volta para uma audiência menor...



Pergunta: - Gostaria que você me contasse um pouco como foi reencontrar Robyn Hitchcock e o pessoal dos Soft Boys na recente reunião do grupo.
Kimberley Rew:
- Foi algo extraordinário, já que o grupo se separou quando eu tinha 29 anos, após ter ficado três anos no Soft Boys. A reunião me possibilitou completar algo que eu tinha abandonado 20 anos atrás, algo que não ocorre freqüentemente em sua vida.

Pergunta: - Você e Robyn são ótimos compositores. Como era o processo de trabalho dentro da banda?
Kimberley Rew:
- Obrigado pelo elogio. Os Soft Boys eram na verdade um meio para Robyn veicular suas canções. Eu desenvolvi meu lado de compositor mais tarde, com o Katrina and the Waves e na minha carreira solo.

Pergunta: - Havia muita diferença entre as duas bandas?
Kimberley Rew:
- Completamente, eram dois grupos totalmente diferentes, em personalidades, no modo de trabalhar. Robyn sempre determinava o que cada um faria, ele trabalhava de maneira muito consistente, sabendo o que desejava e no início facilitava um pouco meu trabalho, que era tocar de maneira correta a minha guitarra. Com a Katrina, eu era compositor e tinha a preocupação de estruturar as canções.

Pergunta: - E como é seu método de trabalho, de composição?
Kimberley Rew:
- O mais importante é saber que cada um trabalha de uma maneira completamente distinta do outro, então o meu jeito serve apenas para mim. Talvez a maneira mais simples para que eu possa compor, é pegar as palavras mais importantes (refrão, início) e desenvolvê-las ao mesmo tempo.

Pergunta: - Você teve um sucesso imenso dentro do Katrina and the Waves com "Walking On Sunshine". Qual foi a sensação?
Kimberley Rew:
- É algo que te transporta para um outro plano e, em nosso caso, nos deixou completamente fora de órbita, durante 12 anos. Mas penso que não estaria aqui hoje com tudo que tenho se não tivesse passado por essa experiência.

Pergunta: - Um dos grandes fãs dos Softs é Peter Buck (guitarrista do R.E.M.). Você chegou alguma vez a tocar com ele ou com o R.E.M.? Qual sua opinião sobre eles?
Kimberley Rew:
- Peter se juntou ao Soft em palco uma ou duas vezes. Ele é muito mais ligado ao Robyn do que a mim durante todos esses anos. Eu não tenho uma opinião sobre os grupos que se dizem influenciados pelos Softs, mas acho o R.E.M. uma boa banda, sem dúvida.

Pergunta: - E o que você acha da atual cena do rock?
Kimberley Rew:
- O mesmo que disse sobre o R.E.M. Não há nada que me afete.

Pergunta: - Me fale um pouco de sua carreira-solo, seus discos...
Kimberley Rew:
- Bem, deixe eu fazer um pouco de propaganda então... Tunnel into Summer está disponível para compra no site da Gadfly Records e Grand Central Revisited você pode comprar através do site da Bongo Beat. São bons discos (risos).

Pergunta: - Em 1997, Katrina and the Waves conquistou o Eurovision Song, com a canção "Love Shine a Light". Ela é sua canção favorita da banda, já que você também a compôs?
Kimberley Rew
: - Ela é minha favorita, como "Walking On Sunshine" é minha favorita também. Mas ainda prefiro "Walking On Sunshine", mas "Love..." vem logo abaixo.

Pergunta: - Quais são suas maiores influências?
Kimberley Rew:
- Os Beatles, obviamente, e todos os artistas que eram populares por volta de 1962. Eu me considero uma pessoa de sorte por ter nascido exatamente na década de ouro da música.

Pergunta: - Quais são suas cinco canções favoritas?
Kimberley Rew:
- "I only have eyes for you" (The Flamingos), "Waterloo Sunset" (Kinks), "What I'd Say" (Ray Charles), "Roll 'em Pete (Big Joe Turner) e "Good Vibrations" (Beach Boys).

Pergunta: - Quais são seus próximos projetos?
Kimberley Rew:
- Recentemente fiz um disco com minha companheira Lee, Spring Forward (que está à venda no site do The Bass Place) e estou trabalhando em um novo disco solo. E meu disco The Bible of Bop (de 1982) está sendo relançado pela Bongo Beat.

Pergunta: - Você participou do primeiro trabalho solo de Katrina Leskanich. O que pode me dizer sobre ele?
Kimberley Rew:
- Eu ainda não o ouvi, mas gostei de algumas canções que ouvi em 2000. Fico muito feliz por ser o tipo de som que ela gosta de fazer desde quando estávamos nos Waves.

Pergunta: - Deixe eu repetir a mesma pergunta que fiz a ela. Em 1985, vocês foram eleitos como a revelação do ano por uma revista brasileira já extinta, "Bizz". Ela disse que nunca ficou sabendo dessa notícia. Você também nunca soube disso?
Kimberley Rew:
- Que grande notícia você está me dando 19 anos depois, já que nunca vencemos um prêmio de "melhor banda nova" à época. Infelizmente não era possível estar em todos lugares do planeta em que "Walking On Sunshine" era apreciada. Mas agradeço por ter me contado isso!

Pergunta: - Bem, essa é aquela velha pergunta clássica de um jornalista brasileiro. O que você conhece da música do Brasil?
Kimberley Rew:
- Infelizmente nada, excetuando um pouco de bossa nova. Mas se a música de vocês não for cheia de computadores e cheia de ritmo, certamente deve ser muito boa. Me mande algo para que eu possa conhecer!

Pergunta: - Para encerrar deixe uma mensagem para seus fãs brasileiros...
Kimberley Rew:
- Gostaria de agradecer com certo atraso pelo prêmio de 1985 e espero que meus discos sejam lançados por aí e que as pessoas gostem deles. Fiquem de olho nesse novo trabalho da Katrina. E tenham certeza que, tanto ela, como Robyn e até eu continuaremos a escrever novas músicas. Obrigado pela chance de falar com o Brasil.

Fiquem com a imensa discografia de Kimberley, não apenas os seus discos solos, mas em todos os projetos em que tocou. Um abraço e até a próxima coluna!

Discografia-solo

Bible of Bop (1982)
Tunnel into Summer (2000)
Great Central Revisited (2002)

Com os Soft Boys

Give It To The Soft Boys (EP, 1977)
(I Want to Be an) Anglepoise Lamp (EP, 1978)
A Can of Bees (1979)
Underwater Moonlight (1980)
Near The Soft Boys (1980)
I Wanna Destroy You (EP,1981)
Only The Stones Remain (EP,1981)
Two Halves For The Price Of One (EP, 1981)
Nextdoorland (2002)

Com Robyn Hitchcock

Black Snake Diamond Role (1981)
Jewels For Sophia (1999)
A Star for Bram (2000)

Com o Katrina and The Waves

Shock Horror (Mini álbum independente inglês pela Aftermath Records, 1983)
Black and White Album (título canadense de Walking on Sunshine, 1983)
Katrina and the Waves 2 (1984)
Katrina and the Waves (1985)
Waves (1986)
Break of Hearts (1989)
Pet the Tiger (1991)
Edge of the Land (1993)
Turnaround (1994)
Roses (compilação canadense Edge of the Land e Turnaround, de 1995)
Anthology (1996)
Walk on Water (1997)
Walking on Sunshine - Greatest Hits (Compilação sueca dos albums de 85/86/89/91) (1997)
The Original Recordings 1983-1984 (reunião do dois primeiros discos canadenses mais um DVD) (2003)

Com The Lonely

Rarer Gifts (1997)
Underground (1998)

Com Julian Dawson

As real as Disneyland (1987)
Steal that Beat (1996)
Spark (1999)
Under the Sun (1999)

Com Ashley Hutchings All Stars

As You Like it (1988)

Com Boo Hewerdine

Ignorance (1992)

Com Deni Bonet

Bigger is always Better (2001)

Com Lee Cave-Berry

Spring Forward (2003)




 

Colunas