Extremamente
educado em sua passagem pelo Brasil, em 1998, Lloyd Cole tocou
alguns dos seus sucessos, mesmo não fazendo mais parte
do seu repertório. Mostrando simpatia, deu uma canja com
um violão acústico ao final da apresentação
para quem ficou até o fim. Com sua banda, os Commotions,
lançou três discos de estúdio e cravaram músicas
como "Forest Fire", "Perfect Skin" e "Jennifer
She Said". Sua coletânea, 1984-1989, é o melhor
exemplo desse trabalho. Apesar das letras melancólicas,
e por vezes amargas, eram sempre cobertas com camadas de guitarras
acústicas, teclados e até dançantes. Um grupo
que durou apenas cinco anos, mas que deixou saudades.
Eu me lembro desse show muito bem: acabara de ser despedido de
meu emprego no jornal e fui com uma amiga ver o show do Lloyd
Cole, sem os Commotions, no Palace. Estava uma noite meio chuvosa
e Denise e eu chegamos em cima da hora. Descolamos uns lugares
razoáveis e fomos surpreendidos pelo bom público
na casa.
No Brasil, seus trabalhos
solos não eram conhecidos, então a platéia
pedia as músicas da época dos Commotions como "Forest
Fire", "Jennifer She Said", "Rattlesnakes"
e "Perfect Skin".
Em um inglês complicado,
explicou educadamente que tocaria algumas dessas músicas,
apesar de não fazerem mais parte de seu repertório,
por ser seu primeiro show por aqui. No final, ele subiu ao palco
e apenas com um violão acústico, tocou as músicas
antigas, como se todos fossem velhos amigos, naquela intimidade
gostosa. As pessoas se espremiam perto do palco, ele sorria, agradecia,
falava alguma coisa, saía, voltava, tocava mais uma e ficou
assim por uns 20 minutos.
Eu andava muito deprimido,
com pouca grana, mas passei boas horas com a Denise lá.
Para me aliviar, trabalhava em uma loja de discos na Avenida Paulista,
chamada Sweet Jane. Obviamente comprei tudo do Lloyd Cole que
tinha na loja no mesmo dia, inclusive essa coletânea.
Confesso que até hoje,
passado dois anos, nunca ouvi uns dois discos solos dele que comprei
naquele dia. Um pouco a ver com o personagem principal de Alta
Fidelidade, filme que está passando no Brasil. Quem
coleciona discos e gosta de música, sabe do que estou falando.
Mas o mais legal de tudo
foi assistir um show de uma pessoa que hoje deve vender pouco
pelo mundo e que sinceramente, fui começar a ouvir mais
nos anos 90 do que nos 80. Em Ribeirão Preto, onde nasci
e vivi até os 18 anos, eu ouvia basicamente uns 10 grupos:
U2, Smiths, Echo, Clash, Cure, Cult, R.E.M., Legião, RPM
e Ira!
Comecei a ficar saudosista
depois de muito tempo, já com quase 30 anos. Fico vendo
aqueles filmes dos anos 80, como Clube do Cinco, O Primeiro
Ano do Resto de Nossas Vidas, Trocando as Bolas e de
vez em quando, deixo escorrer uma lágrima de saudade. De
que, eu não faço a menor idéia.
E no meu revival de 80, que
hoje é febre, saí atrás de Lloyd Cole and
The Commotions. Uma desgraça, pois seus discos estão
fora de catálogo e dá o maior trabalho para achar.
Quando acho, demora para chegar, um verdadeiro inferno.
Eu já conhecia um
pouco da banda quando comprei essa coletânea. São
músicas leves, uma folk meio pop, com letras pessoais,
meio amargas, meio ingênuas.
Alguns idiotas chamaram Lloyd
de Lou Reed de terceira. Bobagem: não há como comparar,
mas todo mundo gosta de fazer isso, não é mesmo?
E saiba que em 1985, naquela mesma votação que colocou
o What's Goig On do Marvin Gaye como o maior de todos os
tempos, Rattlesnakes estava entre os 100 melhores. E todos
os seus álbuns saíram no Brasil em vinil.
Desde a abertura com "Perfect
Skin", passando por "Are You Ready to Be Heartbroken"
com a frase (Are Your Ready to Be Heartbroken/Are You Ready to
Bleed/ Você está preparado para ter o coração
quebrado/ Você está pronto para sangrar?), continuando
pela beleza de "Forest Fire" e chegando lá no
fim em "Jennifer She Said", provoca um bem estar no
ouvinte, ideal para quem estava com a vida partida e sem rumo
profissional.
Quando voltei para o jornal
para fazer uns bicos, eu estava longe de estar bem emocionalmente,
mas ia ouvindo uma fita com esse disco e o primeiro da banda,
Rattlesnakes. Era legal, levantava o humor, ia estalando
o dedo e nem me importava com a merda de trânsito e a distância
do lugar.
Eu ainda fiquei mais um ano
desempregado e não desejo esse mal a ninguém. Essa
pequena biografia é para falar sobre esses disco, o quanto
ele me fez bem em uma época em que muitas vezes desejei
chutar tudo para cima e ir embora do país.
Eu me lembro de uma parte
da letra "Jennifer She Said" que diz: (Did You have
a bad dream wake up and it no stop?/Você teve um pesadelo,
acordou e ele ainda não passou?). Me dizia muito isso e
até hoje me diz, muitas vezes, quando acordo.
A banda durou três
discos e algumas coletâneas. Os trabalhos solos de Lloyd
são bem mais fáceis de achar, saíram inclusives
no Brasil até em vinil. Mas acho que se for procurar em
cds, vai ter que morrer em importadoras, pois estão fora
de catálogo.
Um conselho de quem ainda
se trata de depressão: quando estiver mal, tente ouvir
esse disco. Algumas outras bandas que até saíram
no Brasil como Prefab Sprout são boas opções.
"When Love Breaks Down" fará você chorar
feito um bebê se tiver brigado com seu parceiro(a). Talvez
não seja boa idéia ouvir, mas não custa tentar.
Ah, me lembrei de uma coisa!
Existe, acho, no Brasil uma coletânea preta com a foto de
Lloyd Cole na capa que seleciona as melhores músicas com
a banda e solo. Como vendíamos baratinho na loja, 12 reais,
eu empurrava para tudo que era cliente. Devo ter vendido uns 20
deles. Não peguei nenhum pois tinha todas as músicas.
Acho complicado achar por esse preço em algum lugar, mas
é uma boa maneira de começar a ouvir.
Um abraço e até
a próxima coluna.
Discografia
Rattlesnakes (1984)
Easy Piece (1985)
Mainstream (1987)
1984-1989 (1989)
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