14 - Lloyd Cole & The Commotions - 1984-1989

Extremamente educado em sua passagem pelo Brasil, em 1998, Lloyd Cole tocou alguns dos seus sucessos, mesmo não fazendo mais parte do seu repertório. Mostrando simpatia, deu uma canja com um violão acústico ao final da apresentação para quem ficou até o fim. Com sua banda, os Commotions, lançou três discos de estúdio e cravaram músicas como "Forest Fire", "Perfect Skin" e "Jennifer She Said". Sua coletânea, 1984-1989, é o melhor exemplo desse trabalho. Apesar das letras melancólicas, e por vezes amargas, eram sempre cobertas com camadas de guitarras acústicas, teclados e até dançantes. Um grupo que durou apenas cinco anos, mas que deixou saudades.


Eu me lembro desse show muito bem: acabara de ser despedido de meu emprego no jornal e fui com uma amiga ver o show do Lloyd Cole, sem os Commotions, no Palace. Estava uma noite meio chuvosa e Denise e eu chegamos em cima da hora. Descolamos uns lugares razoáveis e fomos surpreendidos pelo bom público na casa.

No Brasil, seus trabalhos solos não eram conhecidos, então a platéia pedia as músicas da época dos Commotions como "Forest Fire", "Jennifer She Said", "Rattlesnakes" e "Perfect Skin".

Em um inglês complicado, explicou educadamente que tocaria algumas dessas músicas, apesar de não fazerem mais parte de seu repertório, por ser seu primeiro show por aqui. No final, ele subiu ao palco e apenas com um violão acústico, tocou as músicas antigas, como se todos fossem velhos amigos, naquela intimidade gostosa. As pessoas se espremiam perto do palco, ele sorria, agradecia, falava alguma coisa, saía, voltava, tocava mais uma e ficou assim por uns 20 minutos.

Eu andava muito deprimido, com pouca grana, mas passei boas horas com a Denise lá. Para me aliviar, trabalhava em uma loja de discos na Avenida Paulista, chamada Sweet Jane. Obviamente comprei tudo do Lloyd Cole que tinha na loja no mesmo dia, inclusive essa coletânea.

Confesso que até hoje, passado dois anos, nunca ouvi uns dois discos solos dele que comprei naquele dia. Um pouco a ver com o personagem principal de Alta Fidelidade, filme que está passando no Brasil. Quem coleciona discos e gosta de música, sabe do que estou falando.

Mas o mais legal de tudo foi assistir um show de uma pessoa que hoje deve vender pouco pelo mundo e que sinceramente, fui começar a ouvir mais nos anos 90 do que nos 80. Em Ribeirão Preto, onde nasci e vivi até os 18 anos, eu ouvia basicamente uns 10 grupos: U2, Smiths, Echo, Clash, Cure, Cult, R.E.M., Legião, RPM e Ira!

Comecei a ficar saudosista depois de muito tempo, já com quase 30 anos. Fico vendo aqueles filmes dos anos 80, como Clube do Cinco, O Primeiro Ano do Resto de Nossas Vidas, Trocando as Bolas e de vez em quando, deixo escorrer uma lágrima de saudade. De que, eu não faço a menor idéia.

E no meu revival de 80, que hoje é febre, saí atrás de Lloyd Cole and The Commotions. Uma desgraça, pois seus discos estão fora de catálogo e dá o maior trabalho para achar. Quando acho, demora para chegar, um verdadeiro inferno.

Eu já conhecia um pouco da banda quando comprei essa coletânea. São músicas leves, uma folk meio pop, com letras pessoais, meio amargas, meio ingênuas.

Alguns idiotas chamaram Lloyd de Lou Reed de terceira. Bobagem: não há como comparar, mas todo mundo gosta de fazer isso, não é mesmo? E saiba que em 1985, naquela mesma votação que colocou o What's Goig On do Marvin Gaye como o maior de todos os tempos, Rattlesnakes estava entre os 100 melhores. E todos os seus álbuns saíram no Brasil em vinil.

Desde a abertura com "Perfect Skin", passando por "Are You Ready to Be Heartbroken" com a frase (Are Your Ready to Be Heartbroken/Are You Ready to Bleed/ Você está preparado para ter o coração quebrado/ Você está pronto para sangrar?), continuando pela beleza de "Forest Fire" e chegando lá no fim em "Jennifer She Said", provoca um bem estar no ouvinte, ideal para quem estava com a vida partida e sem rumo profissional.

Quando voltei para o jornal para fazer uns bicos, eu estava longe de estar bem emocionalmente, mas ia ouvindo uma fita com esse disco e o primeiro da banda, Rattlesnakes. Era legal, levantava o humor, ia estalando o dedo e nem me importava com a merda de trânsito e a distância do lugar.

Eu ainda fiquei mais um ano desempregado e não desejo esse mal a ninguém. Essa pequena biografia é para falar sobre esses disco, o quanto ele me fez bem em uma época em que muitas vezes desejei chutar tudo para cima e ir embora do país.

Eu me lembro de uma parte da letra "Jennifer She Said" que diz: (Did You have a bad dream wake up and it no stop?/Você teve um pesadelo, acordou e ele ainda não passou?). Me dizia muito isso e até hoje me diz, muitas vezes, quando acordo.

A banda durou três discos e algumas coletâneas. Os trabalhos solos de Lloyd são bem mais fáceis de achar, saíram inclusives no Brasil até em vinil. Mas acho que se for procurar em cds, vai ter que morrer em importadoras, pois estão fora de catálogo.

Um conselho de quem ainda se trata de depressão: quando estiver mal, tente ouvir esse disco. Algumas outras bandas que até saíram no Brasil como Prefab Sprout são boas opções. "When Love Breaks Down" fará você chorar feito um bebê se tiver brigado com seu parceiro(a). Talvez não seja boa idéia ouvir, mas não custa tentar.

Ah, me lembrei de uma coisa! Existe, acho, no Brasil uma coletânea preta com a foto de Lloyd Cole na capa que seleciona as melhores músicas com a banda e solo. Como vendíamos baratinho na loja, 12 reais, eu empurrava para tudo que era cliente. Devo ter vendido uns 20 deles. Não peguei nenhum pois tinha todas as músicas. Acho complicado achar por esse preço em algum lugar, mas é uma boa maneira de começar a ouvir.

Um abraço e até a próxima coluna.

Discografia

Rattlesnakes (1984)
Easy Piece (1985)
Mainstream (1987)
1984-1989 (1989)

 

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