Não era
fácil ser Lou Reed no meio da década de 70. Responsável
por "transformar uma geração inteira em 'bichas
viciadas'" no célebre cartaz criado pela Creem
Magazine (foto que abre a matéria), Lou estava no
limbo após obrigar a RCA a lançar o fiasco Metal
Machine Music, álbum duplo que quase quebrou o selo e destruiu
sua reputação dentro da casa, Lou tinha as mãos
amarradas quando entrou novamente em estúdio, com orçamento
limitado. O resultado? outra obra-prima.
"Em
1975, eu estava sendo processado por um empresário e seu
irmão produtor. Tinha lançado um disco chamado Metal
Machine Music que havia tido um incrível número
de devoluções e foi tirado do mercado em três
semanas. Eu não tinha dinheiro e nem guitarra. Os roadies
haviam levado os instrumentos por falta de pagamento. Eu estava
devendo para todo mundo, inclusive para o sindicato dos músicos.
A RCA me colocou em um hotel enquanto decidiam o meu futuro."
Essa era a vida de Lou
Reed contada por ele mesmo no encarte do CD de Coney Island
Baby. O homem que foi imortalizado pela Creem Magazine
e considerado o "culpado" por mudar toda uma geração
de jovens americanos, estava falido e perto de comer merda, literalmente.
Realmente não era
fácil ser Lou Reed naqueles dias.
Segundo Lou, no mesmo encarte,
"meu amigo Ken Glancy, era presidente da companhia e
um bonre homem, de caráter. Ele me perguntou se eu poderia
prometer que não faria um Filho de Metal Machine
Music. Eu disse que, sim, claro, afinal eu estava em
apuros e o pesadelo de que pudesse traí-los me assolava.
Assim, Ken me colocou no Gramercy Park Hotel. A Rolling Thunder
Revue estava lá, pronta para ganhar a estrada. Mas meu
trovão estava mudo. Eu não estava a indo a lugar
algum que não fosse a advogados, ao sindicato dos músicos
e a contadores que tentavam me tirar da enorme enrascada que havia
me metido. Eu estava indo ao tribunal porque não pagava
meus impostos há cinco anos. Então, um dia Ken Glancy
me ligou e disse 'ok, escolha um estúdio, vá a um
estúdio e faça um disco de rock'. E eu fiz."
Assim,
durante 10 dias, Lou gravou o disco no Mediasound, entre 18 e
28 de outubro, dividindo a produção com Godfrey
Diamond.
Lou se cercou de vários
amigos, entre eles, Doug Yule, o último guitarrista do
Velvet Underground e que ficou vampirizando o grupo após
a saída de Lou. As participações de Doug,
no entanto, só apareceram na edição de 30
anos, em CD, nas faixas bônus.
É impressionante
que tendo pouco tempo para gravar e com a grana contada possa
ter inspirado Lou a fazer um grande álbum.
Na verdade, era mais do
que um ótimo disco que estava em jogo. Lou flertava com
não apenas sua carreira, como sua própria vida.
Ele sabia que jamais teria outra chance se estragasse essa.
Metal Machine Music
havia se tornado um pesadelo. Um disco duplo cheio de feedbacks
e ruídos e que Lou vendera com uma verdadeira obra de arte
para a gravadora. As críticas negativas e os problemas
com as devoluções haviam deixado o selo em péssimos
lençóis, financeiramente falando.
Para
complicar, o "padrinho" de Lou no selo, David Bowie,
também tinha várias pendências financeiras
com a RCA e não podia fazer muito para auxiliá-lo.
Bowie, aliás, causou
outra enorme crise quando lançou Low,
em janeiro de 1977, para ódio dos executivos, que o chamavam
de Metal Machine Music II, embora o disco de David fosse bem mais
palatável, ainda que metade das faixas fossem instrumentais.
Assim, com pouca grana
e gente, Lou se encarregou das guitarras e pianos e teve os seguintes
músicos envolvidos nas gravações:
Bob Kulick - guitarra
Bruce Yaw - baixo acústico e baixo elétrico
Michael Suchorsky - bateria
Joanne Vent, Michael Wendroff, Godfrey Diamond - background vocals
Doug Yule - baixo nas faixas bônus tracks 2, 4-6, guitarra
nas faixas bônus 4-6
Bob Meday - bateria nas faixas bônus 2, 4-6
Michael Fonfara - teclados nas faixas bônus 2, 4-6
Com uma bela fotografia
do venerado Mick Rock, Coney Island Baby, foi
lançado em dezembro de 1975 e chegou ao 41º posto,
em fevereiro de 1976, uma boa colocação.
O LP trazia as seguintes
faixas:
Lado A
1. "Crazy Feeling"
2:56
2. "Charley's Girl" 2:36
3. "She's My Best Friend" 6:00
4. "Kicks" 6:06
Lado B
1. "A Gift" 3:47
2 . "Ooohhh Baby" 3:45
3 . "Nobody's Business" 3:41
4 . "Coney Island Baby" 6:36
Ao
ser editado em CD, em 2006, trazia as seguintes faixas bônus:
1. "Nowhere at All"
3:17 recorded November 18 & 21, 1975 at Mediasound Studios,
NYC
2. "Downtown Dirt"
4:18 recorded January 3 & 4, 1975 at Electric Lady Studios,
NYC
3. "Leave Me Alone"
5:35 recorded October 19 & 20, 1975 at Mediasound Studios,
NYC
4. "Crazy Feeling"
2:39 recorded January 3 & 4, 1975 at Electric Lady Studios,
NYC
5. "She's My Best
Friend" 4:08 recorded January 4, 1975 at Electric Lady Studios,
NYC
6. "Coney Island
Baby" 5:41 recorded January 6, 1975 at Electric Lady Studios,
NYC
Lou mostrava-se ainda um
grande compositor. Utilizando uma antiga canção
do Velvet - "She's My Best Friend" - do terceiro disco
da banda (The Velvet Underground, de 1969), Lou
escreveu outras boas composições e mostrava um lado
bem rock e despojado.
Seria um retorno seguro
ao selo e ao mundo do rock, que mesmo tendo disco irregulares
e outros bons, solidificaria de vez sua carreira.
Mas isso é papo
para outro dia. Um abraço e até a próxima
coluna.
Discografia
Lou Reed (1972)
Transformer (1972)
Berlin (1973)
Rock 'n' Roll Animal (1974)
Sally Can't Dance (1974)
Lou Reed Live (1975)
Metal Machine Music (1975)
Walk on the Wild Side & Other Hits* (1975)
Coney Island Baby (1975)
Rock and Roll Heart (1976)
Walk on the Wild Side: The Best of Lou Reed* (1977)
Live: Take No Prisoners (1978)
Street Hassle (1978)
The Bells (1979)
Vicious* (1979)
Rock and Roll Diary: 1967-1980* (1980)
Growing Up in Public (1980)
Rock & Roll Today (1980)
The Blue Mask (1982)
I Can't Stand It* (1982)
Rock Galaxy* (1983)
Legendary Hearts (1983)
Live in Italy (1984)
New Sensations (1984)
City Lights (Classic Performances By Lou Reed)* (1985)
Mistrial (1986)
New York Superstar* (1986)
Wild Child* (1987)
New York (1989)
Retro* (1989)
Songs for Drella (1990)
Magic and Loss (1992)
Between Thought and Expression: The Lou Reed Anthology* (1992)
A Retrospective* (1993)
Very Best of Lou Reed & Velvet Underground* (1995)
The Best of Lou Reed & the Velvet Underground* (1995)
Different Times: Lou Reed in the '70s* (1996)
Set the Twilight Reeling (1996)
Live in Concert (1997)
Perfect Day* (1997)
Perfect Night: Live in London (1998)
The Definitive Collection* (1999)
Very Best of Lou Reed* (2000)
Ecstasy (2000)
American Poet (2001)
The Wild Side: Best of Lou Reed* (2001)
Golden Collection* (2002)
Legendary* (2002)
NYC Man: The Ultimate Lou Reed Collection*(2003)
The Raven (2003)
The Platinum & Gold Collection* (2004)
NYC Man: Greatest Hits* (2004)
Le Bataclan '72 (2004)
Animal Serendade (2004)
Hudson River Wind Meditations (2007)
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