103 - Madness

Antes que você me pergunte quem é mais esse grupo desconhecido, me sinto na obrigação de deixar uma informação altamente relevante sobre o Madness. Até o início da década de 90, apenas os Beatles e Madonna tinham colocado mais singles nas paradas de sucesso na Inglaterra do que eles, que continuam sendo absolutamente adorados na terra da rainha. E meus 12 leitores devem lembrar de duas canções inesquecíveis do grupo, "One Step Beyond" e "Our House". Oriundos da mesma safra que revelou o sensacional Specials, o Madness teve uma carreira de maior duração e reconhecimento. Sua mescla de ska com rock e o grande senso de humor contribuíram para o nascimento desse grupo britânico até a medula e que ainda deu vários shows até 2003.




"Essas bandas de hoje em dia são um tédio. Produzem apenas um single por ano e só aparecem na mídia por causa de escândalos e fofocas. Quando começamos, lançávamos um novo compacto a cada dois meses, e éramos notícia por lotarmos onde tocávamos e pela qualidade das músicas". Convencido o dono dessa frase, certo? E com razão, afinal quem disse foi Suggs, vocalista e um dos líderes do Madness, grupo que despertou uma paixão imensa e virou mania por todo mundo. Suggs se refere ao período inicial da banda, quando lançaram, entre 1979 a 1981, cerca de 20 singles, três LPs e eram conhecidos como “os sete magníficos", uma referência ao septeto que, junto ao Specials, sedimentou a paixão pelo ska no mundo e que coleciona fãs ardorosos, incluindo músicos desconhecidos como John Lennon, Paul McCartney e Morrissey. Nada mal, hein?

Pois saiba que o Madness foi um super grupo de verdade, com uma mistura de rock dos anos 60 (os garotos eram fãs de Beatles, Kinks) e os ritmos negros, particularmente os da Jamaica, e que mesmo quando tiveram a primeira grande separação em 1986, até sua volta em 1988, como The Madness, e as outras voltas em 1992 e 1999, quando iniciaram uma nova excursão pelo mundo, jamais deixaram de perder o carisma e a alegria que tanto caracterizaram seus discos e seus shows.

A origem do Madness tem origem no ano de 1976, em um grupo de ska chamado Invaders, da cidade de Camden. Seus integrantes eram Mike Barson, Chris Foreman e Lee Thompson. Após dois anos de shows e tendo poucos e violentos skinheads como fãs, o grupo resolveu mudar de nome e roupagem. Surge então o Morris and the Minors e ganham alguns integrantes: Graham "Suggs" McPherson, Mark Bedford, Carl “Chas Smash” Smyth e Daniel Woodgate. No final do ano mudam o nome para Madness, uma homenagem a uma canção de Prince Buster, um dos ídolos dos molesques.



Em 1979, resolvem lançar pelo Two-Tone, seu primeiro single, "The Prince", outra homenagem a Buster. A canção torna-se um grande sucesso, ficando entre as 20 mais da parada britânica e rapidamente são contratados pela Stiff Records, mesma casa de Elvis Costello, que resolvem colocar rapidamente o grupo em estúdio. Em outubro é lançado One Step Beyound, que alcançou a segunda posição nas paradas dos mais vendidos.

A faixa-título impulsiona as vendas e chega ao sétimo posto das paradas. O grupo promove uma mistura de ska com rock, nos mesmos moldes do Specials e seu som é batizado de "nutty sound", por incorporar também influências do soul, funk e jazz e bandas britânicas dos anos 60, além das caretas e da grande descontração que viraram marca registrada de suas apresentações. "One Step Beyond", virou um dos maiores hinos do grupo. Veja a letra...

One Step Beyond

Hey you
Don't watch that watch this
This is the heavy heavy monster sound
The nuttiest sound around
So if you've come in off the street
And you're beginning to feel the heat
Well listen Buster
You better start to move your feet
To the rockingest
Rock-steady beat
Of Madness
One Step Beyond!



SuggsE a febre aumentou ainda mais quando "My Girl" chegou ao terceiro posto da parada, superando os dois compactos anteriores. A canção foi a segunda de uma impressionante seqüência entre os Top 10 da parada britânica, o que tornou o grupo amado por pessoas de todas as faixas sociais e idades. Se algum grupo mereceu o apelido de "banda do povo", nos anos 80, essa banda foi o Madness. Aproveitando o sucesso, o grupo lança em março de 1980 o EP Work Rest and Play, que chegou ao sexto lugar das paradas, graças ao sucesso de "Night Boat on Cairo".

Com tamanho frenesi e shows disputados por toda a Inglaterra e Europa, acabaram tendo o álbum de estréia lançado na América, onde foi um retumbante fracasso, ficando apenas na posição 128 entre os mais vendidos. Apesar da decepção geral, Suggs resolveu brincar com o fato dizendo que eram britânicos demais para os americanos e com um humor por demais sofisticado para quem não fosse inglês.



E Suggs era uma das razões para o sucesso do grupo. Esse jovem viciado em futebol (é fã doente do Chelsea) e que tirou seu apelido de um livro sobre jazz, era um garoto que já tinha passado por pequenas e obscuras bandas que tocavam o ritmo imortalizado por Charlie Parker e Miles Davis, quando entrou para o Morris and the Minors. Com mais de 1,90 m de altura, uma postura frenética e irreverente no palco, além de uma voz marcante, Suggs virou uma figura pública e carismática. Seus trejeitos, penteado e caretas foram imitados por toda a Inglaterra. Mesmo sem querer, Suggs virou a cara oficial do Madness, que até inventou um logo divertidíssimo, bem ao estilo "two tone".



Em setembro é lançado o segundo disco do grupo Absolutely, que novamente ficou em segundo lugar no Reino Unido, mas conseguiu ter um desempenho ainda pior do que o primeiro na América (146º lugar), o que fez a Sire romper contrato com o grupo na América e deixar a banda por anos e anos sem um representante nos Estados Unidos, provando que a declaração de Suggs estava mais do que correta.

Mas na Inglaterra a histeria era tanta que o grupo chegava ao cúmulo de fazer matinês para seu público menor de 16 anos no mesmo dia em que tocariam à noite.

Mesmo não sendo tão primoroso quanto o primeiro LP, Absolutely tinha grandes momentos, como "Baggy Trousers", que havia sido lançado como single no mesmo mês, bateu na terceira posição e se tornou uma das canções mais famosas do grupo, senão a mais conhecida. Nesse ano promovem uma gigantesca turnê por toda Europa, tocando pela primeira vez na Itália, Holanda e outros lugares. A excursão teve um pequeno atraso, já que o segundo vocalista da banda, Carl "Chas" Smyth necessitou arrancar as amídalas em outubro. Chas era então o MC (mestre da cerimônia) do grupo nos palcos. Apesar do enorme sucesso, o grupo confessava que a rotina febril deixa a todos extenuados. "Em dias de shows, nós trabalhamos quase 20 horas, um ritmo alucinante. Além disso, as constantes viagens de um lado para o outro e indo de um lugar quente para cidades geladas, acaba diminuindo nossa resistência. É uma vida dura, mas muito divertida", contou Suggs, em uma entrevista durante a excursão européia.

Mas descanso não era com o grupo, e os próprios integrantes odiavam sem ter nada para fazer, preferindo ensaiar ou compor canções ou mesmo entrar em estúdio. Tamanha fome fez o grupo emplacar uma série de singles e um novo LP (Seven) nas prateleiras e paradas de sucessos. O disco ficou em sétimo lugar entre os mais vendidos e rendeu mais sucessos. E o grupo jura que o modesto sucesso da canção "Cardiac Arrest", que ficou apenas em 14º lugar foi devido ao boicote de algumas emissoras por causa de seu ritmo frenético. Mas o sucesso seria muito maior quando "House of Fun" alcançou o primeiro lugar nas paradas, antecedendo a primeira coletânea da banda, Complete Madness.



Ainda em 1982 lançam um novo disco que é considerado entre muitos amantes do grupo como sua obra-prima: The Rise and Fall. O disco, que foi lançado em novembro, alcançou a décima posição na parada e fez com que a banda conseguisse uma nova casa, na América, a Geffen. E tudo isso por uma canção que virou o único hit por lá e que foi massivamente veiculada na então novata MTV: "Our House".

O sucesso foi tão grande que a Geffen mais do que rapidamente lançou uma coletânea do grupo apenas com o nome da banda, em 1983, tentando aproveitar o bom momento. Veja a letra desse clássico...

Our House


Father wears his Sunday best
Mother's tired she needs a rest
The kids are playing up downstairs
Sister's sighing in her sleep
Brother's got a date to keep
He can't hang around
Our house in the middle of our street
Our house in the middle of our

Our house it has a crowd
There's always something happening
And it's usually quite loud
Our Mum she's so house proud
Nothing ever slows her down
And a mess is not allowed

Our house in the middle of our street
Our house in the middle of our
Our house in the middle of our street
Our house in the middle of our
*Something tells you that you've got to move away from it*
Our house in the middle of our

Father gets up late for work
Mother has to iron his shirt
Then she sends the kids to school
Sees them off with a small kiss
She's the one they're going to miss
In lots of ways

(bridge)

Our house in the middle of our street
Our house in the middle of our

I remember way back then
When everything was true
And when we would have
Such a very good time
Such a fine time
Such a happy time
And I remember how we'd play
Simply waste away the day
Then we'd say nothing
Would come between us
Two dreamers

Father wears his Sunday best
Mother's tired she needs a rest
The kids are playing up downstairs
Sister's sighing in her sleep
Brother's got a date to keep
He can't hang around

Our house in the middle of our street
Our house in the middle of our street
Our house in the middle of our street
Our house in the middle of our
Our house was our castle and our keep
Our house in the middle of our street
Our house that was where we used to sleep
Our house in the middle of our street
Our house in the middle of our street
Our house in the middle of our



Mike Barson é o primeiro, agachado, da esq. para a direitaMas se 1983 prometia ser o ano do Madness nos Estados Unidos, o grupo ficou tremendamente abalado com a notícia de que o tecladista Mike Barson, principal compositor da banda, estava deixando a carreira para cuidar mais de sua vida pessoal, e, em especial, do seu casamento, tão abalado com a vida frenética do músico. A saída de Mike, coincidentemente ou não, marca o fim da fase de ouro da banda, já que sem ele, nunca mais emplacariam uma canção entre as 10 mais. Suggs lembra que quando Barson avisou que sairia, ninguém acreditou e que quando descobriram que ele estava falando a verdade, uma espécie de pânico tomou conta de todos: "Mike era nosso principal compositor e um das mais pessoas mais alegres que conheci. Quando ele deixou o Madness senti que nunca mais seríamos o mesmo."

Mesmo com um desfalque tão grande o grupo continuou em frente e lançou em 1984 um novo disco chamado Keep Moving, que tinha sido realizado com o tecladista. O título do disco (“continue em movimento”) dá a clara noção do que o grupo desesperadamente tentava fazer. A grande canção do disco era "Michael Caine", referência ao famoso ator britânico, ganhador de dois Oscars e que participa na canção dizendo a frase "I am Michael Caine". Apesar de boas vendagens, o trabalho sepultou o final do acordo entre a banda e a Stiff Records, já que a banda resolveu lançar seu próprio selo, Zarjazz. O primeiro lançamento pela nova casa foi o single "Yesterday's Men", em agosto de 1985, uma balada classuda, com uma letra amarga e um arranjo muito puxado para o jazz. O single teve uma colocação modesta na parada inglesa, alcançando apenas a 16ª posição. Mesmo assim vale a pena conferir a letra...

Yesterday's Men

An insolent speck of youth
Being taken for a walk
So tightly by the ear
That he can hardly talk

Yesterday's men hang onto today
To sing in the old fashioned way
It must get better in the long run
Has to get better in the long run

A metropolitan marathon
Has been held today
But who you need to catch
Will be coming the other way

Yesterday's men hang onto today
To sing any old way
It must get better in the long run
Has to get better in the long run

Because when you're told to start
How far can you go?
When your race is run
And you already know
Because when you're told to stop
How far will you go?
When your race is run
And you already know

Yesterday's men hang onto today
To sing any old way
It must get better in the long run
Has to get better in the long run
Will it get better in the long run?
Will we be here in the long run?

(bridge)

Yesterday's men hang onto today
To sing any old way
It must get better in the long run
Has to get better in the long run
Will it get better in the long run?
Will we be here in the long run?
Hang in the long run



Em setembro, sai Mad Not Mad, onde já se podia notar pelas fotos da capa e da contra-capa que a alegria tinha sumido. O Madness fez um bom disco, mas longe da inspiração dos antigos. O resultado acabou sendo sentido e percebido com a pequena vendagem.

A química já não era mais a mesma e após um primeiro semestre de 1986 totalmente sumidos de cena, o grupo anuncia no dia 4 de setembro que a banda chegava ao seu final. Em 1988, para surpresa de muitos, surge um single no mercado ("I Pronunce You") do grupo The Madness. O grupo era formado por quatro integrantes do Madness original (Suggs, Carl Smyth, Chris Foreman e Lee Thompson), tendo a colaboração do lendário Jerry Damers (ex-Specials) nos teclados, além de dois integrantes dos Attractions, banda que tocava com Elvis Costello: Steve Nieve (também teclados) e Bruce Thomas (baixo). Mas após o fiasco do single, o grupo sumiu sem deixar traços.

O grupo entrou em uma longa hibernação até uma volta inesperada em 1992, para duas apresentações no Finsbury Park, em Londres, na primeira edição do Madstock, que saiu em cd pela pequena gravadora Go Discs!, a mesma de Billy Bragg. O festival durou quatro anos e, em todos eles, o grupo se reunia e era a principal atração do evento. Mas as reuniões eram esporádicas e todos tinham seus projetos. O mais bem sucedido foi Suggs, que emplacou uma boa carreira solo e virou até apresentador de um programa de televisão no Canal 5, chamado Night Fever.

Após a última apresentação do grupo em 1996, no Madstock, avisaram que não voltariam mais a se reunir, mas eles voltaram, sim, dois anos depois para uma volta em grande estilo e com a formação original. Lançam um novo single, "Lovestruck", que chega ao décimo lugar nas paradas e fazem planos para um novo disco, contando com os produtores de todos os discos anteriores do grupo, Clive Langer e Alan Winstanley. Lançam apenas outro single, "Johnny the Horse" e uma coletânea contendo todos os seis discos do grupo chamada The Lot.


Chris, Suggs, Clive, Smyth, Alan, Dave, Mike e Mark

Começam uma nova excursão pelo mundo no Natal daquele ano. A "Maddest Show on Earth Tour" sai em carreata pelo mundo e no dia 16 de junho, fizeram uma aparição em um concerto tributo à Ian Dury, velho amigo e ídolo do pessoal, que havia falecido no dia 27 de março daquele ano, após lutar por quase cinco anos contra um câncer. O concerto foi realizado no Brixton Academy, em Londres. Em 2002 Smyth lança o hino da seleção inglesa que disputaria a Copa do Mundo no Japão e na Coréia do Sul, "We're Coming Over", e em outubro o grupo estréia um musical chamado "Our House". O grupo continuou excursionando ainda em 2003 e alguns poucos shows em 2004.



Durante todos esse anos, a banda manteve um alto nível em suas composições e em suas relações com o público. Eles foram umas grandes bandas que souberam misturar humor, política, diversão e muitas melodias inesquecíveis e serem adoradas por pessoas de todas as faixas etárias e sociais. Deixo vocês com mais uma sensacional foto da banda e sua discografia. Um abraço a todos e até a próxima coluna!

Discografia

One Step Beyond (1979)
Absolutely (1980)
Seven (1981)
Complete Madness * (1982)
The Rise And Fall (1982)
Madness * (1983)
Keep Moving (1984)
Mad Not Mad (1985)
Utter Madness * (1986)
The Madness (1988)
It's Madness * (1990)
It's Madness Too * (1992)
Divine Madness * (1992)
The Business * (1992)
Madstock (1992)
Total Madness: The Very Best of Madness * (1997)
Heavy Heavy Hits * (1999)
Universal Madness (ao vivo, 1999)
The Lot * (1999)
Our House: Best of Madness * (2002)

* coletâneas




 

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