Quem
me conhece sabe minha predileção pelos Smiths e
por toda sua obra. Mas eu gosto, e muito, da carreira-solo de
Morrissey. O cantor e letrista foi o único com talento
e vontade em manter-se vivo e trabalhando depois que o maior grupo
inglês dos anos 80 resolveu sair de cena, mantendo uma obra
perfeita e intacta.
A questão é:
teria como Morrissey fazer algo tão bom e ainda sem Johnny
Marr do seu lado? A resposta mais correta seria não, e
de fato, Morrissey apresentou alguns momentos irregulares nos
anos 90. Mas seus acertos são muito maiores e seu primeiro
disco solo, meses após o final do grupo é a maior
prova disso.
Viva Hate
é um belíssimo disco e um alento aos fãs,
que temiam ver o cantor se matar, como alguns fãs fizeram.
Bobagem. Morrissey podia ser um homem inconsolável com
o fim do grupo, mas não seria assim, de uma maneira tão
boba que iria morrer. Ainda mais quando tantas canelas mereciam
ser chutadas...
Como Morrissey nunca compôs
uma melodia na vida - "sempre tive uma voz interior que me
pediu para me manter puro" - o cantor dividiu as composições
com Stephen Street, que havia sido o produtor do último
disco dos Smiths, "Strangeways, Here We Come".
E o resultado é notável.
O disco é feito
com um time que deixa pouco a desejar em relação
ao seu antigo quarteto, com destaque para o excepcional guitarrista
do Durutti Column, Vini Reilly (banda que virará coluna
em breve...). Vini gosta de relembrar que Morrissey possui uma
maneira toda peculiar em trabalhar, pontuando suas canções
da maneira mais estranha possível e que só fazem
sentindo quando ele as canta.
Mas Vini não gosta
de seu trabalho neste disco, já que os arranjos soam convencionais
demais, muitoi rígidos e foram guiados de maneira quase
autoritária por Stephen Street. Ainda assim, Vini introduziu
alguns elementos incomuns na obra de Morrisssey, como alguns sintetizadores,
French Horns via um sampler e até bateria eletrônica,
além de alguns arranjos orquestrais que o cantor não
teria permitido nos Smiths.
O guitarrista relembra
de como o cantor parecia perdido nas sessões sem ter Johnny
Marr ao seu lado e como as pessoas evitavam confrontá-lo.
Mas, até por tudo isso, Viva Hate traz
alguns dos melhores momentos de sua carreira.
Duas dessas canções
são clássicos absolutos: "Everyday Is Like
Sunday" e "Suedehead", que deu a Morrissey o quinto
posto na parada de compactos da Inglaterra, feito não conseguido
pelos Smiths. O disco foi ainda mais longe, chegando a ser número
1 na Inglaterra, feito que os Smiths havia conseguido em 1985
com Meat Is Murder.
Mas Morrissey está
irresistível nas outras dez faixas: "Break Up The
Family" é um chute no saco do conservadorismo inglês;
"I Don't Mind If You Forget Me" falm da solidão,
o principal combustível do cantor. Em "Little Man,
What Now?", Morrissey comenta um famoso caso de um astro
mirm que havia sido colocado pra fora de um programa nos anos
70. Em "Angel, Angel, Down We Go Together" Morrissey
canta o suicídio em meio a uma arranjo de cordas.
O disco conta ainda com
uma bela cutucada no então governo da Dama de Ferro, Margareth
Thatcher, "Margaret On The Guillotine".
A capa original, lançada
em LP, era um luxo só, com letras em alto-relevo, assim
como no último disco dos Smiths. Os dois foram lançados
simultaneamente no Brasil, em 1988.
Existe
ainda uma edição norte-americana com três
diferenças significativas da original inglesa: a primeira
é a mudança da capa. A segunda é a total
ausência das letras, um pecado para alguém como Morrissey.
E a terceira é a inclusão de outras oito faixas
bônus, de sua fase posterior.
Morrissey possui uma das
mais belas trajetórias dos anos 80 e 90 e seu legado será
analisado, com mais calma, brevemente. Enquanto isso, corra atrás
dessa preciosidade. E procure as letras do maior desbocado compositor
inglês na internet.
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