Eles foram,
de longe, a banda brasileira mais importante. Quase estragaram
o mito ao retornarem dois anos atrás, sem Rita Lee e com
um Arnaldo Baptista mais decorativo do qualquer outra coisa. Mas
os fãs nem se importaram, afinal, Os Mutantes recebiam
tratamento de lendas após 40 anos de carreira. Arnaldo,
Serginho e Rita - e depois Liminha e Dinho - formaram o grupo
mais inventivo, irreverente, genial e talentoso que esse país
já viu. Os Mutantes seguem entre nós.
Arnaldo
Baptista , Rita Lee e Sérgio Dias. Certamente o mais importante
trio da música brasileira, os Mutantes tiveram o "azar"
de nascerem brasileiros e cantarem em português. Fossem
ingleses ou norte-americanos, os Mutantes seriam considerados,
hoje, uma das 20 mais importantes bandas da história.
Acrescidos de Liminha (baixo)
e Dinho (bateria), os Mutantes mostraram que o rock brasileiro
estava antenado com o que de melhor se fazia lá fora, apesar
da ditadura militar que proibia tudo, inclusive importar bons
instrumentos. É por isso que a volta do grupo, anos atrás,
foi bem vista por alguns, já que colocou o grupo em perspectiva
mundial. Antes, eram mais conhecidos por serem uma das bandas
favoritas de figuras como o falecido Kurt Cobain e Sean Ono Lennon.
É
muito complexo analisar se a volta foi positiva. Financeiramente,
foi excelente para Arnaldo e Serginho, que nunca tiveram um centésimo
do sucesso comercial de Rita, após o fim da banda.
Por outro lado, é
muito triste ver que Arnaldo não apresenta mais condições
físicas ou psicológicas de tocar e gravar. Uma polêmica
eterna.
O que bem poucos sabem
é que os Mutantes não foram apenas três jovens
talentosos que se uniram para fazer música inspirado nos
Beatles.
A música sempre
correu solta na casa dos Dias Baptista. Os meninos Cláudio,
Arnaldo e Sérgio conviviam diariamente com os pais, intelectuais
de classe média alta em São Paulo.
Arnaldo
Dias Baptista, nascido em 6 de julho de 1948, era o mais talentoso
de todos e, com menos de 16 anos, formou com o irmão Cláudio
e com Raphael Villardi e Roberto Loyola, o grupo The Wooden Faces.
Em pequenos festivais musicais
da cidade, conhece a jovem Rita Lee Jones Carvalho, nascida em
31 de dezembro de 1947, também em São Paulo, e que
fazia parte do grupo Teenage Singers, um trio de meninas.
Nesse
período, Arnaldo e Cláudio convidam o irmão
caçula Sérgio Dias Baptista, nascido em 1º
de dezembro de 1951, para entrar no grupo.
Logo, os dois trios se
juntaram e formaram o Six Sided Rockers, com Raphael Villardi
(guitarra), Suely Chagas (vocal), Sérgio Pastura (bateria),
além de Arnaldo (baixo), Sérgio (guitarra) e Rita
(vocal).
Cláudio deixaria
o grupo logo e se tornaria o responsável por construir
os instrumentos musicais, pois era um habilidoso engenheiro.
O grupo logo muda de nome
- O'Seis - e grava um compacto com as músicas "Suicida"
e "Apocalipse".
A banda tem vida curta
e rapidamente sobram apenas Arnaldo, Sérgio e Rita, que
fundam O Konjunto, que recrutou, provisoriamente, o mano Cláudio
como baterista. O grupo volta a mudar de nome - Os Bruxos - até
adotarem Os Mutantes, sugestão do cantor Ronnie Von, que
estava influenciado pelo livro O Império dos Mutantes,
de Stefan Wul.
Ronnie
Von era uma das estrelas da Jovem Guarda e tinha um programa batizado
dominical na Rede Record batizado de O Pequeno Mundo de Ronnie
Von.
No dia 15 de outubro de
1966, os Mutantes são convidados para participar do programa.
Agradam tanto que ficam como atração fixa e participam
do LP do cantor, Ronnie Von - nº 3, lançado
em 1967.
A vida na televisão
dura pouco, porém. Os anos de chumbo e o humor irreverente
e escachado do trio era considerado um pouco ousado pela emissora
e, aos poucos, a banda é afastado da emissora.
O
grupo ficou rumando meio sem rumo quando conhecem o maestro Rogério
Duprat, que se apaixona pelo trio imediatamente. Duprat ficou
naquele trio de jovens um talento incomum, além de uma
grande riqueza cultural.
Para Duprat, os Mutantes
era um sonho de vida realizado e ao longo dos anos diria que os
três eram até mais talentosos que os Beatles, um
exagero.
"Os Mutantes era formado
por um time pesquisador. Além do charme, humor e inteligência
dos três, tinham a ajuda de Cláudio, um dos maiores
gênios que já vi", conta Duprat.
Em 1967 surge uma nova
chance. Duprat sabia que Gilberto Gil queria modernizar suas composições,
especialmente "Domingo no Parque", que defenderia no
III Festival da Música Popular Brasileira, da
TV Record. Gil pede alguma sugestão ao maestro, que leva
os Mutantes para conhecer o compositor baiano.
O grupo não tinha
familiaridade com partituras musicais, mas conseguiram decorar
a complexa harmonia feita por Gil e Duprat e participaram da gravação
não apenas dessa canção, mas também
de "Bom Dia", que seria defendida por Nana Caymmi, no
mesmo festival.
Gil fica com o segundo
lugar no Festival e os Mutantes se integram ao novo e emergente
movimento Tropicalista, liderado por Caetano Veloso, Torquato
Neto, Gilberto Gil e Tom Zé, apesar das vaias dos presentes,
inconformados com tamanha modernidade e querendo algo mais "conservador".
Os
Mutantes acabam participando do histórico LP de Gil, lançado
em 1968, chamado apenas de Gilberto Gil.
O álbum trazia as
seguintes faixas:
Lado A
1. Frevo Rasgado (Gilberto
Gil/Bruno Ferreira)
2. Coragem pra Suportar (Gilberto Gil)
3. Domingou (Gillberto Gil/Torquato Neto)
4. Marginália II (Gilberto Gil/Torquato Neto)
5. Pega a Voga, Cabeludo (Gilberto Gil/Juan Arcon)
Lado B
6. Ele Falava Nisso Todo
Dia (Gilberto Gil)
7. Procissão (Gilberto Gil)
8. Luzia Luluza (Gilberto Gil)
9. Pé da Roseira (Gilberto Gil)
10. Domingo no Parque (Gilberto Gil)
Desde
o início, os Mutantes ficaram famosos pelo humor do trio
e pela doce face de Rita Lee, então namorada de Arnaldo.
O grupo já tinha
assinado com a Polydor, quando participam do segundo disco de
Caetano Velloso, batizado apenas de Caetano.
Ao final da faixa, "Eles",
Caetano declama: "Os Mutantes são demais!".
No mesmo ano, o grupo lança
o primeiro disco, batizado apenas de Os Mutantes.
Produzido
por Manuel Bareinbein e com arranjos de Rogério Duprat,
o álbum é um dos mais importantes discos brasileiros
de todos os tempos.
Apesar de pouca experiência
em estúdio e parcos recursos financeiros, Os Mutantes mostravam
uma modernidade impressionante.
Além do trio, participam
Jorge Ben, na faixa "Minha Menina", de sua autoria,
tocando violão; o baterista Dirceu e o pai de Arnaldo e
Sérgio, Dr. César Baptista fazendo voz em "Ave
Gengis Khan".
O grupo ousava a misturar
ritmos brasileiros, com Beatles, pop francês. O LP abre
com alguns acordes do Repórter Esso - o programa jornalístico
mais importante da época, antes de começar "Panis
et circenses", de Gil e Caetano. Além disso, recriaram
o famoso clássico "Adeus Maria Fulô", cantaram
"Baby", de Caetano e "Le Premier Bonheur du Jour",
em francês.
O LP trazia as seguintes
músicas:
Lado A
1. "Panis et Circenses"
(Gilberto Gil/Caetano Veloso)
2. "A Minha Menina" (Jorge Ben)
3. "O Relógio" (Os Mutantes)
4. "Adeus Maria Fulô" (Humberto Teixeira/Sivuca)
5. "Baby" (Caetano Veloso)
6. "Senhor F" (Os Mutantes)
Lado B
7. "Bat Macumba"
(Gilberto Gil/Caetano Veloso)
8. "Le Premier Bonheur du Jour" (Jean Renard/Frank Gerald)
9. "Trem Fantasma" (Caetano Veloso/Os Mutantes)
10. "Tempo no Tempo" (John Philips)
11. "Ave Gengis Khan" (Os Mutantes)
Ainda em 1968, participam
de outros álbuns fundamentais daquele período:
A Banda Tropicalista do Duprat, lançado pelo maestro
Rogério Duprat - "uma experiência infeliz, segundo
o próprio - e Tropicália ou Panis Et Circences,
o disco-manifesto do movimento.
Tropicália
tinha as seguintes canções:
Lado
A
1. Miserere Nobis (Gilberto
Gil - Capinan) 3:44 Intérprete: Gilberto Gil
2. Coração Materno (Vicente Celestino) 4:17 Intérprete:
Caetano Veloso
3. Panis et Circencis (Caetano Veloso - Gilberto Gil) 3:35 Intérprete:
Os Mutantes
4. Lindonéia (Caetano Veloso) 2:14 Intérprete: Nara
Leão
5. Parque Industrial (Tom Zé) 3:16 Intérpretes:
Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil e Os Mutantes
6. Geléia Geral (Gilberto Gil - Torquato Neto) 3:42 Intérprete:
Gilberto Gil
Lado B
7. Baby (Caetano Veloso)
3:31 Intérpretes: Caetano Veloso e Gal Costa
8. Três Caravelas (Las Tres Carabelas) (Algueiro Jr. - Moreau;
versão em português: João de Barro) 3:06 Intérpretes:
Caetano Veloso e Gilberto Gil
9. Enquanto Seu Lobo Não Vem (Caetano Veloso) 2:31 Intérpretes:
Caetano Veloso
10. Mamãe, Coragem (Caetano Veloso - Torquato Neto) 2:30
Intérprete: Gal Costa
11. Bat Macumba (Caetano Veloso - Gilberto Gil) 2:33 Intérprete:
Gilberto Gil
12. Hino ao Senhor do Bonfim" (João Antonio Wanderley)
3:39 Intérpretes: Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil
e Os Mutantes
Em junlho, o grupo participa
do Festival Nacional de MPB, da TV Excelsior, cantando
"Mágica", além de "Glória
ao rei dos confins do além", no II Festival Estudantil
da MPB.
Em setembro, o grupo participa
"III Festival Internacional da Canção",
realizado pela Rede Globo, com"Caminhante Noturno",
e fica em sétimo lugar.
O grupo ainda acendeu uma
polêmica ao subir no palco, do mesmo festival, junto com
Caetano para defender "É Proibido Proibir", no
Teatro da PUC, em São Paulo. O grupo foi vaiado intensamente.
A banda fez um protesto, tocando de costas para o público,
enquanto Caetano criticava a platéia.
O grupo ainda participaria
de dois compactos com Caetano, naquele ano. O primeiro, Caetano
Veloso E Os Mutantes Ao Vivo trazia as faixas:
Lado A
1. A Voz do Morto (Caetano Veloso)
2. Baby (Caetano Veloso)
Lado B
3. Marcianita (J. Marcone / G. Aldreto
/ versão: Fernando César)
4. Saudosismo (Caetano Veloso)
Já o segundo, trazia:
Lado A
1. É Proibido Proibir
(Caetano Veloso)
Lado B
2. Ambiente do Festival
(é proibido proibir) (Caetano Veloso)
E,
para encerrar o ano, grupo integra o "IV Festival da
Música Popular Brasileira", defendendo "Dom
Quixote" e "2001" (parceria de Rita com Tom Zé),
músicas que fariam parte do segundo compacto da banda,
a ser lançado, em 1969. Nesse festival são acompanhados
de um novo músico, o baterista Dinho Leme.
O final do ano é
dedicado às gravações do novo LP e
os preparativos para a viagem da banda até Paris, em janeiro
de 1969. Papo que fica para um próximo dia e outra coluna.
Até mais!
Discografia
Compactos
Suicida/Apocalipse (1966)
É Proibido Proibir/Ambiente de Festival (com Caetano Veloso)
(1968)
A Minha Menina/Adeus Maria Fulô (1968)
Dois Mil e Um/Dom Quixote (1969)
Ando Meio Desligado/Não Vá Se Perder Por Aí
(1969)
Top Top/It's Very Nice Pra Xuxu (1971)
Mande Um Abraço Pra Velha (1972)
EPs
A Voz do Morto/Baby/Marcianita/Saudosismo
(com Caetano Veloso) (1968)
Fuga nº II/Adeus, Maria Fulô/Dois Mil e Um/Bat Macumba
(1969)
Hey Boy/Desculpe Babe/Ando Meio Desligado/Preciso Urgentemente
Encontrar Um Amigo (1970)
Cavaleiros Negros/Tudo Bem/Balada do Amigo (1976)
Discos e CDs
Os Mutantes (1968)
Mutantes (1969)
A Divina Comédia ou Ando Meio Desligado (1970)
Jardim Elétrico (1971)
Mutantes e Seus Cometas no País do Baurets (1972)
Tudo Foi Feito Pelo Sol (1974)
Mutantes Ao Vivo (1976)
Algo Mais (1986)
O A e o Z (1992)
Personalidade: Mutantes (1994)
Millenium: Os Mutantes (1999)
Everything is Possible: The Best of Os Mutantes (1999)
Tecnicolor (2000)
A arte de Os Mutantes (2006)
Mutantes Ao Vivo - Barbican Theatre, Londres 2006 (2006)
De Volta Ao Planeta Dos Mutantes (2006)
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