35 - Paulo Barnabé (Patife Band) - entrevista

Paulo Barnabé, o Patife Band do rock brasileiro é um sujeito inteligente, muito acima do normal e que gosta de falar muito sobre suas idéias, o grupo e do que pensa. Ao pedir uma entrevista a ele, não pensei que responderia tão rapidamente, ainda mais dando respostas longas e esclarecedoras. Uma urgência perceptível nas músicas do Patife e no rápido contato com ele, via e-mail. Assim sendo, só me restou editar essa entrevista igualmente de maneira rápida.


Pergunta: - Gostaria que falasse um pouco de seu background, já que é irmão de Arrigo. Vocês tiveram uma formação cultural em casa? Como se iniciou o interesse pela música?
Paulo Barnabé: - A formação que tivemos foi igual a de muitas outras familias de classe média da época (década de 60), que era colocarem seus filhos em conservatórios musicais da cidade. Então, estudei piano e teoria músical no Conservatório Municipal de Londrina, mas por pouco tempo, uns três anos e parei. Aí fui estudar violão com professor particular, etc. Depois me interessei por percussão e misturei tudo com o tempo. Quando vim pra São Paulo ainda não tinha um processo de composição e me dedicava mais aos instrumentos, mas nunca fui um bom instrumentista. Eu já fuçava muito a parte em que toca a criação: músical, roteiros de cinema, poesia, contos etc.
Só mais tarde - meados da década de 80 - após ter participado do primeiro disco do Arrigo é que começei a me preparar pra um trabalho própio.

Pergunta: - O Patife Band foi um dos mais interessantes grupos dos anos 80. Como você começou a banda?
Paulo Barnabé: - Eu tinha algumas músicas e frases músicais ou partes de outras músicas minhas e com parceria com o Arrigo. Comecei a trabalhar essas partes e desenvolver as letras. Eu já havia participado como letrista e compositor em 2 músicas do trabalho do Arrigo, "Acapulco Drive'In" e "Neide Manicure" e gostava muito de escrever letras. A primeira que saiu foi "Tô Tenso", que é meio história em quadrinhos; depois veio "Pesadelo", que era um texto que fazia parte de uma ópera que íamos montar no começo da década de 80 e se chamava João Bobo e as Bonecas Infláveis.
A próxima foi
"Pregador Maldito", que também fazia parte dessa ópera tanto que o nome é de um personagem da ópera e não tem muito sentido se você for pensar esse nome só dentro do contexto da letra (ou até pode ter, depende da interpretação).
Tive uma idéia na época, através de minhas andanças com os punks de periferia (nada a ver com a música do Gilberto Gil, he he), de musicar o "Noite Feliz" colocando dentro desse contexto e fui montando o repertório do primeiro EP, intitulado Patife Band.
Já com tudo na mão, comecei a trabalhar os temas com os músicos e gravamos em 85. Esse foi o primeiro registro de meu trabalho.

Pergunta: - Vocês conseguiram fazer uma mistura de música dodecafônica com punk, pós-punk, além de outros ritmos. A música de vocês é nervosa, seus vocais eram quase espasmódicos. Um dos nomes que me vem a mente em alguns elementos é o grupo norte-americano Pere Ubu. Como você definiria a Patife?
Paulo Barnabé: - Patife é meu alter-ego, é a minha visão músical, minhas frustrações físicas emocionais e também a do próximo, do outrém, daqueles que perambulam, tropeçam, se enganam caem no ridículo pisam na merda...
é uma maneira de fazer som muito particular. E
u não conheço especificamente nomes de grupos da época; o que eu fiz foi me inspirar também entre as outras sonoridades que fui infuenciado com o que estava rolando de mais radical que era o punk. A minha música já era agressiva e percussiva e o contato com o punk ajudou um pouco a definir tudo o que rolava na minha cabeça.

Pergunta: - Várias bandas contemporâneas foram influenciadas por vocês. Penso que os Titãs copiaram muito o estilo de vocês, concorda com isso?
Paulo Barnabé: - Sim, acho que uma parte teve a ver. Pode ser, eu já havia gravado o primeiro EP e havia participado da trilha sonora do filme Cidade Oculta com o "Poema em Linha Reta" e novamente o "Pregador Maldito".


Pergunta: - Gosto muito do EP de vocês. Uma música particularmente interessante é Peiote e gosto muito da versão de "Noite Feliz". Foi um disco muito bem produzido sendo um lançamento independente. Fale um pouco das gravações.
Paulo Barnabé: - "Peiote" é um música composta em meados de 70, eu era bem novo e a música saiu quase inteira, de uma vez, não tive que trabalhar muito como sempre faço. Eu queria ter um espaço pra improvisação vocal lisérgica. Na época, era bem mais experimental que a gravação no disco, mas valeu. O disco foi gravado no estúdio que era do Rogério Duprat, muito bom, e os músicos também eram muito bons: André Fonseca na guitarra, James Müller bateria, Sidney Giovenazzi, que nesse participou de uma faixa ("Pregador Maldito") e convidados. Ainda não era uma banda fixa.


Pergunta: - Vocês trabalharam também no filme Cidade Oculta estrelado por seu irmão e Carla Carmuratti. Você tem alguma trilha-sonora que te marcou muito? Gosta de cinema?
Paulo Barnabé: - Como disse acima, há duas músicas na trilha, o "Pregador" e a novíssima - na época - "Poema em Linha Reta" feito em parceria com o Arrigo e arranjada por mim. Gosto de Nino Rota e outros que agora não me lembro, mas há alguns americanos mais na linha comercial como o que fez Guerra nas Estrela, Indiana Jones etc...


Pergunta: - Corredor Polonês é um belíssimo disco e bem avançado para a época. Como foi a repercussão dele? Por que o grupo não seguiu em frente?
Paulo Barnabé: - A repercussão foi melhor que a venda. O fato de ser gravado por uma multinacional impediu, creio eu, de se ter um tratamento mais específico para cada artista, fica tudo em cima do mercado, de vendas, não há direcionamento específicos, então ficamos meio entrincheirados dentro desse esquema na gravadora. Mas houve também um problema muito sério com um dos músicos e tive que mexer na formação logo após o lançamento no Rio de Janeiro, em 87, e continuamos até início de 90. Aí parei, porque estava precisando compôr novas músicas e também por não estarmos fazendo muito shows e voltei com outra formação em 2002, creio eu.

Pergunta: - Entre ele e o CD ao vivo foram mais de 15 anos. O que você fez nesse tempo?
Paulo Barnabé: - Fiquei um tempo (cinco anos) fazendo curadoria de um projeto Rock Contemporâneo, no Sesc Ipiranga, fiz alguns shows com meu irmão, participei de duas óperas compostas por ele, fizemos turnês, chegamos a ficar uma temporada em Buenos Aires e também temporadas no Rio aqui em São Paulo e turnês pelo interior de São Paulo. Fiz uma ou duas trilhas para longa-metragem e sempre compondo e arranjando repertório para o próximo trabalho.

Pergunta: -Assisti um show de vocês na década de 80 e me lembro que saí exausto só de ver você se mexer no palco. Os shows continuam fortes ou o tempo diminuiu a intensidade?
Paulo Barnabé: - Ah!Ah!... Só vendo agora... atualmente esou mais parado, tocando bateria e cantando, mas o fato de ficar parado não quer dizer nada, porque tocar bateria é muito exaustivo.

Pergunta: - Quais são seus cinco discos favoritos e seus cinco artistas? E o que você costuma ouvir atualmente?
Paulo Barnabé: - Estou ouvindo Gershiw, Rhapsody in blue e Um Americano em Paris e escuto a radio Cultura sempre que dá. Outro dia revi um dos discos tardios que fizeram minha cabeça, Clube da Esquina com todo esse pessoal de Minas Gerais e Milton Nascimento. De rock não estou escutando nada, por enquanto, estou bem desiludido desse gênero e acredito que o que faço não é rock e, sim, uma obra autoral contemporânea.

Pergunta: - Corredor Polonês foi relançado em CD em 2002, mas hoje é uma raridade de se achar. Há alguma chance de um novo relançamento dele? E do primeiro EP?
Paulo Barnabé: - Estive um dia com o Charles Gavin numa entrevista para o seu programa, no Canal Brasil, e ele me disse que essa possibilidade era quase nula. Não há interesse por enquanto, só se o meu próximo trabalho tiver uma repercussão bem grande poderá ser um motivo para um nova reedição.

Pergunta: - Quais são seus planos futuros? Escreveu novas canções? Há planos de um novo CD?
Paulo Barnabé: - Sim, tá tudo dito aí em cima... quero gravar sem preocupações... uma música por vez quando for dando e ir assim, até completar as 11 músicas prontas pra esse novo álbum. Acho que vai demorar um pouco, mas pretendo no meio do caminho lançar um single antes de terminar o álbum com uma ou duas músicas novas.

Pergunta: - O que pensa do mp3 e a da internet?
Paulo Barnabé: - Prefiro os CDs e prefiro mais os vinis, não domino bem internet, mas acho que é o meio revolucionário de divulgação e de escuta, consumo.

Pergunta: - Você se sente antenado com a cena rock atual do Brasil ou não? Sua afinidade é maior com os artistas da sua geração ou se sente próximo aos mais jovens?
Paulo Barnabé: - Nem com artistas de minha geração eu era antenado. Como disse, em algum momento tive contato com os punks: Inocentes, Ratos, Cólera, Olho Seco, Excomungados etc, por um período e o que acontecia no cenário na época eu não acompanhava, ou se acompanhava, era através da mídia. Não é uma atitude ególatra minha, é que realmente não havia semelhanças ou afinidades, o meu som era muito pessoal, não combinava com nada na época. Os caras que se aproximaram de mim, ou que eu também me aproximei, dentro do rock, foram os punks mais radicais.

Pergunta: - Deixe uma mensagem aos fãs, por favor. Obrigado pela chance.
Paulo Barnabé: - Fãs? Por favor, não virem fãs, virar fã é parasitar, he!he!
Grande abraço a todos!!!