Se
tensão e infelicidade são combustíveis essenciais
para se fazer um grande disco, então pode-se dizer que
Porcupine é um dos cinco discos mais essenciais da história.
Após o avassalador Heaven Up Here, feito num clima de felicidade
e paz jamais igualado, o grupo entrou em estúdio para produzir
o terceiro LP com o prestígio em alta, mas vendo as primeiras
diferenças entre os membros aflorando. Ainda assim - ou
até por causa disso - resultou em um disco absolutamente
perfeito. Saiba um pouco mais agora.
"Heaven
Up Here foi o disco mais prazeroso que gravamos. Você
sentia alegria e descontração no estúdio.
Por outro lado, Porcupine foi um pesadelo. Você
sentia que a banda estava começando a se desmanchar e por
isso ele é tão denso, claustrofóbico."
Ian McCulloch não
gosta nem de lembrar o período dessas gravações.
Apesar de ter sido o álbum a dar prestígio definitivo
na carreira do Echo and the Bunnymen, as gravações
de Porcupine foram extremamente caóticas.
O problema todo é
que o grupo não tinha escrito nada após a turnê
promocional do disco anterior. Eles tinham um programa com o radialista
John Peel agendado, local onde geralmente levavam novas canções
em primeira mão. Porém, desta vez tinham apenas
rascunhos. O contrato previa quatro músicas, mas eles só
possuíam três - "No Hands", "Smack"
(que depois viraria "Higher Hell") e "Taking Advantage".
Foi
nesse período que saiu um novo single, The Back
of Love, no dia 21 de maio de 1982. Os seminários
ingleses não gostaram muito da música e disseram
que era confusa demais. A capa foi tirada de uma pintura de Henry
Scott Tuke chamada "The Promise".
Sobre a canção,
Ian comenta: "nós sabíamos que era uma grande
canção e foi minha idéia - embora Will ache
que tenha sido dele e Les também se ache o dono - de colocarmos
um arranjo de cordas que desse mais força à canção".
Foi aí que apareceu o violinista indiano L Shankar, sobrinho
de Ravi.
Bill Drummond foi o responsável
pela vinda de Shankar. Como a banda atravessava um período
turbulento, o produtor achou que o indiano conseguiria dar uma
nova vida à canção, embora nenhum dos membros
tenha concordado com a idéia, originalmente.
As gravações
foram interrompidas por um tempo para que a banda se apresentasse
no festival WOMAD, organizado por Peter Gabriel. E lá tiveram
uma de suas experiências mais interessantes: tocaram "All
My Colours" com a companhia da Royal Burundi Drummers. Os
músicos africanos não falavam inglês e o grupo
teve que pedir ajuda de um intérprete para fazer a versão.
O
período marca também o crescente consumo de bebidas
e cocaína por parte de Ian e do baterista Pete de Freitas.
Pete, aliás, era um motivo de discórdia interna.
Por ser o mais jovem dos
quatro e ter nascido em Trinidad, muitas vezes Pete era alvo de
piadas maldosas por parte dos demais. E a vingança dele
era ir contra os regimentos internos. Para a promoção
do EP Shine's So Hard, apareceu com a cabeça
inteiramente raspada, deixando McCulloch furioso. Depois, entre
1983 e 1984 ele e Jack Brockman, que era considerado o quinto
membro não-oficial, apareceram com barba, o que não
era permitido entre os bunnymen.
Em
janeiro de 1983 sai um novo compacto, The Cutter.
Shankar novamente aparece na canção, utilizando
como base para seu solo "Matthew & Son" para a introdução,
pedida pela banda.
O curioso é que
as duas canções foram as primeiras a fazer grande
sucesso junto ao público britânico, para espanto
da banda. "Nunca pensamos nessas duas canções
como singles. Estávamos apenas tentando fazer
um novo LP", afirma Ian. LP que teria um título curioso:
Happy Loss. Ian relata que sentia que realmente
a banda não iria durar muito, daí o irônico
título.
"The Back of Love"
chegou ao 19º lugar nas paradas de compacto; "The Cutter"
ficou em oitavo.
Em
fevereiro é a vez do disco ser lançado. Não
"Happy Loss", mas Porcupine. É
impressionante como um disco realizado de maneira tão caótica
tenha se tornado um clássico. O disco teve algumas versões
estranhas que surpreenderam os músicos. Afinal, por ordem
da gravadora, alguns arranjos foram modificados escondidos dos
integrantes, adicionando sintetizadores. Ainda assim, o disco
foi um tremendo sucesso, chegando ao segundo lugar da parada inglesa.
Por conta disso, o grupo
realizou um filme de 27 minutos chamado Porcupine - An
Atlas Adventure, onde tocavam seis canções
do disco - "In Bluer Skies"; "The Cutter";
" My White Devil"; "Porcupine"; "Heads
Will Roll" e "The Back Of Love", que foram gravadas
na Islândia e em Liverpool, no final de 1982. A capa, aliás,
foi também produzida na Islândia. A foto mostra a
catarata de Gorfolos.
Apesar
da tensão, Will se lembra de passagens curiosas durante
a realização do disco: "estávamos excursionando
tanto que nem tínhamos tempo de escrever novas canções.
Boa parte dele foi gravado no Air Studios, de Londres e me lembro
de um dia em que Paul McCartney apareceu e ficou jogando Space
Invaders ou Asteroids comigo! Ele foi fantástico
e estava completamente por dentro da nova cena de Liverpool."
Com o sucesso, o Echo começou
a ser encarado como uma banda pop, o que particularmente não
os agradava. Mas Ian aproveitou a recente notoriedade para dar
entrevistas cada vez mais ácidas, onde falava mal de várias
bandas. Sua metralhadora verbal atingia especialmente Bono, do
U2. Ian vivia ridicularizando seu cabelo e ironizava como o cantor
irlandês tinha coragem de se apresentar sem camisa mostrando
pneus na cintura. Ian havia se tornado uma estrela arrogante.
Tanto sucesso acabou redundando
em outra turnê, a mais concorrida até então.
Ela começou no dia 15 de janeiro, em Lancaster e se estendeu
até 12 de novembro, em Bruxelas, na Bélgica. E de
todos esses momentos, um está guardado no coração
de todos: os shows no Royal Albert Hall.
A
última vez que o luxuoso palco londrino havia recebido
uma banda de rock acontecera quase 10 anos antes com o Mott the
Hopple. Desde então, estivera fechado para grupos de rock.
Pois, o Echo realizou duas apresentações - 18 e
19 de junho - que entraram para a história. Os dois concertos
foram gravados e posteriormente as três versões diferentes
de "Do It Clean", apareceram em lados B de compactos
e até na caixa Crystal Days.
"Foram shows mágicos.
A platéia estava conectada conosco e nenhum outro grupo
poderia criar a mesma magia daquela noite. Estou absolutamente
certo disto", falou Ian, que tinha certeza que entre 1983
e 1985 eram a maior banda do planeta, ao vivo, disparado.
Durante
a excursão o grupo gravou um novo compacto, Never
Stop, nos estúdios Amazon, em Liverpool. Para
Ian, era a maior canção deles. Ele conta que Bill
Drummond queria algo do tipo "Boys Keep Swinging", de
David Bowie e que Will também queria um riff dançante
e pensaram imediatamente numa conexão com o New Order,
de quem eram amigos.
O ano de 1983 acabava finalmente
e a banda entraria no ano de 1984 otimista para realizar "o
maior álbum já feito" - não é
mentira, foi promovido desta maneira! - Ocean Rain.
História que já foi contada nesse site, na coluna
número 1.
É isso aí.
Um abraço e até a próxima coluna.
Discografia
Crocodiles (1980)
Shine's So Hard (1981)
Heaven Up Here (1981)
Porcupíne (1983)
Ocean Rain (1984)
Songs to Learn and Sing (1985)
Echo & The Bunnymen (1987)
Reverberation (1990)
BBC Radio 1 In Concert (1992)
Evergreen (1997)
Ballyhoo (1997)
What Are You Going To Do With Your Life? (1999)
Flowers (2001)
Crystal Days 1979-1999 (2001)
Live In Liverpool (2002)
Siberia (2005)
Fillmore - San Francisco Ca 12/5/05 (2006)
House of Blues - West Hollywood Ca 12/6/05 (2006)
The Very Best of Echo & the Bunnymen - More Songs To Learn
& Sing (2006)
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