43 - Régis Martins & Cia Fantasma

Todo ribeirão-pretano (de nascença ou adoção) é, invariavelmente, um bicho estranho. Sempre precisa ficar ciscando, insatisfeito. Deve ser o clima, o calor, o excesso de cerveja ou o cansaço de tirar racha nas largas avenidas ou mesmo de gastar dinheiro nos vários shoppings (quando eu morava lá, só tinha um, pertinho da minha casa...). Então, se não tem o que fazer e já possui uma banda de sucesso mundial, por que não dar uma de Jack White ou Andy Partridge e montar um projeto paralelo, para dar vazão ao imenso talento, vontade de compôr e botar os demônios agroboys para fora? Assim, nasceu o EP Ondas Curtas, de Régis Martins & Cia Fantasma, projeto paralelo de quase todos os membros do Motormama, onde presta uma linda homenagem ao melhor amigo do homem e da esposa (Gisele): Ringo. Mas por que Régis resolveu lançar um novo disco, ao invés de gastar seu dinheiro de rapaz de trabalhador no Pinguim, com a amada? Perguntas, perguntas...


Pergunta: - Regis, por que um projeto paralelo ao Motormama? Não teria como gravar esse disco com o grupo, já que o nome é referência ao terceiro disco (A Legítima Cia Fantasma)?
Régis Martins: -
Rapaz, há 16 anos minha vida "artística" gira em torno do Motormama. São quatro discos (contando o compacto em vinil), EPs, clipes, turnês, festivais, alegrias e tristezas. No início de 2015, quando achava que estava tudo uma maravilha, nosso baterista mudou-se para Brasília para estudar.

Então, respirei fundo e ao invés de ficar me lamentando, resolvi tentar algo diferente, em busca de sarna pra se coçar mesmo. Gosto de artistas como Ty Segall e Jack White que trabalham em várias frentes. Então, a Cia Fantasma é o meu lado mais pessoal, tosco, despojado, garageiro e egoísta. São coisas que acredito que não caberiam no Motormama e não conseguia imaginar gravadas com a banda.

Pergunta: - O EP traz seis faixas, quatro inéditas e duas do Motormama. Fale um pouco delas.
Régis Martins: -
São faixas que estavam meio perdidas por aí e eu não sabia muito o que fazer com elas. O que me restou foi salvá-las desse 'limbo'. Pensei até em dar esse nome ao disco: 'Limbo'. Mas era um troço meio pretensioso, por isso 'Ondas Curtas' tinha mais a ver com o clima das canções. Não tive tempo de testá-las ao vivo, então nasceram praticamente no estúdio. Elas têm algo de incompletas, rudes e despojadas, quase que gravadas ao vivo. Já "Tá Gostoso, Coração" e "Estrelas Perdidas" (que se tornou "Stars Are Lost in Heaven") eram músicas do Motormama que sempre achei muito boas mas que nunca tiveram uma chance. Resolvi retomá-las com novos arranjos. É incrível que ouvindo o EP por inteiro, as músicas se completam. É um disco que é preciso se ouvir por inteiro para entender.

Pergunta: - No Cia. Fantasma não há baixista e o som do teclado lembra muito o de Ray Manzarek, dos Doors. O Alessandro também fez as linhas de baixo nos pedais?
Régis Martins: -
A ideia desde o início era que o teclado tivesse um som bem vintage, garageiro mesmo. Com certeza, Manzarek é uma influência para o Alessandro Perê. Assim como o Arnaldo Baptista na época dos Mutantes e do disco Loki?. Aliás, "Boa Sorte, Meu Chapa" é puro Loki?. E para dar um clima de estranheza e minimalismo, não queria que a Cia Fantasma tivesse um baixista, daí perguntei se ele poderia fazer os baixos. Como o Perê é um grande músico, ele tirou de letra. Ele faz as linhas de baixo com a mão esquerda, como se estivesse tocando um piano. Igual ao Manzarek. Na verdade, nos shows sempre digo que o Perê deveria ganhar dois cachês por fazer isso, hehe.

Pergunta: - Em suas próprias palavras, o Cia. Fantasma é um folk'n'roll do espaço, com elementos garageiros. A capa brinca com o LP Radio Activity do Krafwerk. Quais são as outras influências, diretas ou indiretas?
Régis Martins: -
O meu sonho maluco foi tentar misturar Harvest, do Neil Young com Radio Activity, do Kraftwerk ao gravar 'Ondas Curtas'. Eram discos que não saiam da minha cabeça durante as gravações.

Até por isso, gostaria que ele tivesse mais ruídos "espaciais" entre uma música e outra, assim como Radio Activity, mas não deu tempo porque minha ansiedade era muito grande para lançar o CD, como se tivesse uma batata quente nas mãos. Então acho que a capa faz essa "homenagem" aos alemães que tanto gosto. De resto, muito sixties e até Ennio Morricone foram nossas influências.

Pergunta: - "Lá vamos nós de novo, nessa aventura que não tem fim / tentei manter distãncia, mas é mais forte do que eu". Isso diz muito sobre você e sobre ser músico independente em um país que pouco se lixa para a produção autoral, não?
Régis Martins: -
Ah sim, totalmente. Fazer música autoral no Brasil e no interior paulista é como dar murro em ponta de faca. Mas não consigo viver sem música. É como um vício, uma compulsão ou como diz a letra de Boa Sorte, Meu Chapa": "é um desassossego". Essa letra que abre o disco é tipo uma carta de apresentação. É como se eu dissesse aos meus amigos e parentes que "olha, eu tentei manter distância, mas é mais forte do que eu, sabe". É isso, a música é um troço mais forte do que eu.

Pergunta: - Como tem sido a recepção do CD?
Régis Martins: -
Entonces, até o show de lançamento no Sesc Ribeirão (no dia 5 de agosto) percebi certa desconfiança até dos amigos mais "chegados". Porém, o show foi tão lindo que as pessoas começaram a ouvir mais o disco. Mas até agora não tive uma opinião 'profissional' mesmo, da mídia especializada. Por enquanto, estamos fazendo shows em Ribeirão Preto e tentando lançá-lo em SP nos próximos meses. Graças a parceria com o selo Midsummer Madness, o CD está chegando a lojas da capital paulista e sites de streaming como Spotify e iTunes. Vamos ver até onde vão estas "ondas curtas" . É um mistério porque, apesar dos anos de estrada de seus integrantes, a Cia Fantasma é algo ainda novo pra muita gente.

Pergunta: - Quais são os novos projetos, com o Cia. Fantasma e com o Motormama.
Régis Martins: -
A Cia Fantasma está aí, tentando vender seu peixe. Temos material novo e isso dá um certo gás.

No caso do Motormama, chegamos a participar de um festival aqui perto, o Forro da Lua Cheia, em junho com uma baterista convidada, que, aliás, toca na Cia Fantasma, hehe, a Priscila Contim. E, em novembro, temos um show no teatro daqui, o Pedro II. Vamos pensar em algo novo para 2016, não sei. Algum projeto que realmente valha a pena...

Pergunta: - Seria o sonho de Ringo ser o baterista de vocês ou contiuar sendo apenas o melhor amigo do homem?
Régis Martins: -
Vai saber o que se passa naquela cabecinha canina. Mas na verdade, a música "O Sonho de Ringo" foi escrita por mim e pela Gisele para o nosso cachorro já há um bom tempo e ficávamos cantando mais como curtição, aqui em casa. Até que o nosso "salsichinha" simplesmente parou de andar por causa de uma hérnia de disco nas patas traseiras. Então a música tomou outro rumo e cada vez que a gente cantava pra ele, caíamos no choro. Resolvi colocá-la no disco com um tom mais épico a lá "bangue-bangue a italiana". Claro que quem ama esses bichinhos, vai se ligar na hora, mas é o tipo de música que pode servir pra qualquer coisa. É a música mais ouvida em nossa página no Soundcloud.

Pergunta: - Como é possível adquirir o CD ou conhecer mais a banda? Está disponível em algum site?]
Régis Martins: -
Por enquanto, o CD físico já está a venda pelo site da Midsummer Madness e em lojas como a Locomotiva, de São Paulo. Para download, estão no Spotify, iTunes e Bandcamp.

Pergunta: - Boa sorte, Régis. Um abraço e deixe uma mensagem aos fãs.
Régis Martins:
- Amigos, keep on rockin' in the free world!