Uma banda de rock and roll em estado bruto
da América, na década de 80, importante foi o Replacements.
O grupo, fundado em 1979, era comparado ao saudoso Hüsker
Dü e dono de uma incrível energia ao vivo. Liderados
pelo talentoso e temperamental Paul Westerberg (hoje artista-solo)
fizeram grandes discos, sendo que alguns deles saíram por
aqui, entre eles o clássico Pleased to Meet Me, de 1987.
E se você acha que são uns completos desconhecidos,
te garanto: entre meus nove leitores (eram oito, consegui mais
um), uns quatro me pediram uma bio deles. Sendo assim...
Paul
Westerberg, com então 20 anos incompletos (nasceu em de
31 de dezembro de 1959) queria formar uma banda de garagem, na
cidade de Minneapolis, que já tinham um filho (ainda não
tão famoso) dileto nesse estilo: Hüsker Dü. Procura
daqui, procura dali e dá de cara com os irmãos Bob
(guitarra) e Tommy Stinson (baixo). Com a entrada de Chris Mars
na bateria, nasce o Impediments. Mas a banda logo mudou de nome
após uma briga em um bar. Escolheram então Replacements
e ficaram assim batizados. Enquanto o Dü era violento no
som, mas com uma postura mais compenetrada, Paul e sua gangue
eram, de fatos, wild boys, beberrões e chegados
a uma bela confusão e shows para lá de confusos.
Mesmo assim (ou talvez por isso) conseguiram chamar a atenção
de um selo local, o Twin/Tone.
Com uma contrato na mão,
lançaram seu primeiro disquinho, o compacto I'm
in Trouble/If Only You Were Lonely e o disco Sorry
Ma, Forgot to Take Out the Trash, ambos de 1981. O estilo
era basicamente o mesmo que o Hüsker fazia no início:
um hardcore brutal, com canções de dois minutos,
se tanto, um esporro sem muito sentido. Obviamente, nada aconteceu
em termos de sucesso, rádio, etc...
No
ano seguinte, lançaram o EP Stink, que,
mais uma vez, passou em brancas nuvens, apesar do apoio de Bob
Mould, do Hüsker Dü, então uma banda ascendente
na nova cena americana e que vivia chamando atenção
para seus conterrâneos. Sucesso, ainda que muito tímido,
mas um pouco dele só veio mesmo ao lançarem Hootenanny,
quando começaram a largar a barulheira e burilaram suas
músicas, com influências folk, country e até
blues. Paul começa a fazer letras mais irônicas,
divertidas, saindo um pouco do ranço raivoso que não
eram tanto sua praia. E mostra sua ironia à época
quando afirmou que agora tinha dois trabalhos extras: mais shows
para realizar e tocar músicas novas e mais longas, já
que as novas tinham um acabamento melhor. "Antigamente eu
ganhava o mesmo e trabalhava menos", conta, bem humorado.
E
a confirmação de que eram um dos grandes grupos
de rock do América veio com Let It Be,
de 1984. O grupo faz então um apanhado do som que marcaria
sua história: uma espécie de country-folk-hardcore,
com Paul alternando momentos calmos e de pura barulheira. Como
curiosidades, uma bela cover de "Black Diamond", do
Kiss e uma parceria curiosa: pegaram a canção de
Ted Nugent "Cat Scratch Fever" e a transformaram em
Gary's got a Boner."
Talvez a melhor canção seja a faixa de abertura,
"I Will Dare". Veja a letra:
How young are you?
How old am I?
Let's count the rings around my eyes
How smart are you?
How dumb am I?
Don't count any of my advice
Oh, meet me anyplace
or anywhere or anytime
Now I don't care, meet me tonight
If you will dare, I might dare
Call me on Thursday,
if you will
Or call me on Wednesday, better still
Ain't lost yet, so I gotta be a winner
Fingernails and a cigarette's a lousy dinner
Young, are you?
Meet me anyplace
or anywhere or anytime
Now, I don't care, meet me tonight
If you will dare, I will dare
Let It Be
fez deles um dos artistas "underground" (muito mais
chique do que ser "indie") de maior prestígio
e, por tabela, um contrato com uma major, no caso, a Sire (que
tinha entre outros, os Talking Heads). E as coisas começaram
a fazer água, não tanto pela qualidade, mas pelos
problemas. E são muitos..
Tim, primeiro
álbum na casa nova, começou com uma polêmica.
Alex Chilton (um antigo ídolo de Paul e ex-líder
do grande Big Star) seria o produtor do disco, mas a coisa acabou
dando errado e Tommy Erdelyi, ex-Ramones, ficou com a incumbência.
Ainda assim, o disco foi aclamado por todo o país, mantendo
o nível do anterior, Let It Be e os Replacements
estavam muito perto de serem a nova grande banda de rock dos Estados
Unidos, uns bons anos antes do R.E.M. ocupar esse posto. Um convite
para o famoso programa humorístico Saturday Night Live,
para o país inteiro seria o carimbo último para
o estrelato. E foi aí que tudo começou a ruir: os
músicos estavam completamente bêbados e tocaram com
um desleixo inconcebível para um programa em rede nacional,
e ao vivo. Para piorar, Paul soltou um sonoro fuck you,
que chocou público, produtores e gravadora. O mundo começou
a desabar em cima deles, que ainda assim, seguiram em frente.
Mas os excessos estavam matando a banda que vivia chapada em seus
shows, incapazes de ficarem até o fim deles.
Outro
problema era a recusa em fazer clips das canções,
isso quando todos queriam uma exposição na então
emergente MTV. Com tanto problemas, alguém tinha que pagar
o pato e acabou sobrando para Bob Stinson, o que mais vivia drogado
e alcoolizado. Tim, seu irmão, lembra da saída e
do período turbulento: "foi algo doloroso de se fazer,
porque antes de sermos amigos, era meu irmão. O problema
de Bob é que ninguém conseguia segurar a onda dele,
que não conseguia nem lembrar os acordes das canções.
Eu fiquei metade feliz com sua saída e metade arrasado
por sermos melhores amigos um do outro desde sempre." Tragicamente,
no dia 15 de fevereiro de 1995, Bob foi encontrando em seu apartamento
em Minneapolis, morto, aparentemente por uma overdose.
O
trio restante tratou de juntar os cacos e fizeram outro belo trabalho,
Pleased to Meet Me, um disco maduro e cheio de
clássicos. O maior destaque é a canção
"Alex Chilton" que Paul compôs para o homem que
deveria ter produzido Tim.
Veja a letra da música:
If he was from
Venus, would he feed us with a spoon?
If he was from Mars, wouldn't that be cool?
Standing right on campus, would he stamp us in a file?
Hangin' down in Memphis all the while.
Children by the
million sing for Alex Chilton when he comes 'round
They sing "I'm in love. What's that song?
I'm in love with that song."
Cerebral rape and
pillage in a village of his choice.
Invisible man who can sing in a visible voice.
Feeling like a hundred bucks, exchanging good lucks face to face.
Checkin' his stash by the trash at St. Mark's place.
Children by the
million sing for Alex Chilton when he comes 'round
They sing "I'm in love. What's that song?
I'm in love with that song."
I never travel
far, without a little Big Star
Runnin' 'round
the house, Mickey Mouse and the Tarot cards.
Falling asleep with a flop pop video on.
If he was from Venus, would he meet us on the moon?
If he died in Memphis, then that'd be cool, babe.
Children by the
million sing for Alex Chilton when he comes 'round
They sing "I'm in love. What's that song?
I'm in love with that song."
Novamente crítica
e público receberam a banda de braços abertos, e
durante a turnê fixaram Slim Dunlap como novo guitarrista-solo.
E, apesar de terem mandando embora um amigo e companheiro precioso
por causa das drogas, os demais continuavam a abusar de tudo que
podiam, embora jurassem ter controle sobre seus atos, ainda que
os as performances nos shows não mostrassem isso.
Um
hiato de dois anos e banda volta com outro belo LP, Don't
Tell a Soul, onde pela primeira vez, mostravam-se limpos,
sem uso de aditivos químicos. Além de sóbrios,
resolveram aceitar as pressões da gravadora e fãs
e até toparam fazer clips, sendo a canção
"I'll Be You", a primeira escolhida. Ela teve uma razoável
acolhida nas paradas, sendo a número 51. Mas ainda que
quisessem mostrar uma nova faceta mais séria e madura,
o bonde já havia passado e o estrelato que tanto poderiam
ter alcançado era cada vez mais um sonho perdido.
"Após anos
de loucuras, resolvemos que tínhamos apenas mais uma chance
para sermos grandes como o R.E.M., por exemplo. Sentamos e dissemos:
'ok, vamos parar com as drogas, ser mais flexível com a
gravadora e com os fãs, experimentar um pouco da grande
mídia. Só que ela nos mostrou não ter muito
interesse agora talvez pelo nosso passado", confessa Paul.
Como a banda não
iria mais decolar e Paul sabia que o fim era apenas uma questão
de tempo, pediu para a Sire lançar um disco-solo. Porém,
a gravadora recusou a idéia, querendo tentar mais uma vez
com todos. O resultado foi All Shook Down, de
1990, que pode ser considerado o primeiro solo de Paul, embora
seja um disco dos Replacements. Cheio de músicos convidados
e com Westerberg dando as cartas muito mais do que antes, All
Shook Down era um disco mais acústico, fato que desagradou
o baterista Chris Mars, que saiu fora, acusado o colega de manipulador,
egocêntrico, centralizador e querendo uma liderança
que só ele achava possuir.
Para a excursão
promocional chamaram outro músico de Minneapolis, Steve
Forley, ex-Things Fall Down. Após a fraca turnê e
vendagem, todos se separaram e Paul finalmente começava
sua carreira-solo. Longe da pressão da banda e à
vontade para realizar suas idéias começou emplacando
duas canções na trilha-sonora de Singles.
No ano seguinte, lançou seu primeiro trabalho realmente
solo, 14 Songs conseguindo um certo êxito
com a canção "World Class Fad" e sonhou
em ser um artista de sucesso, idéia que rejeitara e perdera
anos antes.
Eventually,
o disco posterior teve o mesmo blá blá positivo
e no ano seguinte, resolveu radicalizar: abandonou a gravadora,
inventou a persona Grandpaboy e resolveu voltar às
suas raízes, para alegria dos fãs, que não
tinham gostado muito de sua carreira sem os Replacements. Assinou
com a Monolyth Records, um selo de Boston, do amigo Darren Hill,
e em 1997 lançou o EP Grandpaboy.
Paralelamente,
assinou com a Capitol Records para gravar com seu próprio
nome, lançando, em 1999, Suicaine Gratifaction.
Mas dois anos antes, os fãs dos Replacements foram agraciados
com a coletânea dupla All For Nothing/Nothing For
All, um projeto curioso.
Por razões legais,
a Sire não pôde utilizar as gravações
da Twin/Tone, que continham a fase mais pesada do grupo até
o espetacular Let It Be, ficando apenas com as
músicas do grupo pelo seu selo. Se o disco um (All
For Nothing) era só com velhos sucessos, o dois
(Nothing for All) ficou com as belezas escondidas,
entre elas "Can't Hardly Wait", produzida por Chilton,
e "Date to Church, com Tom Waits. O disco serviu também
para mostrar a enorme influência do grupo em bandas como
Nirvana, Wilco e demais e sedimentar o grupo, ao lado de R.E.M.
e Hüsker Dü como os três nomes mais importantes
das bandas under norte-americanas dos anos 80.
Já vencido o desejo
de ser um cantor popular, e depois que a Capitol o dispensou alegando
não ser comercialmente viável, Paul deu um tempo
relativamente longo até voltar com o projeto Mono/Stereo.
A história é singular. Travestido de Grandpaboy,
lançou Mono, um disco extremamente cru, cheio de guitarras
e que como mesmo descreveu "feito com mãos suadas
e sem uma razão específica". Já o Paul
ficou com Stereo, um disco inteiro acústico e melhor produzido.
A edição com os dois, lançada pela Vangrant
saiu por aqui, no início de 2003, é encontrado a
um preço bem em conta e já foi comentado na seção
de lançamentos desse site.
Satisfeito
sozinho e mantendo a boa qualidade de anos anteriores, Paul Westerberg
segue sendo um dos artistas underground (ou independentes se preferir,
está mais em moda atualmente...) que estão por aí.
Uma pessoa que faz um bom rock e com boas sacadas e idéias.
Deixo com vocês mais uma letra do disco Pleased
to Meet Me, "I.O.U." e de "Gary's got
a Boner". Aliás, Pleased to Meet Me é fácil
de achar em sebos da vida e baratinho. Um abraço e até
mais!
I.O.U.
Give me a little
stinkin' fresh air
Ninety days/night and day in the electric chair
Step right up son
Gonna show you something ain't never been done
You're all fucked
Listen, it don't
cost much
I lay down the line that you touch
Never do what you're told
There'll be time, believe me, when you're old
You're all wrong and I'm right
Please be on your
honor
Please be on your side [...sucker?]
(back in here)
Listen to the story
all right
I'm losing all I own on that dotted line
Step right up son
Gonna show you something ain't never been done
You're all wrong and I'm right
You see I want
it in writing, I owe you nothing
want it in writing, I owe you nothing
want it in writing
Gary's got a boner
Hut..yeah..c'mon
C'mon little kiddie
(Gary?), get your head on right
C'mon little kiddie (Gary?), get your head on straight
You're gonna get her down
You're gonna finger to her
You're gonna suck me down
You're gonna see her out...
Forget about the
lights, girl, and the cars
You never heard somebody so far
Grab a hold, gonna hold
You're gonna stick it to her
You're gonna stick it to her
Gary got a boner
'Cause Gary's got a boner
Gary got a boner
Gary's got a boner now
You locked that
door, rolled up that window
Tied your sister up by the fender
I don't know if I will
You're gonna stick it to her
Yes, you're gonna stick it to her
Gary got a boner
Gary's got a boner
Gary's got a soft-on
Enough for more, more, more, more
Let it go
Discografia
I'm in Trouble/If Only
You Were Lonely (compacto, 1981)
Sorry Ma, Forgot to Take Out the Trash (1981)
Stink (EP, 1982)
Hootenanny (1983)
Let it Be (1984)
I Will Dare (EP, 1984)
Tim (1985)
Pleased To Meet Me (1987)
Don't Tell a Soul (1989)
All Shook Down (1990)
All For Nothing/Nothing for All (1997)
Discografia de
Paul Westerberg
Dyslexic Heart (1992)
14 Songs (1994)
Eventually (1996)
Grandpaboy (como Grandpaboy, 1997)
Suicaine Gratifaction (1999)
Mono (como Grandpaboy, 2002)
Stereo (2002)
Come Fell Me Tremble (2003)
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