De todas as
entrevistas que fiz, essa foi a mais prazeirosa. Primeiro, porque
a voz de Sal Valentino ocupa a minha cabeça há mais
de uma década. Segundo, porque eu não achava que
ele seria tão educado e responderia todas as perguntas
com mensagens tão
longas. Sal (para quem não sabe) era vocalista dos Beau
Brummels, banda de San Francisco na década de 60 e uma
das grandes belezas escondidas daquela década. E Sal, além
de ser extremamente simpático, deu sua primeira entrevista
ao Brasil e contou coisas que nunca havia lido, como a ausência
de amizade com Ron Elliott, o principal compositor da banda, e
o trabalho com Sly Stewart, mundialmente depois conhecido como
o líder do Sly and the Family Stone, além de um
certo desprezo pelos Byrds. Se você quer ouvir o que um
grande nome da época de ouro do rock tem a dizer, relaxe
e leia o bate-bola a seguir. As fotos são uma cortesia
do site oficial, BeauBrummels.com,
gentilmente cedidas por Sal e por Hayes Reed, webmaster da mesma.
Pergunta:
- Como surgiu o grupo?
Sal Valentino: - O Beau Brummels originou-se em San Francisco,
Califórnia. Eu conheci Ron Elliot quando eu tinha 15 anos
e ele, 13. Estávamos participando de um evento beneficente
na nossa vizinhança, junto com a escola, a igreja local
e o clube salesiano para jovens, mas não éramos
parceiros, ainda.
Ele estava com o cantor
John Franco Giotta e eu estava cantando com um guitarrista chamado
Bob Gradek. Eu era um dos únicos que conhecia a country
e western music na época. Ron também conhecia os
estilos através de seu pai e ele era, de longe, o melhor
guitarrista com quem eu havia cruzado. Ele estava ansioso por
começar uma carreira na música e um colega meu de
escola, Joe Bratesani, que tocava acordeão, tinha um monte
de compromissos - casamentos, bailes promocionais, festas de escolas
- e trabalhava com Ron.
Eu então conheci
Bob Gaglioni, que tocava 16 instrumentos e poucos anos depois,
John Peterson tocou em alguns shows conosco. Nós quatro
começamos a trabalhar com John Hooley, que estava arranjando
alguns eventos sociais irlandeses dentro da Califórnia.
Em uma tarde, Ron conheceu Declan Mulligan, que queria entrar
em nossa banda tanto quanto desejava ir para a Irlanda. Declan
era um grande fã dos Beatles e desejava ser mais popular
do que eles.
Em
San Francisco, os jovens ouviam mais R&B e Motown e John curtia
mais jazz, country e western. Ron queria algo fora do R&B
e Declan, mais velho do que nós, acabou exercendo uma grande
influência, quando aconteceu a "invasão britânica
e européia". Ron Meagher foi apresentando a Ron por
um amigo e acabou virando nosso baixista, já que Bob Gaglioni
tinha caído fora.
Nessa época eu
trabalhava em clubes em North Beach e tinha gravado meu primeiro
disco e feito uma aparição no San Francisco's Dance
Party, muito semelhante ao Dick Clark' American Dance Party que
era televisionado diretamente da Filadélfia. Foi nessa
época que Ron me chamou e perguntou se eu estava interessado
em montar um banda que ele, Declan e John estavam formando.
Eu fui a um ensaio, gostei
e fiquei. Declan surgiu então com o nome The Beau Brummels,
que usamos em nosso primeiro show e na falta de outro, o adotamos.
Eu não sabia nada sobre o nome e até hoje não
sei porque só usamos um "L" ao invés de
dois.
Pergunta: - "Laugh
Laugh" e "Just A Little" foram grandes sucessos.
Você poderia contar como foram aqueles dias?
Sal Valentino: - Nós ficamos juntos durante o
verão para ganharmos algum dinheiro e, inicialmente, não
duraríamos mais do que seis meses. Mas em três meses
tínhamos um enorme sucesso com "Laugh Laugh".
Tom
"Big Daddy" Donahue e Bob Mitchell tinham nos assistido
em North Beach e depois foram até San Mateo, onde nos apresentávamos,
junto com Sly Stewart, antes de ele virar o famoso Sly and the
Famly Stone. Sly deu à Autumn o primeiro sucesso da gravadora,
"The Swin", e depois produziu sucessos para Bobby Freeman
e o primeiro álbum do Beau, assim como nossos hits "Laugh
Laugh" e "Just a Little".
Após "Just
a Little" começar a fazer sucesso, fomos para a estrada,
aproveitando o bom momento e o nosso primeiro concerto foi tocado
em Sacramento, onde vivo há 11 anos, no Memorial Auditorium.
Quando chegamos para o
concerto da tarde, vi milhares de jovens nos esperando, uns 2
ou 3 mil. Eles queriam nos tocar, nos ouvir, pegar autógrafos
e berravam. Acabaram invadindo o palco quando começamos
a tocar "Laugh Laugh". Estávamos assustados e
surpresos com a experiência e a vida na estrada tomou boa
parte do ano de 1965 para nós.
Viajar através dos
Estados Unidos foi uma experiência muito interessante, porque
nunca sabíamos o que ia acontecer. Quando tocamos na Nova
Inglaterra, contratamos limousines em Nova York, que nos levaram
para o show até lá e nos trouxeram de volta para
a cidade, no mesmo dia.
Em
San Francisco, no entanto, a situação era totalmente
diferente e nunca fazíamos shows lá. Quando Ron
descobriu que tinha diabetes, ficou mais em casa e na estrada
foi substituído por músicos, até fixarmos
Don Irving, que trabalhava como roadie para nós. Não
havia groupies nesse primeiro ano, apenas meninas de
12 ou 13 anos que queriam nossos autógrafos e coisas como
adesivos, etc...
Pergunta: - A
diabete de Ron atrapalhou muito a vida do Beau Brummels, não?
Sal Valentino: - Sim, quando ele descobriu que era diabético,
refletiu imensamente em todos nós, e tivemos que cancelar
uma turnê européia por isso.
Pergunta: - Vocês
surgiram em San Francisco um pouco antes da explosão da
cena psicodélica. O grupo perdeu público quando
o Grateful Dead apareceu?
Sal Valentino: - Quando o UnGrateful Dead apareceu não
tocávamos em San Francisco ou na Califórnia, porque
nossas vendagens eram ótimas no resto da América.
Até hoje, a Califórnia
é considerada um mundo à parte da indústria
musical e nunca foi líder do top 40 de rádios ou
dos artistas que mais vendem. Então tínhamos nossos
fãs locais de Sacramento, mas nossa atenção
era mesmo o meio-oeste e os estados da parte leste. Por isso,
a audiência que o Grateful Dead construiu nada tinha a ver
conosco.
Pergunta: - Sly
Stewart foi um grande produtor, não?
Sal Valentino: - Sly era o produtor perfeito para o Beau
Brummels. Ele tocava vários instrumentos e nos ensinava
a tocar, além de sempre nos apoiar dentro do estúdio.
Ele tinha aprendido muito sobre como construir um grande sucesso
e não tinha medo de arriscar e de errar. Ele tinha um grande
senso de ritmo e adorava minha voz, assim como as composições
de Ron. Além disso, ele compartilhava conosco o fascínio
pelas bandas inglesas que invadiam a América.
Pergunta:
- E se faziam sucesso na Autum porque foram para a Warner?
Sal Valentino: - Não tivemos escolha, já
que a Autumn faliu e nos vendeu para a Warner Brothers. E além
disso o Top 40 davam mais valor às grandes gravadoras (Columbia,
Capital, RCA), já que tinham mais artistas disponíveis
e eles começaram a assinar com novos artistas.
Pergunta: - Vocês
não tiveram um bom começo com o disco Beau Brummels
'66. Por que fizeram um disco de covers?
Sal Valentino: - A Warner sentiu que eles poderiam promover
melhor um álbum desse tipo. Infelizmente, estavam errados.
Eles erraram ao tentar fazer dinheiro fácil com essas coisas
e alguns bons artistas sofreram com esse tipo de ganância
por parte da Warner.
Não conseguiriam
deter Jimi Hendrix, por exemplo, mas conseguiram frear a carreira
do Everly Brothers. Eu não me surpreenderei se os discos
que a Rhino Records adquiriu junto a eles, forem lançados
em um formato do tipo 4 em 1 pela Warner.
Pergunta:
- Como foi a reunião de 1975?
Sal Valentino: - A reunião foi motivada por Ron
e bolada por ele, que esperava muito mais e acabou ficando muito
desapontado. Foi um triste esforço.
Pergunta: - E como
era a amizade entre vocês dois?
Sal Valentino: - Nunca fomos amigos. Por alguma razão,
ele sempre era mais amigo do outros do que de mim. Ele se mudou
para a Warner antes de todos nós, sem nos avisar, e depois
soubemos que eles não se interessavam nos Beau Brummels
sem a minha a voz e então fui convidado por ele para trabalhar
com o produtor Lenny Waronker, que faria os discos da banda.
Pergunta: - Vocês
foram comparados aos Byrds, especialmente nos discos Bradley's
Barn e Triangle. O que acha disso?
Sal Valentino: - Tudo que posso dizer é que sempre
fomos melhores do que eles. Eles eram mais country e folk do que
desejávamos e éramos muito mais criativos do que
eles jamais sonharam em ser.
Pergunta:
- Me fale um pouco da participação de vocês
no desenho The Flintstones...
Sal Valentino: - Essa participação foi
o meu momento favorito de toda a carreira do Beau Brummels e foi
feito sem que tivéssemos que trabalhar, mas a Hanna Barbera
fez toda a animação em cima de nós e quando
vi o resultado final fiquei muito emcionado e com um grande sorriso
e me senti muito afortunado por isso.
Pergunta: - Vocês
possuem um grande número de fãs aqui no Brasil,
sabia?
Sal Valentino: - Não sabia, mas agradeço
pelo carinho e interesse de vocês e espero um dia ir até
o Brasil.
Pergunta: - Muito
obrigado pela entrevista Sal...
Sal Valentino: - Eu é que agradeço a chance
de falar com você e peço desculpas pela demora em
mandar as respostas.
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