Poucos artistas ou pessoas podem receber o título de "Instituição Nacional". Na Irlanda do Norte encontraremos duas, com certeza: o futebolista George Best e o grupo Stiff Little Fingers. Nascidos durante o período punk, o "Irish Clash" como são conhecidos, continuam ainda tocando, comovendo e espalhando sua mensagem de inconformismo e falando da dureza de ser viver em Belfast durante os turbulentos anos 70. Liderados pelo falante e divertido Jake Burns, o Stiff ainda permanece atual, vivo e poderoso em cima de um palco.

Segundo Jake Burns, tudo começou vendo o show de despedida do Taste, banda em que começou Rory Gallagher. "Eu tinha 12 anos e quando vi aquele show ao vivo, pensei "é isso que quero fazer!".

Dessa maneira Jake Burns começou a montar uma banda no começo dos anos 70 chamada Highway Star, nome tirado de um grande sucesso do Deep Purple.

A vida em Belfast era dura e eles viviam fazendo covers de artistas famosos até surgir o movimento punk. Inspirado pela letra "Stiff Little Fingers", da banda Vibrators - "If it wasn't for your stiff little fingers/ nobody would know you were dead" - lado B do compacto "London Girls", nascia o Stiff Little Fingers abandonando o provisório e previsível nome The Fast.

A banda contava com Jake Burns (vocais e guitarra); Henry Cluney (guitarra); Gordon Blair (baixo) e Brian Faloon (bateria).

Em novembro de 1977 conheceram o jornalista Gordon Ogilvie, do Daily Express, que os incentivou a escrever canções próprias e que retratassem a vida de Belfast. Jake topou e em 12 dias veio com "Suspect Device" e "Wasted Life"

As duas canções mostravam a pena firme de Jake, que misturava temas políticos com angústias pessoais, com refrões inesquecíveis e uma pegada punk forte.

Gordon acabaria se tornando o empresário do grupo: "estava procurando publicidade até que um dia Gordon veio conversar comigo. Fomos tomar uma cerveja e perguntou se tínhamos empresário. Disse que não e perguntou se poderia nos ajudar. Aceitei."

Além de Gordon, Colin McClelland comprou a causa do grupo e arranjou um estúdio para que pudessem gravaras duas músicas. Resolveram editar 350 cópias pela gravadora de Ogilvie e começaram a distribuição, sem nenhum sucesso. A sorte mudou quando uma das fitas caiu na mão do DJ John Peel.

Apaixonado pelo que ouvia, Peel começou a tocar as músicas incessantemente chamando a atenção da gravadora Rough Trade, que os contratou.

Enquanto isso, um fanzine de Belfast pediu que escrevessem uma canção especialmente para o flexi-disc que iriam lançar. O flexi acabou não saindo, mas "Alternative Ulster" (nome do mesmo zine) acabaria sendo o grande clássico do grupo e seria o primeiro compacto lançado pela Rough Trade, em outubro de 1978....

O compacto acabou trazendo uma rivalidade de outra famosa banda norte-irlandesa, The Undertones, que acusou o Fingers de fazer sensacionalismo com os conflitos na Irlanda do Norte. Começava uma rivalidade que atravessaria décadas...

Durante o lançamento, o Fingers saiu em turnê abrindo os shows de Tom Robinson Band e em 1979 lançam o clássico LP Inflammable Material.

O disco foi um tremendo sucesso com o apoio de John Peel e alcançou a 14ª posição, tornando-se o primeiro disco independente a entrar na parada oficial.

Inflammable Material é um excepcional trabalho disco de estréia, onde se destacam as faixas assinadas por Burns/Ogilvie como "Suspect Device", "Alternative Ulster", "State of Emergency" e "Wasted Life" (feita apenas por Burns). A veia punk estava toda lá, assim como músicas mais elaboradas, um exemplo é "Johnny Was", de Bob Marley, onde a banda mostra sua versatilidade tocando um bom reggae. Em "Barbed Wire Love", o grupo mostra bom humor fazendo vocais no estilo doo-wop.

A banda resolve se mudar para Londres e Brian Faloon resolve ficar em Belfast.

Ele acaba sendo substituído por Jim Reilly e é "homenageado" na canção "Wait and See". A primeira aparição de Jim é no novo compacto, "Gotta Gettaway".

Naquele verão participam do evento "Rock Against Racism Tour", um movimento contra o racismo que assolava a Inglaterra. Participaram dele The Clash (show presente no filme Rude Boy),Buzzcocks, Steel Pulse, X-Ray Spex, The Ruts, Sham 69, Generation X e Tom Robinson Band, para mais de 80 mil pessoas.

Em 1980, o grupo deixa a Rough Trade e se muda para Chrysalis Records, que aceita dar total controle artístico ao grupo, algo bem incomum. Na nova casa, lançam o igualmente espetacular Nobody's Heroes.

O disco segue a cartilha punk, com protesto anti-militares e anti-racistas e mostra o Stiff Little Fingers igualmente inspirado. Faixas como "Gotta Gettaway" (Fingers/Ogilvie); "Wait and See" (Burns/Ogilvie) e "Fly the Flag" (Fingers/Ogilvie) são outros sucessos.

(Aos interessados em adquirir os dois primeiros álbuns, uma boa notícia é que os dois podem ser importados a preços baixos (para nossos padrões) no site das Lojas Americanas.

Em 1981 é a vez de novo disco, Go For It e após a excursão promocional, Jim Reilly deixa o grupo entrando Brian "Dolphin" Taylor.

Em 1982 é lançado o disco Now Then... que fez pouco sucesso e após a excursão, a banda se separa em 1983.

"Now Then... é um disco injustiçado e após o fracasso vi que era melhor nos separarmos. Curiosamente, todos os ressentimentos apareceram e foi a única vez em que brigamos de verdade", lembra Jake.

A banda ficou cinco anos separada e cada um foi cuidar da vida. Em 1988, Ali ligou para Jake convidando-o para ver o show da volta de Tom Robinson Band. "Não estava animado, mas acabei indo e voltamos a conversar, a beber e falamos de uma possível volta".

Ali conta que eles perceberam que o melhor período de suas vidas aconteceram dentro do grupo.

A banda voltou a se reunir para shows sempre lotados e fizeram duas apresentações no Brixton Academy com fãs vindo de todos os cantos do planeta - Japão, EUA - para vê-los.

O grupo resolveu voltar à ativa e Ali percebeu que não teria como conciliar sua vida com shows e gravações e acabou cedendo lugar ao ex-baixista do The Jam, Bruce Foxton. Em 1991 lançam Flag and Emblems.

Em 1994, lançam Get A Life, e ganham destaque ao serem citados como pais da nova geração punk que começa aparecer liderados por Rancid, Green Day etc

Em 1996, Dolphin deixa a banda entrando Steve Grantley e em 1999 lançam Hope Street, em dois formatos - ao vivo e uma coletânea - e, em 2003, saio último disco de estúdio, Guitar And Drum.

O grupo ainda permanece tocando. Em 2006 Bruce deixou o grupo de forma amigável retornando AliMcMordie ao antigo posto. Nos shows, a banda prefere tocar material novo ao antigo, embora saiba que isso não é possível sempre. "É preciso balancear. O perigo é ficarmos caricatos, mas não podemos decepcionar os antigos fãs e nem canções que nos deram fama", conta Jake.

Jake, aliás, nao gosta de ver seus discos relançados com faixas bônus e material extra: "é uma maneira de pilharmos os fãs novamente. Ok, eles fazem pequenas mudanças e melhoram o som, mas isso não me parece correto."

Nos dois primeiros discos, há na última faixa uma longa entrevista com o diretor Alan Parker (The Commitments, The Wall), onde Jake conta tudo sobre o grupo.

Deixo vocês com a letra de "Alternative Ulster" e "Suspect Device". Um abraço e até a próxima coluna.

ALTERNATIVE ULSTER
(Fingers/Ogilvie)

Nothin' for us in Belfast
The Pound's so old it's a pity
OK, there's the Trident in Bangor
Then walk back to the city
We ain't got nothin' but they don't really care
They don't even know you know
Just want our money
And we can take it or leave it
What we need is

(Chorus:)
An Alternative Ulster
Grab it and change it it's yours
Get an Alternative Ulster
Ignore the bores and their laws
Get an Alternative Ulster
Be an anti-security force
Alter your native Ulster
Alter your native land

Take a look where you're livin'
You got the Army on your street
And the RUC dog of repression
Is barking at your feet
Is this the kind of place you wanna live?
Is this where you wanna be?
Is this the only life we're gonna have?
What we need is

(Chorus)

They say they've got control of you
But that's not true you know
They say they're a part of you
And that's a lie you know
They say you will never be
Free free free

Get an Alternative Ulster, Alternative Ulster, Alternative Ulster

SUSPECT DEVICE
(Fingers/Ogilvie)

Inflammable material is planted in my head
It's a suspect device that's left 2000 dead
Their solutions are our problems
They put up the wall
On each side time and prime us
And make sure we get fuck all
They play their games of power
They mark and cut the pack
They deal us to the bottom
But what do they put back?

(Chorus:)
Don't believe them
Don't believe them
Don't be bitten twice
you gotta suss, suss, suss, suss, suss out
Suss suspect device

They take away our freedom
In the name of liberty
Why don't they all just clear off
Why won't they let us be
They make us feel indebted
For saving us from hell
And then they put us through it
It's time the bastards fell

(Chorus)

Don't believe them
Don't believe them
Question everything you're told
Just take a look around you
At the bitterness and spite
Why can't we take over and try to put it right

(Chorus)

We're a suspect device if we do what we are told
But a suspect device can score an own goal
I'm a suspect device the Army can't defuse
You're a suspect device they know they can't refuse
We're gonna blow up in their face

Discografia

Compactos

Suspect Device/Wasted Life (1978)
Alternative Ulster/78 RPM (1978)
Gotta Gettaway/Bloody Sunday (1979)
Straw Dogs/You Can't Say Crap On The Radio
(1979)
At the Edge/Running Bear/White Christmas (1980)
Nobody's Hero/Tin Soldiers (1980)
Back To Front/Mr. Fire Coal Man (1980)
Just Fade Away/Go For It/Doesn't Make It All Right (1981)
Silver Lining/Safe As Houses (1981)
Listen/That's When Your Blood Bumps/Sad-Eyed People/Two Guitars Clash (1982)
Talkback/Good For Nothing (1982)
Bits of Kids/Stands to Reason (1982)
The Price of Admission/Touch and Go (1982)
Get a Life/Harp/Tin Soldiers (1995)

Discos

Inflammable Material (1979)
Nobody's Heroes (1980)
Hanx! (1980)
Go For It (1981)
Now Then (1982)
All The Best (1983)
The Peel Sessions (1989)
Flags and Emblems (1991)
Get A Life (1994)
Tinderbox (1997)
And Best Of All... Hope Street (1999)
Hope Street... Greatest Hits Live (1999)
Guitar And Drum (2003)