179 - The Sugarcubes

Muito antes de Björk virar a musa da música eletrônica e alternativa, ela já tinha feito coisas bem legais. Entre todas elas, foi essa curiosa e fantástica banda formado em sua Islândia natal, o Sugarcubes. Formada em 1986, o grupo fez um imenso sucesso com o disco Life's Too Good, e com clássicos do quilate de "Deus", "Motorcrash" e "Birthday", primeiro single e que até hoje procuro em uma edição para lá de curiosa: um remix feito pelos irmãos Reid, do The Jesus and Mary Chain. Depois disso, fizeram um fraco segundo disco e mais alguns trabalhos até Björk resolver seguir uma carreira-solo. Mas deixaram seu nome na virada dos anos 80 e 90, e alguns punhados de melodias inesquecíveis.


De vez em quando, o pop internacional é invadido por bandas "exóticas", que cantam em inglês, mas que nada tem a ver com os Estados Unidos ou o Reino Unido.

Nos anos 70, os suecos do ABBA fizeram tanto sucesso que viraram ícones. Nos anos 80, as meninas ficavam histérias com o trio gelado da Noruega, A-ha e nos anos 90, a Suécia voltou a ser notícia com o Roxette e o Cardigans. Mas houve uma outra grande banda, vindo de um lugar ainda mais improvável, a Islândia: o Sugarcubes.

Se você desconhece a banda, saiba que nela cantou uma pequena menina, com cara de esquimó e que hoje é uma das musas da cena eletrônica, Björk.

E o Sugarcubes apareceu fazendo um som totalmente diferente do convencional, graças, em parte, aos vocais da cantora e aos instrumentos pouco convencionais no pop, como o trumpete.

E todos os integrantes da banda já eram veteranos quando o grupo explodiu em 1988, com a canção "Birthday". Vamos traçar a origem desses islandeses.

Reza a lenda que a banda nasceu no dia 8 de junho de 1986, quando nasceu o primeiro filho de Björk (seu nome completo é Björk Gundmundsdottir). Para celebrar o acontecimento, vários amigos formaram o Sugarcubes.

Björk contava com 20 anos (nasceu em 21 de novembro, em Reikjavik, capital da Islândia) e já era uma veterana dos palcos.

Aos 11 anos havia gravado um disco infantil e, em sua adolescência, havia passado pelas bandas Tappi Tikarrass (com quem lançou dois discos) e pelo K.U.K.L., que fazia um som pós-punk bem ruidoso e lançou vários compactos pelo selo independente britânico Crass.

O baterista Siggi Baldursson (nome completo: Sigtryggur Baldursson, era membro do þeyr (conhecido como Theyr), que teve um momento de glória ao gravarem, em 1982, com dois membros originais do Killing Joke, o cantor Jaz Coleman e o baixista (e futuro produtor de renome) Youth.

Nessa mesma época, Einar Benediktsson e Bragi Olafesson formaram um grupo punk chamado Purrkur Pillnikk, que lançaram alguns discos por um selo próprio. Em 1984, Björk, Benediktsson e Baldursson resolveram juntar forças e montar o K.U.K.L., com o tecladista Einar Mellax, que significa bruxa, em islandês.

Em 1986, com a adição do marido de Björk, Thor Eldon (guitarra) e Bragi Olafesson (baixo), formaram o Sugarcubes.

No início, a banda não era a prioridade dos músicos, já que todos tinham um segundo emprego. De acordo com o baterista Siggi, eles dedicavam apenas 15% de seu tempo ao grupo, ficando os outros 85% para uma profissão mais rentável.

Mas o grupo já tinha uma identidade sonora muito particular e um grande apelo visual, especialmente de Björk. No final de 1987, a banda já era assediada por várias gravadoras inglesas, e acabaram assinando com a pequena One Little Indian, no Reino Unido e com a Elektra, na América.

Em outubro de 1987, lançam o compacto Birthday, que fez um enorme sucesso e puxou as vendagens do primeiro disco, Life's Too Good, lançado em abril do ano seguinte.

capa do disco Life's Too Good"Birthday" foi um dos grandes lançamentos de 1988.

Com seu andamento estranho, uma letra esquisita e com a voz incomum de Björk em primeiro plano, fez subir aos primeiros lugares da parada independente e normal inglesa. A canção foi eleita o single da semana pelo esnobe semanário New Musical Express.

"Nós não esperávamos o sucesso dessa maneira. Na verdade, o Sugarcubes era apenas mais uma banda para diversão do que de profissão. Ficamos surpresos quando começamos a ter tanta manchete", confessa a cantora, dona de um timbre incomum, e que se assemelha, nessa característica, com Elizabeth Fraser, do Cocteau Twins.

O disco trazia as seguintes faixas:

Lado A

01. Traitor - 3:08
02. Motorcrash - 2:23
03 Birthday - 3:56
04. Delicious Demon - 2:43
05 Mama - 2:56

Lado B

01. Cold Sweat - 3:15
02. Blue Eyed Pop - 2:38
03. Deus - 4:07
04. Sick for Toys - 3:15
05. Fucking in Rhythm and Sorrow - 3:14
06. Take some Petrol Darling (Hidden Track) - 1:27

O disco teve vários remixes, sendo o mais curioso deles dos irmãos Jim e William Reid, do Jesus and Mary Chain, chamado The Christmas Day Mix.

A edição americana do disco, teve ainda uma exótica capa laranja ao invés da cor verde (essa é a minha cópia, que ganhei de minha irmã quando ela morava nos Estados Unidos, em 1988).

Quando o grupo fez fama, a Islândia colocou-os quase num pedestal. Afinal, a Islândia nunca teve muita fama internacional, já que os islandeses são conhecidos como um povo triste e quieto.

A futura tecladista Magga, aliás, adora recitar a famosa frase de Oscar Wilde: "os islandeses são a raça mais inteligente da Europa, porque foram os primeiros descobridores da América, mas não contaram o fato a ninguém."

Björk lembra bem como foi lidar com a fama em seu país: "minha família havia se mudado para Londres no meio da década de 80 e eu fui para uma escola para aprender a língua inglesa. Em uma aula, o professor pediu que fizéssemos desenhos de minha casa na Islândia e eu desenhei o iglu em que eu vivi. Ninguém conhecia a Islândia, pois o islandês mais famoso até então era Magnus Magnusson, um professor da Universidade de Edimburgo, e que havia se mudado para o Reino Unido ainda criança. Na época do Sugarcubes, estava novamente morando em Londres e fiquei surpresa quando descobri que até minhas tias sabiam quem era o Sugarcubes. Uma das coisas mais estranhas era ver os jornalistas estrangeiros entrevistando outros músicos locais, tentando descobrir mais sobre a gente."

E a banda tinha uma vida paralela na Islândia, mesmo com o sucesso. "A Islândia é um país terrivelmente caro para se viver e é muito comum cada um ter dois empregos", conta Einar, que também vivia como DJ local, embora odiasse ser chamado dessa forma: "eu toco música e converso com as pessoas." Björk também tinha um emprego em um loja de antiguidades.

Nesse momento, o grupo começou a apresentar alguns rachas internos, particularmente entre a cantora e o trumpetista e ocasional cantor, Einar, e também entre a cantora com seu marido, Thor.

Em abril de 1988, o grupo lança outro três compactos: Coldsweat, Deus e Motorcrash. Coldsweat ficou em primeiro lugar na parada independente inglesa; Deus, em segundo.

Björk era considerado uma musa por seus fãs e o Sugarcubes mostrava um forte conotação sexual, embora não fosse apelativo: "na Islândia o sexo é visto como algo normal, sem todo essa tabu que existe no resto do mundo. Dizem que sou muito sensual no palco, mas na verdade, eu sempre cantei e fui dessa maneira", explica Björk.

Em 1989, em meio às gravações do segundo disco, Björk e Thor se separam e o guitarrista casa com Magga Ornolfsdottir, que ironicamente seria a nova tecladista da banda.

E, para aumentar ainda mais o horror do mundo conservador, Olafesson deixa sua mulher para casar com Einar, na primeira união gay oficial do mundo pop.

Foi nesse clima que o grupo lançou o disco Here Today, Tomorrow Next Week!, bem menos inspirado do que o disco anterior. A grande canção do álbum era "Regina", mas o resto do disco não era lá muito bom.

Uma curiosidade: apenas de Björk ser grande fã de música brasileira, Elis Regina e Milton Nascimento, especialmente, "Regina" nada tem a ver com a cantora brasileira, que foi homenageada, anos depois, em "Isobel".

Para comemorar o segundo disco, o grupo saiu em sua primeira turnê mundial, indo para a América com ninguém menos do que o New Order e o PiL Björk disse que adorou cada minuto dessa excursão.

"Enquanto nós tocávamos e passeávamos em paz, víamos o desespero de John Lydon sendo cercado pelos jornalistas, sedentos por ouvir histórias sobre os Sex Pistols. Eu o vi várias vezes vomitando em cima deles. E o New Order também já tinha um grande número de fãs."

capa do disco Here Today, Tomorrow Next Week!O disco tinha as seguintes músicas:

Lado A

01. Tidal Wave 02:56
02. Regina 04:04
03. Speed Is the Key 03:18
04. Dream TV 03:12
05. Nail 03:17
06. Pump 04:25
07. Eat the Menu 03:44
08. Bee 02:27

Lado B

01. Dear Plastic 03:23
02. Shoot Him 02:10
03. Water 03:01
04. A Day Called Zero 02:38
05. Planet 03:22
06. Hey 03:21
07. Dark Disco 1 03:00
08. Hot Meat 03:14

Mas, após o final da excursão, em 1990, os membros do grupo resolveram dar um descanso para que cada um pudesse cuidar de seus projetos pessoais.

O grupo tinha conquistado coisas demais para seus próprios padrões. "Você sabia que em 1990, o presidente François Mitterand veio até a Islândia com o seu ministro da Cultura, Jacques Lang, e trocou um tedioso jantar oficial por um show nosso? É verdade! Quando ele soube que Lang ia nos assistir ao invés de cumprir o protocolo oficial, ele disse 'foda-se, eu também quero ver o Sugarcubes'. E ele adorou!", conta Einar.

Essa parada serviu para esfriar os ânimos acirrados entre os integrantes e para que cada um pudesse curtir um pouco da fama.

A banda só voltou à cena em 1992, com dois discos: o bom Stick Around For Joy e o disco de remixes It's-It. Mas os dois álbuns fracassaram na tentativa de dar um grande sucesso ao Sugarcubes. E It's-It foi um projeto grandioso. A edição em vinil era dupla, contendo os seguintes remixes:

capa do disco Stick Around For Joycapa do disco It's-It

Lado A:

01. Birthday (07:32) Justin Robertson 12" Mix
02. Leash Called Love (06:27) Tony Humphries Mix
03. Blue Eyed Pop (06:39) S1000 Mix

Lado B:

04. Motorcrash (06:49) Justin Robertson Mix
05. Planet (04:42) Graham Massey Planet Suite Pt 2
06. Gold (06:10) Todd Terry Mix

Lado C:

07. Water (04:13) Bryan 'Chuck' New Mix
08. Regina (05:12) Sugarcubes Mix *
09. Mama (05:09) Mark Saunders Mix
10. Pump (04:30) Marius de Vries Mix

Lado D:

11. Hit (07:10) Tony Humphries Sweet & Low Mix
12. Birthday (06:42) Tommy D Mix
13. Coldsweat (04:12) DB/BP Mix

O grupo ainda saiu em uma última excursão, mas a banda já não conseguia mais mostrar entusiasmo.

O resultado foi a dissolução do Sugarcubes logo após os shows.

Com isso, Björk acabaria se tornando o maior nome, ao lançar em 1993, o primeiro disco-solo, Debut, aclamado mundialmente, e conseguindo um sucesso ainda maior, com o segundo disco, Post, de 1995 e que continha o megahit, "It's Oh So Quiet".

Vários lançamentos póstumos de todos os projetos pré-Sugarcubes foram jogados no mercado, na tentativa de ganhar sempre algum dinheiro a mais.

Mas o que ficará na memória serão sempre as canções de Life's Too Good e a vida que os gelados habitantes islandeses proporcionaram ao universo pop. Deixo vocês com a discografia da banda. Um abraço e até a próxima coluna.

Discografia

Life's Too Good (1988)
Here Today, Tomorrow Next Week! (1989)
Stick Around For Joy (1992)
It's-It (1992)

 

 

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