Podem reclamar, urrar e negar, mas fatos
são fatos: se os Beatles dominaram completamente os anos
60, ninguém foi maior nos anos 80 e 90 do que esse quarteto
de Dublin. Não tem para Nirvana, Smiths, R.E.M., Oasis
e quem mais você quiser listar. Fique à vontade...
Bono é um cara que muitas vezes deveria ficar com a boca
fechada? The Edge toca sempre os mesmos acordes e Larry Mullen
Jr. e Adam Clayton formam uma cozinha eficiente, mas sem grande
brilho? Sim, sim... mas os Beatles também não eram
isso? Um baterista meia-boca, além de um guitarrista limitado,
apesar de todo charme místico que tinha (George Harrison)?
É claro que a força residia em Paul e John, dois
dos maiores gênios da música contemporânea
e que jamais terão outra dupla como sombra à altura
deles. Mas o U2, como todo grande jogador em uma final, chamou
para si o jogo quando todo mundo só malhava a cena rock
dos anos 80 e reinventaram o grupo e toda uma audiência
sedenta por uma luz-guia. Desde o início ingênuo,
passando pelo rock de arena de Rattle and Hum, até deixarem
meio mundo de queixo caído com Achtung Baby e Zooropa,
eles nunca perderam a majestade e o cetro que herdaram. Se foram
herdeiros dignos é uma outra história, mas já
que ninguém quis segurar o rojão...
Essa é uma coluna
especial. Especial, porque tentarei contar a história da
banda que mais ouvi em toda minha vida, desde o início
e em vários e longos capítulos, que (acreditem)
não defini quantos serão ou como terminarei. Mas
é mais especial por um motivo puramente egoísta:
essa é a centésima coluna Mofo.
Sim, você leu bem: eu pentelhei vocês, pobres leitores
exatamente 100 vezes nesse espaço, ao mandar o texto, pedir
para arrumarem um erro pequeno ou grande que cometi, entre outras
atrocidades. Nesses quase 4 anos dentro deste cantinho cativo
e que foi a primeira coluna do site, troquei milhares de e-mails
com leitores, de todos os tipos: elogios, farpas, pedidos de textos,
comentários, sugestões, indicações.
Sem falar nos emails que troquei com o João Paulo, Creed
e todo os que fazem do Whiplash! o lugar mais bacana que eu poderia
ter encontrado. Assim sendo, agradeço a todos pelo incentivo
e pelo carinho e que tenham paciência com as próximas
100 colunas que pretendo publicar.
Elogios e agradecimentos
feitos (embora insuficientes), essa primeira parte abordará
a origem do U2, os famosos anos de anonimato, fazendo uma pequena
bio de Bono, Edge, Larry e Adam e a luta que tiveram para começar
o grupo. Fotos e fontes de pesquisas serão retiradas do
fantástico site oficial da banda,
que aconselho a visitarem e das várias biografias que tenho
do grupo.
Espere que meus cativos
leitores não me abandonem em mais essa missão. E
o primeiro capítulo começa com...
1 – Os garotos
Paul, Larry, Adam e Dave
a - Paul
Que o U2 nasceu devido
a um cartaz que o baterista Larry Mullen Jr. colocou no mural
da escola, em 1976, todo fã está careca de saber.
Mas como foram os primeiros ensaios e quais eram suas vidas antes
de se conhecerem? Quantos eram, de fato, irlandeses de nascimento?
Essas e algumas outras curiosidades serão agora comentadas.
Vamos começar a viagem com um breve resumo de seu mais
famoso membro, Bono.
Bono
é, de fato, um dos irlandeses originais da banda. É
também o mais intranqüilo e delinqüente desde
garoto. Nascido no dia 10 de maio de 1960, no hospital Rotunda,
em Dublin, Paul Hewson, era o segundo filho do casal Bobby e Iris
Hewson. Antes dele, o casal já tinha o primogênito
Norman, com sete anos. Mais do que irlandeses, os pais do jovem
Paul eram dublinenses e haviam passado toda sua vida na cidade.
Fatos contam que Paul era
um chorão de marca maior e que os pais só tinham
silêncio quando o pequeno ia para cama, quase desmaiando
de tanto berrar. Mas nem dormindo dava silêncio já
que tinha uma certa tendência para roncar. Quando acordava
e começava a urrar, Norman pegava o caçula para
dar umas voltas pelo quarteirão, na tentativa de atenuar
o trabalho de sua mãe.
Mesmo mais velho, Paul
não cessava de chorar. Preocupada, Iris levou-o para um
médico, já desesperada. O médico examinou
a criança de dois anos. Não encontrou nada, mas
por precaução pediu que a mãe o deixasse
no hospital
durante uma semana para ser observado. Ao final desse período,
Iris foi buscá-lo e soube que nada havia de errado com
o garoto. Aliás, havia sim: Paul chorava quando as enfermeiras
não davam atenção para ele. Resumindo: era
um garoto extremamente mimado. A situação chegou
a tal ponto que seu pai só conseguia ler o jornal, após
chegar do trabalho, dentro de seu carro, já que silêncio
para tal seria impossível com o caçula acordado.
Aos três anos, Paul sossegou um pouco e começou a
formular suas primeiras frases. Ao invés de berrar passava
horas conversando com amigos imaginários no jardim de casa
ou mesmo com seu irmão ou com sua mãe. Mas conseguiu
pregar bons sustos. Certa vez, seu pai viu o garoto com uma abelha
em sua mão e começou a berrar para que Paul se livrasse
dela ou poderia ser picado. "Está tudo bem, papai,
nós fizemos amizades e estamos apenas conversando",
disse o pequeno, com um sorriso no rosto. O pequeno adorava ficar
se metendo na vida dos pais, e para conseguirem um pouco de paz,
resolveram colocá-lo em uma escola. Matricularam-no na
Glasnevin National School, onde começou a viver um dilema.
Bobby era católico e Norman tinha sido criado assim. Mas
Iris era protestante e pediu que Paul fosse criado sobre sua ótica,
o que foi aceito pelo marido. Glasnevin era uma boa escola protestante
primária. Nesse tempo, a separação entre
as duas religiões na Irlanda estava começando a
ficar mais acentuada, mas isso não existia na casa dos
Hewson. A melhor amiga de Iris, Onagh Byrne, era católica.
Iris e Bobby nunca discutiam sobre religião dentro do lar.
Essa proximidade religiosa com a mãe fez de Iris a melhor
amiga de seu filho e a única pessoa com quem, de fato,
se sentia à vontade. Norman era muito mais velho e seus
gostos e amigos totalmente opostos, além de serem completamente
distintos em personalidade. Norman era calado, obediente, sério
e metódico, enquanto Paul totalmente imprevisível,
irônico, desleixado.
Paul não se sentia
confortável com as crianças protestantes e isso
ficava mais nítido quando ia com Iris aos cultos de domingo.
De certa forma se sentia um católico entre todos e acabou
aumentando ainda mais sua confusão e causando mais problemas.
Aos sete anos, Paul conheceu Derek Rowen e logo viraram grandes
amigos. Os dois compartilhavam algumas idéias em comum
e possuíam forte independência e personalidade. Derek
e Paul adoravam pintar, atividade que faziam na garagem da casa
dos Hewson. Mas o auge acontecia quando Clive, irmão mais
velho de Derek, pegava os dois e bancava o monitor em aventuras
pela vizinhança. Tanta amizade fez que a casa de Derek
fosse praticamente seu segundo lar, ainda que fosse pequena e
os Rowen tivessem onze filhos.
Paul foi se distanciado
de sua família, em especial de seu pai e de seu irmão
maior. Norman, nessa época, já tinha um emprego
e depois das aulas ia para o trabalho para ajudar nas despesas
de casa. Paul era simplesmente visto como o garoto que ainda ia
para a escola e que deveria apenas cuidar de seus deveres escolares
e não pertubar a mãe durante o dia. Iris sabia que
havia essa diferença em casa e tratava de cuidar para que
o equilíbrio fosse mantido. Ela tinha uma grande paixão
pelos três e era a única que observava e dava atenção
para o filho menor. Era Iris quem conversava com Paul, que queria
saber dos seus desejos, problemas e frustrações.
Aos 11 anos, Paul começou a dar novas dores de cabeça.
Ele havia ido para uma nova escola, St. Patrick's Secondary School,
o que o desagradou. Paul reclamou para seu pai que queria ir para
a mesma instituição em que seu irmão havia
estudado. Bobby disse que não seria possível, pois
era uma escola muito cara e que Norman tinha conseguido uma bolsa
de estudos por sua excelência escolar. E assim foi decidido
que ele iria para onde fosse mandado. Mas Paul não era
um aluno ruim, pelo contrário. Quando saiu de Glasnevin,
era o segundo melhor aluno de sua classe e tinha fama de ser bem
comportado, atento, embora um tanto inquieto. O que ele mais gostava
realmente eram os passeios que ele fazia pelo parque Griffith,
onde ia olhar as garotas e conversar sobre música. Aliás,
a única coisa que Paul "aproveitava" de Norman
era o seu apurado gosto musical, já que seu irmão
tinha em casa discos de Jimi Hendrix, The Who, Rolling Stones
e Beatles. Mesmo pequeno, Paul gostava de se juntar aos mais velhos
e conversar de "igual para igual" sobre o tema.
Paul odiou a nova escola,
a postura com a qual tratavam os protestantes. Como tinha um bom
porte físico tentou entrar no time de futebol e de rúgbi,
mas acabou optando por jogar xadrez e fez seu pai ensinar os rudimentos
do jogo. Revelou-se um jogador talentoso e jogando pelo seu bairro,
Ballymun, acabou como vice-campeão em um torneio comunitário
com jovens de todos os cantos da Irlanda. Acabou entrando em um
clube da cidade, o que aumentou mais sua angústia, já
que era preciso atravessar a cidade inteira para treinar e não
podia ficar mais com seus amigos. E o ódio à escola
ainda era o mesmo. O bom aluno virou um péssimo aluno,
que cabulava aulas e era displicente. Ele queria sair de lá,
mas não sabia como, até ouvir falar de uma instituição
nova que estava sendo inaugurada em Dublin, a Mount Temple. A
nova escola causou um frisson ao abolir certas normas do país,
já que permitiria que católicos e protestantes estudassem
juntos, assim como meninos e meninas. Não haveria uma doutrina
específica e eles propunham que tanto crianças de
lares humildes como dos mais abastados fossem educados da mesma
maneira e até que dividissem carteiras. À princípio,
Bobby não concordou em matricular Paul na nova escola,
mas acabou sendo convencido por Iris e pelo próprio filho.
E Paul amou a nova escola, que era completamente diferente das
demais e cheia de possibilidades. Em primeiro lugar, não
havia uniforme. Também não havia um grande rigor
interno e nas aulas era possível debater idéias
com os professores. Paul acabou se tornando um aluno brilhante,
especialmente em Inglês, História e em Música.
Aproveitava para utilizar todo seu charme, inteligência
e arsenal de piadas para conquistar colegas e professores. O local
preferido dos alunos nos intervalos era um grande corredor da
escola, batizado pelos alunos de "The Mall". Lá
era o local onde realmente tudo acontecia, ao menos pelos olhos
de Paul. Ali estavam as garotas a serem conquistadas, idéias
debatidas e principalmente, o local para que pudesse mostrar todas
as suas habilidades. Seu melhor amigo era Reggie Manuel, um menino
boa pinta, e que namorava uma garota pela qual Paul tinha verdadeira
loucura, Zandra. Paul já tinha sua namorada, Cheryl, mas
o que queria mesmo era conquistar a namorada do amigo. Uma de
suas melhores idéias para isso foi a de inaugurar um local
para que todos dançassem. Paul pensou em uma antiga escola
e conseguiu que o reverendo Laing, responsável pelo local,
desse sua aprovação. Paul era o principal DJ e em
breve Zandra abandonou Reggie para ficar com ele, a quem não
considerava tão bonito quanto seu ex-namorado e nem tão
interessante. Coisas do coração...
Mas logo ele se cansou
de Zandra quando viu a nova garota da escola, Maeve, que de cara
odiou o menino, por considerá-lo apenas um agitador. Entretanto,
Maeve gostou de seus amigos, e tentou usá-lo para entrar
naquela turma. A sorte voltou a brilhar para o menino, já
que em algumas aulas estudavam na mesma classe e Maeve começou
a reparar que Paul era mais brilhante e articulado do que ela
imaginava. A amizade dos dois começou a crescer, as conversas
aumentavam e os dois se identificavam muito em suas angústias,
em suas esperanças. Logo começaram a namorar seriamente.
Com 14 anos e na nova escola,
a vida não poderia ser melhor para o jovem Paul. Na escola
certa, com a garota certa, e não sentia mais o medo de
ser considerado um peixe fora d'água. Nada poderia atrapalhar
sua vida. No verão de 1974, seus pais viajaram para Roma,
de férias, e Paul foi para um acampamento de verão
em Criccieth, Gales, conhecido como "Bee Dees". Paul
foi junto com os irmãos Rowen, Derek e Trevor, seus melhores
amigos. Lá, começaram a participar dos estudos dominicais
na Associação para Jovens Cristãos, o popular
YMCA...
O bom do local é que após as lições,
poderiam passar o resto do dia nas praias e lá, Paul conheceu
uma garota chamada Mandy, na qual teve um típico romance
de férias.
Em setembro daquele ano,
Iris e Bobby foram participar das comemorações de
50 anos de casamento do pai de Iris. O que era para ser uma grande
festa virou uma tragédia familiar de proporções
imensas. No dia seguinte, o pai de Iris não acordava e
o descobriram morto. Seu corpo foi enterrado e cremado no Cemitério
Militar em Blackhorse. A tragédia ficaria ainda maior quando
Iris passou mal no local e desmaiou. Levaram-na correndo ao hospital
quando descobriram que Iris sofrera um derrame cerebral. O prognóstico
não era nada animador, e no dia 10 de setembro, Iris morreu.
Paul, que tanto rezara em casa e tinha certeza que não
perderia sua melhor amiga, ficou completamente arrasado. No dia
do enterro, Paul trancou-se em seu quarto, chorando e tocando
seu violão. Como poderia viver com seu pai e seu irmão,
pessoas com quem pouco tinha convivência, sem a mãe
por perto? Mas não foi só Paul que sentiu a perda.
Tanto seu pai como Norman ficaram dias mudos e deixaram as tarefas
de casa com Paul, já que os dois trabalhavam. Paul agora
tinha que lavar, esfregar, passar aspirador de pó, descobrir
como a máquina de lavar funcionava, entre outras coisas.
Sua vida, em questão de dias, virara completamente do avesso.
O mundo parecia que voltava a conspirar contra ele...
b - Larry Mullen
Jr.
Larry é o segundo
irlandês original do grupo. E o último. É
também o mais novo, o fundador do grupo e aquele que, em
aspectos emocionais e pessoais, mais se distancia e se aproxima
de Bono. Vejamos como...
Larry Mullen Jr. nasceu no dia 31 de outubro de 1961. Larry tinha
uma irmã mais velha, Cecília, e anos depois nasceria
a terceira criança da prole, Mary e que faria parte de
uma seqüência trágica na vida do jovem baterista.
Larry era uma criança
calma, comportada, tímida e fechada. Assim como Paul, sua
melhor amiga era sua mãe, Maureen. Sua irmã mais
velha, Cecilia, também era sua grande protetora e muito
ligada a ele. Após ficar um ano em uma escola do bairro,
Larry foi transferido para a Scoil Colmcille, e toda manhã
seu pai o levava até lá, de trem, completando o
restante do percurso a pé. O trabalho de buscá-lo
ficava para sua mãe, que fazia todas as vontades de seus
filhos e do marido. Maureen era uma mulher extremamente dedicada
ao lar e à família. Larry tornou-se um escoteiro,
para alegria dos pais e aos oito anos resolveu aprender piano
na mesma escola em que Cecilia tomava aulas. Ficou lá durante
um ano, mas sua inabilidade para o instrumento acabou frustrando-o.
Um dia, Larry viu alguém tocando um pequeno kit de bateria
e ficou encantado. Pediu aos pais, que concordaram, desde que
ele "pagasse" com tarefas domésticas o custo
das aulas para tocar o instrumento, de aproximadamente 9 libras
irlandesas mensais. Larry começou a ter aulas com Joe Bonnie,
um renomado baterista local e que também era professor.
Larry gostava das aulas e do estilo de Joe, mas odiava ter que
ler livros técnicos. Ele sempre foi um aluno regular, sem
nenhum brilho acadêmico. Fazia apenas o necessário
para conseguir boas notas, e na escola, apesar de se destacar
por ser um menino extremamente bonito, evitava contatos com outras
crianças. Joe deu ao aluno um par de baquetas de borracha
para que pudesse praticar alguns exercícios em casa. Larry
passou a ficar o dia todo em casa fazendo os movimentos. Certo
dia, Larry tomou um susto: sua irmã Cecilia havia feito
uma surpresa para o irmão caçula e dado a ele um
kit de bateria, que ela havia comprado de um rapaz, por 17 libras.
Larry não acreditou no presente e cada centavo que ganhava
ou economizava foi gasto em melhorar sua bateria, com pratos,
peles e todos os acessórios que queria. Larry também
adorava ouvir a coleção de discos de sua irmã,
especialmente os LPs de David Bowie e Roxy Music. Nessa mesma
época, a irmã caçula de Larry, Mary, morre,
em 1973, fato que o baterista nunca gostou de comentar. Meses
mais tarde, seria a vez de seu professor, Joe, falecer. Sua filha
Monica tornou-se a professora, mas Larry não simpatizou
com ela e nem seus métodos e resolveu deixar a escola.
Larry
tinha confiança em seu estilo de tocar, apesar de não
ter muita técnica, e resolveu praticar por conta própria.
Nesse mesmo ano, entrou para a Mount Temple, por decisão
de seu pai, que viu naquela instituição vários
cursos diferenciados e que poderiam proporcionar uma profissão
ao garoto, que não era um entusiasta dos livros. Como Larry
adorava tocar e a Mount tinha um curso de música, pensou
que seria uma idéia desenvolver essa habilidade de seu
filho. Após a morte de Joe, Larry entrou na Artane Boys'
Band, mas logo saiu, depois que exigiram que cortasse seus longos
cabelos loiros. Larry disse que o faria, mas nunca mais voltou.
Desde garoto mostrava uma personalidade muito forte e apesar de
sua quietude, sabia exatamente o que desejava. Em seguida conseguiu
uma vaga na banda dos empregados das agências de correios.
Larry ficou por dois felizes anos, já que o grupo participou
de inúmeros festivais, além de tocar todos os estilos
musicais, desde músicas folclóricas até as
mais tocadas nas emissoras de rádio. O ponto alto para
Larry foi o desfile no dia de St. Patrick, mais precisamente na
data de 17 de março de 1975.
Aos poucos ele ia criando
sua própria música e não suportava mais ter
alguém dizendo ou ensinando como deveria tocar. E Larry
resolveu que deveria fazer algo a esse respeito. E o algo, encorajado
pelo seu tutor Colm McKenzie, era montar uma banda. Mas montar
como? Colm sugeriu que ele colocasse um cartaz na escola. Larry
aceitou o conselho, mas o fez da maneira mais tímida possível.
Apenas dizia que tinha uma bateria e procurava outros músicos
para começarem algo. Mas ninguém respondeu de imediato.
Até que...
c - Adam Clayton
Oficialmente foi um certo
Dave Evans quem primeiro procurou Larry para saber do que se tratava
o cartaz, mas o primeiro garoto que realmente foi convidado pelo
jovem baterista foi Adam Clayton. Adam era um rapaz totalmente
diferente dos que circulavam por Mount Temple. Primeiro pelo seu
sotaque britânico, já que Adam nasceu em Chinnor,
Oxfordshire, Inglaterra, no dia 13 de março de 1960. O
outro motivo era que Adam vestia-se e comportava-se como um hippie,
usando lenços, cabelos encaracolados e óculos escuros.
Era um garoto extremamente rebelde, mas ao contrário de
Paul, sabia como levar seus professores à loucura, sem
nunca perder o estilo britânico ou alterar a voz. Uma das
coisas que mais gostava de fazer em sala de aula e que provocava
risadas de seus colegas e desespero aos mestres, era colocar uma
garrafa de café em sua carteira e ficar bebendo, sem parar.
Nessas horas, quando os professores, irritados, perguntavam o
que ele estava fazendo, polidamente respondia, "estou tomando
uma xícara de café, senhor". Outra manobra
que utilizava quando não fazia as suas lições
de casa era responder da seguinte forma: "veja senhor, eu
estou terrivelmente envergonhado sobre isso, mas simplesmente
não entendi o assunto. Sei que isso é um tanto estranho
e realmente lamento, mas não há nada que eu possa
fazer."
Tanta petulância
e audácia fez de Adam um nome muito famoso no "The
Mall", onde um certo Paul Hewson, vivia zanzando. Várias
coisas eram ditas sobre o tal Clayton e as mais comuns eram que
sua família era rica e que ele possuía um baixo
elétrico. Foi através desses boatos que Larry foi
atrás de Adam. "Olá, ouvir dizer que você
tem um baixo e estou formando um grupo, toco bateria e coloquei
um cartaz na escola. Você teria interesse em se juntar a
mim?", foi mais ou menos a pergunta que Larry fez. Adam adorou
a proposta, mas como achou que fosse alguma atividade oficial
da escola e não um convite que nada tinha a ver com os
estudos, ignorou no início.
Adam
era filho de um piloto das Forças Armadas Britânicas,
Brian, e sua mãe, Jo, havia desistido de ser aeromoça.
Quando Adam tinha cinco anos, a família resolveu abandonar
a Inglaterra e ir morar em Dublin. Brian recebera um convite para
ser piloto comercial da Aer Lingus, e aceitou já que o
salário era muito superior. Assim, Adam partiu com seus
pais e sua irmã menor, Sarah Jane, que ele chamava de Sindy.
Os Claytons moravam no
mesmo bairro dos Mullens, Malahide, uma comunidade basicamente
protestante. Quando fez oito anos, Adam foi enviado para a escola
Castle Park, no outro extremo de Dublin. Os pais relutaram no
início, por acharem que passariam boa parte do tempo sem
seu filho, mas no final, acharam que seria o melhor para a educação
de Adam. Castle era um internato e os meninos ficavam em dormitórios
governados por alunos mais velhos. Adam não gostou nada
de ter deixado sua casa para ir morar em Castle, já que
voltaria para a casa de seus pais apenas nos finais de semana.
O grande pesadelo para Adam eram as tardes de domingo, quando
sua mãe preparava um agradável chá para o
filho. Adam sabia que após a refeição deveria
voltar para a escola. Às cinco horas, após dar adeus
para Jo e Sindy, entrava no carro junto com seu pai e viajavam
por cinqüenta minutos até o odiado lugar. Adam detestava
as regras da escola, como usar sapatos marrons dentro do dormitório
e pretos fora dele. Além disso, era proibido ver televisão
ou ouvir músicas, pois eram consideradas coisas decadentes.
Os meninos eram obrigados a gostar de praticar esportes, a ser
entusiastas das práticas físicas ou não poderiam
ser considerados uma pessoa da fraternidade. Adam recusava tudo
isso e fazia uso de seu charme e inteligência para se esquivar
de tais leis. Adam era definido como um bom aluno, embora um pouco
descuidado. Seu único amigo era Phillip Thursby, filhos
de paquistaneses, com quem adorava conversar, ouvir pássaros
cantando e iam sempre à Sociedade Gramophone para ouvir
discos de música clássica. Mau comportamento na
escola era severamente punido com surra ou sessões de ginástica,
aplicadas pelos alunos mais velhos. Adam conseguia de alguma forma
ou outra, não ser muito perseguido, até que com
13 anos, deixou claro que não toleraria mais isso. Adam
era um garoto educado, paciente, gentil, mas não era servil
e isso todos sabiam.
Sua
agressividade começou a aflorar perto dos 15 anos. Ele
acabou sendo escalado para jogar críquete e se recusou,
mas mesmo assim foi obrigado a integrar o time. Adam foi escalado,
jogou, mas claramente prejudicou o time. Após o final da
partida, foi chamado pelo treinador que começou a chamá-lo
de imbecil, incompetente. Adam retrucou dizendo que o jogo era
imbecil e não ele.
Ao final do ano, Adam foi
mandado para outra escola, St. Columba. A instituição
não fazia parte da idéia inicial de seus pais, que
queriam enviar o menino a uma instituição mais prestigiosa
na Inglaterra, mas Adam se revelou um aluno apenas regular. Um
outro ponto também agravaria a vida do garoto. Seu pai
havia sido transferido temporariamente para Singapura, e a escola,
novamente um regime de internato, era a única solução.
As coisas pouco mudaram e quando os pais perceberam que o filho
estava decaindo em suas notas, entraram em desespero. Enquanto
isso, Adam começou a fazer amigos, em especial com John
Lesley, amante de rock e grupos como Grateful Dead, Cream e Crosby,
Stills, Nash & Young. John tinha um violão e Adam ficava
fascinado com as fitas de seu colega e com o som que tirava de
seu instrumento. Quando um aluno mais velho conseguiu autorização
da escola para converter uma sala abandonada em um local para
os alunos ouvirem e tocarem música, Adam nem pensou muito.
Começou a aprender alguns acordes e comprou uma guitarra
usada, por 12 libras. John então persuadiu o amigo a comprar
um baixo elétrico e montarem um grupo. Adam ficou em dúvida.
Apesar de gostar de música, não se considerava muito
musical e sabia que John era muito melhor instrumentista do que
ele. Depois de pensar na idéia, resolveu aceitar a sugestão.
Ligou então para sua mãe e pediu que ela lhe desse
o instrumento. Jo aceitou de imediato a oferta do filho, e pagou
52 libras em um baixo para Adam. Mesmo pagando caro pelo instrumento,
Jo ficou feliz ao ver o filho realmente empenhado e entusiasmado
com alguma coisa, e porque, de certa forma, Adam começou
a melhorar suas notas na escola. Entretanto Adam mais gostava
de olhar para o instrumento do que propriamente tocá-lo.
E Adam quase não tocava, esperando que algo ou alguma coisa
o inspirasse. No verão de 1975, Adam foi visitar os pais,
que acolheram o filho com muito carinho. Mas ele continuava a
ter sérios problemas dentro da escola e várias vezes
foi punido por rebeldia ou insolência. A situação
chegou a um ponto tal, que Jo teve que ligar para o diretor da
escola, quando soube que seu filho havia sido expulso da instituição
por várias faltas. Adam se tornava uma criança problemática
e seus pais resolveram, irritados, que o colocariam em uma escola
pública, e economizariam o dinheiro com a educação
de Adam. E assim, foi mandando para a Mount Temple. Adam reclamou
que os dois estavam interrompendo sua carreira musical ao lado
do amigo John, mas foi voto vencido. Adam obedeceu, mas resolveu
que de agora em diante, não se curvaria mais às
leis e normas de qualquer instituição e que aquela
seria a última vez. Adam estava muito irritado com sua
vida e com seus pais...
d - Dave Evans
Se The Edge é considerado
o cérebro da banda, o responsável por dar forma
às idéias do grupo, não é por acaso.
Desde criança, Dave Evans sempre foi uma criança
muito atenta, inteligente e apesar de parecer dispersivo ou aéreo,
sempre se manteve atento com aquilo que realmente o interessava.
Sempre foi considerado entre os membros do U2 como o mais brilhante
intelectualmente e o mais tenaz de todos. Possui a confiança
de Larry, a vivacidade de Bono, a polidez de Adam e algo a mais.
Assim como Adam, Dave é inglês. Nasceu no dia 8 de
agosto de 1961, em Londres, na maternidade Barking. Sua família
mudou-se para a Irlanda quando o pequeno Dave contava com um ano.
Apesar de ter nascido inglês, era filho de um casal galês.
Garvin e Gwenda Evans eram pessoas que haviam nascido em Llanelli,
cidade conhecida pelos times de rúgbis e pelos corais de
mineiros, uma das maiores tradições musicais daquele
país. Garvin e Gwenda eram de origem protestante e por
coincidência, ambas as famílias foram para a Inglaterra
em busca de uma vida melhor. Se encontraram na escola e juntos
foram para a Universidade e casaram logo após a formatura.
Garvin diplomou-se como engenheiro e Gwenda como professora. Depois
de dois anos de serviço obrigatório no exército,
Garvin pediu transferência para seu país de origem,
mas para sua surpresa e choque foi transferido para a Irlanda
do Norte. Mas acabaram gostando do lugar e quando teve nova chance
de transferência poderia optar entre Dublin ou Wigan, norte
da Inglaterra. O casal escolheu a capital do Eire e, nessa época,
já contavam com dois filhos. Além de Dave, havia
Dick, com três anos. A mais nova, Gill, nasceria já
em solo irlandês.
A
família Evans mudou-se então para Malahide mesmo
bairro dos Claytons e dos Mullens. Era uma família normal,
muito educada e muito popular na vizinhança. Garvin começa
a prosperar trabalhando como consultor, por conta própria.
Era assíduo freqüentador da igreja presbiteriana e
fundador do Coral Masculino dos Galeses de Dublin, além
de grande apaixonado pela seleção de rúgbi
de seu país natal. Gwenda era igualmente ativa e integrava
a Sociedade Musical de Malahide. O jovem casal amava música
e tocavam piano em casa. Gwenda tocava músicas para os
filhos pequenos.
Dos quatros futuros integrantes
do U2, foi o Dave o que teve a infância mais feliz, menos
atribulada e mais segura. Na escola, apesar de tímido e
quieto, mostrava-se um aluno brilhante, obediente e participativo.
Fora dela, era uma criança feliz, com muitos amigos e divertido.
A única coisa que o incomodava um pouco era seu sotaque
carregado, influência de seus pais. E nada mais.
Dave foi parar na Mount Temple por influência de seu melhor
amigo, Shane Fogarty. Shane vivia dizendo a ele o quanto a nova
escola era agradável, divertida e que tinha um garoto excêntrico
chamado Paul Hewson que vivia aprontando das suas. Dave acabou
mudando para lá, mas não gostou do ambiente. Dave
era uma criança que gostava de discrição,
de não chamar atenção. Como nunca foi bonito
e muito tímido, pouco se arriscava a conquistar as belas
meninas da escola, embora se sentisse, ocasionalmente atraído
por algumas. O resultado é que acabou se aprofundando nos
estudos, e de fato, nos primeiros anos, Dave vivia praticamente
só dentro da instituição. Era uma situação
ambígua, pois Dave gostava de fazer amigos. Nas poucas
oportunidades em que deixava a inibição de lado,
se mostrava um garoto com uma inteligência aguçada,
ótimo papo e uma companhia agradável. Mas esses
momentos eram raros. Dave, seguindo o exemplo dos pais, adorava
as aulas de música, e, em especial, tocar violão.
Sua primeira paixão foi a música flamenca e a espanhola,
em geral. Também aprendeu algumas noções
de piano e demonstrava um excelente ouvido para a música.
Junto com seu irmão Dick, começou a tirar canções
dos Beatles. Dick havia ganho o instrumento de sua mãe
que achou em uma loja por apenas 1 libra, mas sem cordas. Após
ajeitar o instrumento acabou dando a seu filho mais velho.
Dick foi uma importante
influência na vida de seu irmão. Como o pai, era
apaixonado por eletrônica e escrevia artigos para a Everyday
Electronics, uma revista que ensinava como as pessoas poderiam
construir aparelhos eletrônicos de maneira fácil.
Um dia, Dick viu na capa da mesma revista, dicas de como construir
uma guitarra em casa. Trancou-se em casa com seu amigo Barry O'Connell,
tendo o irmão menor ao seu lado. Dave acompanhava silenciosamente
o trabalho de seu irmão, fascinado. E acabou descobrindo
que a música seria sua profissão.
2 - O primeiro
encontro
Após ter conversado
com Adam, Larry foi perguntar para Dave se ele gostaria de começar
um grupo. Dave topou, mas com a condição de que
pudesse levar seu irmão junto. Larry aceitou. Era a chance
dos irmãos Evans estrear a nova guitarra, toda amarela,
mas que produzia uns sons estranhos. Os dois encontraram então
um jovem cabeludo com óculos escuros no ponto de ônibus.
Era Adam Clayton, que carregava seu baixo embaixo do braço
e um amplificador no outro. Os Evans olharam para Adam admirados
e percorreram todo o caminho até a casa de Larry conversando
e estabelecendo uma amizade. Adam encantou os dois falando milhões
de gírias do mundo do rock. "Esse cara manja muito",
pensaram os irmãos. Mas eles não foram os únicos
que caminharam até a avenida Rosemount. Vindo de outro
lado, Paul Hewson resolveu conferir o convite daquele jovem baterista
que tanto o impressionara na escola, pela sua beleza e timidez.
Mas Paul não foi sozinho e acabou carregando Ivan McCormick
junto.
Quando Larry olhou para
aqueles cincos garotos, levou um susto. Ele havia procurado um
baixista e um guitarrista e de repente, apareceram um baixista
e QUATRO guitarristas! "Bem, e quem cuidará dos vocais?"
perguntou Larry. Ninguém se habilitou.
Apesar de todos freqüentarem
a mesma escola, nunca haviam ficado juntos ou sequer conversado.
Os gostos musicais batiam em poucas coisas. Todos gostavam de
Beatles, Stones e Bowie. Larry amava as bandas glitters como o
Sweet. Dave adorava o som da guitarra de Rory Gallagher, fosse
com seu grupo Taste ou solo, e até de Yes. Paul gostava
de Elvis e estava antenado com o novo movimento que invadia o
mundo, chamado punk rock. Adam conhecia tudo sobre a cena de San
Francisco dos anos 60. Apenas Dick e Ivan não tinham gostos
claros ou não quiseram comentar. O primeiro trabalho para
Larry era acomodar seis pessoas em um espaço exíguo
dentro de sua casa. O único local que parecia possível
seria a cozinha e para lá foram. Larry precisou abrir a
porta de trás para abrigar sua bateria. De maneira desordenada,
começaram a tocar canções dos Stones, como
"Brown Sugar". Mas a balbúrdia agregada ao som
horroroso que faziam chamaram atenção de toda a
vizinhança. Logo, o quintal estava cercado de curiosos,
que riam. Irritado, o baterista ligou a mangueira de água
em cima de sua primeira "platéia" e espantou
os curiosos.
O primeiro encontro deixou
claro alguns pontos: Larry e Dave sabiam tocar, assim como Dick,
embora sua guitarra desafinasse clamorosamente. Ivan desistou
e nunca mais voltou. Paul não era bom guitarrista, mas
tinha atitude e queria tentar. E a maior decepção
acabou sendo Adam, que após tanta pose, gíria, seu
próprio amplificador e atitude, mostrou que não
sabia tocar nada. Mas Adam tinha tanta vontade e atitude quanto
Paul. Bem, e quem faria o quê? Estava claro que Paul era
um guitarrista medíocre, se tanto, e que ele gostava muito
mais de falar do que de tocar, e que tentava chamar toda a atenção
para ele da mesma maneira que agia em casa ou na escola. Adam
viu isso e tentou tomar a frente dizendo que eles poderiam começar
a ensaiar e até arriscar algumas apresentações,
já que Adam jurava conhecer algumas pessoas do meio. Mas
depois de verem como manejava seu baixo, todos pensaram se aquilo
não seria apenas outra bravata. Ok, eles iam tentar. E
qual seria o nome do novo conjunto? A escolha acabou sendo Feedback,
uma referência ao som distorcido que saía dos amplificadores
de Adam. Dick poderia fazer parte da banda, se sua guitarra assim
permitisse. E o som começou para os cinco jovens. Mas nada
seria muito fácil...
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