114 - U2 - 1987

E finalmente o sonho de tantos anos acabou virando realidade: de uma banda que tinha grandes audiências ao vivo, mas poucas vendagens (como The Edge inteligentemente resumiu em uma entrevista meses antes do lançamento de The Joshua Tree), o U2 era agora um autêntico campeão de vendas: basta dizer que The Joshua Tree é até hoje o disco que mais rápido vendeu na Inglaterra (300 mil cópias em dois dias) e em menos de dois meses, mais de sete milhões de pessoas compraram o seu disquinho. Os anos de 1987 e 1988 ficaram conhecidos como os excessos do grupo – em dinheiro, em shows, em aparições, e em abusar de clichês – e a chegada de Rattle and Hum no ano seguinte, aumentou ainda mais o gigantismo, mas também rendeu belas pauladas pelo excessivo amor e apego ao som americano. A banda acabou sendo presa fácil em milhões de armadilhas, nas quais não contava: desde a crítica de grupos do selo Mother até ataques pessoais na Irlanda e ainda tentar explicar que a obsessão que tinham pela América não significava que abraçariam o estilo de vida americano. A enorme excursão pela América e Europa com lotações sempre esgotadas e o contato com as origens rock ‘n’ roll, do jazz, soul, gospel e do blues, mudaram radicalmente o grupo. Para se ter uma idéia, Bono chegou a esquecer o aniversário da esposa e acabou compondo uma canção para pedir desculpas a ela. Larry perguntava o que havia acontecido com o U2, que havia virado uma máquina de dinheiro e de paranóia. Se o U2 não havia ainda achado o que tanto procurava, finalmente acabavam de encontrar. E em doses cavalares...


 

1 – O topo da parada

Após muitos anos tentando e batendo na trave, finalmente a banda consegue o primeiro posto nas paradas. E o sucesso veio com “With Or Without You”, a primeira canção do grupo a liderar a parada de sucesso na América, embora não tenha repetido o feito na Inglaterra (isso aconteceria apenas com “Desire”, de Rattle and Hum). Musicalmente falando, “With Or Without You” é uma das mais belas composições que escreveram e um belíssimo vídeo para promovê-la mostrou um grupo diferente, com Bono usando um rabo de cavalo e The Edge com uma vasta cabeleira. Bono afirma que uma grande influência para a canção foi o cantor Scott Walker e seu disco Climate of Hunter.



imagem do vídeo de With Or Without YouE o visual da banda já começava também a dar mostras com o vocalista usando e abusando de roupas de caubói. Mas a música sofria também muitas mudanças: desde que o grupo voltara a “pensar em formato de canções” como The Edge dissera, muitas melodias e músicas começaram a ser escritas de maneira mais simples, sem o experimentalismo utilizado em The Unforgettable Fire.

Ela é uma das mais bem estruturadas músicas do grupo, com um começo lento e que vai crescendo gradualmente. O primeiro lugar na parada foi extremamente comemorado pelo grupo, já que a América era a grande obsessão. Uma prova disso pode ser constatada na mixagem final de “Bullet the Blue Sky”. No último dia de gravação, o grupo e Steve Lillywhite (que iria mixar a música) estavam em um dilema. A banda havia gravado dois finais possíveis no último verso – “of America” ou “of the world”. E qual deles deveria entrar? Após uma reunião infrutífera, Steve ligou para Paul McGuinness, que decidiu: usariam América já que eles queriam mostrar a América como metáfora e também sonhavam com o riquíssimo mercado dos Estados Unidos.

 

capa do single With Or Without YouO grupo embarcaria para os Estados Unidos e iniciaria uma monstruosa excursão, mas antes disso, não se furtaram em participar de uma homenagem a um grande grupo da Irlanda. No dia 16 de março, em um programa televisivo chamado The Late Late Show, a banda Dubliners era homenageada por completarem 25 anos de carreira. O grupo participou da festa cantando “Springhill Mining Disaster”, de Peggy Seeger, música que contém uma história comovente. A canção relembra os sobreviventes de um acidente em uma mina de carvão que havia ocorrido em Springhill, na Nova Escócia, no Canadá. Após ficarem soterrados e sem poderem sair, os mineiros começaram a cantar, enquanto esperavam ajuda. Ao final da apresentação, o U2 se juntou aos próprios Dubliners e aos Pogues para uma apresentação conjunta. Vale dizer que a canção tornou-se parte do repertório da banda durante a excursão mundial.

Após a homenagem e com “With Or Without You” em primeiro lugar, o grupo rumou definitivamente para a América. E se o grupo queria ser notícia, conseguiu logo: no dia 27 de março subiram no teto de uma loja de licores, na esquina da Sétima Avenida com a Rua Principal, no centro de Los Angeles, para uma apresentação surpresa. O grupo iria gravar um vídeo para a canção “Where The Streets Have No Name” e a tocaram três vezes, além de “Pride”, “Sunday Bloody Sunday”, “In God’s Country” e “People Get Ready”, clássico de Curtis Mayfield. E o que se viu foi um caos enorme no meio do coração da cidade, com os fãs ocupando todas as ruas e sendo preciso a intervenção policial. E dessa confusão acabaram filmando duas versões para a canção: uma maior, começando com um rádio falando e tendo “Bullet the Bue Sky” ao fundo e uma mais curta, que se tornou a mais popular.


imagem do vídeo de Where The Streets Have No NameAlguns críticos disseram que a idéia era uma cópia descarada dos Beatles, que tocaram “Get Back”, no teto da gravadora Apple, em Londres, no ano de 1969. No vídeo, dirigido por Meiert Avis, algumas pessoas do staff da banda, como Joe O’Herlily e Paul McGuinness são focalizadas, sendo uma atração a mais para os fãs. E depois da brincadeira era hora de conquistar o planeta. Mas não sem uma outra pequena polêmica que renderiam algumas boas agulhadas...

 

 

 

2 – U2 não respeita pedido de Stevie Wonder

O U2 abriria a turnê americana em Denver, no dia 2 de abril em show na Universidade Estadual do Arizona, na cidade de Tempe. O estado do Arizona era um dos poucos que não adotaram o dia 15 de janeiro, data de nascimento de Martin Luther King, como feriado nacional. O governador Evan Mechan vetou a idéia e alguns músicos americanos, em repúdio, decidiram não tocar no estado enquanto ele não mudasse sua postura. Mas o U2 tocou, ainda que Stevie Wonder tivesse feito um pedido à banda para que isso não acontecesse.

Com a polêmica aberta, o grupo a aumentou ainda mais com uma declaração que foi lida pelo promotor Barry Fey, e escrita pela banda. Eis os dizeres: “o governo Mecham está envergonhando todo o povo do Arizona. Nós condenamos sua ação e seu ponto de vista, que é um insulto a um grande líder.” E deram o show, recebendo críticas duplas: do governador e dos demais músicos. Uma pequena curiosidade: esse show rendeu um belo cd duplo pirata chamado Governor Mechan & MLK e que até hoje eu guardo e mostra a banda em boa forma, fato raro em um início de turnê.

Após o final do show, Bono argumentou que a vontade do governador não era a mesma das pessoas e por isso fizeram a apresentação. Os críticos rebateram dizendo que se era para respeitar a opinião pública, deveriam ter boicotado o estado. E a briga mostrou ao cantor e ao grupo que algumas vezes as palavras e ações erradas iriam causar um considerável estrago durante o ano.

Polêmica passada, o mês de abril reservou uma grande surpresa para a banda. Uma honra que apenas os Beatles e The Who haviam conseguido...

3 – E o U2 é capa de uma revista "séria"

capa da revista TimeAinda no mês de abril a revista Time estampa o grupo em sua capa, na edição do dia 27, e afirma: “U2 Rock’s Hottest Ticket”. Na orelha da capa, uma foto do ex-líder da União Soviética, Mikhail Gorbachev com o título “Talking Cold Turkey”, talvez usando uma brincadeira deliberada com a própria banda, que já vinha tocando regularmente “Cold Turkey” de John Lennon.

O grupo seguia então uma imensa sucessão de apresentações. Foram 29, até o dia 16 de maio, final da primeira parte da turnê norte-americana, quando partiram para a Europa. Vale dizer que todos esses shows na América foram abertos pela banda Lone Justice, liderada por Maria McKee, e grupo com quem Bono fez uma cover de “Sweet Jane, de Lou Reed, incluída na coletânea This World Is Not My Home, do Justice, em 1999. Em um desses shows, Bob Dylan subiu ao palco para cantar “Knockin’ On Heaven’s Door”. Meses depois se encontrariam de uma forma muito mais especial: em um estúdio.

A parte européia começou com um show em Roma, no dia 27 de maio. Uma das grandes atrações dos 30 shows foram os artistas convidados para abrirem as apresentações. A lista é impressionante e vale colocar algum desses nomes: Big Audio Dynamite (banda de Mick Jones, ex-Clash), Dubliners, The Fall, Lone Justice, The Mission, Pogues, The Pretenders, UB40 e o grande ídolo de Bono, Lou Reed.

 

capa do single I Still Haven’t Found What I’m Looking ForE em maio é lançado o segundo single do disco, a canção “I Still Haven’t Found What I’m Looking For”. O título foi dado por The Edge e reflete exatamente o que a banda sentia. E, como The Edge tinha dito que Bono havia pensando nela inicialmente como um reggae, várias vezes durante os shows, cantavam “Exodus” de Bob Marley no meio da melodia.

A canção rendeu o primeiro lugar nas paradas novamente. Uma curiosidade foi a realização do vídeo promocional. Ele foi realizado em Las Vegas, no dia 12 de abril, logo após uma apresentação do grupo na cidade. Bono, Larry,The Edge e Adam saíram andando pelas ruas iluminadas, com o guitarrista empunhando um violão.

A excursão pela Europa teve lotações esgotadas por todos os lugares em que passou: Itália, Inglaterra, Alemanha, Holanda e França, mas o fato mais extraordinário aconteceu em Madri. Era a primeira vez que o grupo apresentava-se na cidade e eles tocariam no estádio Santiago Bernabeu, de propriedade do Real Madrid. Foram vendidos 75 mil ingressos para a apresentação, mas quando o show começou havia 115 mil pessoas, já que 40 mil ingressos haviam sido falsificados! Essa foi a maior platéia de toda a excursão e a segunda vez na carreira do grupo em que tinham mais de 100 mil espectadores em um show. A apresentação foi memorável, especialmente após tocarem “Spanish Eyes”, o lado B do single “I Still Haven’t Found What I’m Looking For”. O último show da turnê européia aconteceu na Irlanda, no Pairc Ui Chaoimh, em Cork, no dia 8 de agosto. Nesse dia, The Edge completava 26 anos e um bolo gigante foi levado ao estádio durante a canção “Party Girl”. Para surpresa do guitarrista, sua esposa Aislinn saiu de dentro e estourou uma garrafa de champagne.

E em agosto sai no terceiro single, “Where The Streets Have No Name”, que além do vídeo rendeu uma bela história...

4 – "Me perdoe, Ali..."

A atração não é a canção principal, novamente primeiro lugar nas paradas e sim, o lado B dela: “Sweetest Thing”. E o motivo é o mais improvável possível: Bono estava pedindo desculpas por ter esquecido o aniversário da esposa! A canção foi regravada e lançada como single quando lançaram a coletânea The Best of 1980-1990, já que Bono argumentou que eles nunca haviam dado um acabamento final quando ela foi lançada no lado B. Ou seja: duas gafes com a esposa...

5 – Aumentam os problemas e as críticas...

Mas nem tudo era maravilha no horizonte da banda. Apesar do imenso sucesso de crítica, público, vendagem, a banda começou a ser criticada duramente dos dois lados do Atlântico. O primeiro grande problema foi a forma, até certo ponto ingênua, de como o grupo tentou “salvar o mundo”. A cada show Bono fazia dois ou três discursos intermináveis sobre a situação do mundo, da América, especialmente na canção “Bullet the Blue Sky”, quando improvisava frases e citava nomes de John Coltrane e outros músicos americanos famosos, mas com quem a platéia não conhecia. Isso causou dois problemas: a primeira, a de serem tachados como presunçosos por quererem mostrar cultura musical, e o outro pela postura maniqueísta do mundo. E essa posição inflamada de Bono no palco começou a respingar nos demais integrantes. Um dos que mais se irritou foi Larry Mullen.


Em uma entrevista para a revista Musician, o quieto baterista comentou o fato: “Não é incrível que quando você atinge um certo nível tudo que você faz de repente se torna importante? Parece que todo mundo está falando do ‘fenômeno U2’, mas se esqueceram de nossas músicas!” O baterista não se conformava como tudo era exagerado após virarem a banda do momento. “A cada gesto ou ato nosso, há mil interpretações. Às vezes pedimos para o Bono não falar tanto e apenas cantar. Mas ele age dessa forma e como não há como controlar, tudo vira uma grande histeria.”

Adam Clayton chegou também a comentar o fato e se dizia chateado com tanto assédio e histeria.

“As pessoas acham que escrever uma canção é fácil, mas elas não percebem que quando você escreve algo, ela são doloridas para nós, no sentido em que nos expomos e deixamos que as pessoas conheçam mais sobre nós. É óbvio que não vamos mudar o mundo, nem queremos isso. Mas de repente, cada palavra de Bono vira manchete mundial e temos que responder mil perguntas. A nossa relação com a América não é de amor, ela é bem ambígua, aliás. Nós gostamos da liberdade e por ser o lugar onde as pessoas possuem a mente mais aberta para idéias e realizações. Mas há o lado negro da América, a América que Reagan construiu, de um caubói que entrou na Casa Branca como se fosse em seu rancho e cria uma paranóia no planeta. Há o racismo, a intolerância, o embargo econômico contra os países da América Central, enfim vários detalhes que não concordamos. Nós gostamos da América, mas isso não significa que abandonamos nossas origens irlandesas e nem que tenhamos ficado cegos para as injustiças que lá acontecem.”

Bono também se sentia confuso. “As pessoas acham que sou uma pessoa que tem todas as respostas. Só que não tenho, mas mesmo assim, acho importante apontar certas questões. Aliás, nunca houve um grupo de rock que tivesse todas essas respostas. O que causa confusão é que nós estamos com um poder tão grande que as pessoas acabam dando uma importância demasiada para as minhas opiniões. Na Irlanda me chamam de liberal porque sou contra o que acontece no meu país. Fico enlouquecido quando tentam me enquadrar politicamente em um lado. Eu não faço parte nem da esquerda, da direita ou centro porque o que manda na Irlanda são velhas ideologias com as quais não concordo. Mas isso não significa que apóio os liberais, pois igualmente discordo deles. Eu não me interesso por ideologias políticas, eu me interesso pelo indivíduo e por suas idéias em particular. O fato de eu gostar de um ou de outro, não significa que eu vá comparecer em suas reuniões ou comícios, mas também significa que me dou a liberdade de ir caso eu queira, sem que isso implique necessariamente em um apoio. Existe uma tênue diferença entre você concordar e abraçar uma causa. Minha única causa é o U2 e nossa música.”

The Edge fez um comentário interessante sobre a evolução do “fenômeno U2”. Um ano atrás éramos a maior banda underground do mundo e nós vendíamos bem menos. Na verdade, sempre ficava frustrado quando via nossas vendagens, porque não entendia como poderíamos fazer shows para 10 ou 15 mil pessoas toda noite e nossos discos terem uma procura tão baixa. Nós éramos visto como a banda imaculada, pura, de um país com pouca tradição no rock e dado como ingênuos. Bem, somos ingênuos, mas nada em nós mudou. A única coisa que alterou é que resolvemos ir dentro das raízes da música e por isso somos criticados.

Bono mostra que várias canções possuem um tema bem “europeu”. “Eu escrevi ‘Running to Stand Still’ com a imagem nas Sete Torres, que era um local onde as pessoas costumam até hoje comprar drogas em Dublin. Eu escrevi ‘Red Hill Mining Town’, falando das greves dos mineiros na Inglaterra e como ela devastou a vida de várias famílias. ‘One Tree Hill’ é para Greg e para Victor Jara, um músico chileno que foi perseguido pelo governo de seu país. Eu me interesso em vários aspectos do mundo, mas me interesso muito mais pelo indivíduo. Eu gostaria de saber como era a vida desses mineiros que de repente perderam seu emprego e que tinham uma família para sustentar. Como ficou o orgulho deles, vendo que buscando uma resposta para seus problemas só conseguiram agravar? O ponto de vista humano é o que me interessa, muito mais do que o de uma nação.”

Mesmo “Bullet the Blue Sky” há um ponto de vista específico. “Quando voltei da América Central comecei a escrever essa letra e pedi para que Edge reproduzisse em seu amplificador o som de San Salvador. Aliás, a maior influência dele nessa canção foi Jimmy Page. Eu não entendo quando chamam esse disco de o ‘álbum americano do U2’, porque, apesar de eu querer mesclar com o blues e o gospel, ele soa muito mais europeu do que propriamente norte-americano.”

Um assunto que começou a irritar profundamente a banda era sobre o selo Mother. “De repente começaram a nos criticar dizendo que éramos uma gravadora igual às outras, que só visamos o lucro. Mas será que eles não perceberam que nosso esquema era muito mais limitado, que funcionamos mais como um cartão de visitas. Hoje a Sinéad O’ Connor nos xinga, nos critica, mas ela se esquece o quanto nós nos empenhamos para ajudá-la no começo, com todo seu gênio complicado. Eu nunca mais vou me esquecer de um conselho de Pete (Townshend, do The Who) quando ele me disse que tínhamos feito uma grande bobagem em montar o selo. Pete me disse para que nunca na vida se perca o norte e sempre siga nele, porque quanto mais você tenta ajudar mais você é criticado e mais ódio você atrai. Eu disse que ele estava errado, mas hoje vejo que o erro foi nosso. Por isso quando vejo Adam e Larry dizendo que vão acabar com tudo isso, que não se importam em serem criticados depois, fico dividido, porque apóio a decisão deles, mas ao mesmo tempo critico essa postura de pular fora.”

6 –Um novo projeto

capa do disco de Robbie RobertsonO grupo chama a atenção por um novo lançamento, mas que não era nenhum disco ou singe novo. Robbie Robertson, um dos antigos membros do The Band (grupo que ficou famoso por gravarem vários discos com Bob Dylan nos anos 70, entre eles, o essencial duplo ao vivo Before The Flood) lança um disco solo apenas com seu nome. Nesse disco, havia uma canção chamada "Sweet Fire of Love", que Robbie havia gravado com a banda em agosto de 1986, dias antes da banda entrar em estúdio para gravar The Joshua Tree.

Em setembro, a banda volta os Estados Unidos iniciando a terceira e última parte da turnê americana. O primeiro show aconteceu no dia 10 e nesse dia tocam pela primeira vez “One Tree Hill”, música composta para Greg Carroll. Nesse mês o grupo ganha mais um integrante: o diretor de cinema, Phil Joanou.

Phil JoanouJoanou havia sido escolhido para dirigir um filme que documentaria a excursão mundial. A idéia partiu de Paul McGuinness que achava que o filme anterior, realizado em Red Rocks não representava a realidade do grupo. Bono, aliás, o achava constrangedor. O diretor acompanharia o grupo entre os meses de setembro e dezembro e filmaria mais de 250 horas de película. Phil queria realizar o filme em preto e branco e em cores, deixando apenas o último concerto da turnê, no dia 20 de dezembro, curiosamente em Tempe (onde abriram e tiveram a polêmica com o governador Menchan) sendo realizado em cores. Joanou iria acompanhar também as gravações das novas canções.



capa da revista Rolling StoneO filme, no início seria bancado por um grande estúdio, mas as dificuldades começaram a aparecer e McGuinness fechou um acordo com a Paramount, que entraria com uma pequena parte de dinheiro, deixando o gasto principal para o empresário e para o grupo. Essa foi a maneira encontrada de terem um maior controle na produção.

O grupo ganha novamente a ganha da revista Rolling Stone e começam outra série bem sucedida de apresentações. E resolvem mergulhar de vez na música norte-americana.


Em novembro, o grupo começa seu mês mais meu movimentado de toda a turnê e de forma inesperada.

Os Dalton BrothersO grupo teria no show do dia 1º, em Indianápolis, a abertura dos Los Lobos, que por alguma razão não puderam comparecer. Foi então que o U2 realizou uma velha idéia que vinha amadurecendo durante toda a excursão. Travestidos com perucas, chapéus e óculos escuros, entram no palco como os “Dalton Brothers”. Bono era Alton Dalton, The Edge era Luke Dalton, Larry era Duke e Adam Clayton (usando vestido) era Betty Dalton. A platéia fica sem entender nada e começa a vaiar aquele grupo que falava um arrastado sotaque caipira e que executou duas canções, “Lucille”, e “Lonesome Highway”. Saem do palco, fazem o show habitual. Na hora do bis, o U2 toca novamente “Lucille” e só então o público percebe que os Dalton era o U2. A brincadeira aconteceu outras vezes, sendo que na última, ganharam um outro “irmão”: Dallas Schoo, técnico-responsável das guitarras de The Edge.


Bono pixa o monumento em São FranciscoNo dia 11 do mesmo mês, participam de um concerto ao ar livre intitulado “Save The Yuppies”, em São Francisco, que foi confirmado apenas duas horas antes de ser iniciado. Esse show ficou particularmente famoso no filme Rattle and Hum por mostrarem a banda tocando “All Along the Watchtower”, de Bob Dylan, mas que havia feito grande sucesso com Jimi Hendrix. O grupo começou a tocar a canção e de repente Bono começou a correr pelo palco, pegou uma lata de spray e pichou as palavras “Rock & Roll Stops the Traffic” em uma estátua na fonte de Vaillancourt. O cantor foi acusado de vandalismo e condenado a pagar US$ 1000 de multas ou ficaria um ano preso. O cantor alegou que estava apenas exercendo o direito de se expressar. A situação criou um embaraço grande para a banda até que o escultor responsável pela obra disse que não considerava uma falta de respeito de Bono com sua obra. O prefeito disse que o show grátis já tinha sido uma forma de “punição”, mas que Bono teria que arcar com a limpeza do local, o que de fato aconteceu. Passado o incidente era hora de realizar um velho sonho...

7 – Gravando no berço do rock

A banda então partiu para a “casa sagrada” onde nasceu o rock ‘n’ roll, o estúdio Sun, onde Elvis Presley, Jerrry Lee Lewis, entre outros gravaram seus grandes clássicos. O grupo fez questão de contar com a presença de Cowboy Jack Clement, o responsável por essas gravações históricas. The Edge lembra que o estúdio era bem simples, com poucos avanços tecnológicos, o que caía coma uma luva, pois queriam gravar novas canções como se estivessem nos anos 50.

As gravações contaram com dois convidados ilustres: Bob Dylan e B.B. King. Bono conta que um dia acordou após ter um sonho com Dylan e estranhamente recebeu um telefonema na casa que havia alugado em Beverly Hills do próprio cantor e compositor norte-americano, para que fosse visitá-lo. Bono se dirigiu à casa de Dylan e mostrou uma letra que ele havia começado, mas não conseguia terminar. Dylan então sentou e juntos escreveram “Love Rescue Me”. Os dois entraram no estúdio Sun, junto com o U2 nos dias 29 e 30 de novembro para gravarem a canção. Dylan ainda deu uma canja tocando órgão em “Hawkmoon 269”.

Mas ele não foi a única presença ilustre nesses dois dias. B.B. King também compareceu após receber convite da banda. Eles se encontraram no dia 24 de novembro durante uma passagem de som, Bono mostrou a B.B uma canção que ele havia escrito chamada “When Love Comes to Town”. King adorou a canção e prometeu gravarem juntos. E de fato, aconteceu, mas B.B gravou sua parte de guitarra dias depois.

 

Larry ri enquanto coça o pé durante a gravação de Angel of HarlemFoi ainda nesses dois dias que fizeram uma outra música, “Angel of Harlem”, uma homenagem à Billie Holiday. Essa gravação ficou imortalizada no filme Rattle and Hum por mostrar Larry parando a canção para coçar o pé!

Com canções novas, o som da banda sofreu significativas mudanças, ficando mais “gordo” e encorpado e o U2 passou a ser taxado de “rock de arena”, uma denominação que cai muito melhor em bandas do sul dos Estados Unidos, por fazerem um som mais acessível e comercial. No palco, Bono continuava a fazer inúmeros discursos e contando suas experiências, para horror dos críticos que taxaram o grupo de arrogante e de quererem mostrar uma pompa desnecessária.


capa do single In God's CountryO grupo ainda lançaria nesse mês um novo single apenas para o mercado norte-americano, “In God’s Country”, que não fez sucesso nas paradas.

Com as filmagens sendo finalizadas, faltava apenas filmarem os dois shows de Tempe em que seriam rodadas as cenas em cores da produção. Com medo de que o estádio não estivesse completamente lotado nos dias, Paul McGuinness ordena que os preços dos ingressos sejam reduzidos para apenas Us$ 5, possibilitando que mais de 110 mil espectadores compareçam aos shows de 19 e 20 de dezembro. Esses foram os últimos shows do grupo até setembro de 1989, com exceção de uma apresentação em Londres, em outubro de 1988.


Sobre o show, Bono confessou algo muito curioso: “Phil nos chamou e disse que só tinha aqueles dois shows para realizar as tomadas coloridas, mas que precisava de uma apresentação mais teatral, o que não estava acontecendo, pois sempre falamos diretamente com o público. Ele perguntou se eu poderia fazer um show mais para a ‘câmera’ do que para os espectadores. Eu, claro, concordei...”

Finalizando a maior turnê que já tinham realizando, resolveram dar um tempo, já que a ordem agora era preparar o novo disco e acabar de editar as filmagens do filme, que como o disco, receberia o título de Rattle and Hum.

Mas na verdade, o que mais queriam era organizar a vida e fazer um balanço do ano. “Nos últimos 12 meses, nossa organização virou um hospício. Os telefones berravam o dia inteiro, Paul (McGuinness) gritava pelo quatro cantos e fomos duramente criticados. Estamos sendo taxados de arrogantes, por convidarmos Dylan e B.B. King a gravarem conosco e por termos feito músicas no estúdio Sun. Alguns dizem que nós queremos ser tão importantes quanto Elvis ou próprio Dylan. Ora, isso é ridículo! Apenas por gravarmos lá e com ele? É claro que eu gostaria que o U2 fosse tão grande como eles, mas isso não quer dizer que uma coisa tem a ver com outra”, afirmou Bono.

Na verdade, uma das críticas mais ácidas acontecia quando tocavam “Bullet the Blue Sky” ao vivo, já que a canção se iniciava com uma gravação de Jimi Hendrix executando “Star Spangled Banner”, em Woodstock, tendo fogos de artifício explodindo acima de uma imagem da bandeira americana.

“Essa é uma metáfora, a canção toda é uma metáfora. Até quando vou precisar explicar que apenas usamos Hendrix tocando porque servia como uma luva para nossa idéia? Alguns reclamaram que eu estava preocupado demais em agradar os americanos. Eu estava falando dos problemas do mundo, usando os Estados Unidos como alvo principal.”

“Acho que nosso maior problema é que atingimos um nível tão alto para a Irlanda que ficamos sem um rival à altura e de repente tudo que falamos ou fizermos ganham contornos ridículos. Essa é a nossa maior preocupação, mas sinto que o público nos entende e que está descobrindo novas experiências na música junto conosco, porque nós estamos descobrindo muita coisa e queremos progredir ainda mais”, contou The Edge.

capa do disco A Very Special ChristmasFinalizando o ano o U2 aparece em uma coletânea intitulada A Very Special Christmas, cantando uma canção do lendário produtor norte-americano Phil Spector, "Christmas (Baby, Please Come Home)", e que foi produzida por Jimmy Iovine. A canção havia sido grava do no dia 30 de julho, em Glasgow. O disco foi realizado com um álbum de caridade para a Olimpíada para deficientes físicos e teve a participação de Madonna, Bruce Sringsteen e Run D.M.C. O U2 chegou a tocar a música no último show da turnê.

Mas o fantasma dos Estados Unidos ainda viria atormentar o grupo nos próximos dois anos e a repercussão confusa de Rattle and Hum apenas aumentaria ainda mais a angústia da “maior banda de rock do mundo”. Mas, todos esses assuntos, ficam para uma próxima análise...




 

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