101 - Violent Femmes


Essa é uma banda totalmente diferente e interessante do ponto de vista sonoro, por misturarem a folk music com o punk e por fazerem das sátiras inteligentes de Gordon Gano um excelente antídoto para o conservadorismo cada vez mais absurdo na América. O grupo, que começou suas atividades oficialmente em 1981, na era Reagan, fez para o então presidente norte-americano uma letra sensacional, de apenas 33 segundos ("Old Mother Reagan"). Uma banda anárquica que gravava por um selo de nome igualmente inspirador, Slash, que teve um pequeno mini-hit pelo mundo, "Blister In The Sun" e que lançou em 2001 um cd apenas em mp3. Senhoras, e senhores, um trio único: Violent Femmes!


Antes de começar essa coluna dois avisos:

1 – essa coluna agora terá um outro espaço cativo na Internet. Meu amigo Fábio Costello, que possui um dos blogs mais divertidos sobre cultura pop, o www.ouvidopenico.blogger.com.br, achou que é uma boa idéia reproduzir algumas colunas por lá. Estreou com Leonard Cohen e só Deus sabe quais outros crimes cometerá com seus leitores. Caso queira conferir algumas delas, que deverão ter outro formato e se divertir com seus posts sobre música, cinema e sua banda mundialmente obscura, os Hereges (por pouquíssimo tempo...). Dica dada...

2 – A idéia era colocar toda a biografia do U2 na seqüência, mas com medo de que alguns leitores que não curtam a banda sumam durante esse tempo, resolvi intercalar a mesma. A proposta é simples: um capítulo dos irlandeses, uma coluna sobre outra banda, assim sucessivamente. Assim os amantes de Bono e companhia continuam acessando isso aqui e os outros, que gostam de sons mais diferentes, não desistem de mim, que por acaso já consegui 12 leitores? (ô chefia, e o aumento, não rola não? Eu hein?)

Como diria Jim Morrison, “is everybody in? the ceremony is about to begin….”

“The Violent Femmes — they bring all their equipment on the bus. And you can't fuck with the Violent Femmes. You cannot fuck with this band!”



Victor, Gordon e Brian Essa frase de uma delicadeza igual a de um elefante andando de patins em uma loja de cristais (isso é possível?) é a primeira faixa do disco Add It Up, tirada de um show do grupo em 1981. Olhando assim parece mais uma banda punk irada, mas o que se ouve ou vê não lembra em nada essa premissa. Um trio da cidade de Milwaukee que adorava, sim, o espírito anárquico do punk, mas misturado com músicas mais tradicionais ao estilo americano. Um trio básico de rock, com guitarras (ou violão), baixo e bateria e com a intenção apenas de pontuar suas composições, sem nenhuma pretensão de “descer a lenha” como faziam os antigos trios, que transitavam pelo hard ou progressivo. O destaque era a presença caótica em palcos, a empatia com os fãs e suas letras, para lá de divertidas e críticas.

O grupo foi formado em 1980 pelo baixista Brian Ritchie e pelo baterista Victor DeLorenzo e pelo guitarrista, cantor e letrista Gordon Gano. Ritchie vinha de uma banda chamada Violent e colocaram "Femmes" por ser uma gíria local para as "garotas de vida fácil".


Os Violent Femmes foram descobertos pelo falecido guitarrista dos Pretenders, James Honeyman-Scott, que os ajudou nos primeiros passos. Na verdade, os Pretenders ficaram “babando” com a estética do grupo e suas músicas e os convidaram para abrir alguns shows da banda pela América, em 1981. No final de 1982 assinaram com a pequena gravadora Slash e no ano seguinte lançaram sua estréia. Com um “paitrocínio” (Victor conseguiu U$ 10 mil emprestado com seu pai) e intitulado apenas com o nome do grupo e tendo uma angelical foto de uma garotinha descalça, com um vestidinho branco, olhando por uma janela. O disco trouxe seu maior sucesso comercial, a genial canção "Blister In The Sun". Veja a letra...


Blister In The Sun

When I'm out walking
I strut my stuff yeah I'm so strung out
I'm high as a kite
I just might stop to check you out
let me go on like I blister in the sun
let me go on big hands I know your the one
body and beats I stain my sheets
I don't even know why
my girlfriend she's at the end
she is starting to cry
let me go on like I blister in the sun
let me go on big hands
I know your the one...

 

O disco era uma mistura quase inusitada de folk com punk e virou uma sensação entre os universitários, maior público do grupo. Embora não tenha feito nenhum sucesso comercial, os Femmes passaram a ser uma das bandas mais queridas das college radios, emissoras independentes e que tinham como proposta apoiar todo e qualquer artista que estivesse fora do grande mercado. Uma das marcas do grupo era sua ironia e raiva contra o sistema. Um exemplo perfeito pode ser visto no single que antecede o disco, chamado "Gimmie the Car", que Gordon tocou em sua festa de formatura: "Vamos lá papai, libere o carro/Eu quero sair com minha garota/Deixá-la bêbada/Quero deixá-la bem doida/Quero fazê-la gritar.." Não é difícil imaginar o porquê de ter virado um hit entre os jovens.

As letras de Gordon são extremamente pessoais e falam basicamente das angústias que passam pela cabeça dos jovens - briga com pais, namorados(as), leis absurdas, etc... - sempre narradas em primeira pessoa.



capa de The Blind Leading the NakedNo ano seguinte lançam Hallowed Ground, onde Gano começa a expor suas idéias religiosas (era um dedicado batista, pois seu pai era um ministro da igreja) e o grupo aprimorava mais sua receita folk/punk, agora mergulhando também na música country. Em 1986, lançam um novo trabalho, que para muitos fãs, é o melhor da banda: The Blind Leading the Naked. Produzido pelo tecladista e guitarrista dos Talking Heads, Jerry Harrison, o disco é considerado o mais próximo de comercial que poderiam fazer. Gravam uma cover de "Children of the Revolution", do T. Rex e uma excelente paródia sobre o então presidente norte-americano Ronald Reagan (veja a letra ao final do texto...). Mas o disco serve também como encerramento das atividades da banda por algum tempo.

Brigas internas acabam fazendo com que o trio se separe por um período. Gano aproveita para lançar um trabalho com seu projeto gospel "The Mercy Seat", em 1987. Sobre esse projeto e sua dedicação à religião, Gordon explica: "muitas pessoas pensam que o cristianismo é algo extremamente conservador, mas na verdade há uma grande liberdade nela, começando por aceitar Jesus Cristo em você mesmo. Quando era criança e via meu pai falando aos seus fiéis, me sentia livre. Parece estranho que isso transpareça em minhas canções, pois elas são muito críticas, mas é a maneira que encontrei de me sentir honesto comigo." Além de Gano, o grupo consistia na cantora Zena Von Heppinstall, na baixista Patricia Moran e no baterista Fernando Mendez.



Ele explica que suas primeiras canções foram assustadoras para seus pais: "quando escrevi 'Out of Window' minha mãe ficou horrorizada e disse que queria conversar comigo. Ela disse que a letra parecia um incentivo ao suicídio quando a idéia era exatamente a inversa. Quando expliquei a idéia, ela entendeu, mas disse que as pessoas poderiam ter o mesmo pensamento dela, pois a letra era ambígua. Mas ela sempre apoio meu trabalho, assim como meu pai também."

Talvez a maior oposição estivesse dentro do grupo, mas precisamente em Brian Ritchie, um ateu de carteirinha. Brian confessa que as letras de Gano o irritaram várias vezes por considerar a fé como uma grande bobagem e uma maneira de fazer lavagem cerebral nas pessoas. "Pedi ao Gordon que não abordasse o tema no nosso primeiro disco, já que me sentia incomodado com isso. Eu não acho que podemos ajudar alguma pessoa com nossas canções. Não era a nossa intenção vender mensagens, afinal que mensagens podemos passar se somos três caras confusos?"

Gordon ressalta que apesar de serem cantadas em primeira pessoa e escritas por ele, nem sempre as músicas são biográficas ou expressam o que realmente sente. "Não é porque as fiz assim, me sinto dessa forma ou ajo dessa maneira. É apenas uma forma de narrativa."



Em 1989 o grupo volta e soltam um disco intitulado apenas com o nome 3 e em 1991 lançam outro disco intitulado Why Do Birds Sing?.

Nessa época os desentendimentos com Brian aumentaram, mas depois tiveram uma reviravolta. "Eu não gostava do ponto de vista de Brian sobre religião, mas concordava que ele pudesse também se expressar. Quando ele começou a dizer que se recusava a tocar minhas canções, eu não liguei porque eu escrevi tantas e poderia tocá-las em outra oportunidade. Até que um dia ele chegou e pediu para que nós as tocássemos e quando fizemos isso, elas pareciam mais punks do que as outras canções do Violent. Brian me dizia que elas eram minhas melhores composições, depois disso."

Tanta força em suas composições fez de Gordon um dos porta-vozes de sua geração, segundo revistas e jornais especializados. E seus fãs eram garotos que depois dariam o que falar como Billy Corgan, Kurt Cobain e até, para sua surpresa, um dos seus maiores ídolos, Lou Reed. "Quando encontrei Lou uma vez em Nova York, ele me disse que adorava os Femmes e que me achava o maior letrista do mundo, fiquei mudo e depois quase chorei. Eu ouvia Velvet Underground em casa quando menino, copiava seu estilo de tocar guitarra e depois meu herói me diz que era meu fã. Não conseguia acreditar."



O grupo jamais gostou de ensaiar ou fazer um set list para seus shows, deixando que Brian começasse a dedilhar uma canção para que a banda atacasse. DeLorenzo nunca abriu mão de seu minúsculo kit de bateria, e se considera um dos poucos bateristas minimalistas do rock.

A banda sempre procurou inovar em suas apresentações, quer seja pelo público (clubes gays e instituições para deficientes mentais) ou locais (desde o imenso Carneggie Hall até uma apresentação no Pólo Norte!) sem que isso mudasse o estilo ou maneira de se comportarem. Aliás, o grupo chama seus fãs carinhosamente de "quarto integrante", tamanha a empatia e carinho pelo qual são recebidos. Não importa onde toquem, os mais devotados os seguem por toda parte e aprontam uma confusão dos diabos. Incapazes de ficarem um segundo parados, sobem no palco, cercam os integrantes e conversam com os três, por horas e horas. "Eles não são delinqüentes, apenas meninos cheios de energia", brinca Gano.



Em 1993, saiu a coletânea Add It Up (1981-1993), com canções raras e clássicos do grupo, sendo cinco delas ao vivo. O grupo que manteve sempre uma discografia irregular, inovou em 2001, ao lançar Something’s Wrong, apenas em formato mp3. Mais uma atitude politicamente incorreta do grupo? Gordon diz que sim e que não. "Os nossos fãs sempre reclamaram que não tinham dinheiro para comprar discos e que encontravam poucas músicas nossas na internet. Por isso, resolvemos fazer um álbum ao estilo deles."

Em 2002, Gordon lançou um disco chamado Hitting the Ground, que teve participações de Frank Black, PJ Harvey, Lou Reed e John Cale, além de participações em vários projetos como a volta do Talking Heads, sem David Byrne, chamada The Heads, cantando na faixa “Only the lonely”.



Em 2003, o grupo comemorou 20 anos de carreira e 40 de Gordon (ele nasceu em 7 de julho de 1963), em alto estilo: shows, vários deles para a alegria dos seus dedicados fãs. Infelizmente nada de aparecerem por aqui. Mas que sabe um dia o milagre acontece.

Deixo vocês com três letrinhas bem ácidas de Gordon, “Dance Motherfucker Dance” e “Old Mother Reagan” e “Gimme the Car”, que causou uma revolta geral na tal festa. Um abraço e até a próxima coluna!

Dance Motherfucker Dance

When I say dance, you best dance motherfucker

dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
I say dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
I say dance, dance, dance, dance, dance, dance, whohoo...
you suckin' ugly motherfucker dance

dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
I say dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
I say dance, dance, dance, dance, dance, dance, whohoo...
you suckin' ugly motherfucker dance

you suckin' ugly motherfucker dance

dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
I say dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
I say dance, dance, dance, dance, dance, dance, oh...
you're such an ugly motherfucker dance

I say dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
I say dance
dance motherfucker dance
dance motherfucker dance
I say dance, dance, dance, dance, dance, dance, whohoo...
you're such an ugly motherfucker dance

Old Mother Reagan

And her crew
Took away
From me and you
I hope she goes far away
She better go far away
Y'know it ain't right
When it's all wrong
This is the Old Mother Reagan
Protest song
Old Mother Reagan
She's so dumb
She's so dangerous
How come...
Old Mother Reagan went to heaven
But at the pearly gates
She was stopped!

Gimme The Car

Come on dad gimme the car tonight
Come on dad gimme the car tonight
I got this girl I wanna....
Come on dad gimme the car
Come on dad gimme the car tonight
I tell'ya what I'm gonna do
I'm gonna pick her up
I'm gonna get her drunk
i'm gonna make her cry
I'm gonna get her high
I'm gonna make her laugh
I'm gonna make her...shh
woman, woman, woman
she gotta knows she's it
cause I'm gonna touch her
all over her body
gonna touch her
all over her body
gonna touch her
all over her body
gonna touch her
all over her body
and she can touch me
all over my body
she can touch me
all over my body
she can touch me
all over my body
she can touch me
all over my body
time goes by I can feel myself growing old
burning inside makin' this boy turn out cold
What's wrong, What's right
I don't care when I hate my life
What's wrong, What's right
y'know people don't care when they hate their life
but how can I explain personal pain
how can I explain personal pain
how can I explain my voice is in vain
how can I explain the deep down
driving, driving, driving,
weredriving, weredriving, weredriving
hey dad speaking of driving
come on dad gimme the car tonight
so much he don't understand
just might never make it to a man
Come on dad gimme the car
I ain't no runt
come on girl gimme your...
cause I ain't had much to live for
I ain't had much to live for
y'know I ain't had much to live for
y'know I ain't had much to live for

Discografia

Violent Femmes (1983)
Hallowed Ground (1984)
“The Blind Leading the Naked (1986)
3 (1988)
"Debacle: The First Decade" (1990)
Why Do Birds Sing? (1991)
Add It Up (1993)
New Times (1994)
Machine (1994)
Rock!!!!! (1995)
Viva Wisconsin (1999)
Freak Magnet (2000)
Something’s Wrong (2001)

 




 

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