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Irônico
como as pessoas odeiam os anos 80. Nunca entendi o motivo. E o
mais incrível é que a música daquela época
é odiada e, ao mesmo tempo, lotas festas retrô em
todos os cantos. E os anos 80 nos deram ótimas coisas.
E também coisas esquisitas, que, de tão esquisitas,
eram boas. É o caso do Vzyadoq Moe, um grupo sorocabano,
que ousou misturar samba com minimalismo, dadaísmo e rock
industrial e que virou a sensação no meio alternativo,
entre 1987 e 1990. Em seu primeiro disco, O Ápice, lançado
pela Wop-Bop, deixaram sua marca registrada: um rock "industrial"
com letras influenciadas por Clarice Lispector, Augusto dos Anjos
e impressionismo alemão.
Nos
anos 80, o rock brasileiro começava a se atualizar com
a música produzida no exterior, especialmente na Europa
e Estados Unidos. Embora a importação de instrumentos
e tecnologias fosse quase impossível, devidos aos impostos
e burocracia, os emergentes artistas nacionais procuravam compensar
a falta de estrutura com originalidade e muita vontade.
O Vzyadoq Moe foi mais
exemplo de como o Brasil dos anos 80 era interessante e o que
poderiam ter feito se tivessem tido a chance de trabalhar em condições
ideais.
O grupo surgiu em 1986,
na improvável cidade de Sorocaba, interior de São
Paulo, a "Manchester paulista". O nome do grupo já
mostrava o quão original era: as letras foram sortedas
e no final saiu algo "vzyadoqmof". O grupo resolveu
deixá-la mais palatável, criando o Vzyadoq Moe e
era formado por meninos com idade entre 15 e 17 anos: Fausto Marthe
(voz e letras); Marcelo Raymond (guitarra), Marcos Stefafeni "Peroba"
(bateria e percussão), Edgard Degas (baixo) e Jacksan Moreira
(guitarra).
O grupo foi percebido pela
primeira vez na extinta seção da Revista BIZZ chamado
"Porão" (bons tempos...). Veja o artigo assinado
por Sônia Maia...
VZYADOQ
MOE
Um nome impronunciável para um som impressionante. (Revista
Bizz – Novembro de 1986)
Quando a fita aterrissou aqui na redação, os
primeiros ouvidos logo questionaram: O que é isso? De onde
vêm: Quem são?” Isso era uma mistura inspirada
no expressionismo alemão e na poesia dadaísta, usando
latas como bateria e percussão, e um vocal antivocal, fora
do ritmo. Eles vêm de Sorocaba, interior de São Paulo,
e são os Vzyadoq Moe.
Nossos ouvidos não
mentiram. Apesar de terem montado o grupo há apenas sete
meses, esses garotos (15 a 17 anos) já têm seus caminhos
muito bem definidos.
“Queremos chegar à Europa. Tem muita gente que acha
que banda nacional não presta. Queremos mudar isso. Temos
condições de arrebatar o cetro de Londres. Lá
está tudo morto! As únicas coisas novas e que realmente
prestam são Smiths e Jesus and Mary Chain.
E aqui? “Mercenárias, Akira S & As Garotas que
Erraram, Cabine C, Chance e Fellini”, concordam.
Orlak acrescenta: “Mercenárias estão acima
dos outros, mas o Vzyadoq está acima de tudo”, conclui
Fausto.
O nome foi feito á base de sorteio de letras. No mais,
minimalismo e preocupação de não parecer
nada. “Virou até paranóia. Descartamos muitas
músicas, porque achamos que pareciam com alguma coisa.
Além disso, o que torna o som característico é
o fato de todos os instrumentos estarem direcionados para idéia
de banda, e não o contrário”, vão completando
um após o outro.
Edgard (baixo), Fausto T. (vocal e letras), Orlak (guitarra),
J. Calegari Jr. (guitarra) e Marcos (percussão) não
estão sendo arrogantes. O Vzyadoq é diferente, é
novo, é demente, é idéia pura. Que venha
o vinil para que todos possam conferir.
Sônia Maia.
O
som do Moe era derivativo, por vezes, de baluartes dos anos 70
e 80, como o Pere Ubu, Joy Division, PiL, e bandas industriais,
como o alemão Einstürzende Neubauten. A bateria era
formada por latas, pedaços de metal, chapas de zinco, e
produziam um som hipnótico e perto do violento. As composições
eram feitas de maneiras livres: "'Não existe lei.
Às vezes o baixo faz a linha da guitarra, a guitarra marca
o ritmo e a bateria define a melodia", falava Marcelo "Peroba",
dono da garagem onde rolaram os primeiros ensaios.
O grupo impressionava ao
vivo pela violência e carisma em cima do palco, além
do som incomum por esses lados. Seduzido por isso, o selo independente
Wop-Bop ofereceu-lhes um contrato para a produção
de um LP próprio. O produtor escolhido era o jornalista
José Augusto Lemos, músico independente do grupo
Chance.
Em
1988 é lançado O Ápice,
disco que chamou a atenção de críticos no
Brasil e no exterior, embora a produção não
tenha sido das mais primorosas, tecnicamente falando.
René Ferri, um dos
sócios e dono da Wop-Bop, lembra dos problemas: "O
disco do Vzyadoq Moe nos deu a idéia completa do que é
editar um retumbante fracasso. A gravação se deu
no velho e superadíssimo Estúdio Eldorado, sei lá
por que motivo. Acho que os músicos não levaram
muito a sério o trabalho. A banda devia ser um brinquedo
para eles. O corte do disco na RCA saiu ruim e ninguém
percebeu ou fez que não percebeu. Conseguimos vender menos
de 300 cópias. Foi o disco que mais divulgamos e o que
menos deu retorno. Um fracasso completo."
O
disco chama a atenção pelas cantadas em português
por Fausto, dono de uma poesia única: "ousaste
na infância temer a doença / lançaste ao vento
mil sortes remotas/ não estás na verdade em alma
e transe / e o amor urge, não tarda ou recua."
Ainda assim, o disco mostrava
ineditismo do material feito no Brasil e o grupo a se apresentar
em vários palcos das regiões Sul e Sudeste.
Em
1989 o grupo participa da coletânea Sanguinho Novo
- Arnaldo Baptista Revisitado, coletânea lançada
pela gravadora Eldorado, com novas bandas brasileiras interpretando
clássicos dos ex-líder dos Mutantes.
O Moe participa com a faixa
"Bomba H Sobre São Paulo". Nessa época,
o guitarrista Jacksan deixa o grupo para acabar os estudos, entrando
Fernandão Dias.
Em 1990, o grupo participa
de nova coletânea, Enquanto Isso...?!,
produzida por RH Jackson e Alex Antunes.
O
disco trazia faixas das bandas 3 Hombres, Solano Star, Killing
Chainsaw, Akt2 e Notícias Populares, além do próprio
Moe, que contribui com "The Cabinet" (a primeira composição
da banda cantada em inglês) e "Santa Brigida"
e foi lançado pelo selo Manifesto, em outubro de 1990.
O grupo começa,
porém, a se ressentir, de melhores condições
técnicas e financeiras para trabalhar e o grupo precisa
trabalhar em locais improvisados entre São Paulo e Sorocaba
para produzirem mais.
Ainda em 1990, o grupo
é convidado para tocar em Nova York, no Cat Club, pelo
New Music Seminar, mas não podem aceitar o convite por
falta de recursos financeiros. Frustrados, entram novamente no
estúdio SoftSynch, com RH Jackson e saem de lá com
cinco novas músicas.
Após uma parada
em 1992, o grupo retorna no ano seguinte como um quarteto e um
som mais pesado, próximo do speed metal e gravam mais duas
músicas em um estúdio da capital paulista. Ainda
nesse ano produzem o primeiro vídeo, “Rompantes de
Fúria”. Mesmo assim, desanimam com as pouquíssimas
oportunidades e o grupo termina.
Em
1999, sai um último disco da banda, Hard Macumba,
de material inédito, além de algumas faixas tiradas
de um showno Aeroanta em São Paulo, no ano de 1991.
Em 2001, a Gorila Groove
relança, em CD, todo o catálogo da Wop-Bop. O disco
O Ápice é editado e se esgota rapidamente,
apesar de alguns problemas técnicos. A faixa seis "Não
Há Morte" some misteriosamente, e entra em seu lugar,
de forma repetida, a número três, "O Incerto".
Infelizmente, nenhum dos discos da banda se encontra mais em catálogo.
Deixo vocês com a
discografia do grupo. Um abraço e até a próxima
coluna.
Discografia
O Ápice (1988)
Sanguinho Novo (1989)
Enquanto Isso...?! (1990)
Hard Macumba (1999)
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