311 - Patti Smith - Wave
 

O adeus de Patti (pelo menos até a volta, em 1988). Um segredo tão bem guardado que nem havia compartilhado com a banda. Apenas o produtor e ex-namorado Todd Rundgren sabia disso. Patti queria deixar o mundo da música. Queria ser esposa. Queria ser mãe. Queria viver com seu grande amor, Fred Smith, ex-guitarrista do MC5. Patti estava disposta a deixar os palcos e a condição de mito para se tornar uma adorável e atenciosa mãe e esposa. E ninguém sabia disso. Ainda.


O sucesso causou problemas a Patti Smith. A histeria dos fãs, os concertos em estádios, as pressões absurdas geradas pelo sucesso de "Because the Night" e o romance com o ex-guitarrista do MC5, Fred "Sonic" Smith, levaram-na a uma atitude radical: o adeus.

Patti estava tão certo disso que faria do próximo álbum um adeus. O maior desejo era ser mãe e esposa.

E ela andava arredia com a mídia, dando pouquíssimas entrevistas. "Estou cansada de ver pessoas inventando fofocas sobre mim e distorcendo tudo o que digo", disse Patti em uma de suas raras entrevistas, em 1979.

Além disso, Patti estava terrivelmente apaixonado pelo taciturno e discreto Fred Smith.

capa do compacto FrederickFinalmente ela havia encontrado o homem com quem queria dividir sua vida, ter filhos, uma vida normal. O amor por Fred era tão grande que ela havia escrito uma canção de nome "Frederick".

Frederick era uma canção de amor e ela não negava isso: "uma das coisas que tentei colocar nesse disco era escrever uma cançãozinha que todo mundo amasse, que todos gostassem de ouvir, que os pais pudessem ouvir enquanto estivessem trabalhando ou que as crianças pudessem dançar. Frederick teve esse objetivo para mim."

Wave foi lançado em 17 de maio de 1979 e em momento algum Patti revelou seus planos ao grupo.

O quarto disco tinha um quarto produtor diferente, embora o álbum fosse mais próximo do pop.

O LP conseguiu o 18º lugar na parada norte-americana e apenas o 41º lugar no Reino Unido.

O disco trazia as seguintes faixas:

Lado 1

1. "Frederick" – 3:01
2. "Dancing Barefoot" (Smith, Ivan Kral) – 4:18
3. "So You Want to Be (A Rock 'n' Roll Star)" (James McGuinn, Chris Hillman) – 4:18
4. "Hymn" (Smith, Lenny Kaye) – 1:10
5. "Revenge" (Smith, Kral) – 5:06

Lado 2

1. "Citizen Ship" (Smith, Kral) – 5:09
2. "Seven Ways of Going" – 5:12
3. "Broken Flag" (Smith, Kaye) – 4:55
4. "Wave" – 4:55

Foram retirados três compactos do novo trabalho: além de "Frederick", a Arista editou "Dacing Barefoot" e "So You Want to Be (A Rock 'n' Roll Star)", música dos Byrds e gravada no disco Younger Than Yesterday, de 1967.

"Dancing Barefoot" é dedicada à Jeanne Hébuterne, amante do pintor italiano Amedeo Modigliani (1884-1920) e recebeu ao longos dos anos várias covers, sendo a do U2 mais famosa. O grupo lançou-a como lado B do single When Loves Comes to Town, de 1988.

Já a dos Byrds falava das falsas ilusões na vida de astro do rock, algo que ela sentia na pele. Outro destaque é a faixa-título, inspirada na Bula Papal lançado por João Paulo I enquanto o disco era gravado.

O último disco foi marcado também por uma turnê extensa, sendo os últimos shows do Patti Smith Group, na Itália, nas cidades de Bolonha e Florença. O grupo passou momentos tensos nestes shows, como relatam Lenny Kaye e Jay Dee Daugherty no livro Please Kill Me:

Jay Dee Daugherty: "os dois últimos concertos do Patti Smith Group foram em Bolonha e Florença. Patti ficou numa situação muito assustadora em Florença. Era um grande estádio de futebol, e tinham perdido o controle sobre a multidão. Boa parte da platéia tinha entrado de graça - numa espécie de derrubada de portões. Parte do acordo que o promotor teve que fazer com o partido comunista local era que eles iriam garantir a segurança.
O concerto seguiu sem muitos incidentes, mas depois ficamos trancados no backstage porque os palhaços dos seguranças tinham fechado um portão de ferro e ninguém tinha a chave.
Então havia oitenta mil pessoas gritando 'Patti, Patti', sabe como é, indo à loucura, e a banda estava começando a entrar em pânico, tipo: 'O que está acontecendo, porra? Queremos voltar pro palco! Quem pegou a porra da chave?
De repente, aqueles seguranças começaram a ficar agitados. Tiraram o resto da banda do caminho e cercaram Patti - iam carregá-la embora num carro. Patti temeu pela própria vida - pensou que fosse ser raptada e ter as orelhas cortadas ou sabe-se lá o quê. Foi nesta noite que Patti ficou de joelhos e rezou. Meio que funcionou, mas achar a chave também ajudou.
Por isso, na noite seguinte a empresária dela, Ina disse: 'Isso não pode acontecer de modo algum - só vamos tocar sob tais e tais condições.
Mas a noite seguinte foi uma cópia da noite anterior - mesmo tipo de estádio e um longo corredor de azulejos no backstage. [...]Então, estou indo, dobro e tem um carabinieri parado ali com uma metralhadora, e penso: 'Oh, merda.' Eram nossos guardas pra noite. Houve um tumulto. A platéia foi à loucura. [...]
Naquela noite, Patti fez uma longa improvisação ao piano, em cima da qual tocaram uma preleção do papa pelo sistema de som. Aquilo não pegou muito bem pros jovens de Florença. As pessoas ficaram de cara. Talvez pensassem que era um sacrilégio ou talvez simplesmente não quisessem mais ouvir aquela merda.
A seguir, a bandeira americana aparece e, então, as barreiras começaram a ser quebradas. Grandes pedaços de madeira com pregos começam a ser atirados no palco. Daí, comecei a me lembrar de todas as histórias de horror sobre os concertos de Lou Reed, na Itália, sendo bombardeados. Por isso, logo que vi aquelas coisas vindo, corri até a gigantesca caixa de transporte do órgão B-3, me meti lá dentro e saí quando parou de chover entulho, e começamos a tocar de novo."

Lenny Kaye: "Todos os garotos da platéia subiram no palco, e pareciam que iam quebrar tudo, mas apenas sentaram no palco. Foi o máximo em respeito e honra. Foi como se aqueles garotos fossem uma metáfora - a gente estava passando o palco para eles, e agora era a vez deles botarem para quebrar e mostrarem a que vinham."

Jay Dee Daugherty: "Toda a segurança tinha dado o fora. Não restou ninguém. nada de promotores, nada de coisa nenhuma, nada de tiras. As pessoas começaram a subir no palco e estavam passando a mão nos instrumentos e tocando. E a gente estava sendo muito legal, tentando evitar uma situação muito explosiva, por isso eu disse: 'Lamento, mas ainda não terminei com essa bateria.
Esta foi a nossa gloriosa despedida. Mas, também, foi muito assustador."

Lenny Kaye: "Começamos tocando pra duzentas e cinquentas pessoas em St. Mark's Church e terminamos na frente de setenta muil num estádio, em Florença. Não dá pra inventar uma narrativa melhor que esta."

Jay Dee Daugherty: "O término oficial da banda se deu no escritório do nosso contador... Basicamente, Patti disse: 'O grupo não existe mais. Vamos terminar de uma maneira graciosa - não vamos anunciar que o grupo está se separando."

Lenny sabia que a banda iria terminar, pois Patti havia se mudado para Detroit, onde vivia Fred Smith. Segundo ele, a comunicação entre ela e a anda ficou muito complicada e sem Patti por perto, não havia muito sentido, já que o papel deles era apoiá-la, que dava a direção musical.

"Por um tempo, estive completamente envolvido no que fazia. Eu podia me imaginar desintegrando embaixo das luzes, tocando guitarra, mas de repente percebi que não poderia mais fazer isso e perdi a motivação. Eu também estava cansada, por causa da minha saúde. Ficar muito tempo na estrada me deixava quase todas as noites com bronquite e isso me deixou insegura e muito temperamental. Eu tinha muitas pessoas em volta de mim e fazendo tudo por mim. Isso é ótimo, mas à medida que você quer crescer como pessoa, eu acho que você precisa entender que o mundo não gira em torno de você. E ninguém te ensina isso mais do que uma família."

Fred e Patti casaram no dia 1º de março de 1980 e ela teve uma vida bem calma, longe do palco. Além de ser mãe, estudava clarinete e piano, influenciada por Patti e compunham lentamente. Seria apenas em 1988 que ela voltaria, com Dream of Life. Você poder ler sobre isso clicando aqui.

Deixo vocês por aqui. Um abraço e até a próxima coluna.

Discografia

Horses (1975)
Radio Ethiopia (1976)
Easter (1978)
Wave (1979)
Dream of Life (1988)
Gone Again (1996)
The Patti Smith Masters: The Collective
Peace and Noise (1997)
Gung Ho (2000)
Land 1975-2002 (2002)
Trampin’ (2004)
Twelve (2007)tti Smith - Radio Ethiopia

 


 

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