132 - Wire Train

 

Uma banda obscura (depois de um disco tão grandioso como o de John Coltrane), porém talentosa. Nascido no meio da década de 80, o Wire Train foi uma daquelas bandas que perseguiu o pop perfeito, lendo cartilha de Beatles e outros artistas dos anos 60. Se você viveu e consumiu vinis na década de 80, talvez se lembre de uma série da antiga CBS intitulada New Rock Collection. Entre um disco do Clash, o primeiro do Lone Justice,e o terceiro do R.E.M., saiu Between Two Words. Eu cheguei a ouvir o disco, mas não comprei. Anos depois, quando balconista da saudosa Sweet Jane, encomendei o disco para o Carlos e veio um daqueles 2 em 1, trazendo o primeiro, ... in a chamber, e esse citado. Bem, desde então acabou sendo um bom companheiro e qual não foi a minha surpresa ao encontrar um site bacana do grupo. Aí um neurônio cutucou o outro e perguntou: por que não? "É, por que não?", pensei. Aí está então...


em pé: Federico Gil-Sola e Kurt Herr; sentados Kevin Hunter e Anders RundbladO Wire Train nasceu através de uma talentosa dupla de compositores, Kevin Hunter e Kurt Herr. Hunter foi um menino de sorte e deixou a América para estudar na França, Itália e Espanha. Desde cedo, Kevin era chegado em poesia e literatura, e teve dois contos publicados aos dezesseis anos. Ao voltar para seu país, foi estudar poesia em San Francisco e deu de cara com Kurt Herr. Logo na primeira conversa, fulminou o futuro parceiro com duas perguntas? “você toca algo?” “gostaria de formar um grupo?”. Kurt apenas disse não para as duas perguntas.

Kurt ainda não havia tido contato algum com uma guitarra e Hunter só sabia que queria escrever. Depois de muita saliva gasta, Kevin convenceu Kurt, e juntos, ficaram seis meses tentando aprender a tocar. Enquanto aprendiam a tocar conheceram dois outros jovens, o sueco Anders Rundblad, baixista e um argentino chamado Federico Gil-Sola, que tocava bateria. Resolveram formar um grupo, The Renegades, e iniciaram um sério processo de composição e gravação de uma demo.

“Na época dos Renegades, tínhamos um ritmo duro de trabalho, tocando de madrugada, já que estudávamos e tínhamos que nos manter. Ensaiávamos de uma até às três da madrugada e quase não víamos ninguém. Estávamos apenas focado em nossas músicas.”

Em junho de 1983, conseguiram um contrato com o selo 415 Records e o grupo mudou o nome para Wire Train, palavra usada em uma das primeiras composições deles. Imediatamente correram para um estúdio chamado Automatt, em San Francisco e ali nasceu ... in a chamber.

capa do disco ... in a chamberO disco foi gravado em 17 dias e custou US$ 22 mil para ser feito. Mas o resultado foi compensador: contendo melodias etereais, guitarras faiscantes e todos os truques que os Beatles ensinaram às várias gerações que os sucederam.

“Chamber Of Hellos” é a grande canção do disco e tornou-se um pequeno hit na América. O disco chegou a figurar em algumas listas do ano e Bono o considerou seu disco favorito de 1984.

O disco deu uma grande credibilidade à banda e fez bonito nas college radios, onde foi tocado por vários meses. Com isso, a banda saiu em excursão pelos clubes de toda a América, chegando a abrir para o grupo Big Country, em sua turnê “The Crossing Tour”. Mas logo finalizaram os shows, Gil-Sola resolveu sair fora e foi substituído por Brian Macleod.

Apesar do sucesso, Kevin não acha que o grupo tinha alguma similaridade com os grupos californianos, como Long Ryders e Green On Red.

"Wire Train é totalmente diferente das bandas da Califórnia. Se o objetivo é criar boa música – com sensibilidade, inteligência e um pouco de diversão – a coisa que mais nós tínhamos em mente era o pop dos anos 60. O que fazemos (e as outras bandas californianas ignoram) é trabalhar o ponto em que você sente essa clima dos anos 60, mas não precisa ficar imerso em todo aquele rótulo da época”, explicou Kevin.

da esquerda para a direita: Kevin Hunter, Anders Rundblad, Brian MacLeod e Kurt HerrTendo o disco distribuído pela CBS (hoje Sony), o Wire Train começou a ficar mais famoso, embora Kevin Hunter dissesse que as músicas não fossem tão simples: “não somos músicos muito bons, mas ela não flui de uma maneira tão óbvia. Isso frustrou alguns, que pensavam em nós como um grupo descartável. Nós fazemos um som mais sutil, mais triste.”

Kevin descreve o seu método de composição como algo muito delicado, como se colocasse novas texturas em um sonho.

No ano seguinte, o grupo voou para Viena, por dois motivos: por ser a casa do produtor Peter Maunus, produtor do novo disco e pela similaridade emocional com San Francisco. Kevin lembra bem dessas gravações: “Viena é uma cidade muito quieta, com apenas um clube noturno e você não ouve um som nas ruas de noite. O único barulho audível lá era quando ensaiávamos. As pessoas podiam nos ouvir por vários quarteirões! Nós também tocamos em alguns lugares e as pessoas se mostraram educadas e quietas, mas quando já estávamos na metade de nossa apresentação, alguns começaram a ter uma atitude meio esquizofrênica, com as pessoas socando o ar com os punhos, berrando e pulando. Foi algo fantástico de se ver.”

capa do disco Between Two WordsAs sessões foram muito produtivas e escreveram 30 músicas, mas apenas 10 foram aproveitadas no disco Between Two Words, que foi lançado aqui em 1986, na tal série da CBS, mencionada logo no começo. Mas o disco (que saiu originalmente em 1985) marcou a saída de Kurt Herr, que queria seguir uma carreira solo.

O álbum contém uma cover para um clássico de Bob Dylan, "With God on Our Side", que no disco saiu com o título de "God on Our Side". Dylan foi uma das maiores influências de Kevin Hunter.

Com uma turnê já agendada, tiveram que contratar o guitarrista dos Replacements, Jeffrey Trott, que teve apenas duas semanas para aprender todo o repertório do grupo. Primeiro abriram para os australianos do INXS na Califórnia e depois seguiram por conta própria.

Durante a turnê o grupo começou a se chocar com a CBS. Tudo por causa de um vídeo para a canção “Last Perfect Thing”, que seria a música de trabalho. “A gravadora veio com uma idéia de chamar Steve Price, que havia feito uns vídeos para o Sisters Of Mercy, para gravar um filme para “Last Perfect Thing”. Eles estavam dispostos a gastar US$ 30 mil com isso e eu achei um absurdo. Por que gastar se não iríamos aparecer na MTV? Ninguém consegue ter um vídeo em alta rotação, a não ser que seja um artista como Phil Collins. Todos os 20 vídeos mais vistos são de bandas que já alcançaram a marca de discos de platina antes de chegarem à MTV. Você sabe o que esse dinheiro compra? No máximo cinco segundos de um vídeo do Phil Collins ou três em um de Michael Jackson. Uma banda hoje gasta quase o dobro só gravando uma demo. Eu não quero que fiquemos marcados por isso. Se não é para ser veiculado, não quero contrair uma dívida”, resumiu Kevin.

Em 1986, o Wire Train fez vários shows pela Europa, abrindo para os grupos The Alarm, Bangles e Waterboys. Jeffrey quase entrou para o grupo de Mike Scott, mas preferiu permanecer no Wire Train, para alívio de todos.

 

O grupo resolveu que era hora de escreverem novas canções para um novo disco, que seria gravado no segundo semestre de 1986. Em 1987 é lançado Ten Women, que contou com as participações do próprio waterboy Mike Sott e de Dave Sharpe (Alarm).

capa do disco Ten WomenO grupo voltou a excursionar pela Europa, abrindo para o The Alarm novamente e quando voltaram para San Francisco, sumiram do mapa. A causa era simples: o selo 415 Records havia sido vendido e quando a banda ligou para o escritório da companhia, foram surpreendidos com a notícia e conversando com pessoas estranhas. Eles resolveram mudar para uma grande gravadora e os novos donos da 451 disseram que precisariam fazer tudo de forma legal.

“Quando advogados são envolvidos tudo se complica e eles não têm nenhum interesse em resolverem rapidamente”, afirmou Anders Rundblad.

O resultado disso é que por dois anos ninguém ouviu falar deles, até que em 1990 voltaram com um álbum chamado apenas de Wire Train e por uma nova companhia, a MCA.

Os dois anos serviram para que os músicos se virassem como podiam. Jeff acabou tocando com Karl Wallinger no grupo World Party e participou do excepcional disco Goodbye Jumbo (comentado nesse espaço, dê uma caçada), enquanto Brian tocou com Madonna e Michael Jackson. Wire Train acabou sendo um disco totalmente estranho, com uma influência maior de Jeff e composições mais bucólicas, folks. E ninguém mais prestou atenção no grupo, apesar da MTV tocar algumas vezes o single “Should She Cry?”.

A solução foi cair na estrada e abrindo para um dos ídolos de Kevin: Bob Dylan. A banda começou a notar que Bob Dylan era um cara totalmente excêntrico. “Em alguns dias, com a temperatura passando dos 40 graus e Dylan subia com dois casacos e um chapéu de veludo. Ele é muito estranho”, diria Kevin.

capa do disco No Soul No StrainUm novo disco só sairia em 1992: No Soul No Strain, era um jogo de palavras com a foto da capa e com as palavras “Nose Hole, Nose Train”. E, apesar de terem agora um grande apoio da MCA, o disco foi um fracasso. O grupo abraçou o estilo “MOR” (More Oriented Rock), fazendo músicas mais comerciais, arriscando até um funk desavergonhado no single “Stone Me”. O grupo participou do Reading Festival, na Inglaterra, onde fizeram um bom show e foram elogiados pelo semanários ingleses.

Mas o final era eminente e o grupo resolveu se dissolver em 1993. A banda só voltou a ser notícia quando um pequeno selo americano chamado Oglio, resolveu lançar os dois primeiros discos da banda em único CD (a versão que possuo), com pouca informação.

capa do disco Last Perfect Thing - A RetrospectiveE, para não deixar de faturarem algum, a Columbia (que era o braço da CBS e agora da Sony) resolveu soltar a coletânea Last Perfect Thing - A Retrospective, com várias faixas raras, incluindo uma inédita, “I Will Wait For You”.

Após esses lançamentos, pouco ou nada é comentado sobre o grupo ou os integrantes. Há algumas boas informações no site Wire Train, que resume a vida de todos.

Deixo vocês com duas letras do primeiro disco: o clássico “Chamber Of Hellos” e de “Like”, minha favorita. Um abraço e até a próxima coluna.

Chamber of Hellos

Someone's masquerading in the galleries today
Beside the arch it is always following me
It seems
Confusion dance and echoes ringing loud
So clear
Vaging on these loops are filled with
Empty dreams

In a chamber of hellos
In a chamber of hellos
In a chamber of hellos
In a chamber of

Such familiar feelings
Come and go
Betraying
Such familiar prayers said to the way
And gone
Someone's masquerading in the galleries
Leave no one
Making all these moves when no one really
Hears hallo

In a chamber of hellos
In a chamber of hellos
In a chamber of hellos
In a chamber of

Hello hello hello
In a chamber of
In a chamber of

In a chamber of hellos
In a chamber of
Hello hello
Hello hello
Hello hello
Hello hello
Hello

Like

Like a walk down through the misty changes
And I run a run away
I never thought I'd change like this
In terms of I as I turn

Turn
Turn
Turn

Like I said you're standing by my side
By my side I could
Could not see
High up up
On the edge I'm standing in my dreams

Like I heard your friends call you away
Call you away from here
Outta place
I too run back to me
Run to me
To me back
Run around
Round
Round
Turn me around

Discografia

... in a chamber (1984)
Between Two Words (1985)
Ten Women (1987)
Wire Train (1990)
No Soul No Strain (1992)
... in a chamber / Between Two Words (relançamento 2 em 1, 1995)
Last Perfect Thing: A Restrospective (1996)




 

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