Meus leitores (já nem sei
quantos são, to me sentindo o "Sydney Sheldon"
do rock) vão se lembrar dessa banda, com certeza. E muito
mais do mega hit "Agora Eu Sei" em que teve a participação
de Paulo Ricardo quando o RPM era a "Xuxa do rock" (melhor
eu parar com essas comparações...) e quando estouraram
na cena. Quem leu (ou lia) a extinta BIZZ, se lembra dos pegas
do vocalista Guilherme Isnard com a crítica, quando eram
chamados de "bregas", "românticos exagerados"
entre outras "pérolas" culturais dos críticos.
Mas, apesar disso, o ZERØ sempre manteve sua postura desde
o início e tinha nas interpretações de Isnard
e no apuro visual, os grandes destaques. Aliás, Guilherme
explicou o motivo de tanta preocupação com a imagem
(não, não vou contar, terão que ler...) e
o que andou fazendo quando o grupo sumiu de cena, ou pelo menos,
da grande mídia. De quebra, o grupo tem um dos melhores
(senão o melhor) site de uma banda de rock tupiniquim.
Vamos ao papo então?
Essa foi uma entrevista
atípica. Atípica porque sempre que peço uma
entrevista por e-mail e mando as perguntas, muitos reclamam que
são muitas ou que escrever é algo cansativo. “Aí
não daria para ligar? Por telefone é mais rápido...”.
Bem, pode ser mais rápido, mas muitas vezes sai bem caro,
como quando liguei para Andy Gill, na Inglaterra.
Mas com o Guilherme não
teve isso não. Aliás, teve sim. Ele demorou para
mandar as respostas e até achei que a entrevista tinha
rodado. Mas o motivo pela demora foi surpreendente: Guilherme
não apenas respondeu pacientemente minhas 17 questões;
ele auto-biografou o ZERØ (essa é a grafia oficial),
de uma maneira tão extensa, completa e bem escrita que
nem vou fazer o meu famoso texto introdutório. Tudo que
você sempre quis saber (e eu também!) do grupo está
aqui. E você até pode conversar com a lenda. Saiba
isso e muito mais agora...
PS:
Eu que agradeço a entrevista, Guilherme. Se as perguntas
foram inteligentes, as respostas foram ainda mais e quase não
tive que “copydeskar” suas respostas. Uma coisinha
ali outra acolá, mas nada sério.
Boa leitura!
Pergunta: - Guilherme,
poderia, por favor, falar um pouco sobre a origem do Zero e as
principais influências? Roxy Music era mesmo a grande inspiração?
E de onde veio o nome?
Guilherme: - O ZERØ surgiu em 1983, assim que
eu saí dos Voluntários da Pátria. Um amigo
me apresentou a uma banda de punk-jazz instrumental chamada Ultimato.
Eu gostei do som e me propus a criar melodias para os temas e
escrever algumas letras. Todos gostaram do resultado e então
começamos a ensaiar esses temas e a compor novas canções,
até juntar material para uma apresentação.
Nesse meio tempo enviamos um demo-tape com cinco canções
(que foram recentemente lançadas pelo fã-clube em
versão para colecionadores) e acabamos sendo selecionados
para uma coletânea da Deck Discos, da qual dois artistas
foram selecionados para assinar um contrato com a CBS (atual Sony
Music). Assim surgiu o nosso primeiro compacto com “Heróis”
no lado A e “100% paixão”, no lado B. É
preciso lembrar que isso aconteceu 20 anos antes dessa moda de
100% isso ou aquilo...
Essa formação, embora só tenha gravado a
demo e um compacto, é a original. As influências
iam do psicodelismo inglês ao art-rock norte americano,
passando pelo som progressivo e a música experimental.
Posso citar como influências de King Crimson a Talking Heads,
e nesse meio-de-campo tem lugar ainda pra Gang of Four, Simple
Minds, David Bowie e Roxy Music, é claro, mas não
que eles tenha sido a maior influência. A midia é
que resolveu fazer essa relação mais pela estética
de elegância do que pelo som propriamente dito.
Sobre a origem do nome... é aquilo mesmo, uma lista múltipla
e profundo debate. ZERØ acabou vencendo por que tinha a
mesma grafia em diversas línguas e também por representar
um ponto de partida, sem esquecer a conotação niilista
que tinha tudo a ver com os temas existencialistas, que eram o
nosso principal assunto.
Pergunta:
- Vocês nasceram na década em que o rock brasileiro
foi mais relevante. Como era a cena comparada aos dias de hoje
e o espaço na mídia?
Guilherme: - Naqueles idos de 1982 quando eu comecei,
a realidade é semelhante a de hoje, com a agravante de
que ainda estávamos sob o julgo da ditadura militar. As
bandas tocavam umas para as outras, os artistas de rock do país
eram Rita Lee e Lulu Santos e o movimento underground era solenemente
ignorado pela indústria fonográfica.
Isso começou a mudar depois que o RPM, Titãs e Legião
Urbana gravaram seus primeiros discos. De repente, toda aquela
pressão de talento acumulado explodiu ao mesmo tempo e
foi aquilo que todos os que viveram lembram com saudade, um festival
de bandas de várias tendências, sotaques, estilos
e propostas. E foi assim que a musica jovem brasileira virou a
mesa dos enlatados internacionais, criando uma linguagem nacional
para o ritmo universal da juventude, discutindo com profundidade
as questões e dimensões de uma realidade totalmente
brasileira.
Hoje em dia eu vejo uma cena muito parecida, centenas de bandas
ignoradas por uma indústria que não faz outra coisa
a não ser se queixar da pirataria que ela mesmo estimula.
Ou será que ninguém percebe que um CD custa três
vezes o que deveria custar? Ou ainda, que a pirataria só
prejudica os autores e intérpretes, que não tem
a sua propriedade intelectual remunerada, e o estado e fisco que
não têm os seus impostos recolhidos. Mas mesmo assim,
a Sony, que é uma das maiores reclamonas - vive ameaçando
fechar as portas da sua divisão fonográfica –
espantosamente, é uma das maiores fabricantes e vendedoras
de CD mídia gravável e de gravadores de CD para
computador. Como isso se explica? Ou sou só eu que vejo
a situação por aí?
Só que, a exemplo do que aconteceu nos anos 80, essa panela
de pressão vai estourar novamente, e isso acontecer será
um deus nos acuda, porque o que tem de gente boa por aí,
do Oiapoque ao Chuí, não é mole, não.
A grande diferença é que hoje as condições
de trabalho são outras, bem melhores... Já se pode
compra instrumentos importados, já existem ótimos
instrumentos nacionais, a estrutura de shows e turnês evoluiu
demais... enfim, tudo melhorou, só a indústria fonográfica
e os seus “departamentos” de marketing terceirizados
(ou deveria dizer jabalizados), as rádios, é que
andam para trás, na contra-mão da história.
Pergunta:
- Eu sei que você já se cansou de responder, mas
como alguns dos meus leitores têm menos de 20 anos, gostaria
que você falasse um pouco sobre isso. É sobre a gravação
de "Agora Eu Sei", que teve a participação
de Paulo Ricardo, que estava no auge com o RPM. Eu me lembro de
você ficar extremamente irritado quando o acusaram, de maneira
injusta, de ter se aproveitado do sucesso do RPM ao convidá-lo
para dividir os vocais e obter sucesso. Qual é a verdadeira
versão? Quando vocês gravaram o RPM já era
aquele fenômeno todo?
Guilherme: - A irritação era por conta
da insinuação maldosa e historicamente equivocada,
pois o ZERØ é muito anterior ao RPM. O Paulo e o
Deluqui sempre estavam na primeira fila dos meus shows, desde
os Voluntários, e também freqüentavam os nossos
ensaios. Foi em um ensaio que o Paulo ouviu “Agora Eu Sei”
pela primeira vez e disse que era uma grande canção
e que gostaria de gravá-la comigo. Entre gravar e, finalmente,
lançar a canção, o RPM tornou-se o fenômeno
de mídia no Brasil. A prova de que não foi uma armação
é a seguinte: Naquela época, e ainda hoje, é
o costume abrir o CD com a música de “trabalho”,
aquela que a gravadora e o artista apostam e pretendem divulgar.
A faixa 1 do LP “Passos no Escuro” é “Cada
Fio um Sonho”, que era a música escolhida para a
divulgação. Só que, entre prensar e lançar
o LP, O RPM estourou de um jeito que, quando os radialistas descobriram
que o Paulo fazia backing vocals na faixa 2, “Agora Eu Sei”,
passaram por cima da nossa faixa de trabalho e saíram tocando-a.
No começo isso assustou a gente, porque a gente via o que
estava acontecendo com os caras e ficamos temerosos de que estaríamos
atrelados àquela trajetória meteórica. Só
relaxamos quando “Formosa” começou a tocar.
Pergunta: - Ouvindo
o primeiro compacto e as canções gravadas nos ensaios
que estão presentes no lançamento do selo Invisível,
duas coisas me chamaram a atenção: a falta de um
tecladista e a proximidade sonora com o Simple Minds. Existia
essa proximidade com o som feito pela banda escocesa? E quando
você optou por colocar um tecladista?
Guilherme: - Bom... Como eu contei acima, o ZERØ
teve uma formação “original” e uma “clássica”,
a original era uma banda de duas guitarras que estava muito mais
próxima da sonoridade do “Talking Heads” do
que do “Simple Minds”. Em comum, só o papo
cabeça... A segunda formação aconteceu por
acaso, e a gente nem imaginava que ela seria uma continuidade
do ZERØ. Essa formação organizou-se de um
jeito muito peculiar. Eu sempre encontrava o Eduardo Amarante,
que era meu vizinho em Sampa, e um guitarrista que eu admirava,
inclusive, pela importância histórica (ele era, ao
lado do primeiro guitarrista com quem eu toquei, o Miguel Barella
do “Voluntários da Pátria”, parte do
legendário “Agentss”, banda seminal do genial
Kodiak Bachine). O Edu sempre que me via, perguntava porque eu
não estava mais cantando, que eu era um grande cantor,
blá-blá-blá... E eu sempre dizendo que havia
tido duas más experiências e que não me imaginava
envolvido profissionalmente com música nunca mais. Um certo
dia, ele me disse que ia fazer um som na noite seguinte com dois
amigos que tinham acabado de sair de suas respectivas bandas,
“Degradée” e “Joe Eutanazia”–
ele mesmo tinha acabado de encerrar as atividades do “Azul
29” - e me convidou. Eu relutei, mas fui. Cheguei e não
conhecia ninguém, perguntei pelo Edu, que não estava,
e disse que tinha sido convidado por ele. Os caras estranharam,
mas disseram que ele devia estar chegando, me chamaram pra entrar.
Resultado: o cara me convidou pra uma jam-session que ele não
foi, e nós (O tecladista Freddy Haiat o baixista Ricky
Villas-Boas e eu) compusemos “Cada Fio um Sonho” no
primeiro encontro, “Agora eu Sei” no segundo e “Formosa”
no terceiro, quando ele finalmente apareceu e gravou de primeira
a inesquecível e marcante introdução de “Agora
Eu Sei”. Na seqüência, o grande visionário
Jorge Davidson, da EMI, me ligou pra saber o que eu andava fazendo.
Disse que estava me divertindo sem compromissos com uns amigos,
e ele me pediu pra mostrar o novo material. O resto é história.
Ou seja, novamente, nada planejado, mas tudo certo.
Pergunta:
- Você sempre gostou de dizer que é um romântico
incurável. Esse romantismo ainda persiste? E qual é
o principal combustível de seu romantismo? Ser romântico
é necessário ser brega como pregam?
Guilherme: - Olha só, o novo show do ZERØ
tem o seguinte nome: “O Quinto Elemento”, tá
respondido? Eu sou mesmo romântico, desde de o tempo em
que ainda não era moda. Nos anos 80, era malvisto ser romântico,
mas eu nunca me importei, o nosso empresário da época,
o jornalista Eduardo Logullo, dizia que o ZERØ fazia música
pra quem sabia beijar e era isso mesmo. Afinal, o amor ou a falta
dele, está no fundo de todas as questões importantes
do ser humano.
O combustível do meu romantismo é o amor em si,
e os seus desdobramentos. Brega o romantismo? Eu acho brega o
desamor, a violência, a panfletagem raivosa, o protesto
retórico e as canções vazias.
Pergunta: - Quais
eram as bandas que eram amigas de Guilherme e do Zero? Qual foi
o grande show conjunto que você realizou ou a performance
mais inesquecível do grupo?
Guilherme: - Em São Paulo a gente dividia o estúdio
de ensaio com o Metrô, e o RPM era uma banda bem chegada.
No Rio tinha o Hojerizah, Os Rapazes de Vida Fácil –
primeira banda do Alvin L que escreve as canções
do Capital Inicial - e os Picassos Falsos. Eu também era
muito amigo da galera de Brasília. Pouca gente sabe, mas
o ZERØ estreou lá, em 1983, no teatro do Colégio
Escola Parque num show com a Plebe, a Legião e o Capital.
No começo todas as bandas de lá ficavam hospedadas
na minha casa quando vinham a São Paulo. O Dinho era como
um irmão, assim como o saudoso Renato Russo. O ZERØ
fez muitos concertos memoráveis: No Teatro do MASP (São
Paulo), no Noites Cariocas do Morro da Urca (Rio de Janeiro),
no Mineirinho (Belo Horizonte), entre tantos outros. Mas, muito
provavelmente, os nossos maiores espetáculos foram os shows
de abertura da turnê da Tina Turner, quando tocamos duas
noites no estádio do Pacaembu lotado e uma noite no Maracanã,
pra aproximadamente 200.000 pessoas.
Pergunta: - Passos
no Escuro vendeu quase 200 mil cópias. Deu para fazer um
pé-de-meia para o futuro?
Guilherme: - Nem. Deu pra curtir muito, é verdade.
Cruzeiro de veleiro pelas Ilhas Virgens Britânicas e alguns
brinquedinhos tecnológicos, mas nada demais. Naquela época
não se ganhava dinheiro, o divertimento era muito, mas
a grana era curta. As necessidades da nossa geração
criaram toda uma infra-estrutura de shows e turnês que simplesmente
não existiam, no início era tudo muito mambembe.
E também, o ZERØ não vendeu os 3 milhões
de cópias do RPM.
Pergunta:
- Você continua sendo um cantor 100% de seu tempo ou hoje
trabalha em alguma outra coisa?
Guilherme: - Não sei se você sabe,
mas eu fiquei 5 anos longe dos palcos, de 1992 até 97.
Durante esse tempo fiz mil coisas diferentes tentando levar uma
vida normal, mas só encontrei mil maneiras de ser infeliz.
No final de 96, após quase 5 anos de silêncio, fiz
um show para homenagear um grande e esquecido sambista, o Luiz
Antônio, que veio a falecer um mês depois. Aí
não consegui mais parar, montei uma banda pra divulgar
um trabalho solo e, quando comecei a aparecer novamente, o público
exigiu a volta do ZERØ. Como era aniversário de
15 anos da banda, contatei a galera da formação
clássica e o Fabio Golfetti, da formação
original para dois shows comemorativos, no BallRoom, no Rio e
no Blen-Blen, em São Paulo. Depois disso não deixaram
mais a gente parar. O ZERØ hoje faz entre 3 e 5 shows por
mês, o que não é nada de extraordinário,
mas que na atual conjuntura econômica-cultural, é
significativo. Não dá pra viver igual nababo, mas
dá pra ir levando, apostando que dias melhores virão.
Fora isso, as pessoas começaram a nos regravar, a banda
carioca FullGás e a cantora Nila Branco, por exemplo. Ou
seja, Guilherme Isnard é 100% cantor e compositor, se é
que você me entende.
Pergunta:
- Uma das marcas fortes do Zero era o cuidado com o vestuário,
o que fazia de vocês, a banda mais elegante do rock brasileiro.
O visual era pensando, planejado por quem?
Guilherme: - Ué, essa é fácil,
por mim é claro, antes do ZERØ eu trabalhava como
designer de moda, você não sabia? (eu tinha me
esquecido disso, Guilherme...)
Eu mudei pra Sampa pra desenhar a roupa da Zoomp, e quando o ZERØ
foi convidado pra gravar o “Passos no Escuro”, eu
criava as coleções da Ellus. Ou seja, era natural
que eu tivesse uma preocupação com o figurino, até
mesmo porque eu pensei em fazer uma banda por causa da moda. Não
me entenda mal, mas é que eu viajava muito pro exterior
pra acompanhar as coleções e os últimos lançamentos
e aproveitava a oportunidade pra assistir a todos os shows que
eu pudesse e fiquei com vontade de montar uma banda no Brasil.
Pergunta: - Se
fosse rotular a banda em um estilo musical, qual o Zero se encaixaria?
Rock, new wave, new romantics? Aliás, alguma vez esses
rótulos te incomodaram?
Guilherme: - O ZERØ é rock, com toda certeza,
agora, qual o tipo de rock, nem eu e talvez ninguém saiba.
Eu nunca me importei com isso, já chamaram a gente de progressivo
e de neo-gótico. Você pode imaginar duas coisas mais
distantes?
Mas a primeira formação, até por conta da
nossa profissão (éramos 5 arquitetos e 1 designer),
tinha influência do Art-Rock norte americano do começo
dos 80. Já na formação clássica, a
predominância era mesmo do rock progressivo inglês
do final dos anos 70.
Pergunta: - Imagine
que pudesse voltar ao passado. O que gostaria de repetir e o que
gostaria de apagar de sua memória?
Guilherme: - Hum... essa é difícil...
Deixa eu ver...
Repetir, eu acho que queria repetir tudo, menos as burradas é
claro! E apagaria algumas pessoas em quem eu confiei e não
devia, um moleque recalcado chamado Alex Antunes e uma tal de
Juliana Zambelo que é uma traíra ignorante, pra
citar só dois, mas pode crer que são vários.
Pergunta:
- Voltando à questão da atual cena rock no Brasil.
Hoje ela está praticamente morta. Os espaços são
escassos, a divulgação é quase nula. Fazer
música, e rock especificamente, no Brasil é quase
um ato de rebeldia por todas as dificuldades. Em sua opinião
porque houve essa regressão e qual é sua inspiração
em continuar?
Guilherme: - Em primeiro lugar, fazer rock é
um ato de rebeldia sempre! Mas a regressão foi por obra
da indústria fonográfica, como eu contei lá
em cima. Eles ignoravam o movimento rock até a coisa explodir,
quando explodiu, trataram de ganhar rios de dinheiro, só
tinha um probleminha: gravar e lançar artistas nacionais
custa dinheiro, e não é pouco. Tem os custos de
estúdio, capa, figurinos, fotos, videoclip, assessoria
de imprensa, kits promocionais, “jabá” pra
rádio, TV, etc... Então o “produto”
artista nacional, é caro, tem um custo inicial, o tal de
“break even” de 30.000 cópias em média
– isso na época em que eu fazia parte dessa indústria,
mas não deve ter mudado muito não – enquanto
o “produto” artista internacional, já vem pronto,
sem custos além dos de industrialização.
Já vem com o master, a capa, o clip, a repercussão
da mídia internacional, ou seja, é só prensar
e vender, então o “break even” (o número
de cópias vendidas, que são necessárias para
cobrir o custo do produto) e conseqüentemente o risco, é
muito menor, qualquer 3000 cópias paga o lançamento
gringo.
Diante desse fato, é fácil supor que depois de uma
farra inicial, as multinacionais começaram a ficar preocupadas
com aquele movimento que tomou de assalto a preferência
do público e a mídia. É preciso lembrar que
a nossa geração conseguiu inverter os percentuais
históricos de execução radiofônica
que sempre estiveram em 70 a 80% de música estrangeira,
para 70 a 80% de música nacional, e o melhor... de puro
roquenrou!!!!
O resultado dessa “tomada de consciência” da
indústria foi de que as rádios FM pararam de tocar
as bandas e inventaram o tal de brega romântico, que o Paulo
Ricardo veio a redescobrir no final dos anos 90. Depois do brega,
veio a onda sertaneja, a onda da lambada, a onda do pagode, a
onda do axé, e por aí vai...
Eu continuo justamente porque ainda tenho inspiração,
e porque como todo mundo sabe o mundo é redondo, e assim
também é a vida e os ciclos se repetem, mas além
disso, nesse momento em que as bandas e os novos talentos pululam,
algo de muito importante está para acontecer.
Pergunta:
- Gostaria que falasse sobre esse lançamento da Invisível.
Qual a relação com Fabio Golfetti, quase 20 anos
após as gravações?
Guilherme: - O Fábio sempre foi um lorde,
somos amigos até hoje, eu sou fã do estilo siririca’s
“glissando” guitar que ele inventou (e odeia que eu
tenha batizado assim, ah ah...). Na verdade ele é o único
“ZERØ original” com quem ainda me relaciono.
Nós fizemos um show antológico para 3500 pessoas,
com três gerações (A banda nova, mais o Ricky
Villas e ele) de ZERØs no palco, numa rave gótica
no pico do Jaraguá em Sampa, dois anos atrás.
O
CD Dias Melhores é resultado da batalha
dele e do Renato Donisete, presidente do nosso fã-clube,
para lançar o material da formação clássica
que estava inédito em CD. Reeditaram as duas musicas do
nosso compacto, mais o nosso primeiro demotape de estúdio,
gravado em 83 e de bônus, algumas gravações
de ensaios. A qualidade deixa um pouco a desejar, mas para os
fãs foi um lançamento inestimável.
Pergunta: - Bryan
Ferry continua sendo o cara mais "cool" do mundo em
sua opinião? O que achou do último disco dele, Frantic?
Guilherme: - Nem ouvi. Isso responde a sua pergunta?
Eu gosto das coisas antigas e, principalmente, do Roxy Music,
na época do Brian Eno.
Pergunta: - O Zero
possui um dos sites mais bonitos e elaborados das bandas brasileiras.
Quem o desenhou e com quais recursos ele é mantido?
Guilherme: - O site
do ZERØ, é o presente amoroso de um cara que era
fã passou a ser amigo, o Stefan Santana, que mora em Washington
DC, USA. De lá mantém atualizado esse trabalho incrível.
O site que esse nosso talentoso amigo e benfeitor construiu com
a ajuda do Renato e de outros, é (e não porque é
nosso) sem modéstia, e com certeza, o site de banda mais
bonito (e como beleza não é tudo) e rico de conteúdo
que eu já vi. O que você precisar ou quiser saber
da gente está lá, de agenda de shows a vídeos
da época do Cassino de Chacrinha. E isso tudo é
mantido com os mesmos recursos que a banda. O amor que nós
conseguimos inspirar desinteressados aos outros e que retorna
maravilhosa e inesperadamente das formas mais espetaculares. Um
grande milagre de Deus na verdade.
Ps: Se alguém
se interessar em patrocinar ou apoiar, será bem-vindo.
A média é de 1000 acessos por mês, já
estamos em 15.000 visitantes desde que o Stefan colocou no ar,
em Janeiro de 2003.
Pergunta:
- Existe alguma chance do grupo voltar a gravar por uma grande
gravadora? Como esse é seu projeto paralelo cantando samba?
Noel Rosa e Bryan Ferry convivem pacificamente? Aliás,
essa parceria daria casamento?
Guilherme: - Enquanto toda a galera da minha
juventude curtia os baianos e a tropicália, eu era apaixonado
pelos sons que chegavam das Minas Gerais. O Clube da Esquina
foi meu único e adorado LP de MPB durante anos, e Minas
soube me retribuir esse amor. Mas nós vivemos em tempos
onde até pra um gênio como Milton Nascimento, está
difícil gravar por uma grande gravadora. Aliás,
pensando bem, eu acho que nem existe, nem cabe mais esse negócio
de grande gravadora.
Flexibilizar é a palavra de ordem. Viva os regionalismos!
Os sotaques! Os pequenos mercados! Os artistas de grande talento
e pequeno público! Viva os selos! A internet! Viva as alternativas
e os alternativos! É deles o reino dos céus.
Os meus sambas ainda darão o que falar, pode confiar, só
que estão mais pra Cartola que pra Noel. Com Bryan Ferry?
Deve combinar sim, ele curte, sempre fala de dançar um
samba em suas canções, só eu é que
estou em outra. Meu cantor predileto desde 99 é o Lian
MacKahey da banda londrina Cousteau que parece que agora chama
Moreau.
Pergunta:
- Deixe uma mensagem para seus fãs e fale dos projetos
futuros e como o público pode conversar contigo.
Guilherme: - Putz! Me adiantei e já mandei
“aquele” recado na resposta anterior... Mas dá
pra acrescentar ainda o famoso, mas verdadeiro, clichê de
que todo sonho vale a pena. Eu tentei me desviar do meu e não
fui feliz, então, o que eu posso aconselhar é o
seguinte: Se agarre ao seu, com fé e esperança,
porque o que você leva dessa vida é, ironicamente,
o que você der pra ela. E ela não pede muito, só
que você se comprometa com a sua verdade.
No meu futuro, com certeza, tem muita música. Com o ZERØ
estamos começando a gravar o novo repertório que
é fueda de bueno! Sem o ZERØ eu já compus
mais de 30 sambas que espero um dia gravar. Tenho também
o meu romance pra escrever, o primeiro deles... Me aguardem.
Pra conversar com a gente
é só ir lá no site e clicar em contato, eu
é que leio e respondo tudo.
Discografia
Heróis/ 100% Paixão
(compacto, 1985)
Passos no Escuro (1985)
Carne Humana (1987)
Electro Acústico (2001)
Obra Completa (Reunião dois dois primeiros LPs, 2003)
|