293 - Talking Heads - Remain In Light

Poucas bandas merecem a fama de terem feito música para o cérebro. Com certeza, o Talking Heads é um delas. E nenhuma foi mais cerebral do que o quarto disco do grupo, Remain In Light e com Brian Eno sendo praticamente um quinto membro, exercendo uma influência imensa sobre David Byrne e ocasionando uma tensão insuportável com os demais membros. Mas foi desta tensão que nasceu um dos discos mais importantes e inovadores dos anos 80.


Brian Eno e David ByrneBrian Eno havia entrado na vida do grupo em 1978, quando produziu o segundo álbum, More Songs About Building and Food.

No terceiro, Fear of Music, começou a mudar a cara do grupo, levando-os a explorar ritmos africanos e a trabalhar com músicos diversos, como o guitarrista Robert Fripp, líder do King Crimson.

Mas, em 1980, sua influência extrapolava qualquer limite.

Sob sua batuta, o grupo mergulhou nos ritmos africanos cada vez mais, especialmente os do nigeriano Fela Kuti. Eno armou uma senhora banda em volta dos Talking Heads: Adrian Belew (guitarra), Jose Rossy e Robert Palmer (percussão), Nona Hendryx (voz) e Jon Hassell (trumpete). Além disso, meteu a mão em duas letras de Byrne - "Crosseyed and Painless" e "Born Under Punches (The Heat Goes On)".

O grupo dividiu as gravações entre os estúdios Compass Point Studios, em Nassau, Bahamas e o Sigma, em Nova York.

Quem mais se sentia incomodado era o casal Tina Weymouth e Chris Frantz. Como membros-fundadores, os dois reclamavam da influência de Eno.

O que era uma ajuda considerável em termos técnicos, no início, havia virado uma doença, segundo eles.

"Muitas vezes achava que Brian não se incomoda com o que a banda queria. Na verdade, ele realmente não se incomodava. Nós éramos apenas instrumentos para suas idéias. O problema é que ele conseguiu se aproximar de David fortemente e os dois tentavam nos manipular. Não foi nada fácil conviver com essa situação", confessou a baixista, anos depois.

capa do disco My Life in the Bush of GhostsTina não estava distante da realidade, tanto que em 1981, Brian Eno e David Byrne lançaram um LP intitulado My Life in the Bush of Ghosts, onde exploravam a paixão por ritmos africanos e asiáticos, através de colagens.

Para muitos, é o primeiro lançamento do ainda inédito estilo "word music".

O disco tinha as seguintes faixas:

Lado A

01. "America Is Waiting" (arr. Eno, Byrne, Bill Laswell, Tim Wright, David Van Tieghem) – 3:36
Unidentified indignant radio host (Ray Taliaferro of KGO NEWSTALK AM 810), San Francisco, April 1980.
02. "Mea Culpa" – 3:35
Inflamed caller and smooth politician replying, both unidentified. Radio call-in show, New York, July 1979.
03. "Regiment" (Eno, Byrne, Michael "Busta Cherry" Jones / arranged by Eno, Byrne, Jones, Chris Frantz and Robert Fripp) – 3:56
Dunya Yunis,[22] Lebanese mountain singer, from The Human Voice in the World of Islam (Tangent Records TGS131)
04. "Help Me Somebody" – 4:18
Reverend Paul Morton, broadcast sermon, New Orleans, June 1980.
05. "The Jezebel Spirit" – 4:55
Unidentified exorcist, New York, September 1980.

Lado B

01. "Qu'ran" – 3:46
Algerian Muslims chanting the Qur'an. (same source as track 3)
02. "Moonlight in Glory" – 4:19
The Moving Star Hall Singers, Sea Islands, Georgia. (From The Moving Star Hall Singers, Folkways FS 3841). Produced by Guy Carawan.
03. "The Carrier" – 3:30
Dunya Yunis. (same source as track 3)
04. "A Secret Life" – 2:30
Samira Tewfik, Lebanese popular singer. (from Les Plus Grandes Artistes du Monde Arabe, EMI)
05. "Come with Us" – 2:38
Unidentified radio evangelist, San Francisco, April 1980
06. "Mountain of Needles" – 2:35

capa do disco Remain In LightMas antes do disco entre os dois, Eno se trancou por meses com a banda para fazer o mais ambicioso trabalho do grupo.

Misturando funk com minimalismo, Byrne explicava que a banda queria adentrar no mundo do ritmo, fugindo do lugar-comum das canções pops tradicionais.

Isso significava dizer trabalhar os arranjos em pequenas partes, com grande ênfase na mixagem e nas texturas. Além disso, David contribuía com letras cada vez mais densas, dando brechas a inúmeras interpretações.

Lançado em 8 de outubro de 1980, Remain In Light, ganhou efusivos elogios da crítica, apesar das vendas modestas.

O disco trazia oito faixas, assim divididas:

Lado 1

1. "Born Under Punches (The Heat Goes On)" – 5:46
2. "Crosseyed and Painless" – 4:45
3. "The Great Curve" – 6:26

Lado 2

1. "Once in a Lifetime" – 4:19
2. "Houses in Motion" – 4:30
3. "Seen and Not Seen" – 3:20
4. "Listening Wind" – 4:42
5. "The Overload" – 6:00

capa do compacto Once In a LifetimeO disco chegou ao 19º lugar na Billboard e ao 21º no Reino Unido.

Apenas uma faixa, "Once In a Lifetime", foi lançada como compacto e pouco sucesso fez. O vídeo trazia David Byrne dançando como se fosse uma marionete.

A coreografia foi desenvolvida pela cantora Toni Basil e ficou famosa por refletir alguns dos maneirismos de Byrne no palco, como seus espasmos musculares e movimentos nervosos, além de usar uma engraçadíssimo óculos.

Esse também seria um importante ponto de partida para David desenvolver o seu lado visual, que chegaria ao ápice no filme True Stories.

Remain In Light mostra o grupo no auge de suas potencialidades em termos de idéias e conceitos. A música era pesada, claustrofóbica e a última faixa do disco, "The Overload", parecia emular o Joy Division, apesar de nenhum dele jamais ter ouvido o quarteto britânico já extinto com a morte do vocalista Ian Curtis.

A complexidade dos arranjos e a liberdade necessária para que David Byrne pudesse se expressar corretamente, sem ficar preso à guitarra, obrigou o grupo a se apoiar em excepcionais músicos (bem melhores do que a própria banda), durante a excursão promocional entre os anos de 1980 e de 1981.

Boa parte desse show está capturado no disco duplo The Name of This Band is Talking Heads, lançado em 1982. Vale dizer que muitos desses músicos das idéias estariam presentes e mais aperfeiçoadas, anos depois, no documentário e disco Stop Making Sense, de 1984.

Tina Weymouth e Adrian BelewA banda que se apresentava era formada por: David Byrne (vocais e guitarra); Chris Frantz (bateria e percussão); Jerry Harrison (teclados, guitarra e voz), Tina Weymouth (baixo, guitarra, percussão, sintetizador e voz); Adrian Belew (guitarra-líder e backing vocals); Nona Hendryx (vocais), Busta Jones (baixo e guitarra); Dolette McDonald (vocais e percussão), Steve Congas (congas e percussão) e Bernie Worrell (teclados e voz).

A longa e estafante turnê e o "fantasma" de Brian Eno causaram uma ruptura entre David e os demais membros do grupo e por essa razão o grupo demorou três anos para lançar um novo disco de estúdio.

Mas esse assunto já foi dissecado na coluna que fala sobre o disco Stop Making Sense.

Deixo vocês com a discografia do grupo. Um abraço e até a próxima coluna.

Discografia

Talking Heads: 77 (1977)
More Songs About Building And Food (1978)
Fear of Music (1979)
Remain In Light (1980)
The Name of This Band is Talking Heads (1982)
Speaking In Tongues (1983)
Stop Making Sense (1984, versão quase na íntegra, 1999)
Little Creatures (1985)
True Stories (1986)
Naked (1988)
The Best Of: Once In a Lifetime (1991)
Popular Favorites: Sand in the Vaseline (1991)
Once in a Lifetime - The Best of Talking Heads (1992)
12 x 12 Original Remixes (1999)
Once In a Lifetime (Box com 3 Cds, 2003)
The Best of Talking Heads (2004)
Talking Heads Dual Disc Brick (caixa com 8 cds, 2005)
Bonus Rarities and Outtakes (2006)
Talking Heads: The Collection (2007)

 


 

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