156 - The Velvet Underground


Muito tempo atrás - coluna 47, para ser mais exato - falei do primeiro disco do Velvet. Agora, ouvindo novamente os antigos clássicos do grupo e relendo a biografia pela enésima vez, resolvi acabar de contar a história de um dos grupos mais importantes - para muitos, o mais importante depois dos Beatles. Aqui falarei desde White Light/White Heat, até o estranhíssimo Squeeze, quando nenhum membro original constava no grupo e a bateria ficou a cargo de um certo Ian Paice, do Deep Purple... Estranho isso? Mais estranhos eram os sons de Lou e companhia em pleno anos 60...


1 - Um Beatle para o Velvet

Lou Reed e Andy WarholA saída de Andy Warhol foi muito traumática, embora previsível. Como ele não sabia lidar com o meio musical e gostava muito mais de fazer seus filmes, Andy foi deixando o Velvet Underground se virar sozinho. Mas o que Andy não esperava era um ato de ingratidão de Lou Reed e que marcou a amizade entre os dois.

Lou havia conhecido um empresário chamado Steve Sesnick, que realmente gostou do Velvet e queria ser o empresário. Sesnick era um homem com muito mais conhecimento no meio musical e logo foi se aproximando de Lou e ganhando a confiança do líder da banda. Sesnick acreditava que poderia fazer o grupo ser tão grande quanto os Beatles e, para isso contava com um futuro aliado: o próprio empresário dos garotos de Liverpool, Brian Epstein.

Steve conhecia o advogado de Epstein em Nova York, Nat Weiss, e através dele fez contato. Sesnick tinha inclusive dado uma cópia do primeiro disco para Brian. Dias depois, o próprio Steve conseguiu que Brian conhecesse Lou Reed e afirmasse que tinha gostado muito do álbum. Lou agradeceu, mas não ficou tão esperançoso. Infelizmente para Steve, logo depois Brian Epstein faleceu e a ajuda foi pelo ralo.

Independente disso, Lou gostou da agilidade e da visão do novo empresário e por isso resolveu conversar com Andy Warhol. Andy já estava magoado com algumas atitudes hostis de Lou com Nico. Mas nada se comparou quando ele chegou e formalmente demitiu Warhol da função de empresário. O que Lou não esperava e temeu foi a reação de seu mentor: "ele simplesmente ficou furioso e me chamou de rato, a pior ofensa que poderia dirigir a alguém. Eu sabia que seria horrível seguir sem ele, mas precisava deixar o ninho. Só não esperava que ficasse tão furioso, pois ele mesmo incentivava as pessoas a procurarem seu caminho."

Andy realmente fazia isso, mas não esperava tamanha ingratidão, principalmente porque tinha investido uma grande soma de dinheiro. Mas Andy o liberou sem problemas, desde que recebesse o acordado em contrato - 25% de tudo que o Velvet recebesse sob sua batuta. Após isso, Warhol esfriou sua amizade com o cantor até o fim de sua vida, evitando ao máximo o contato com Lou. Mas ele manteve sua postura indiferente e quando era perguntado sobre o Velvet, apenas dizia: "oh, eu gostava tanto deles e decidiram procurar outro empresário. Mas não tem problema."

Os problemas é que começavam a perseguir o Velvet, principalmente John Cale...

2 - White Light/White Heat

Sterling, Maureen, Lou e JohnSem Andy e sem Nico, o Velvet se trancou em estúdio no segundo semestre de 1967 para trabalhar em um novo disco. E durante as gravações começaram a pipocar as tensões entre Lou e John. Grande parte da culpa cabe a Steve, que viu em Reed um grande músico e letrista e começou a encher a cabeça dele afirmando que ele era o astro da banda e inflando o já inflado ego do cantor.

Para piorar, Steve começou a querer colocar os demais Velvets em um segundo plano. "Steve começou a construir um abismo entre eu e Lou. Ele chegava e dizia que eu era apenas o parceiro dele, mais nada. Eu dizia que as coisas não funcionavam assim dentro do Velvet", explicava John.

E Lou realmente começou a brigar com John nos arranjos e as discussões ficavam cada vez mais ríspidas. Sesnick passou a ser odiado não apenas pelos membros do grupo, como por todos os amigos da banda e até por Andy, que sabia de tudo o que acontecia e comentava: "oh, eles escolheram um monstro para o meu lugar!"

capa do disco Chelsea GirlEnquanto a rixa interna crescia, John tinha uma outra missão: produzir o primeiro disco-solo de Nico, Chelsea Girl. O trabalho contou com três canções escritas por Lou Reed, que desejava continuar colaborando com Nico dentro de seus termos, mantendo uma boa distância. Um dos maiores colaboradores do disco foi um jovem de 17 anos e que escreveu boa parte das letras, Jackson Browne. E Jackson lembra bem de Lou durante as gravações: "ele ficava quieto no seu canto e falava apenas por monossílabos, da mesma maneira que Andy havia feito no primeiro disco deles. Mas Lou, apesar de sua aparência dura e distante era um cara muito gentil e foi extremamente atencioso comigo."

Quando o disco saiu em outubro, houve um certo desapontamento de todos, já que alguns arranjos haviam sido mudados. Lou quase chorou ao ver que alguns arranjos de Cale haviam sido mudados e disse que gostaria de ter tido mais autonomia no projeto.

capa do disco White Light/White HeatEnquanto lamentavam o resultado de Chelsea Girl, Lou e John já haviam concluído o segundo disco do Velvet, White Light/White Heat.

O novo trabalho trazia apenas seis músicas e é uma grande amostra do talento de John Cale. Cale é responsável por dois grandes momentos do disco: a canção falada "The Gift", em que ele funciona como o narrador, deixando bem evidente o seu pesado sotaque galês; e a radical e estranha "Sister Ray". "Sister Ray" é uma peça de mais de 17 minutos que conta a história de marinheiros que são levados por drag queens às suas casas, mortos e que começam uma orgia quando são presos pela polícia. A canção introduz vários ruídos eletrônicos, não utiliza baixo e era tocada em um total clima de caos.

Mas a maior canção do disco é mesmo a faixa-título. E a idéia dela vem de uma experiência definitiva para Lou: aos 17 anos, ele foi internado em um hospital psiquiátrico e obrigado a tomar três choques elétricos durante oito semanas para "curar" seu "homossexualismo", por incrível que pareça. A "luz branca" e o "calor branco" das letras são exatamente o que ele sentiu e viu na primeira vez que sofreu tamanha tortura.

Veja a letra da canção...

White Light/White Heat

(White light)
White light going messin' up my mind
(White light)
and don't you know it's gonna make me go blind
(White heat)
Oh, white heat, it tickle me down to my toes
(White light)
Lord have mercy, white light have it goodness knows

(White light)
White light going messin' up my brain
(White light)
oh, white light it's gonna drive me insane
(White heat)
Oh, white heat, it tickle me down to my toes
(White light)
oh, white light, I said now, goodness knows
do it

(Ooohhh-ooohhh, white light)
Oh, I surely do love to watch that stuff drip itself in
(Ooohhh-ooohhh, white light)
Watch that side, watch that side
don't you know gonna be dead and dried
(Ooohhh-ooohhh, white heat)
Yeah foxy mama, watching me walking down the street
(Ooohhh-ooohhh, white light)
Come upside your head
gonna make you dead hang on your street

(White light)
White light movin' me between my brain
(White light)
white light gonna make you go insane
(White heat)
Oh, white heat, it tickle me down to my toes
(White light)
oh, white light, I said now, goodness knows

(White light)
Oh, white light, it lightens up my eyes
(White light)
don't you know it fills me up with surprise
(White heat)
Oh, white heat, tickle me down to my toes
(White light)
oh, white light, I'll tell you now, goodness knows
now work it

(Ooohhh-ooohhh, white light)
Oh, she surely do move speed
(Ooohhh-ooohhh, white light)
Watch that speed freak, watch that speed freak
yeah, we're gonna go and make it every week
(Ooohhh-ooohhh, white heat)
Oh, sputter mutter
everybody's gonna go and kill their mother
(Ooohhh-ooohhh, white light)
Here she comes, here she comes
everybody get it gonna make me run
do it

Higher

3 - A demissão de John Cale

John CaleO disco acabou sendo lançado apenas no dia 30 de janeiro de 1968 e não teve boa acolhida. Além disso, Lou usou, pela primeira vez, um expediente que se tornaria comum em sua carreira: alterar o som na mixagem. Estava claro que Cale exercia uma importância imensa dentro da concepção sonora e que o Velvet era muito mais do que um simples grupo de acompanhamento como queria Sesnick e como, no fundo, desejava Lou, sempre temeroso e invejoso em relação ao talento de seus colaboradores.

O maior exemplo está na faixa "I Heard Her Call My Name", quando mixou bem alto a sua parte na canção, especialmente o solo de guitarra, soterrando os demais membros na canção. Maureen disse que quando ouviram a faixa, não acreditaram no que Lou havia feito: "ele simplesmente se dirigiu até o estúdio sem nos avisar e soterrou a canção com todo aquele ruído. Você podia apenas ouvir a parte dele e acabou com tudo."

Lou usaria muito esse expediente, especialmente em carreira-solo, quando contava com o excelente guitarrista Robert Quine em sua banda. Em um dos discos, ele simplesmente abaixou todo o som das guitarras de Quine e mandou a fita para o guitarrista ouvir. Furioso, Quine simplesmente estraçalhou a fita com uma marreta e viajou até passar a raiva.

Mas mesmo tendo uma baixa vendagem, o grupo começou a ver mais dinheiro do que quando estavam com Andy, já que Sesnick conseguiu marcar mais apresentações para o grupo e tiveram ainda mais, quando Sesnick convenceu a MGM a dar o dinheiro que gastariam com promoção para usarem em uma excursão. A banda viajava sempre de primeira-classe, ficava em hóteis caros e não se preocupavam com as contas. Mas quem estava cada vez mais preocupado era Cale, que a cada dia lutava contra Lou e Steve. Cale queria manter a postura de banda de vanguarda, enquanto os dois preferiam ser um grupo de rock. A situação chegou ao ponto de Cale e Sesnick se pegarem a tapa e pelo pescoço após um porre de ambos.

John e Betsey no dia do casamentoO ciúme de Lou aumentou ainda mais quando John Cale anunciou que ia se casar com sua namorada, Betsey Johnson. Lou ficou furioso, porque para ele, Cale só poderia estar casado com apenas uma coisa: o grupo. "Lou ficou furioso, porque agora havia uma mulher no meio do relacionamento entre eles. Mas naqueles dias, John ficava irritado com as constantes brigas entre eles."

O casamento, inicialmente marcado para fevereiro, só aconteceu em abril, pois John contraiu hepatite. Lou apareceu à cerimônia, mas o relacionamento cada vez mais se deteriorava.

Após o casamento, o grupo saiu em excursão e Lou resolveu que era hora de expulsar o antigo parceiro do Velvet. Os dois já não conseguiam mais se entender musicalmente. Lou queria ser um astro do rock e Joh, um artista de vanguarda. Com isso, Lou marcou uma reunião em setembro e chamou apenas Maureen e Sterling, e avisou que John estava fora do grupo: "fora por hoje ou pela semana toda", perguntou Sterling. "Para sempre", retrucou o cantor. E para piorar ainda mais a situação, pediu que Morrison desse a notícia para Cale, que não suspeitava de nada.

Quando Cale soube, ficou furioso: "nós íamos viajar para Cleveland para fazermos um show, quando Sterling veio até a minha casa e deu a notícia. Isso é bem típico de Lou; mandar alguém fazer o serviço sujo." Porém, John afirmou que não fora expulso da banda e que havia saído. Para Betsey, era evidente que isso iria acontecer: "os dois caminhavam em lados opostos, e como Lou era o líder e principal compositor do grupo, era natural que John fosse excluído."

4 - Uma banda convencional

Doug, Sterling, Mo e LouSem Cale, Sesnick acabou chamando o desconhecido Doug Yule para seu lugar. Doug tocava numa banda de Boston chamada Glass Menagerie e já conhecia o Velvet, quando a banda tocou no Boston Tea Party. Sterling e Maureen não gostaram de terem um novo membro no Velvet, já que a banda tinha uma estrutura interna muito delicada.

Doug era um bom baixista, mas não podia substituir John Cale de maneira alguma. Apesar disso, Lou abraçou o jovem músico e o tratava com mais respeito e carinho do que os demais integrantes do grupo.

capa do disco The Velvet UndergroundNovamente um quarteto, o grupo entrou em estúdio para gravarem o terceiro disco do grupo, intitulado apenas The Velvet Underground. Os fãs levaram um susto quando ouviram o trabalho, pois, ao invés de todos as experimentações, o grupo soava extremamente acessível, com canções mais pops, bem leves. Lou abordava um tema até então inédito para ele, o amor. Assim "Pale Blue Eyes" nada mais era do que uma canção para uma ex-namorada e a doce "Candy Says" - a melhor composição de Lou, em suas próprias palavras - fala de um travesti que freqüentava a Factory, Candy Darling, que odiava ser homem e queria ser mulher. Lou disse que se inspirou no travesti para falar de um tema mais universal o "de olharmos para o espelho e não gostarmos do que vemos."

O disco ainda traz uma faixa bem estranha, que remete um pouco aos tempos de Cale - "The Murder Mystery". Nela, Lou e Sterling recitam dois poemas ao mesmo tempo, um em cada canal de estéreo. Um fala de maneira lenta e o outro de maneira rápida. Mas Lou contou que a idéia, apesar de boa, não funcionou, porque, no final, o ouvinte não conseguia ouvir nenhum dos dois corretamente e por causa disso, toda diversão sumiu.

Sterling também contou que o som do disco ficou mais "limpo" devido a um roubo no aeroporto de Nova York, quando viajavam para Los Angeles, local da gravação do disco, quando todo o equipamento do grupo, incluindo pedais e outras engenhocas sumiu. Sem tais recursos, o jeito foi fazer um trabalho mais calmo.

Uma curiosidade: existem duas mixagens disponíveis do disco. No LP da época e na redição em CD, a gravadora optou por uma mixagem diferente do que sugeriu Lou Reed, que deu um acabamento menos "equilibrado", recusado pela gravadora. Mas essa mixagem - batizada de "closet mix", por Sterling Morrison -, aparece quando o disco é reproduzido na caixa Peel Slowly And See.

O ano de 1969 era um ano relativamente calmo e o grupo se preparava para gravar um quarto disco, quando tiveram uma notícia inesperada...

5 - "Sem canções de drogas!"

O Velvet começava a trabalhar em um novo disco, extremamente animado com as novas canções, quando foram avisados que o disco não sairia.

O grupo havia passado os meses de maio até outubro entrando e saindo do Record Plant Studios e produziram 14 canções novas - clássicos como "I Can't Stand It", "Foggy Notion", "Lisa Says", "Stephanie Says", quando o presidente da MGM, Mike Curb resolveu demitir todos seus "artistas malucos e drogados", sobrando também para o Mothers, de Frank Zappa.

A demissão do Velvet da gravadora veio em um momento doloroso para a banda, já que Lou brigava com Steve Sesnick e Maureen e Sterling já admitiam a possibilidade de deixarem o grupo.

capa do disco VUcapa do disco Another View

Essas canções "perdidas" foram recuperadas na década de 80, quando a mesma MGM lançou dois discos com as canções: VU e Another View.

O grupo, no entanto, não ficou sem gravadora, pois o presidente da Atlantic Records, Ahmet Ertegun assinou com o grupo. Ertegun, inclusive, propôs lançarem por uma subsidiária, a Cottilion. Mas Ertegun fez um pedido para Lou: "não quero um disco que fale de drogas. Quero um disco cheio de grandes canções, para tocarem em rádios!"

E Lou atendeu...

6 - Max's Kansas City e o adeus de Lou

Mas antes de acabarem as gravações do disco, o grupo teria que cumprir uma agenda de seis shows no Max's Kansas City, em Nova York. O grupo não tocava na cidade desde 1967 e Lou não estava nem um pouco contente com os shows. Para piorar, Maureen tinha tido dado a luz à sua primeira filha em junho e não iria poder participar do show. O jeito foi convidar o baterista Billy Yule, irmão de Doug e que havia trabalhado como músico de estúdio no novo disco.

Maureen "Moe" TuckerMaureen disse que, mesmo assim, resolveu ver uma apresentação: "foi horrível, não era mais o Velvet. Apenas Lou e Sterling eram da formação original, mas era nítido a falta de ânimo dos dois". Antes do último show, Lou avisou a Steve que deixaria o grupo. Sesnick pouco se importou, já que queria se livrar de Reed, apostando em Doug para substitui-lo.

Moe lembra que quando Lou Reed confessou que não suportava mais aquela vida e a pressão, ela não podia acreditar: "mais do que ninguém, ele era o Velvet. Sem Lou, tudo estava acabado."

capa do disco Live at Max's Kansas CityIncrível ou não, a apresentação do dia 23 de agosto acabou sendo gravada e lançada dois anos mais tarde como um álbum, o Live at Max's Kansas City, uma das mais tristes gravações do grupo. Totalmente entediados, a banda vai anunciado novas canções, enquanto é possível ouvir conversas de pessoas dentro do bar. E o mais incrível é que esse disco tenha saído agora, em 2005, em versão remasterizada e com todas as canções na íntegra. Apesar do desleixo da banda, vale como um importante registro, especialmente de Lou.

capa do disco LoadedMenos de um mês depois do show, é lançado o derradeiro disco do Velvet com Lou: Loaded. E novamente o álbum traz algumas peculiaridades. Apesar de constar o nome de Maureen nos créditos, ela não tocou em nenhuma faixa, sendo substituída por Billy Yule - que recebia 6 dólares por dia como músico contratado. E Moe ficou muito irritada quando viu seu nome nos créditos.

Por mais incrível que pareça, Loaded é o disco favorito de muitos fãs e por um simples motivo: é um dico cheio de grandes canções. O disco abre com a bela "Who Loves The Sun", cantada por Doug. Uma balada bem anos 60 em que ele reclama por que precisa do sol, depois que sua amada partiu seu coração. Mas os dois maiores méritos do disco são o clássico "Sweet Jane" e "Rock And Roll". Sobre essas duas canções, Lou comenta:

"Rock And Roll" é auto-biográfica e fala de mim. Se eu não tivesse ouvido rock and roll na rádio quando criança, jamais desconfiaria que havia vida no planeta. Foi o rock quem me salvou."

Sobre "Sweet Jane", Lou explica que a edição da canção foi um dos motivos que o levaram a deixar o Velvet. Quando fizeram o trabalho de pós-produção, haviam feito uma versão editada da canção, cortando uma parte da letra, o que irritou Lou. "Eles cortaram um pedaço da letra que falava do 'days of wine and roses', mesmo contra minha vontade. Você pode imaginar o que é escrever uma canção, e vê-la cortada, e pior, sendo eternizada dessa maneira? Eu nunca perdoei por terem feito isso!"

Sterling MorrisonA versão original de "Sweet Jane" foi restaurada quando a caixa Peel Slowly And See foi lançada, mas mesmo assim, não agradou Lou: "ela já tinha ficado famosa da outra maneira. Até me perguntaram porque eu havia mexido nela para esse lançamento."

Quando o disco saiu, Sterling optou por seguir os passos de Lou e abandonar a banda. O guitarrista optou em acabar os estudos interrompidos em 1965 e se graduar em inglês e dar aulas, profissão que seguiria até 1992. Maureen ainda seguiu mais um tempo, mas também logo pulou fora do grupo. A banda agora era liderada por Doug Yule, como Steve Sesnick tanto queria.

7 - Reunião e o triste adeus

Billy YuleEm 1971, Doug e Steve resolveram manter o nome e saíram chamando músicos totalmente desconhecidos para a banda. Mantendo o mano Billy na bateria e convidando Willie Alexander, Walter Powers, Rob Norris, George Kay, Mark Nauseef e Don Silverman, fizeram uma série de shows até 1973, quando, não satisfeito, Doug resolveu macular totalmente o nome do grupo. Em um disco lançado apenas no Reino Unido e tendo o baterista Ian Paice, do Deep Purple, como o único convidado, Doug lançou um embaraço em forma de vinil: Squeeze.

capa do disco Squeeze"Reconheço que era muito mais um disco-solo meu do que outra coisa e só usei o nome Velvet Underground, pois tinha os direitos sobre ele. "De qualquer maneira, o disco foi um fiasco absoluto e nem teve uma edição norte-americana e nem foi sequer cogitado em sair como CD.

Mas, para a sorte dos fãs, o nome do Velvet foi sedimentado com uma reunião surpreendente e que (também) foi editada em 2003: um show no club Bataclan, em 1972.

A reunião contou com Lou Reed, John Cale e Nico, que pela primeira vez, se reuniam, desde 1967. Lou e John haviam se encontrando pela última vez em 1969, quando Steve convidou John para algumas gravações do disco abortado pela MGM. O empresário queria ver se era possível trazer Cale de volta, mas não teve sucesso, embora ele tenha participado da faixa "Ocean". Já em Paris, a história foi outra: o encontro de 29 de janeiro reuniu os três em 14 músicas e, ironicamente, marcou a única apresentação do Velvet Underground na Europa. Ainda que desfalcados de Sterling e Maureen.

Mas o nome Velvet Underground ainda seria ouvido muitos anos depois...

8 - A volta, ainda que breve

capa do disco Songs for DrellaEm 1990, Lou e John Cale resolveram se reunir para um disco-tributo a Andy Warhol, Songs for Drella. E dessa reunião começou a ser especulado uma futura reunião do Velvet.

Mas Lou não queria nem ouvir falar em Velvet Underground, apesar de Moe ter participado de seu disco anterior, New York. Porém, Sylvia Reed, então esposa de Lou, começou a tramar a futura volta do Velvet. E foi em um show no dia 15 de junho de 1990, quando Lou e John faziam uma apresentação na cidade francesa de Jouy-en-Josas, a convite da Fundação Cartier, para pouco mais de 150 pessoas e jornalistas, que Lou interrompeu e disse: "temos uma pequena surpresa para vocês..."

A pequena surpresa era a presença de Sterling e Moe, que fizeram uma versão de 17 minutos para "Heroin". O acontecimento foi noticiado em todo o planeta como a "volta do Velvet Underground!"

Não ainda... O problema é que Lou já tinha uma imensa e bem-sucedida carreira-solo e não queria voltar em igualdade de condições com os demais, particularmente com Sterling e Moe, que tinham vidas bem modestas e até sacrificadas - na ocasião, o guitarrista ganhava pouco dinheiro com suas aulas e a baterista era caixa de supermercado.

O primeiro contato havia sido feito quando os outros dois membros queriam alguma compensação financeira pelo legado da banda, todo em poder de Lou. Reed aceitou rever o contrato sem muitos problemas, possibilitando um dinheiro extra aos demais. Mas a reunião mesmo só começou a acontecer em 1992. No dia 5 de dezembro, Lou e John tiveram a companhia de Sterling Morrison no palco, que estava nervoso pelos anos de inatividade como guitarrista.

Foto do Velvet em 1993Em fevereiro de 1993, os quatro resolveram se encontrar em Nova York para ensaiarem. "Foi uma reunião tensa, mas tocamos por mais de cinco horas e saímos todos felizes", conta Tucker.

O grupo resolveu então realizar um sonho: fazer uma excursão pela Europa, o que não havia ocorrido na década de 60. E, para minimizarem os custos, o Velvet abriria os shows do U2, então em uma mega temporada pelo planeta. Mas isso causou alguma comoção dos fãs: "abrir para o U2 é o mesmo que Hendrix abrindo para os Monkees. Não deveria ser o contrário??", reclamou um.

A excursão, que iniciou bem, começou a azedar quando Lou resolveu mostrar quem mandava na banda. Nos primeiros shows, Lou mostrava calma e compreensão com o nervosismo geral, especialmente de Sterling, com quem havia reestabelecido grande amizade. Ele, inclusive, chegou a pedir desculpas sinceras após uma bronca em um ensaio. Mas Lou era imprevisível e ao final da excursão, John Cale lamentava amargamente ter aceitado tal convite.

Mas o pior veio depois. Quando os quatro retornaram à América, Lou ficava mandando mensagens grossas por fax para John e Sterling, dizendo o que haviam feito de errado e como tinha ficado desapontado com John. A situação ficou tão incontrolável, que após Sterling e Maureen receberem o dinheiro que tinham direito, nunca mais quiseram saber de uma volta. E com a morte de Sterling, no dia 30 de agosto de 1995, em Poughkeepsie, Nova York, o Velvet encerrou de vez.

capa do disco Live MCMXCIIIMas o grupo deixou dois importantes registros. O primeiro é o CD duplo da excursão, Live MCMXCIII, que causou muita tensão para Lou, já que, segundo Maureen "ele descobriu que sua voz estava ruim e que sua habilidade na guitarra não é tão grande assim e quis fazer vários overdubs"; e a imponente caixa, Peel Slowly And See, contendo cinco CDs, sendo os quatro discos de carreira do grupo - descontando, obviamente Squeeze - e mais um CD com demos, além de um luxuoso livro de 88 páginas.

capa da caixa Peel Slowly And SeeO grupo teve uma série de lançamentos póstumos, como reedições de todos os discos e várias caixas.

A influência do Velvet nos anos 80 e 90 é imensa, podendo ser comparada aos Beatles. Poucos grupos puderam desfrutar de uma notoriedade tão grande anos depois de encerrarem suas atividades.

Lou Reed segue em uma bem-sucedida carreira-solo, embora tenha oscilado em qualidade nos últimos trabalhos.

Deixo vocês com a discografia do grupo. Um abraço e até a próxima coluna.

 

Discografia

The Velvet Underground and Nico (1967)
White Light/White Heat (1968)
The Velvet Underground (1969)
Loaded (1970)
Live at Max's Kansas City (1972)
Squeeze (1973)
1969: Velvet Underground Live vol.1 (1974)
1969: Velvet Underground Live vol.2 (1974)
VU (1985)
Another View (1986)
The Best of The Velvet Underground (1989)
Live MCMXCIII (1993)
What Goes On (1993)
Peel Slowly and See (1995)
20th Century Masters - The Millennium Collection: The Best of the Velvet Underground (2000)
An Introduction to The Velvet Underground (2000)
Bootleg Series, Vol. 1: The Quine Tapes (2001)
Le Bataclan '72 - Lou Reed, John Cale & Nico (2003)
Gold (2005)

 

 

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