Category Archives: Contos

Cardação de verão

Cardação de verão

Em um final de tarde de primavera, em que já se achegava o verão, estavam as tecelãs reunidas no Ateliê da Donzela, que era mãe e também anciã. Dali a mais alguns dias a Litha chegaria trazendo o dia mais longo e a noite mais curta do ano.

Após a grande tosquia da primavera, os carneiros corriam leves pelo campo, sem a sua densa lã. A tosquia acontecia somente uma vez por ano,  ao final do inverno, pois a camada de lã era a proteção dos animais contra os rigores da estação. Mas no verão ela causava calor intenso e poderia prejudicar os animais, trazendo desconforto e podendo levar até à morte. Era raríssimo isso acontecer com os carneiros de Beatrix, mas já havia ocorrido ao menos uma vez de um dos carneiros ter fugido e ter sido encontrado tarde demais. Por isso todo o cuidado na contagem durante a tosquia. Nenhum deles poderia escapar do ritual. Os melhores carneiros forneciam até mais de quatro quilos de lã bruta.

Carneiros esquilados, a lã era enrolada, curtida, depois separada e tratada. Durante dias ela era lavada para tirar a gordura, que depois seria aproveitada para sabão.

Depois de lavada e seca, começaria a cardação. Naquela noite no galpão do atelier, entre bolos, pasteis e biscoitos, muita conversa e chávenas de chá, Beatrix estava reunida com as suas tecelãs.

Todas estavam animadas para o serão. Fazia tempo que Beatrix não participava pessoalmente da cardação e tinha saudades daqueles momentos, por isso uniu-se ao grupo. A agora baronesa sentou-se em um banco, e enquanto separava a lã para penteá-la no cardador propôs ao grupo.

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Mudando mais uma vez…

Mudando mais uma vez…

Depois de algum tempo residindo com a família Henriques em Santarém, eis que mais uma vez Beatrix mudaria de ares.

Enquanto Fitzwilliam e seus irmãos viajavam para negociar a casa que seria a nova residência da família Henriques, Beatrix cuidava dos detalhes da mudança, em Santarém, com Heloysa, a esposa de Samuel, além dos empregados dos Henriques.

A louça deveria ser embalada e encaixotada em meio à palha, os móveis da família deveriam ser cuidadosamente transportados. Ali estavam objetos que pertenciam aos Henriques e dos quais eles tinham uma memória afetiva muito forte. Esse apego ao passado era uma forma de manter viva a memória dos pais, já falecidos há tanto tempo. Era curioso como eles se esforçavam para estar sempre próximos vivendo na mesma casa.

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Mulheres-aranhas

Mulheres-aranhas

“Em várias culturas, a criadora cósmica, divindade dedicada à fiação e à tecelagem, é representada pela aranha.  Como epifania lunar, a aranha evoca, pela fragilidade de sua teia, uma realidade de aparência ilusória, enganadora. Sendo Senhora do Destino, tem função divinatória. Em algumas crenças, tem o papel de intercessora, fazendo a ligação com o plano celeste, ligando criatura e criador. Entre os navajos, a Mulher Aranha ou Mulher Mutante é a responsável pela manutenção do universo, fiando e tecendo continuamente a vida. Nessa cultura, as aranhas nunca são mortas, pois seria uma ofensa às Avós ou antepassadas.”

filtro-dos-sonhos

Existem muitas histórias relacionadas com aranhas e Mulheres-Aranhas entre as várias nações de índios americanos. Em muitas destas tradições, por exemplo, a Mulher-Aranha é um personagem fundamental e sábio, ora mensageira do Sol, ora avó do próprio Sol e organizadora da vida na Terra. Existem várias lendas relacionadas com os dream catchers. Esta é apenas uma das versões:

Uma aranha fiava sua teia próximo à cama da avó (Nokomi). Todos os dias ela observava a aranha trabalhar. Alguns dias depois, o neto entrou e, ao ver a aranha na teia, pegou uma pedra para matá-la. Mas a avó não deixou. O garoto achou estranho, mas respeitou o seu desejo. A velha mulher voltou-se para observar mais uma vez o trabalho do animal e, então, a aranha falou: Obrigada por salvar minha vida. Vou dar-lhe um presente por isso. Na próxima Lua nova vou fiar uma teia na sua janela. Quero que você observe com atenção e aprenda como tecer os fios. Porque esta teia vai servir para capturar todos os maus sonhos e as energias ruins. O pequeno furo no centro vai deixar passar os bons sonhos e fazê-los chegarem até você.

Quando a Lua chegou, a avó viu a aranha tecer sua teia mágica e, agradecida, não cabia em si de felicidade pelo maravilhoso presente: Aprenda, dizia a aranha. Finalmente, exausta, a avó dormiu. Quando os primeiros raios de sol surgiram no céu, ela acordou e viu a teia brilhando como jóia graças às gotas de orvalho capturadas nos fios. A brisa trouxe penas de pomba que também ficaram presas na teia, dançando alegremente e, por último, um corvo pousou na teia e deixou uma longa pena pendurada. Por entre as malhas da teia, o Pai Sol sorria alegremente. E a avó, feliz, ensinou todos da tribo a fazerem os filtros de sonhos. E até hoje eles vêm afastando os pesadelos de muita gente.

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Fonte:

Extase da Deusa: http://shaktilalla.blogspot.com.br/2011/06/medicina-da-mulher-aranha.html

 

 

Aventura rumo à Alexandria? – Vento no rosto, água salgada e imensidão. 

Aventura rumo à Alexandria? – Vento no rosto, água salgada e imensidão. 

Eu realmente gosto de aventuras, de andar pelas estradas sem rumo e não ficar parada. Não sei de onde veio esse bicho aventureiro que me mordeu, mas ele certamente já visitou alguns familiares. Meu irmão Guilherme tem muitas histórias e aventuras para contar das viagens que fez e lugares que visitou pela Europa. Talvez a culpa disso tudo sejam as histórias que ele me contou em suas cartas. Assim, desde que comecei a viajar criei gosto e nunca parei. Minhas distâncias percorridas são ainda modestas, mas tudo começa com pequenos passos e já comecei os meus. Assim, foi com uma empolgação genuína que vi um cartaz na Praça de Alcácer do Sal anunciando: “Descubra o Oriente. Uma viagem inesquecível ao Egipto, venha conhecer a maravilhosa Alexandria”. O embarque seria no Domingo, 27 de abril no porto de Alcácer. 
 

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Memórias do convento – o primeiro assassinato

Memórias do convento – o primeiro assassinato

claustro-monasterio

Beatrix viveu entre os dois e os nove anos de idade em companhia do irmão, que de fato foi a única família que ela chegou a conhecer, uma vez que a mãe morreu pouco tempo depois de seu nascimento e o pai partiu com a filha mais velha Elizabeth para a Irlanda, deixando seus negócios em Montemor aos cuidados do filho mais velho, William. Read the rest of this entry