Category Archives: Contos

Rumpelstiltskin

Rumpelstiltskin

O CONTO

VERSÃO RECENTE:

Para impressionar o Rei, com o objetivo de fazer o príncipe casar com a sua filha, um moleiro bastante pobre mente e diz que ela é capaz de fiar palha e transforma-la em ouro. O Rei chama a moça, fecha-a numa torre com palha e uma roda de fiar, e exige-lhe que ela transforme a palha em ouro até de manhã, durante três noites, ou será executada. Algumas versões dizem que, se ela falhasse, seria empalada e depois cortada em pedaços como um porco, enquanto outras não são tão gráficas e dizem que a moça ficaria fechada na torre para sempre. Ela já tinha perdido toda a esperança, quando aparece um duende no quarto e transforma toda a palha em ouro em troca do seu colar; na noite seguinte, pede-lhe o seu anel. Na terceira noite, quando ela não tinha nada para lhe dar, o duende cumpre a sua função em troca do primeiro filho que a moça desse à luz.

O Rei fica tão impressionado que decide se casar com ela, mas quando nasce o primeiro filho do casal, o duende regressa para reclamar o seu pagamento: “Agora dá-me o que me prometeste”. A Rainha ficou assustada e ofereceu-lhe toda a sua riqueza, se este a deixasse ficar com a criança. O duende recusa, mas por fim aceita desistir da sua exigência, mas cria outra exigência: se a Rainha conseguisse adivinhar o seu nome em três dias. No primeiro dia, ela falhou, mas antes da segunda noite, o seu mensageiro ouve o duende a saltar à volta de uma fogueira e a cantar. Existem muitas variações da canção, mas a mais conhecida é:

Hoje eu frito, amanhã eu cozinho!
Depois de amanhã será meu o filho da rainha!
Coisa boa é ninguém saber
Que meu nome é Rumpelstiltskin!

Quando o duende foi ter com a Rainha no terceiro dia, ela revela o nome dele, Rumpelstiltskin, e ele perde o seu negócio.

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Rosea perennis

Rosea perennis

 

Um homem com a aparência de um viajante adentrou o templo. Ele era muito alto, usava uma longa capa escura e sentou-se nos últimos bancos da Sé de Braga, afastado de nobres e figuras importantes que ocupavam aquele espaço.

Pelo capuz se via um pouco de seu rosto, parecia ser um homem aparentando entre 45 e 50 anos, seus olhos eram verdes e brilhantes. Seu cabelo era castanho de um tom mais claro e já mostrava alguns raros fios grisalhos, sua tez tinha um leve bronzeado. Mesmo as marcas da idade que já lhe assomavam ao rosto não lhe tiravam sua beleza singular.

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A infinita fiandeira

A infinita fiandeira

A aranha, aquela aranha, era tão única: não parava de fazer teias! Fazia-as de todos os tamanhos e formas. Havia, contudo, um senão: ela fazia-as, mas não lhes dava utilidade. O bicho repaginava o mundo. Contudo, sempre inacabava as suas obras. Ao fio e ao cabo, ela já amealhava uma porção de teias que só ganhavam senso no rebrilho das manhãs.
E dia e noite: dos seus palpos primavam obras, com belezas de cacimbo gotejando, rendas e rendilhados. Tudo sem nem finalidade. Todo bom aracnídeo sabe que a teia cumpre as fatias funções: lençol de núpcias, armadilha de caçador. Todos sabem, menos a nossa aranhinha, em suas distraiçoeiras funções.
Para a mãe-aranha aquilo não passava de mau senso. Para quê tanto labor se depois não se dava a indevida aplicação? Mas a jovem aranhiça não fazia ouvidos. E alfaiatava, alfinetava, cegava os nós. Tecia e retecia o fio, entrelaçava e reentrelaçava mais e mais teia. Sem nunca fazer morada em nenhuma. Recusava a utilitária vocação da sua espécie.
— Não faço teias por instinto.
— Então, faz porquê?
— Faço por arte.
Benzia-se a mãe, rezava o pai. Mas nem com preces. A filha saiu pelo mundo em ofício de infinita teceloa. E em cantos e recantos deixava a sua marca, o engenho da sua seda. os pais, após concertação, a mandaram chamar. A mãe:
— Minha filha, quando é que acentas as patas na parede?
E o pai:
— Já eu me vejo em palpos de mim…
Em choro múltiplo, a mãe limpou as lágrimas dos muitos olhos enquanto disse:
— Estamos recebendo queixas do aranhal.
— O que é que dizem, mãe?
— Dizem que isso só pode ser doença apanhada de outras criaturas.
Até que se decidiram: a jovem aranha tinha que ser reconduzida aos seus mandos genéticos. Aquele devaneio seria causado por falta de namorado. A moça seria até virgem, não tendo nunca digerido um machito. E organizaram um amoroso encontro.
— Vai ver que custa menos que engolir mosca — disse a mãe.
E aconteceu. Contudo, ao invés de devorar o singelo namorador, a aranha namorou e ficou enamorada. Os dois deram-se os apêndices e dançaram ao som de uma brisa que fazia vibrar a teia. Ou seria a teia que fabricava a brisa?
A aranhiça levou o namorado a visitar sua coleção de teias, ele que escolhesse uma, ficaria prova de seu amor.
A família desiludida consultou o Deus dos bichos, para reclamar da fabricação daquele espécime. Uma aranha assim, com mania de gente? Na sua alta teia, o Deus dos bichos quis saber o que poderia fazer. Pediram que ela transitasse para humana. E assim sucedeu: num golpe divino, a aranha foi convertida em pessoa. Quando ela, já transfigurada., se apresentou no mundo dos humanos logo lhe exigiram a imediata identificação. Quem era, o que fazia?
— Faço arte.
— Arte?
E os humanos se entreolharam, intrigados. Desconheciam o que fosse arte. Em que consistia? Até que um, mais-velho, se lembrou. Que houvera um tempo, em tempos de que já se perdera memória, em que alguns se ocupavam de tais improdutivos afazeres. Felizmente, isso tinha acabado, e os poucos que teimavam em criar esses pouco rentáveis produtos — chamados de obras de arte — tinham sido geneticamente transmutados em bichos. Não se lembrava bem em que bichos. Aranhas, ao que parece.

Por Mia Couto